ASSOCIAÇÃO ENTRE AS INFECÇÕES POR Trypanosoma cruzi e

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INSTITUTO DE ENSINO E PESQUISA-IEP
SANTA CASA DE BELO HORIZONTE
Núcleo de Pós Graduação e Pesquisa
ASSOCIAÇÃO ENTRE AS INFECÇÕES POR
Trypanosoma cruzi e VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA
ADQUIRIDA HUMANA (HIV)
ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO.
MARCOS AVILA GUIMARÃES
BELO HORIZONTE
2013
MARCOS AVILA GUIMARÃES
ASSOCIAÇÃO ENTRE AS INFECÇÕES POR
Trypanosoma cruzi e VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA
ADQUIRIDA HUMANA (HIV)
ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO
Dissertação apresentada ao programa
de Pós-graduação da Santa Casa de
Misericórdia de Belo Horizonte, como
requisito parcial para obtenção do título
de mestre em Medicina e Biomedicina.
Área de concentração: Medicina e
Biomedicina
Orientador: Prof. Dr. Carlos Maurício de
Figueiredo Antunes
Belo Horizonte - MG
2013
À minha mãe que me deu todo apoio em toda trajetória,
Aos meu irmãos Erika e Lucas pelo suporte,
Ao amigo, primo, conselheiro, professor, incentivador Dr Flávio que sempre esteve ao meu lado,
À minha namorada Thaís, pelo carinho e compreensão e
Ao professor Dr Carlos Maurício por me ensinar e compartilhar seus conhecimentos.
“A mente que se abre a uma ideia, jamais voltará ao seu tamanho original”
Albert Einstein
RESUMO
Introdução: A coinfecção vírus da imunodeficiência humana adquirida (HIV/AIDS) e
Trypanosoma cruzi/doença de Chagas foi descrita pela primeira vez na década de
90. Desde então vários casos tem sido relatados; os efeitos desta coinfecção ainda
não estão esclarecidos e pouco se sabe sobre o impacto de uma infecção sobre a
outra. Objetivo: Estudar as características da associação entre as infecções pelo
Trypanosoma cruzi/doença de Chagas e pelo HIV/AIDS. Metodologia: Trata-se de
um estudo epidemiológico, transversal, descritivo e analítico, envolvendo analise de
prontuários de pacientes de três grupos: infectados pelo T.cruzi/doença de Chagas
(grupo 1), infectados pelo HIV/AIDS (grupo 2) e coinfectados pelo HIV/AIDS e
T.cruzi/doença de Chagas (grupo 3). O estudo foi realizado em três Centros de
Pesquisa: Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade de São Paulo e
Universidade Estadual de Campinas. No total foram avaliados 150 prontuários,
sendo 53 pacientes com HIV/AIDS, 68 pacientes com T.cruzi/doença de Chagas e
29 coinfectados HIV/AIDS-T.cruzi/Chagas. Resultados: A comparação entre os
grupos 1 e 3 mostrou um risco 34 vezes maior (Odds Relativa 34,7 e IC95% 4,1290,6) de doenças sexualmente transmitidas (DSTs) no grupo coinfectados; a
comparação entre os grupos 2 e 3, revelou um risco 5 vezes maior (Odds Relativa
5,2 e IC95% 1,5-17,6) de doenças associadas (comorbidades) no grupo
coinfectados. Conclusão: Este estudo mostrou que pacientes com a coinfecção
T.cruzi/doença de Chagas-HIV/AIDS tem um maior risco de relatarem história de
DSTs e de doenças associadas (comorbidades) quando comparados aos pacientes
mono infectados; deve ser ressaltado que novos estudos são necessários para
melhor caracterizar a associação encontrada.
Palavras-chave: HIV, AIDS, Trypanosoma cruzi, doença de Chagas, epidemiologia,
coinfecção.
ABSTRACT
Introduction: Coinfection with human immunodeficiency virus (HIV / AIDS) and
Trypanosoma cruzi / Chagas disease was first described in the 90s. Since then,
several cases have been reported, the effects of coinfection are unclear and little is
known about the impact of infection on the other. Objective: To study the
characteristics of the association between infection with Trypanosoma cruzi / Chagas
disease and HIV / AIDS. Methodology: This is an epidemiological cross-sectional
descriptive and analytical, involving analysis of patient records of three groups:
infected by T. cruzi / Chagas disease (group 1), infected with HIV / AIDS (group 2)
and coinfected with HIV / AIDS and T. cruzi / Chagas disease (group 3). The study
was conducted at three research centers: Universidade Federal de Minas Gerais,
Universidade de São Paulo and Universidade Estadual de Campinas. Altogether 150
medical records were evaluated, 53 patients with HIV / AIDS, 68 patients with T. cruzi
/ Chagas disease and 29 coinfected HIV / AIDS-Trypanosoma cruzi / Chagas.
Results: The comparison between groups 1 and 3 showed a 34 times greater risk
(Odds Ratio 95% CI 4.1 to 290.6 and 34.7) of sexually transmitted diseases (STDs)
in the coinfected group, the comparison between groups 2 and 3, revealed a 5 times
higher risk (Odds Ratio 5.2 and 95% CI 1.5 to 17.6) of associated diseases
(comorbidity) in the coinfected group. Conclusion: This study showed that patients
with coinfection T.cruzi / Chagas-HIV/AIDS disease have an increased risk of
reporting a history of STDs and associated diseases (comorbidities) compared to
mono-infected patients, it should be emphasized that further studies are needed to
better characterize the association found.
Keywords: HIV, AIDS, Trypanosoma cruzi, Chagas disease, epidemiology,
coinfection.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AIDS – Acquired Immunodeficiency Syndrome
DCA – Doença de Chagas
DST – Doenças Sexualmente Transmissíveis
ELISA - Enzyme-Linked Immunosorbent Assay
HAART - Highly Active Antiretroviral Threrapy
HIV – Human Immunodeficiency Virus
LV – Leishmaniose Visceral
MS - Ministério da Saúde
OMS – Organização Mundial de Saúde
OPAS – Organização Pan-americana de Saúde
PAD - Pressão Arterial Diastólica
PAS - Pressão Arterial Sistólica
T. cruzi - Trypanosoma cruzi
UNAIDS - Joint United Nations Program on HIV/AIDS
VCM - volume corpuscular médio
WHO – World Heath Organization
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Distribuição de frequências e médias das características sócio-demográficas e
econômicas dos 29 pacientes com coinfecção e dos 68 pacientes com doença de Chagas
nos centros de Belo Horizonte, Campinas e São Paulo. ............................................................. 32
Tabela 2 : Distribuição de frequências e médias das características clínicas dos 29
pacientes com coinfecção e dos 68 pacientes com doença de Chagas nos centros de Belo
Horizonte, Campinas e São Paulo. ................................................................................................. 33
Tabela 3 : Distribuição de frequências e médias das características laboratoriais dos 29
pacientes com coinfecção e dos 68 pacientes com doença de Chagas nos centros de Belo
Horizonte, Campinas e São Paulo. ................................................................................................. 34
Tabela 4: Distribuição de frequências e médias das características sócio-demográficas e
econômicas dos 29 pacientes com coinfecção e dos 53 pacientes com HIV nos centros de
Belo Horizonte, Campinas e São Paulo. ........................................................................................ 35
Tabela 5: Distribuição de frequências e médias das características clínicas dos 29 pacientes
com coinfecção e dos 53 pacientes com HIV nos centros de Belo Horizonte, Campinas e
São Paulo. ........................................................................................................................................... 37
Tabela 6: Distribuição de frequências e médias das características laboratoriais dos 29
pacientes com coinfecção e dos 53 pacientes com HIV nos centros de Belo Horizonte,
Campinas e São Paulo...................................................................................................................... 39
Tabela 7: Análise logística incondicional (modelo final), dos 97 prontuários analisados de
portadores de coinfecção e doença de Chagas. ........................................................................... 40
Tabela 8: Análise logística incondicional (modelo final), dos 82 prontuários analisados de
portadores de coinfecção e HIV. ...................................................................................................... 41
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 11
1.1 Infecção pelo Trypanosoma cruzi e doença de Chagas ................................................... 11
1.2. Infecção pelo HIV e AIDS ...................................................................................................... 12
1.3. Coinfecção Trypanosoma cruzi/HIV .................................................................................... 12
2. JUSTIFICATIVA.............................................................................................................................. 15
3. REVISÃO DE LITERATURA ........................................................................................................ 16
3.1. HIV/AIDS.................................................................................................................................. 16
3.1.1. Epidemiologia .................................................................................................................. 16
3.1.2. Transmissão ..................................................................................................................... 17
3.1.3. Diagnóstico....................................................................................................................... 18
3.1.4. Tratamento ....................................................................................................................... 19
3.2. Infecção pelo Trypanosoma cruzi e doença de Chagas .................................................. 20
3.2.1. Características Clínicas da Doença ............................................................................. 20
3.2.2. Epidemiologia .................................................................................................................. 22
3.2.3. Transmissão ..................................................................................................................... 22
3.2.4. Diagnóstico....................................................................................................................... 24
3.2.5. Tratamento ....................................................................................................................... 24
3.3.Coinfecção HIV/Trypanosoma cruzi ..................................................................................... 25
4. OBJETIVOS.................................................................................................................................... 27
4.1. Objetivo principal .................................................................................................................... 27
4.2. Objetivos específicos ............................................................................................................. 27
5. METODOLOGIA ............................................................................................................................ 28
5.1. Tipo de estudo......................................................................................................................... 28
5.2. Local de estudo....................................................................................................................... 29
5.3. População do Estudo ............................................................................................................. 29
5.4. Aspectos éticos ....................................................................................................................... 29
5.5. Período de coleta de dados .................................................................................................. 30
5.6. Análise dos dados .................................................................................................................. 30
5.7. Pesquisa bibliográfica ............................................................................................................ 31
6. RESULTADOS................................................................................................................................ 32
6.1. Análise Univariada .................................................................................................................. 32
6.2. Resultados da análise multivariada ..................................................................................... 40
7. DISCUSSÃO................................................................................................................................... 42
8. CONCLUSÃO ................................................................................................................................. 46
9. PROPOSIÇÕES............................................................................................................................. 47
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ................................................................................................ 48
APÊNDICE .......................................................................................................................................... 54
ANEXO ................................................................................................................................................ 62
11
1. INTRODUÇÃO
1.1 Infecção pelo Trypanosoma cruzi e doença de Chagas
A descoberta da doença de Chagas, pelo médico brasileiro Carlos Chagas em 1909,
é considerado um dos mais completos achados realizados por um mesmo
pesquisador na historia da biologia, ecologia e patologia humana parasitária. Pela
primeira, vez um único cientista descobriu a doença, seu agente etiológico, vetor e
hospedeiro. O agente etiológico é o Trypanosoma cruzi, protozoário flagelado da
ordem Kinetoplastida, família Trypanosamotidae. No sangue dos vertebrados, o
parasita se apresenta sob a forma de tripomastigota e, nos tecidos, como
amastigota. Nos invertebrados, ocorre um ciclo envolvendo a transformação dos
tripomastigotas sanguíneos em epimastigotas, que depois se diferenciam em
tripomastigotas metacíclicos que são as formas infectantes acumuladas nas fezes
do inseto, um reduvídeo, hospedeiro intermediário.(Chagas, 1909; Gilles, 1999;
Brasil, 2005)
A doença de Chagas é uma doença infecciosa de curso clínico crônico. Se
caracteriza por apresentar uma fase inicial aguda, com sinais ou sintomas quase
sempre inespecíficos, quando presentes. Pode evoluir para a fase crônica com
comprometimento cardíaco (cardiopatia chagásica) ou digestivo (megaesôfago e
megacólon). Outras manifestações clínicas, tais como a meningoencefalite
chagásica, são bastante raras.
1
É um importante problema de saúde pública,
afetando cerca de 10 milhões de pessoas, principalmente na América Latina onde é
endêmica; migrações internacionais estão tornando a doença cada vez mais
frequente em países não endêmicos.(Quijano-Hernandez e Dumonteil, 2011)
12
1.2. Infecção pelo HIV e AIDS
A Síndrome da imunodeficiência humana adquirida (AIDS) teve seus primeiros
casos relatados nos Estados Unidos da America, Haiti e África Central em 1982. É
uma
doença
do
sistema
imunológico
humano
causada
pelo
vírus
da
imunodeficiência adquirida humana (HIV). O vírus afeta o sistema imunológico ao
infectar e destruir principalmente os linfócitos T CD4+, reduzindo a capacidade do
hospedeiro em gerar respostas imunológicas efetivas. Desta forma, indivíduos
infectados tornam-se gradativamente mais vulneráveis ao surgimento de outras
doenças.(Sepkowitz, 2001)
Embora o avanço das terapêuticas medicamentosas tenham possibilitado a
diminuição das taxas de mortalidade, observa-se no cenário atual o aparecimento
de coinfecções associadas à infecção pelo HIV/AIDS.(Saúde, 2008b)
1.3. Coinfecção Trypanosoma cruzi/HIV
A coinfecção pelos agentes etiológicos da doença de Chagas e AIDS,
respectivamente, vem sendo descrita sistematicamente como um evento clínico
relevante. A coinfecção foi descrita pela primeira vez em 1980 e os efeitos da
mesma são pouco conhecidos.30 Apesar da redução de casos novos no Brasil da
doença de Chagas, é estimado que milhares de pessoas em áreas endêmicas e não
endêmicas estão sob risco de reativação da doença, se infectados pelo HIV.(Ramos
Junior, Correia et al., 2010)
13
A partir da década de 1990, tem-se relatos cada vez mais comuns de casos com
grave expressão clínica de reativação da doença de Chagas em pacientes com
coinfecção por HIV e T.cruzi em fase avançada de imunodeficiência.(Saúde, 2007d)
Nos pacientes com AIDS, cresce o número de descrições de casos de reativação da
infecção
pelo
T.cruzi
e,
consequentemente,
da
doença
de
Chagas.
Aproximadamente, 120 casos foram relatados até 2004.(Saúde, 2007d)
Dados mais atualizados estimam uma prevalência de 12 a 14 milhões de pessoas
com a doença de Chagas crônica. Essa situação traz como possibilidade a
ocorrência de comorbidades ou coinfecção, dentre elas a infecção HIV e T.cruzi.
Mesmo com o controle, a partir da década de 60, alguns estudos latino-americanos
demonstraram que T. cruzi pode comportar-se como um patógeno oportunista em
pacientes com imunodepressão natural ou induzida. Desde então, casos de
reativação da doença de Chagas em indivíduos com imunodepressão vêm sendo
relatados.(Saúde, 2007d)
Na presença concomitante das duas infecções, em mais de 40% dos casos estas
evoluem de acordo com a história natural de cada uma, sem que haja indicações de
mudança nos padrões clínicos típicos de cada uma. Como os relatos na literatura
são raros e, muitas vezes, incompletos, as possíveis interações clínicas entre as
duas doenças são pouco conhecidas. No caso da coinfecção, a menor sobrevida
esta possivelmente relacionada à reativação da doença de Chagas e/ou às
complicações acumuladas de ambas as doenças.(Almeida, Júnior et al., 2011)
Pouco se sabe sobre o impacto da doença de Chagas sobre a infecção pelo
HIV.(Sartori, Caiaffa-Filho et al., 2002) No entanto, para outras parasitoses, tais
como a Leishmaniose, a interação com a infecção pelo HIV é bem descrita,
especificamente no caso da Leishmaniose Visceral (LV). Neste caso, a interação
entre estas duas infecções surge como um importante modelo para identificação e
14
estudo de padrões clínicos associados à coinfecção envolvendo o HIV e parasitoses
protozoóticas.
A LV tem emergido como uma importante infecção oportunista associada ao HIV.
Em áreas endêmicas para a LV, muitas pessoas têm infecção assintomática. A
infecção por HIV concomitante aumenta o risco de desenvolvimento de LV ativa por
entre 100 e 2320 vezes. No Sul da Europa, em até 70% dos casos de leishmaniose
visceral em adultos estão associadas com a infecção por HIV. 48 As alterações nos
perfis epidemiológicos da AIDS e da LV como a interiorização na infecção pelo HIV
simultânea à urbanização da LV apontam para maior exposição da população às
duas infecções.(Sousa-Gomes, Maia-Elkhoury et al., 2011)
A coinfecção de leishmaniose e HIV tem importantes implicações clínicas,
diagnóstico e epidemiológica. As duas doenças são mutuamente reforçadas:
pessoas infectadas pelo HIV são particularmente vulneráveis a LV, enquanto LV
acelera a replicação do HIV e progressão para a AIDS, mostrando assim que uma
doença tem influencia sobre a outra.(Organization, 2012)
Varias lacunas na coinfecção T. cruzi e HIV precisam ser preenchidas para que
possamos compreender melhor esta interação entre infecções, pois é sabido que há
interação entre elas.
15
2. JUSTIFICATIVA
Já é conhecido que várias doenças apresentam interações clínicas particulares com
a
AIDS,
tais
como:
Leishmaniose(Alvar,
Aparicio
et
al.,
2008);
Toxoplasmose(Shimelis, Tebeje et al., 2009) e Strongiloides.(Getaneh, Medhin et al.,
2010)
Por ocasião de seu surgimento, a AIDS era conhecida como uma doença
tipicamente urbana, atingindo principalmente indivíduos do sexo masculino e
transmitida por contato sexual e seringas compartilhadas. Já a doença de Chagas é
considerada como uma doença típica do ambiente rural. De acordo com os
balanços divulgados através do Ministério da Saúde, os casos de HIV no Brasil
diminuíram consideravelmente nas grandes capitais, porém os casos aumentaram
em cidades do interior(Saúde, 2009). E já se observa um aumento da doença de
Chagas no meio urbano.(Saúde, 2007d) Estes novos padrões epidemiológicos
pressupõem, de forma quase inevitável, a concomitância entre as duas infecções
distintas num mesmo ambiente humano e a eventual ocorrência da coinfecção com
as mesmas em determinados pacientes. A evolução clínica das duas infecções
isoladas já é bastante conhecida e documentada, no entanto, muito pouco se sabe
sobre sua evolução quando superpostas em um mesmo paciente. Diante das
mudanças epidemiológicas correntes e em face das lacunas de conhecimento
cientifico relativas à interação entre a doença Chagas e a infecção pelo HIV, estudos
que elucidem as características desta coinfecção tornam-se absolutamente
necessários.
16
3. REVISÃO DE LITERATURA
3.1. HIV/AIDS
3.1.1. Epidemiologia
No inicio dos anos 1980, a infecção pelo vírus HIV era descrita em determinados
grupos de risco compostos por homossexuais, usuários de drogas injetáveis,
pacientes hemotransfundidos, haitianos, prisioneiros e africanos. No Brasil o
primeiro caso diagnosticado foi em São Paulo em 1982.(Saúde; Sepkowitz, 2001)
Três décadas após o inicio da epidemia de infecção pelo HIV, avanços significativos
foram observados na caracterização, terapia, conceito do grupo de risco, atitudes de
solidariedade, profilaxia da infecção e direitos de portadores de HIV/AIDS.(Saúde)
Em 2001, havia no mundo 28,6 milhões de pessoas vivendo com HIV/AIDS; em
2009, 32,9 milhões. Apenas no Brasil, foram notificados 544.846 novos casos desde
o início da epidemia até o ano de 2010. Atualmente, o Ministério da Saúde estima
que haja no Brasil 630 mil pessoas com a AIDS e, segundo UNAIDS (Joint United
Nations Program on HIV/AIDS), 34 milhões no mundo, com ocorrência de 2,7
milhões de novas infecções, uma redução de 21% em comparação com o pico
verificado em 1997.(Saúde; Organization, 2010 2011)
Segundo o relatório da UNAIDS, estima-se um total de 2,5 milhões de óbitos
evitados em países de renda baixa e média desde 1995 devido à intensificação do
uso da terapia antirretroviral e que 700 mil óbitos relacionados à AIDS tenham sido
17
evitados apenas no ano de 2010. Entre as crianças, o óbito diminuiu 20% entre
2005 e 2010.(Organization, 2010 2011)
Dentre as regiões brasileiras, a sudeste possui o maior número de casos de AIDS
notificados: 343.095 mil de 1980 até 2011. E dentro desta, Minas Gerais ocupa o
terceiro lugar, totalizando 42.283 casos(Saúde, 2010). Também chama a atenção o
fato de que a epidemia está se interiorizando no país; sendo que sua disseminação
tem ocorrido com cada vez mais frequência em municípios pequenos, pobres e com
menor renda per capita(Castilho, Bastos et al., 2000). Neste contexto, a epidemia
evidencia as desigualdades sociais e as relações de gênero, as quase se alteraram
significativamente nos últimos anos. De fato, a taxa de incidência entre homens e
mulheres, que na década de 90 era de 3,7:1, hoje é de 1:1.(Saúde, 2011)
Ressalta-se, ainda, que os casos de AIDS são de notificação compulsória, desde
que preenchidos alguns dos critérios de definição de casos em crianças ou em
indivíduos com 13 anos ou mais, critérios estes estabelecidos pelo Ministério da
Saúde.(Saúde)
3.1.2. Transmissão
Existem quatro formas principais de transmissão do vírus da AIDS: a sexual, por
meio de relações anais, vaginais e orais; a intravenosa, sobretudo pelo
compartilhamento de seringas; a perinatal, na qual a mãe transmite o vírus ao bebê
na hora do parto; e, por fim, a transmissão por contato com sangue e outras
secreções corpóreas contaminadas, seja em transfusões, seja em acidentes com
material perfurocortante, ou em outras circunstâncias menos comuns. É possível
ainda adquirir a infecção através de inseminações artificiais(Saúde) e de
transplantes, se o órgão transplantado provier de alguém portador do HIV na
circulação.
18
3.1.3. Diagnóstico
Em 1985, quatro anos depois da identificação dos primeiros casos de AIDS, foi
aprovado, nos Estados Unidos, pela autoridade reguladora americana o primeiro
exame de diagnóstico para detectar anticorpos anti-HIV, pela metodologia ELISA.
Em 1986, o uso do ELISA nos bancos de sangue do Brasil tornou-se
obrigatório.(Saúde)
O diagnóstico pode ser feito inicialmente, entre duas e seis semanas após a
aquisição do vírus HIV. Durante a infecção inicial, o indivíduo pode manifestar febre,
dores musculares, aumento de gânglios, dor de cabeça e de garganta, entre outros
sintomas que representam um episódio agudo da infecção comum a outras doenças
causadas por agentes infecciosos. A fase sintomática inicial é caracterizada pela
redução dos linfócitos T CD4+, que podem chegar a níveis inferiores a 200 células
por mm³ de sangue. Em adultos saudáveis, esse valor varia entre 800 a 1.200
células. Passado um longo período de incubação, de 2 a 20 anos, começam a surgir
sinais clínicos de falência imunológica. A baixa imunidade permite o aparecimento
de doenças oportunistas, levando ao estágio mais avançado da doença.(Saúde)
É importante ressaltar que apenas a contagem de linfócitos T CD4+ não é suficiente
para o diagnostico. É necessária ainda a confirmação com dados clínicos
característicos da doença, já que outras condições causadas por diversos agentes
podem levar a um quadro semelhante.(Saúde, 2007c)
A quantificação da carga viral serve como um marcador de risco futuro da
diminuição dos linfócitos T CD4+. Assim, quanto mais alta a carga viral mais rápida
será a queda dos níveis de linfócitos T CD4+.(Saúde, 2007c)
19
3.1.4. Tratamento
A terapia HAART (highly active antiretroviral threrapy) foi introduzida nos Estados
Unidos e no mundo na década de 1990. Vários governos da America Latina
começaram a fornecer gratuitamente estes medicamentos aos pacientes. No Brasil,
os antirretrovirais começaram a ser distribuídos gratuitamente em 1991.(Saúde;
Sepkowitz, 2001; Fernandes, Acurcio et al., 2009)
Definir o melhor momento para iniciar o tratamento antirretroviral é uma das mais
importantes decisões no acompanhamento de uma pessoa infectada pelo HIV.
Apesar de os benefícios do diagnóstico precoce estarem claramente demonstrados,
muitos pacientes tem acesso tardio ao diagnóstico da infecção, o que determina pior
prognóstico.(Saúde, 2008c)
Os principais objetivos do tratamento antirretroviral são:
 Reduzir morbidade e mortalidade associadas ao HIV.
 Melhorar a qualidade de vida.
 Preservar e, quando possível, restaurar o sistema imunológico.
 Suprimir de forma sustentada a replicação viral.(Saúde, 2008c)
O benefício da terapia antirretroviral altamente ativa já foi claramente demonstrado
em pacientes com doença sintomática avançada e naqueles que, apesar de
assintomáticos, apresentam imunodeficiência acentuada expressa na contagem de
linfócitos T CD4+ inferior a 200/mm³.(Saúde, 2008c)
20
Segundo a UNAIDS, 47% das pessoas com indicação de terapia antirretroviral já
estão em tratamento, uma vez que 6,6 milhões de pessoas em países de baixa
renda e média estavam recebendo tratamento no final de 2010.(Organization, 2010
2011)
A não adesão ao tratamento ou mesmo o seu uso incorreto são considerados uma
ameaça à efetividade do tratamento e também à qualidade de vida desses
indivíduos.(Saúde, 2007a) Em contrapartida, o uso prolongado dos medicamentos
influencia, de forma negativa, a qualidade de vida dos pacientes, uma vez que leva
ao aparecimento de diversas doenças e efeitos colaterais adversos.(Bader, Kremer
et al., 2006)
3.2. Infecção pelo Trypanosoma cruzi e doença de Chagas
3.2.1. Características Clínicas da Doença
Na Doença de Chagas a maioria dos casos não apresenta sinais ou sintomas
(forma indeterminada), embora aproximadamente 30% dos indivíduos desenvolvam,
ao
longo
do
tempo,
sinais
e/ou
sintomas
de
cardiopatia
e/ou
megaesôfago/megacólon. São considerados portadores da forma indeterminada da
doença de Chagas os indivíduos soropositivos e/ou com exame parasitológico
positivo para T. cruzi que não apresentam quadro sintomatológico próprio da
doença, e com resultados de eletrocardiograma de repouso, estudo radiológico de
tórax, esôfago e cólon normais. A forma indeterminada tem particular relevância por
ser a apresentação de maior prevalência, apesar do evidente caráter benigno e do
baixo potencial evolutivo da mesma, conforme ficou demonstrado em diversos
estudos longitudinais.(Saúde, 2007d)
21
A doença apresenta distintas formas clínicas, podendo ser classificada em forma
aguda ou crônica.
A forma aguda dura entre 1 e 4 meses, e pode ser sintomática ou assintomática. É
importante reconhecer essa fase, pois a quimioterapia específica pode, muitas
vezes, ser benéfica e a cura da infecção pode ser possível com tratamento nesta
fase. Quando a doença é sintomática, pode ser caracterizada por uma miocardite e
outras manifestações gerais como febre, mal-estar geral, cefaléia, astenia,
hiporexia,
edema
e
hipertrofia
de
linfonodos.
Frequentemente
ocorre
hepatoesplenomegalia. O sinal de Romaña é um edema bipalpebral que caracteriza
a típica lesão de entrada do parasita.(Gilles, 1999; Rocha, Ribeiro et al., 2003;
Brasil, 2005)
A fase crônica começa entre 2 e 4 meses depois da transmissão. De 20% a 30%
das pessoas desenvolvem algum tipo de sinal e sintoma da fase crônica da doença.
Esta fase caracteriza-se por duas formas clínicas bastante distintas. Na forma
indeterminada, o paciente pode apresentar as manifestações típicas da fase aguda
da infecção, as quais tendem a eventualmente desaparecer, fazendo com que o
indivíduo assuma à condição de paciente assintomático para o resto da vida. Já na
forma determinada, esta pode ser caracterizada pelo surgimento de manifestação
cardíaca, a mais importante condição limitante ao doente chagásico e a principal
causa de morte. Não obstante, casos podem se apresentar sem a ocorrência da
sintomatologia típica, mas com alterações eletrocardiográficas que incluem:
bloqueio completo do ramo direito; hemibloqueio anterior esquerdo; bloqueio AV do
primeiro, segundo e terceiro graus; extrassístoles ventriculares; sobrecarga de
cavidades cardíacas; alterações da regularização ventricular, entre outras.(Gilles,
1999; Brasil, 2005)
Outra forma da fase crônica, é a digestiva que se caracteriza por alterações ao
longo do trato digestivo, ocasionadas por lesões dos plexos nervosos, com as
22
consequentes alterações da motilidade e da morfologia na região do trato digestivo,
sendo o megaesôfago e o megacólon as manifestações mais comuns. Os sintomas
incluem dor abdominal característica, desconforto e dispepsia.
A forma congênita ainda é apresentada com sinais clínicos como hepatomegalia e
esplenomegalia, icterícia, equimose e convulsões decorrentes de hipoglicemia.
3.2.2. Epidemiologia
A doença de Chagas é uma endemia no novo mundo. É estimado que entre 16 e 18
milhões de pessoas estão infectadas pelo T. cruzi e cerca de 90 milhões estão em
risco de serem infectadas. Há relatos de casos desde no Texas e Califórnia, nos
Estados Unidos, até no estado de Chubut no sudeste da Argentina, sendo
associada ao subdesenvolvimento social e econômico. Dentre os países que sofrem
com a doença, a Bolívia é a mais atingida.(Gilles, 1999; Organization, 2002)
No Brasil, migrações para as áreas urbanas durante os anos de 1970 e 1980,
mudaram o padrão epidemiológico tradicional, uma vez que a doença era
tipicamente rural. Estima-se que 32% da população estiveram em risco de infecção
até aquela época e que 6,3 milhões de pessoas estejam infectados.(Gilles, 1999)
3.2.3. Transmissão
A transmissão natural ocorre pela contaminação da pele ou mucosas pelas fezes
dos vetores - insetos hematófagos estritos, da família Triatominae (Hemiptera:
Reduviidae), conhecidos genericamente por triatomíneos e, vulgarmente, por
barbeiro, chupão, fincão, procotó - com formas infectantes de T.cruzi. Os
23
mecanismos secundários de transmissão ocorrem por via transfusional sanguínea,
materno-infantil (transplacentária ou por aleitamento), por via oral, transplante de
órgãos e transmissão acidental, mais frequente pela manipulação de material
contaminado em laboratório. Entre essas outras "possibilidades" de veiculação da
doença, tem especial importância epidemiológica a transmissão por transfusão de
sangue, que pode levar a doença para áreas sem transmissão natural, inclusive
para grandes centros populacionais, e a transmissão congênita, que pode
representar o risco mais duradouro de produção de novos casos e de manutenção
da endemia chagásica.(Brasil, 2005)
No ano de 2006, a forma oral foi identificada como de potencial risco para a Saúde
Pública, houve a confirmação de 115 casos de DCA, na região Norte e Nordeste,
sendo 94 casos de transmissão via oral, devido ao consumo na maioria dos casos
de açaí contaminado. Registrou-se neste período também surto pela ingestão de
Bacaba (Oenocarpus bacaba) e de cana-de-açúcar.(Saúde, 2008a)
Devido ao controle da transmissão vetorial, especialmente pela eliminação do
Triatoma infestans no Brasil e em outros países da América do Sul, combinado com
o controle de transmissão transfusional, a fase aguda está se tornando rara.(Saúde,
2006)
Em razão de programas de controle em vários países da América do Sul, a
transmissão pelo vetor e por transfusão sanguínea foi controlada. Em junho de
2006, o Brasil recebeu certificado relativo à eliminação da transmissão da doença
de Chagas pelo principal vetor (T. infestans) e pela via transfusional, concedido pela
Organização Mundial de Saúde / Organização Pan-Americana de Saúde
(OMS/OPAS).(Pinto Dias, 2006)
24
3.2.4. Diagnóstico
Observados os sinais e sintomas nos pacientes, deve-se fazer também um
diagnóstico laboratorial parasitológico. Métodos imunológicos como Hemaglutinação
indireta, Imunofluorescência indireta, Elisa e testes moleculares devem ser feitos
para se chegar ao diagnóstico conclusivo e direcionar o tratamento.(Brasil, 2005)
3.2.5. Tratamento
Para melhor direcionar o tratamento, é essencial identificar-se a fase da doença
através do diagnóstico clínico, laboratorial e epidemiológico.
O tratamento específico para a supressão da parasitemia é o Benznidazol indicado
para a fase aguda e para os casos congênitos da doença. Contudo, não é indicado
para casos crônicos, pois os pacientes não se beneficiariam clinicamente, porque
nesta fase a parasitemia não tem importância significativa na evolução da doença.
Taxas de cura excedem 50%-70% na Argentina e no Chile, mas é menos frequente
no centro e nordeste do Brasil.(Gilles, 1999; Brasil, 2005)
O tratamento sintomático depende das manifestações clínicas apresentadas pelo
paciente. Sintomas cardíacos geralmente são evidenciados e as drogas utilizadas
são aquelas prescritas para outras cardiopatias. Sintomas digestivos também são
encontrados e, dependendo do estágio, podem ter medidas mais conservadoras ou
mais agressivas.(Brasil, 2005)
É possível encontrar na literatura médica trabalhos que relatam a aplicação de
tratamentos específicos para o paciente chagásico que apresenta a doença em sua
25
fase crônica. No entanto, os dados correntemente disponibilizados ainda são
inconclusivos para indicar se estes tratamentos são capazes de prevenir ou retardar
a progressão da doença no estágio crônico.(Gilles, 1999)
3.3.Coinfecção HIV/Trypanosoma cruzi
A primeira publicação na literatura sobre pacientes com AIDS e reativação da
doença de Chagas foi feita por Castillo, et al., em 1990, onde um paciente com
manifestações neurológicas atípicas e submetido a exames complementares, fez-se
necessário uma cirurgia. Histologia do tecido encontrado mostrou uma lesão
inflamatória aguda perivascular com um grupo de amastigotas de Trypanosoma
cruzi. O paciente também foi testado e confirmado para soropositivo de T. cruzi e
HIV.(Del Castillo, Mendoza et al., 1990)
Desde então, diversos casos de reativação da doença de Chagas em pacientes
infectados com HIV foram relatados, a maioria no Brasil e na Argentina. A frequência
real da reativação, porém, não é conhecida e há diferentes descrições deste evento
na literatura.(Saúde, 2007b)
Como em outras doenças por infecção, o T.cruzi se comporta como microorganismo oportunista em pessoas com qualquer tipo de imunossupressão e, entre
eles, o HIV que era predominante em zonas urbanas.(Almeida, Júnior et al., 2011)
De acordo com Almeida e colaboradores, em uma revisão de artigos publicados de
1980 até 2010, foram encontrados 83 artigos em 30 anos de pesquisa,
correspondendo a 2,7 artigos por ano. O Brasil foi o país com o maior número de
publicações com este tópico, com 43 artigos. O número de coinfectados obtidos na
26
literatura foi de 291 casos, correspondentes a 9,7 casos por ano em
média.(Almeida, Júnior et al., 2011)
A doença de Chagas em pacientes infectados pelo HIV representa um evento
potencialmente grave com altas taxas de fatalidade. No entanto, o conhecimento
relativo às modificações dos padrões clínicos de uma doença na presença da outra
ainda é escasso.(Sartori, Caiaffa-Filho et al., 2002; Harms e Feldmeier, 2005;
Martins-Melo, Ramos et al., 2012) Neste contexto, considerando-se a magnitude da
AIDS no Brasil e as alterações epidemiológicas recentes observadas em relação à
doença de Chagas no país, sendo ambas doenças crônicas, é possível pressupor o
aumento da probabilidade de ocorrência da coinfecção no futuro.(Almeida, Ramos
Junior et al., 2009) De fato, a reativação da doença de Chagas tem sido
reconhecida como uma doença oportunista e foi incluída como evento definidor de
AIDS no Brasil em 2003. Assim, pessoas infectadas por HIV ou que tenham AIDS já
definida, devem ser testadas para doença de Chagas.(Ramos, 2004)
27
4. OBJETIVOS
4.1. Objetivo principal
Estudar a associação entre as infecções pelo Trypanosoma cruzi e o vírus da
imunodeficiência adquirida humana (HIV).
4.2. Objetivos específicos
● Comparar os aspectos clínicos, laboratoriais e sócio-demográficos dos
participantes classificados em 3 grupos: infecção pelo HIV/AIDS, infecção pelo
Trypanosoma cruzi/doença de Chagas e coinfecção HIV/AIDS-Trypanosma
cruzi/doença de Chagas.
● Identificar possíveis alterações na manifestação destas infecções no contexto da
sua associação.
28
5. METODOLOGIA
5.1. Tipo de estudo
Trata-se de um estudo epidemiológico, transversal, descritivo e analítico,
envolvendo pacientes com (1) infecção T. cruzi/doença de Chagas, (2) infecção
HIV/AIDS e (3) coinfecção por HIV/AIDS e T. cruzi/doença de Chagas.
A pesquisa epidemiológica é baseada na coleta sistemática de informações sobre
eventos ligados à saúde em uma população definida e na quantificação desses
eventos. Este tipo de estudo objetiva descrever a frequência, distribuição, padrão e
tendência temporal de eventos ligados à saúde em populações específicas.(Block,
2002)
As pesquisas transversais são caracterizadas pelo fato de as observações serem
feitas em um único ponto ou fase do tempo. Dessa forma, esses estudos são
indicados para avaliar a prevalência de uma determinada doença e seus
determinantes (fatores de risco) em uma população.(Papaléo Netto, 2001)
O estudo descritivo é a distribuição de frequência das doenças e dos agravos à
saúde em função de variáveis ligadas ao tempo, ao espaço e à pessoa,
possibilitando o detalhamento do perfil epidemiológico, visando a promoção da
saúde.
A pesquisa descritiva é de grande valor para o estudo de fenômenos naturais,
tornando-se possível descrever as relações observadas entre as variáveis.
29
Geralmente são categorizadas em transversal, ou seja, o fator e o efeito são
observados num mesmo momento histórico.
O caráter instantâneo de um estudo se define quando a produção de dados é
realizada em um único momento do tempo, como se fosse um corte transversal do
processo em observação.(Rouquayrol, 1999)
5.2. Local de estudo
O estudo foi realizado em três centros de pesquisa: Universidade Federal de Minas
Gerais (responsável: Dra. Eliane Dias Gontijo), Universidade de São Paulo
(responsável: Dra. Maria Aparecida Shikanai Yasuda) e Universidade Estadual de
Campinas (responsável: Dr. Eros Antonio de Almeida).
5.3. População do Estudo
A população do estudo constitui-se de pacientes com Doença de Chagas, com vírus
HIV/AIDS e com a coinfecção HIV/AIDS e Doença de Chagas.
No total foram avaliados 150 prontuários, sendo 53 pacientes com HIV, 68 pacientes
com doença de Chagas e 29 portadores da coinfecção HIV/Chagas.
5.4. Aspectos éticos
Trata-se da análise de dados coletados em outros projetos de pesquisa e
armazenados em banco de dados digitais, sem a identificação dos participantes. Os
30
projetos originais foram aprovados por Comitês de Ética em suas Instituições de
origem.
5.5. Período de coleta de dados
Os dados foram coletados durante o desenvolvimento dos projetos originais na
década de 1990 de prontuários dos participantes e armazenados em bancos de
dados digitais. Qualquer informação que permitisse a identificação dos voluntários
não foi incluída. Posteriormente, os bancos de dados foram recodificados e
agrupados em um único banco de dados para a análise final; os Centros
participantes foram considerados como uma nova variável. Os dados coletados
incluíam variáveis clínicas, laboratoriais e epidemiológicas.
5.6. Análise dos dados
A análise estatística inicial foi realizada por meio do programa EPI-INFO (v3.5.2) até
a análise univariada. A análise multivariada foi realizada por meio do pacote
estatístico STATA (v10.3).
Para realização das análises multivariadas o procedimento consistiu em selecionar
inicialmente as variáveis que na análise univariada apresentaram valor p≤0, 25. Isto
nos permite retirar as variáveis de confusão, e incluir as variáveis que embora não
tenham a principio diferenças significativas entre os grupos, possam contribuir de
modo independente em outras variáveis.
31
Ajustou-se o modelo logístico eliminando individualmente as variáveis. Foi
considerado como critério para permanência das variáveis no modelo final o valor
p≤0,05 e os dados de controle gerados pelo programa a partir da exclusão de
determinadas variáveis.
5.7. Pesquisa bibliográfica
Para o levantamento bibliográfico, foram consultadas as bases de dados PubMED,
Bireme, Medline, LILACS e Scielo. Também foram utilizados acervos de bibliotecas
universitárias públicas e particulares, onde foram selecionadas teses, dissertações,
anais de eventos científicos, dentre outros materiais importantes para o estudo.
32
6. RESULTADOS
6.1. Análise Univariada
(1) Participantes coinfectados (HIV/AIDS) e com T. cruzi/doença de Chagas
Na tabela 1 encontram-se os dados referentes às características sóciodemográficas e econômicas entre os pacientes com a coinfecção Chagas-HIV/AIDS
e com T. cruzi/doença de Chagas. A variável cor da pele mostrou diferença
significativa entre estes grupos. Observou-se uma maior proporção de brancos e
menor proporção de pardos no grupo coinfecção Chagas-HIV/AIDS. As tabelas com
os valores esperados e as diferenças para o cálculo do qui-quadrado encontram-se
no Apêndice 1.
Tabela 1: Distribuição de frequências e médias das características sócio-demográficas e
econômicas dos 29 pacientes com coinfecção e dos 68 pacientes com doença de Chagas
nos centros de Belo Horizonte, Campinas e São Paulo.
Variáveis
Cor
COINFECÇÃO
CHAGAS
% (n)
% (n)
Branco
74,1 (20)
31,3 (20)
Pardo
22,2 (6)
53,1 (34)
Negro
3,7 (1)
15,6 (10)
Empregado
54,5 (12)
74,6 (47)
Desempregado
45,5 (10)
25,4 (16)
Vínculo
p
0,0008
0,08
33
Encontram-se na tabela 2, os dados referentes às características clínicas entre os
pacientes com coinfecção.T. cruzi/Chagas-HIV/AIDS e T. cruzi/doença de Chagas.
As variáveis doenças associadas, congestão pulmonar, DST e PAS(Pressão Arterial
Sistólica) foram as que apresentaram diferença significativa entre estes grupos.
Observou-se maior proporção de indivíduos com doenças associadas no grupo
coinfecção comparado ao de doença de Chagas. O mesmo comportamento ocorreu
para congestão pulmonar e DST. A diferença observada na variável PAS, embora
estatisticamente significativa não tem significado clínico.
Tabela 2 : Distribuição de frequências e médias das características clínicas dos 29
pacientes com coinfecção e dos 68 pacientes com doença de Chagas nos centros de Belo
Horizonte, Campinas e São Paulo.
Variáveis
COINFECÇÃO
X/% (n)
DP
CHAGAS
X/% (n)
Doenças
Sim
51,9 (14)
23,9 (16)
Associadas
Não
48,1 (13)
76,1 (51)
Congestão
Sim
13,6 (3)
1,8 (1)
Pulmonar
Não
86,4 (19)
98,2 (54)
Sim
37 (10)
1,7 (1)
Não
63 (17)
98,3 (59)
p
DP
0,008
0,035
DST
< 0,001
PAS
20
123 ±
20,73
68
130 ±
14,08
0,05
PAD
20
79,7
± 13
68
85 ±
10,8
0,07
34
Os dados referentes às características laboratoriais entre os pacientes com a
coinfecção Chagas-HIV/AIDS e T. cruzi/doença de Chagas, foram demonstrados na
tabela
3. As
variáveis
CD4,
plaquetas
e
VCM
apresentaram
diferença
estatisticamente significativa entre os grupos. Na variável CD4 o grupo de
coinfectados apresentou uma media inferior ao do grupo T. cruzi/doença de Chagas.
Na variável plaquetas, o grupo de Coinfecção, apresentou uma média maior que o
grupo de Chagas.
Tabela 3 : Distribuição de frequências e médias das características laboratoriais dos 29
pacientes com coinfecção e dos 68 pacientes com doença de Chagas nos centros de Belo
Horizonte, Campinas e São Paulo.
COINFECÇÃO
X/% (n) DP
CHAGAS
X/% (n) DP
p
CD4
(22) 299,4 ±
199,8
(54) 832,2 ±
300,6
< 0,001
CD8
(19) 577,3 ±
422,7
(54) 503,7 ±
228,7
0,34
Hemoglobina
(21) 17,4 ± 11,7
(43) 22,4 ±
16,5
0,2
Plaquetas
(18) 228,1 ±
93,8
(8) 135,2 ±
123,7
0,04
VCM
(19) 88,6 ±
10,2
(4) 91,2 ± 7,5
0,6
Variáveis
35
(2) Participantes coinfectados
(HIV/AIDS e T. cruzi/Doença de chagas) e com
HIV/AIDS
As características sócio-demográficas e econômicas na tabela 4 estão relacionados
os pacientes com coinfecção T. cruzi/Chagas-HIV/AIDS e HIV. Nenhuma
comparação apresentou diferença significativa entre os grupos.
Tabela 4: Distribuição de frequências e médias das características sócio-demográficas e
econômicas dos 29 pacientes com coinfecção e dos 53 pacientes com HIV nos centros de
Belo Horizonte, Campinas e São Paulo.
Variáveis
P
Coinfecção
% (n)
HIV
% (n)
Cor
Branco
Pardo
Negro
74,1 (20)
22,2 (6)
3,7 (1)
60 (21)
25,7 (9)
14,3 (5)
0,31
Vínculo
Empregado
Desempregado
54,5 (12)
45,5 (10)
51,8 (14)
48,2 (13)
0,851
36
A tabela 5 expõe os dados referentes às características clínicas entre os pacientes
com coinfecção T. cruzi/Chagas-HIV/AIDS e HIV. A variável doenças associadas
apresentou diferença significativa entre os grupos mostrando uma maior proporção
no grupo de coinfectados.
37
Tabela 5: Distribuição de frequências e médias das características clínicas dos 29 pacientes
com coinfecção e dos 53 pacientes com HIV nos centros de Belo Horizonte, Campinas e
São Paulo.
Variáveis
Coinfecção
X/% (n)
DP
X/% (n)
SIM
51,9 (14)
17,2 (5)
NÃO
48,1 (13)
82,8 (24)
BULHAS
ACESSÓRIAS
PRESENTE
0 (0)
7,1 (2)
AUSENTE
100 (20)
92,9 (26)
CONGESTÃO
PULMONAR
SIM
13,6 (3)
0 (0)
NÃO
86,4 (19)
100 (24)
SIM
37 (10)
42,4 (14)
DOENÇAS
ASSOCIADAS
p
HIV
DP
0,006
0,22
0,06
DST
0,67
NÃO
63 (17)
PAS
PAD
57,6 (19)
(20)
123 ±
20,7
(27)
123,03
±14,1
(20)
79,7 ±
13
(27)
78,8 ±
9,1
0,99
0,77
38
Na tabela 6 manifestam-se os dados referentes às características laboratoriais entre
os pacientes com coinfecção T. cruzi/Chagas-HIV/AIDS e HIV. As variáveis CD4,
CD8, e hemoglobina apresentaram diferença significativa entre os grupos. Os
indivíduos do grupo coinfecção apresentam, em média, valores de CD4 maior que
os indivíduos do grupo HIV. A variável CD8 apresenta, em média, valores inferiores
no grupo de coinfectados comparados ao grupo HIV, sendo essa diferença
estatisticamente significativa. A variável hemoglobina apresenta um maior valor para
o grupo de coinfectados, porem sem relevância clinica.
39
Tabela 6: Distribuição de frequências e médias das características laboratoriais dos 29
pacientes com coinfecção e dos 53 pacientes com HIV nos centros de Belo Horizonte,
Campinas e São Paulo.
Variáveis
Coinfecção
(n)
Média
± DP
(20)
363,4
±
215,6
CD8
Hemoglobina
CD4
Plaquetas
VCM
p
HIV
(n)
Média ±
DP
(35)
174,8 ±
125,2
< 0,001
(19)
520,1
±
337,9
(34)
844,8 ±
583
0,05
(21)
17,4 ±
11,7
(26)
(18)
(19)
228,1
± 93,8
(35)
88,6 ±
10,2
12 ± 2,2
194,2 ±
55,2
89,1 ±
6,1
(39)
0,02
0,1
0,8
40
6.2. Resultados da análise multivariada
As variáveis explicativas que foram incluídas no modelo de regressão logística para
a análise do grupo de pacientes portadores da coinfecção e do grupo de pacientes
com de doença de Chagas (valor p≤ 0,20) foram: doenças associadas, DST, PAD e
PAS. A variável que permaneceu no modelo final para a análise foi a variável DST.
O modelo completo da análise multivariada encontra-se no Apêndice. Para melhor
compreensão, será utilizado apenas o modelo final da regressão logística.
Na tabela 07, encontram-se o resultado da regressão logística. O resultado
apresentou-se estatisticamente significativo para DST. O grupo de coinfectados tem
34 vezes mais chances de apresentar DSTs do que o grupo de portadores Chagas,
sendo a razão de chance (Odds Ratio): 34,7.
Tabela 7: Análise logística incondicional (modelo final), dos 97 prontuários analisados de
portadores de coinfecção e doença de Chagas.
Variáveis
DST
Razão de
Chances
95%
I.C.
Coeficiente
34,7059 4,1455 290,5552
CONSTANT
Fonte: dados da pesquisa
*
*
*
S. E.
3,5469 1,0841
Valor de
Valor p
z
3,2716
0,0011
-1,2443 0,2753 -4,5204 0,0000
41
As variáveis explicativas que foram incluídas no modelo logístico para a análise do
grupo de pacientes portadores da coinfecção e do grupo de pacientes portadores de
HIV (valor p≤ 0,05) foram: doenças associadas, bulhas acessórias e congestão
pulmonar. A variável que permaneceu no modelo final para a análise foi a variável
doenças associadas. O modelo completo da análise multivariada encontra-se no
Apêndice. Para melhor compreensão, será utilizado apenas o modelo final da
regressão logística.
O resultado de regressão logística, tabela 8, apresentou-se estatisticamente
significativo para doenças associadas. O grupo de coinfectados tem 5 vezes mais
chances de apresentar doenças associadas do que o grupo de portadores de HIV,
sendo a razão de chance (Odds Ratio): 5,16.
Tabela 8: Análise logística incondicional (modelo final), dos 82 prontuários analisados de
portadores de coinfecção e HIV.
Variáveis
Razão de
Chances
Doenças
Associadas
CONSTANT
Fonte: dados da pesquisa
95%
I.C.
Coeficiente
5,1692 1,5204 17,5745
*
*
*
S. E.
Valor de
Valor p
z
1,6427 0,6244 2,6310 0,0085
-0,6131 0,3444 -1,7804 0,0750
42
7. DISCUSSÃO
Este estudo mostrou que doenças sexualmente transmissíveis e outras doenças
associadas são fatores de risco que caracterizam doentes coinfectados por
HIV/AIDS e T. cruzi/doença de Chagas quando comparados com pacientes que
estão no grupo da T. cruzi/doença de Chagas e no grupo de pacientes com
HIV/AIDS respectivamente.
A coinfecção é um tema pouco abordado na literatura, dificultando o achado de
maiores e melhores dados, para melhor relacionar com os achados deste trabalho.
Desde a revisão da definição de caso de síndrome da imunodeficiência adquirida
(AIDS) realizada em 1992, pelo Ministério da Saúde do Brasil, pesquisadores e
técnicos já sinalizavam, a partir das evidências na literatura científica nacional e
internacional, que determinados processos infecciosos e parasitários de caráter
endêmico, como a leishmaniose, a doença de Chagas e a paracoccidioidomicose,
por exemplo, poderiam ter comportamento oportunista em indivíduos infectados pelo
vírus da imunodeficiência humana (HIV) em fase avançada.(Saúde, 2007d)
A reativação da doença de Chagas foi considerada condição definidora de AIDS por
diferentes razões: 1) alta taxa de fatalidade, alcançando 100% sem a intervenção
prévia com terapia específica com benzonidazol; 2) mudança da historia natural da
doença de Chagas e na infecção de HIV devido a várias manifestações de
meningoecefalite e miocardite; 3) modificação da resposta ao tratamento com
recorrência e falha terapêutica.(Saúde, 2007d)
Segundo o ministério da saúde (2007)(Saúde, 2007d), a frequência desta reativação
não é consensual, havendo diferentes descrições da literatura. No estudo em
43
questão, apresentado na forma de um boletim epidemiológico, foi verificado que em
torno de 20% dos pacientes coinfectados houve a reativação da doença de Chagas
dentro de um longo período de tempo variável.
Conforme o Ministério da Saúde (2007)(Saúde, 2007d), nos pacientes com AIDS
são cada vez mais descritos casos de reativação da doença de Chagas.
Aproximadamente, 120 casos foram relatados até 2004, a maioria deles somente
foram apresentados em congressos, simpósios da área de doenças infecciosas e
parasitárias e por meio de comunicações pessoais. A frequência desta reativação
não é totalmente conhecida, havendo diferentes descrições da literatura. Em um
estudo prospectivo (incluindo pacientes no período pré e pós-terapia anti-retroviral
altamente efetiva) verificou-se que o percentual de reativação, em seguimento
prolongado, foi em torno de 20%. A reativação tem sido traduzida na maioria dos
casos por meningoencefalite e/ou miocardite.
De acordo com a revisão feita por Almeida (2011)(Almeida, Júnior et al., 2011) e
Gundel
(2005)(Sartori,
Caiaffa-Filho
et
al.,
2002)
a
meningoencefalite
necrohemorrágica, uni ou multifocal é a forma mais grave da reativação da doença
de Chagas em aproximadamente 80 a 90% dos casos, na presença da coinfecção
por HIV.(Saúde, 2007d) O diagnóstico de reativação da parasitose no SNC é
bastante claro nos pacientes imunodeprimidos, uma vez que não ocorre em
pacientes imunocompetentes.(Saúde, 2007d) O coração é outro órgão envolvido
durante o processo de reativação de doença de Chagas. A frequência deste
envolvimento é difícil de ser calculada, uma vez que a maioria dos pacientes não
teve uma avaliação com propedêutica cardiológica adequada durante a reativação
ou por necropsia. Ao contrário da meningoencefalite, o envolvimento cardíaco pode
ser subestimado quando o acometimento for leve. Esta patologia no órgão esteve
presente em aproximadamente 30 a 40% dos pacientes coinfectados. Dessa forma,
a miocardite é menos comum de forma isolada, sendo habitualmente caracterizada
por um quadro agudo de miocardite com acometimento difuso ou focal do órgão.
44
Estas conclusões são também corroboradas por outros autores.(Saúde, 2007d;
Martins-Melo, Ramos et al., 2012)
Estes dados diferem, pelo menos em parte, dos resultados encontrados no presente
trabalho, onde detectou-se a ocorrência significativa de doenças sexualmente
transmissíveis
no grupo coinfectado em relação aos grupos de pacientes
apresentando cada infecção isoladamente (HIV ou Doença de Chagas).
De acordo com Greco (2008)(Greco, 2008) na maioria dos países do Terceiro
Mundo, o impacto da AIDS vem se somar a uma grande lista de doenças endêmicas
ou emergentes, como por exemplo: tuberculose, hanseníase, esquistossomose,
leishmaniose e malária. Calza (2004)(Calza, Manfredi et al., 2004) e Rickerts
(2000)(Rickerts, Brodt et al., 2000) mostraram a presença da dislipidemia tem
consequências clinicas patológicas em pacientes com HIV que não estão
completamente elucidadas, embora alguns autores reportassem observações como
aumento de risco de doença arterial coronariana prematura, ateroesclerose e
pancreatite. Joshi (1987)(Joshi, Pawel et al., 1987) e Paton et al (1993)(Paton, Tabib
et al., 1993) demonstraram, através de estudos necroscópicos, que há associação
entre a doença coronariana e HIV. Estes dados ilustram a complexidade das
interações oriundas da coexistência entre a infecção pelo HIV e outras
manifestações clínicas, de natureza infecciosa ou não, em um mesmo paciente.
De forma similar, a ocorrência de manifestações clínicas secundárias ao tratamento
com a terapia antirretroviral é frequente e igualmente complexa. Bader et al
(2006)(Bader, Kremer et al., 2006) relata que o uso prolongado dos medicamentos
leva ao aparecimento de diversas doenças e efeitos colaterais. De maneira geral,
essas alterações podem desencadear acidose lática, neuropatia periférica,
miopatias, esteatose hepática, hipogonadismo, diabetes, anemia e lipoatrofia. A
síndrome lipodistrófica também é uma consequência comum dos pacientes com uso
de terapia antirretroviral.(Snopkova, Matyskova et al., 2010) A etiologia destas
manifestações ainda é alvo de debate, mas Nolan (2004)(Nolan e Mallal, 2004) e
Moyle (2003)(Moyle, 2003) descreveram que o uso de NRTIs como tratamento
45
podem causar lesões mitocondriais em diferentes linhagens celulares, por
mecanismos diversos. Portanto, a ocorrência de efeitos clínicos resultantes do
tratamento contra o HIV torna-se um fator complicador adicional à compreensão
geral das doenças associadas à infecção pelo vírus.
Não obstante, em nosso estudo não foi possível desmembrar a ocorrência de
doenças associadas em virtude de limitações decorrentes do questionário aplicado
na época da coleta de dados, pois a pergunta do questionário era: Possui doenças
associadas (SIM/NÃO), sem que houvesse especificação clinica ou circunstancial
da mesma (vide questionário em anexo)
Neste estudo foi possível encontrar uma relação entre a existência da coinfecção
HIV/Trypanosoma cruzi e a presença de doenças sexualmente transmissíveis. Até o
presente, não há relatos na literatura sobre a associação direta da coinfecção em
questão e a ocorrência de outras DSTs (excluindo-se a própria infecção pelo HIV
como uma DST), o que enfatiza a importância dos resultados encontrados. Por
outro lado, a prevalência de “doenças associadas” encontrada neste trabalho, pode
ser encaixada em vários perfis descritos previamente na literatura. Logo, não é
possível precisar se o dado está ou não de acordo com os resultados previamente
publicados. Outros estudos são ainda necessários para elucidar os aspectos da
evolução clinica de pacientes coinfectados pelo HIV e T. cruzi.
46
8. CONCLUSÃO
O estudo demonstrou a caracterização da coinfecção nos pacientes infectados com
doenças sexualmente transmissíveis e doenças associadas com HIV/AIDS,
respectivamente com 34,7 e 5,1 de Razão de Chances quando comparados aos
pacientes do grupo de doença de Chagas e com o grupo de HIV/AIDS. Tais
manifestações clínicas caracterizam, portanto, a associação entre as duas doenças
da coinfecção.
Já é conhecido na literatura que doenças associadas e HIV/AIDS possuem uma
associação direta, mas em contrapartida não há relatos de associação entre DST e
a coinfecção, logo novos estudos são necessários para fortalecer o achado e poder
marca-los como novos indicadores da coinfecção.
47
9. PROPOSIÇÕES
 Novos estudos similares devem ser realizados para a solidificação dos dados
encontrados.
 Com as doenças associadas bem descritas, que comorbidades estes
pacientes da coinfecção apresentam?
48
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54
APÊNDICE
Apêndice 1 Análise univariada coinfecção X Chagas
Variáveis
COINFECÇÃO
CHAGAS
X/% (n)
X/% (n)
Cerveja
44,4 (4)
85,2 (23)
Outras
55,6 (5)
14,8 (4)
Branco
74,1 (20)
31,3 (20)
Pardo
22,2 (6)
53,1 (34)
Negro
3,7 (1)
15,6 (10)
Empregado
31,8 (7)
60,3 (38)
Desempregado
13,6 (3)
12,7 (8)
Autônomo
22,7 (5)
14,3 (9)
Aposentado
18,2 (4)
12,7 (8)
Afastado
13,6 (3)
0 (0)
Tipo de bebida
Cor
Vínculo
P
0,015
Apêndice 2 – Análise univariada coinfecção X HIV
0,0008
0,01
55
Variáveis
Coinfecção
HIV
X/% (n)
X/% (n)
Cerveja
44,4 (4)
70 (7)
Outras
55,6 (5)
30 (3)
Branco
74,1 (20)
60 (21)
Pardo
22,2 (6)
25,7 (9)
Negro
3,7 (1)
14,3 (5)
Empregado
31,8 (7)
37 (10)
Desempregado
13,6 (3)
11,1 (3)
Autônomo
22,7 (5)
14,8 (4)
Aposentado
18,2 (4)
33,3 (9)
Afastado
13,6 (3)
3,7 (1)
Tipo de bebida
Cor
Vínculo
P
0,27
0,31
0,54
56
Apêndice 3- Análise multivariada DST
Epi Info
Biblioteca dos resultados
C:\mestrado\dados da tese\banco de dados em varios
Visão corrente:
formatos\recodnova0210CoChagas.MDB:tabela
Número de registros: 97
Data: 24/10/2012 15:31:05
LOGISTIC inclusaorec = associadasrec congesta02rec dstrec padrec pasrec
PVALUE=95%
Procedimento seguinte
Regressão Logística Incondicional
Termo
Razão de
Chances
95%
I.C.
Coeficiente
S. E.
Valor
de z
Valor
p
associadasrec
2,6793 0,5946
12,0740
0,9856 0,7681
1,2831 0,1995
congesta02rec
1,0995 0,0181
66,8430
0,0949 2,0957
0,0453 0,9639
25,5991 2,0662 317,1530
3,2426 1,2841
2,5251 0,0116
dstrec
padrec
1,3817 0,2767
6,9005
0,3233 0,8206
0,3940 0,6936
pasrec
0,4512 0,0852
2,3889
-0,7959 0,8504
-0,9359 0,3493
*
-1,8197 0,5234
-3,4766 0,0005
CONSTANT
*
Convergência:
Converged
Iterações:
5
Final -2*Log-Likelihood:
53,7234
Cases included:
65
*
57
Estatístico g.l. Valor p
Teste
Escore
20,8888
5 0,0009
Razão de Verossimilhança
18,8258
5 0,0021
Conjunto de dados anterior Biblioteca dos resultados
LOGISTIC inclusaorec = associadasrec dstrec padrec pasrec PVALUE=95%
Procedimento seguinte
Regressão Logística Incondicional
Termo
associadasrec
dstrec
Razão de
Chances
95%
I.C.
3,1586 0,8035
Coeficiente
S. E.
Valor de
z
Valor
p
12,4157
1,1501 0,6984
1,6468 0,0996
23,1668 2,2213 241,6219
3,1427 1,1963
2,6271 0,0086
padrec
1,3863 0,3268
5,8808
0,3266 0,7373
0,4430 0,6578
pasrec
0,5187 0,1168
2,3044
-0,6563 0,7608
-0,8627 0,3883
*
-1,9165 0,4814
-3,9808 0,0001
CONSTANT
*
*
Convergência:
Converged
Iterações:
5
Final -2*Log-Likelihood:
64,0740
Cases included:
78
Teste
Estatístico g.l. Valor p
Escore
23,0484
4 0,0001
Razão de Verossimilhança
20,1979
4 0,0005
Conjunto de dados anterior Biblioteca dos resultados
LOGISTIC inclusaorec = associadasrec dstrec pasrec PVALUE=95%
58
Procedimento seguinte
Regressão Logística Incondicional
Termo
Razão de
Chances
associadasrec
dstrec
pasrec
95%
I.C.
3,0526 0,7844
Coeficiente
Valor de
z
Valor
p
11,8804
1,1160 0,6933
1,6096 0,1075
24,4621 2,4262 246,6342
3,1971 1,1790
2,7117 0,0067
2,3310
-0,5349 0,7047
-0,7591 0,4478
*
-1,8473 0,4509
-4,0974 0,0000
0,5857 0,1472
CONSTANT
*
*
Convergência:
Converged
Iterações:
5
Final -2*Log-Likelihood:
64,2673
Cases included:
78
Teste
Estatístico g.l. Valor p
Escore
22,9157
3 0,0000
Razão de Verossimilhança
20,0046
3 0,0002
Conjunto de dados anterior Biblioteca dos resultados
LOGISTIC inclusaorec = associadasrec dstrec PVALUE=95%
Procedimento seguinte
S. E.
59
Regressão Logística Incondicional
Termo
Razão de
Chances
associadasrec
95%
I.C.
2,4299 0,7865
dstrec
Coeficiente
S. E.
Valor de
z
Valor
p
7,5074
0,8878 0,5756
1,5426 0,1229
22,8097 2,5658 202,7750
3,1272 1,1148
2,8052 0,0050
-1,5853 0,3547
-4,4696 0,0000
CONSTANT
*
*
*
Convergência:
Converged
Iterações:
5
Final -2*Log-Likelihood:
81,9488
Cases included:
85
Teste
Estatístico g.l. Valor p
Escore
21,9396
2 0,0000
Razão de Verossimilhança
21,0368
2 0,0000
Conjunto de dados anterior Biblioteca dos resultados
LOGISTIC inclusaorec = dstrec PVALUE=95%
Procedimento seguinte
Regressão Logística Incondicional
Termo
dstrec
CONSTANT
Convergência:
Iterações:
Razão de
Chances
95%
I.C.
Coeficiente
34,7059 4,1455 290,5552
*
Converged
5
*
*
S. E.
Valor de
z
Valor
p
3,5469 1,0841
3,2716 0,0011
-1,2443 0,2753
-4,5204 0,0000
60
Final -2*Log-Likelihood:
Cases included:
Teste
87,4948
87
Estatístico g.l. Valor p
Escore
21,0915
1 0,0000
Razão de Verossimilhança
20,2767
1 0,0000
61
Apêndice 4- Análise multivariada doenças associadas
Epi Info
Biblioteca dos resultados
C:\mestrado\dados da tese\banco de dados em varios
Visão corrente:
formatos\recodnova0210.MDB:tabela
Número de registros: 82
Data: 26/10/2012 01:54:40
LOGISTIC inclusaorec = associadasrec PVALUE=95%
Procedimento seguinte
Regressão Logística Incondicional
Termo
associadasrec
CONSTANT
Razão de
Chances
95%
I.C.
Coeficiente
5,1692 1,5204 17,5745
*
*
*
Valor
de z
Valor
p
1,6427 0,6244 2,6310 0,0085
-0,6131 0,3444
Convergência:
Converged
Iterações:
4
Final -2*Log-Likelihood:
69,8734
Cases included:
56
Teste
S. E.
Estatístico g.l. Valor p
Escore
7,4715
1 0,0063
Razão de Verossimilhança
7,6877
1 0,0056
0,0750
1,7804
62
ANEXO - Questionário
63
64
65
66
67
Download