CLONAGEM HUMANA E A REGULAMENTAÇÃO BRASILEIRA A clonagem é uma forma de reprodução assexuada, feita artificialmente, tendo como base um único patrimônio genético1[1]. Os indivíduos que resultarem deste processo serão detentores das mesmas características genéticas do indivíduo doador dos cromossomos, pois um único patrimônio genético pode ser reproduzido diversas vezes. A técnica para a sua realização pode ser implantada de duas formas: a) separandose as células de um embrião em seu estágio inicial de multiplicação celular, conhecida como divisão embrionária; b) pela substituição do núcleo de um óvulo por outro proveniente de uma célula de um indivíduo já existente ou de células embrionárias ou fetais, conhecida como transferência nuclear. No caso da divisão embrionária, a separação provocada das novas células de um embrião produz simultaneamente novos indivíduos geneticamente idênticos, porém diferentes de qualquer outro existente, por exemplo, como ocorre na natureza, quando da geração de gêmeos univitelinos. No caso da transferência nuclear se reproduz assexuadamente um indivíduo igual ao outro previamente existente, como foi realizado no caso da ovelha Dolly, ou com a mesma constituição genética de um embrião ou feto. Neste último caso, poderá ocorrer a interferência do genoma mitocondrial do sujeito que doou o óvulo para a reprodução clônica, o que poderá resultar em pequenas diferenças genéticas entre o sujeito clonado e o clone. Em ambas situações diversas questões éticas, religiosas e jurídicas são suscitadas, tendo em vista o fato de que a técnica de clonagem rompe com o sistema natural de reprodução humana, modificando fundamentalmente o sentido da procriação, da vida nascente, da família, da maternidade e da paternidade biológica e também dos vínculos geracionais2[2], as quais, apesar de serem objeto de discussão há mais de duas décadas, ainda não alcançaram um consenso absoluto, em decorrência, até mesmo, da própria dinamicidade científica e do aprimoramento tecnológico dos últimos tempos, que acabaram por agregar novas complexidades e novas questões a serem refletidas. Grande parte dos países europeus e os Estados Unidos proibiram a clonagem de seres humanos com fins reprodutivos por representar, no estágio atual do desenvolvimento científico, violação aos princípios fundamentais que sustentam os direitos da pessoa humana. Atualmente está em discussão a problemática em torno da clonagem não reprodutiva (que engloba atividades de diagnóstico, ou seja, criação de um duplo para a realização do diagnóstico pré-implantatório, permitindo selecionar os embriões a implantar; experimentação, ou seja, quando se pretende obter modelos que assegurem similitude genética; para efeitos industriais e comerciais e ainda como reservatório de tecidos e órgãos para eventuais transplantações) e a proteção jurídica do embrião humano. No Brasil, não obstante já estar previsto na Lei nº 8.974/95 a vedação de manipulação genética de células germinais humanas nas atividades relacionadas a organismos geneticamente modificados3[3], além do disposto na Instrução Normativa nº 8 da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança relativamente a manipulação genética e clonagem em seres humanos, ainda não há uma efetiva proibição da clonagem em seres humanos no território brasileiro. Praticamente todos os projetos de lei que estão atualmente em andamento sobre esta questão, posicionam-se no sentido de considerar proibida a realização da clonagem reprodutiva. Mais recentemente o Conselho Nacional de Política Criminal e penitenciária, através da Resolução nº 06 de setembro de 2002 instituiu como referência na área o Parecer do Conselheiro Edison José Biondi, cuja orientação sugere que (i) não devem ser permitidos experimentos em animais que visem produção de seres humanos por clonagem reprodutiva no estado atual do conhecimento científico; (ii) devem ser estimulados experimentos em animais que visem o aprimoramento da clonagem artificial ou fertilização assistida, especialmente para a obtenção de células-tronco pluripotenciais e (iii) que devem ser estimuladas pesquisas científicas visando à obtenção de células-tronco multipotenciais. Por outro lado, há quem entenda que não há razão sólida para não fazer a clonagem humana, seja reprodutiva ou terapêutica4[4]. Portanto, denota-se que a regulamentação desta temática deverá resultar de um intenso debate interdisciplinar, com o envolvimento e a participação de toda a sociedade. Adriana Diaféria ******* Notas 5[1] DIAFÉRIA, A. Clonagem – Aspectos Jurídicos e Bioéticos. Bauru: EDIPRO, 1999, pág. 145. 6[2] KASS, Leon R. “The Wisdom of Repugnance” in The New Republic, 2 de junho de 1997. 7[3] Art.8º, inciso II da Lei nº 8.974/95. 8[4] SCHRAMM, F. R. A moralidade da clonagem. Jornal Arte & Política, ano V, número XV, de 26 de julho de 2002, pp.4-5.