Professor Cesar Ranquetat Jr. A Filosofia no Ocidente originou-se na Grécia antiga, mais particularmente na cidade-estado de Mileto, no séc. VI a.c. O pensamento filosófico grego é uma das bases da Civilização Ocidental. Teoria atômica e Ética, Matemática e Lógica, Metafísica e Teologia são palavras de origem filosófica que são ainda hoje fundamentais (Luce). A Filosofia surge quando alguns gregos, admirados e espantados com a realidade começaram a fazer novas perguntas e buscar novas respostas (Chauí). Demonstraram que o mundo e os seres humanos, os acontecimentos e as coisas naturais podem ser conhecidas pela razão (ibidem). Os gregos inventaram a ideia ocidental da razão como um pensamento sistemático que segue regras e normas de valor universal (ibidem). Acrópole-Parthenon É no contexto da polis que surge a Filosofia. A polis era a forma de organização social e política dos antigos gregos. A polis era composta, basicamente, por uma acrópole, uma ágora, uma khora e uma ástey. A acrópole correspondia a parte mais elevada da cidade, onde haviam templos dedicados aos Deuses. A ágora era a parte mais pública da cidade. Lá existia o mercado e as assembleias do povo. A ágora era a praça principal na constituição da polis. Péricles na Àgora A khora era o setor, região, agrícola. Nela habitavam os camponeses e eram cultivados os alimentos. A ástey era a parte urbana da polis. Em realidade, as cidades-estados gregas compunhamse de duas partes: uma rural ( a khora) e outra urbana (a ástey). A vida na polis era dividida em duas esferas: a esfera privada e a esfera pública. A esfera pública correspondia ao espaço público urbano e suas instituições. Era no espaço público que ocorriam as deliberações e estabeleciam-se as regras para a cidade. Três eram as instituições políticas principais: a assembleia do povo, o conselho aristocrático e os magistrados. Além de inventarem a ciência e a filosofia os gregos inventaram a política. A palavra política vem da grega polis. Os gregos instituíram práticas pelas quais as decisões eram tomadas a partir de discussões e debates públicos. Estabeleceram instituições políticas como os tribunais e as assembleias. Criaram a ideia da Lei e da Justiça como expressão da vontade coletiva pública (Chauí). BUSTO DE ZEUS Antes do surgimento da Filosofia predominava na Grécia o pensamento mítico-religioso. A religião grega arcaica era politeísta. Não há um clero, não há uma igreja, não há um livro sagrado e ela não implica nenhum credo (Vernant). Multiplicidade de Deuses, cada um com suas funções, seus domínios reservados, seus modos particulares de ação, seus tipos específicos de poder (Vernant). Os Deuses estão no mundo, dele fazem parte. Não criaram o mundo, como o Deus único da tradição judaicocristã. O culto não se dirigia a um ser radicalmente extramundano, sem relação com o universo físico e o mundo natural. O culto dirigia-se a certos astros como a lua, a luz do sol, uma fonte, uma árvore, ao cume de uma montanha, e também a um sentimento, uma paixão (Eros), uma noção moral ou social (Dike) (Vernant). Num cosmos repleto de Deuses, o homem grego não separava, como se fossem dois domínios opostos, o natural e o sobrenatural (ibidem). Contudo, não se trata de uma religião da natureza, os Deuses não são personificações de forças ou fenômenos naturais. O raio, a tempestade, os altos cumes, não são Zeus, mas de Zeus (Vernant). Os Deuses se manifestam no conjunto do universo por tudo o que traz a marca de uma eminente superioridade, de uma supremacia (ibidem). Os Deuses não são pessoas mas potências. Os Deuses encarnam os valores mais altos: a força, a beleza, a juventude. A “imortalidade” é o traço fundamental que separa os Deuses do homens. Além da figura dos Deuses os mitos falam da “raça do heróis”. Os heróis são “ancestrais míticos”, pertencem a um passado longínquo. O culto dos heróis tem ao mesmo tempo um valor cívico e territorial. HERÁCLES O culto do heróis está associado a um local preciso, um túmulo com a presença subterrânea do defunto. Os heróis são “semideuses”. Como os homens conheciam o sofrimento e a morte. Porém, possuíam toda uma série de traços que os distinguiam dos seres humanos. Viveram numa época “antiga”, já acabada, no qual os homens eram diferentes do que são hoje, eram maiores, mais fortes e mais belos. É uma “raça extinta” cujas proezas são contadas pela poesia épica. A “raça dos heróis” resultou do cruzamentos de duas “raças”: a perecível e a imortal. A religião grega era uma religião cívica. Entre o religioso e o social, o doméstico e o cívico, não há oposição e nem corte nítido. A religião grega não constitui um setor à parte, fechado em seus limites (Vernant). O político estava impregnado de religioso, e o religioso era ligado ao político. Não havia cidades sem deuses, os deuses eram deuses da cidade. Toda cidade tinha suas divindades, cuja função era cimentar a vida social. O mundo das divindades ( da religião grega antiga) era transmitido de dois modos: 1) mediante uma tradição puramente oral exercida em cada lar, sobretudo, através da mulheres; 2) pela voz dos poetas, o mundo dos Deuses era apresentado aos humanos por meio de narrativas. O mito é uma narrativa sobre a origem de alguma coisa. Quem narra o mito é o poeta. Acreditava-se que o poeta era uma escolhido dos Deuses. A “palavra do poeta” - o mito - era sagrada pois originava-se de uma revelação divina. O mito era visto como incontestável e inquestionável (Chauí). APOLO O mito narra a origem das coisas por meio de lutas, alianças e relações sexuais entre forças sobrenaturais que governavam o mundo e o destino dos homens (Chauí). Ouvia-se os poetas em público durante os banquetes, as festas oficiais, os grandes concursos e jogos. Homero e Hesíodo exerciam um papel privilegiado. Suas narrativas sobre os seres divinos adquiriram um valor quase canônico, funcionavam como modelos de referência (Vernant). A Filosofia nasce de uma transformação gradual dos mitos? Continua ou rompe com os mitos? Para alguns, a Filosofia nasceu devido a uma ruptura radical com os mitos, sendo a primeira forma de explicação científica da realidade (Chauí). Outros autores afirmam que a Filosofia nasceu, vagarosa e gradualmente, do interior dos próprios mitos, como uma racionalização deles (Ibidem). De algum modo a Filosofia reformulou e racionalizou as narrativas míticas. SOPHIA Ocorre a passagem de uma simbolização teomórfica, própria do mito, para uma nova simbolização (Voegelin). Os primeiros filósofos-místicos rompem com o mito pois descobriram uma nova fonte de verdade em suas almas (ibidem). A filosofia grega possibilita a emergência da “alma”, da “psique”, como a fonte experimental da ordem (ibidem). A verdadeira ordem já não é a sociedade política nem o cosmos repleto de Deuses, mas a alma, a psique do filósofo (Voegelin). A alma ordenada do filósofo fornece o padrão de medida da ordem ou desordem da sociedade. É a psique, a alma, o novo centro do homem, e não a totalidade do cosmos e/ou mundo social. Assim, o filósofo, o teórico, como representante da nova verdade deveria ser capaz de opor sua autoridade à autoridade da sociedade (Voegelin). A Filosofia grega que começou como uma tentativa de entender o mundo sem recorrer ao mito religioso, terminou como uma teologia racional que buscou definir a relação entre Deus, a alma e o mundo (Luce). A Filosofia grega nada ficou devendo ao politeísmo grego. Pelo contrário, a consciência religiosa dos gregos foi realçada pelos filósofos (Luce). De alguma maneira, Sócrates, Platão e Aristóteles procuraram aprimorar a religião antiga, ao invés de rejeitála (ibidem). 1)As viagens marítimas: produziram desencantamento e desmagificação do mundo. o 2) A invenção do calendário: como uma nova forma de calcular o tempo, percebendo-o como algo natural. 3) A invenção da moeda: permitiu uma nova forma de troca. 4) O surgimento da vida urbana: com o predomínio do comércio e do artesanato, e a diminuição do poder das famílias da aristocracia da terra. 5) Invenção da escrita alfabética: que como o calendário e a moeda revelou o crescimento da capacidade de abstração e generalização. 6) A invenção da política: a) o aspecto legislado e regulado da cidade serviu de modelo para a Filosofia propor a ideia do mundo como algo racional e regulado (Chauí). B) o surgimento do espaço urbano que fez aparecer um novo tipo de discussão, diferente do discurso mítico. C) com a polis, surge a palavra como direito de cada cidadão emitir em público sua opinião, discuti-la com outros, persuadi-los (Chauí). D) surge assim o “discurso político” como a palavra humana compartilhada, como diálogo, discussão e deliberação (Chauí). 7) A inexistência de uma dominação de uma casta sacerdotal. Período (600-450 a.c). Os filósofos deste período preocupavam-se exclusivamente com problemas cosmológicos. Especulavam acerca do elemento primário, do princípio (arché) da qual se originam todas as coisas. Estes filósofos eram “físicos”. Tratava-se de uma “Filosofia Natural”. quase As principais características desta cosmologia eram as seguintes: 1) para estes primeiros filósofos não existia a criação do mundo – “ Nada vem do nada e nada volta do nada”. Isto quer dizer; a) que o mundo ou natureza é eterno; b) que no mundo-natureza tudo se transforma em outra coisa sem jamais desaparecer. 2) O fundo eterno, perene, imortal de onde tudo nasce e para onde tudo volta é invisível para os olhos do corpo, mas visível para os olhos do espírito (Chauí). 3) O fundo perene, eterno, de onde tudo brota e para onde tudo retorna é o elemento primordial da Natureza e chama-se physis. 4) Todos os seres, além de serem gerados e de serem mortais, são seres em contínua transformação (Chauí). 5) a natureza-mundo é mobilidade permanente. 6) os primeiros filósofos escolheram diferentes elementos para afirmar qual era o princípio eterno e imutável que está na origem da natureza e de suas transformações (Chauí). A primeira escola a surgir foi a Milésia, composta por Tales de Mileto, Anaximandro e Anaxímenes. Para Tales o elemento primordial era a água, para Anaximandro o apeíron (Ilimitado), para Anaxímenes o ar. Havia, também, neste período a escola itálica de Pitágoras. Para Pitágoras o “número era o fundamento de tudo”. Outro nome importante deste período é de Heráclito de Éfeso. Para Heráclito o mundo era visto como um processo dinâmico, em constante vir a ser. Tudo estaria em perpétuo fluxo. Afirmava a mutabilidade de todas as coisas. Para Heráclito era o fogo o princípio primeiro. No período pré-socrático é preciso destacar a escola eleática. Parmênides é o maior filósofo desta escola. Outro nome importante é de Zenão. Parmênides afirmava a unicidade, eternidade e imutabilidade do Ser. A mudança, o movimento seriam ilusões dos nossos sentidos. Só haveria uma única realidade o Ser. Segundo Parmênides, aquilo que realmente existe não veio a existir nem deixara de existir. É a mesmo tempo não gerado e imperecível. “ Aquilo que é é, aquilo não é não é”. Há que destacar ,ainda, a figura de Empédocles. Para ele tudo no mundo é derivado de quatro raízes fundamentais: o fogo, o ar, a terra e água. Por fim, existia a escola atomística, formada por investigadores como Leucipo e Demócrito. Para eles todas as coisas visíveis e tangíveis são produzidas pela agregação casual de átomos. Os filósofos jônicos substituíram as figuras divinas do mito por símbolos criados extraídos de objetos e substâncias do mundo da percepção sensorial (Voegelin). Na especulação milesiana sobre a natureza o mito foi abandonado (Voegelin). Os “milesianos” chegaram a uma das grandes ideias da história humana, ao descobrir a natureza como um âmbito autônomo (ibidem). Por sua vez, com Parmênides o “símbolo do ser” aparece pela primeira vez (Voegelin). Com Parmênides tem início a história da filosofia propriamente dita, como a exploração da constituição do ser (ibidem). O Ser de Parmênides não é a origem das entidades percebidas sensorialmente com na escola jônica. O Ser é apreendido pela experiência individual, através de uma faculdade específica da alma o Nous (Voegelin). Pode-se afirmar que o movimento da especulação filosófica dos milesianos a Heráclito é um movimento que se afasta da experiência da desordem concreta na direção de um princípio de ordem (ibidem).