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O monstro
Era uma vez um monstro que vivia num lago muito profundo.
Dizia-se
que
o
lago
era
habitado
por
estranhas
criaturas
especialistas em assustar quem se aproximava.
Este monstro era o mais jovem morador do lago. Havia sido
contratado para manter o local sob um intenso clima de medo. Era jovem e
tinha ainda pouca experiência profissional. No entanto, e como todos os
monstros de boas famílias, tinha uma grande qualidade: o seu horrendo
aspecto físico.
O herói desta história era verde, tinha uma grande boca por onde
cuspia fogo (apesar de um pouco desajeitado, a ponto de chegar a queimar
os bigodes), e era também muito comprido, com cristas ao longo do dorso.
No total, media uns bons quinze metros de comprimento. O seu nome era
Acácio, o monstro Acácio.
Acácio fora educado na melhor escola de monstros de sempre, por
insistência do seu pai, que queria manter a tradição familiar.
O jovem monstro tinha demonstrado ser um bom aluno, mas o seu pai
temia que a sua falta de vocação o desviasse dessa tradição. Daí a
preferência por uma escola tão especializada. No fundo, tinha esperança
de que Acácio pudesse, finalmente, rivalizar com o tal monstro do lago
Ness. (…)
Carvalho, António Antunes. O monstro.
Lago Ness – É um lago da Escócia que se tornou famoso por se achar que nele
existe um monstro aquático, mas a sua existência ainda não foi comprovada.
1
O Veado Florido
Foi numa floresta silenciosa.
Bem perto, por entre as árvores, olhou-o um veado. Pois que
admiração, se viviam na floresta veados que espreitavam num repente, que
espreitavam e fugiam, cheios de susto… Como era porém diferente aquele
veado!
Era um veado florido.
Belo e acetinado como os outros, corpo flexível, patas finas, focinho
aguçado, humedecido de ternura. Tal como os outros. Mas, nas longas e
recortadas hastes que lhe ornavam a cabeça, tinha flores. Eram brancas. E
tinha folhas, folhas de um verde luzidio e quase transparentes. Entre as
folhas, botões donde brotariam novas flores. Era um veado florido.
O veado estacou quando o homem estacou. Parado no verde escuro
das sombras, parecia dizer-lhe: «Vem admirar-me de perto. Vem!» Ele foi
e o veado não fugiu. Queria que lhe fizessem festas. Gostava muito de
festas.
Torrado, António. O Veado Florido. p. 7-10. Civilização.
2
ADIVINHA
Tem predilecção por queijo,
às despensas vai espreitar,
pois o seu maior desejo
é comer e passear.
Viva no campo ou na cidade
tem sempre a mesma maneira;
ladino e com à-vontade,
só temendo a ratoeira.
Além desta, foge ao perigo
de algum gato o apanhar,
estando sempre de olho vivo
no buraco onde morar.
Costa, Soledade Martinho. Vamos adivinhar Animais.
3
O Palhaço Verde
Vou falar-lhes de um palhaço. Tinha um nariz muito grande e uns
olhos que brilhavam como estrelas. E no peito um coração de oiro – os olhos
brilhavam como estrelas porque ele tinha um coração de oiro. E as mãos,
quando estavam fora das luvas grandes, eram grandes, isso eram, mas
meigas e bonitas.
O Palhaço era bom. Sonhava muito. Sonhava que no mundo todos
deviam ser bons, alegres, bem dispostos.
O Palhaço não tinha pai nem mãe. Vivia sozinho desde criança.
Sozinho com o seu coração de oiro.
Um dia olhou o espelho do seu quarto, era ainda rapazito. E disse
para a figura que o espelho reflectia:
- Tenho tanta graça!
E riu. Riu uma gargalhada que parecia a escala de um piano: Dó! Ré!
Mi! Fá! Sol!
E acrescentou:
- Vou fazer rir todos os meninos!
E deitou-se a sonhar.
No dia seguinte pegou numas calças velhas, cor de ferrugem. Num
casaco de quadrados encarnados e verdes, muito largo, que era tão grande
que nele caberiam dois palhaços. E nuns sapatos muito grandes, também,
amarelos como as patas de uns patos.
E numas luvas enormes, muito brancas.
E, por fim - e isso era tão importante! – num macio chapéu verde
tenro da cor dos prados antes de as papoilas nascerem como pingos de
sangue.
Lindo, o nosso Palhaço!
Araújo, Matilde Rosa. O Palhaço Verde. p. 3-4. Livros Horizonte.
4
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