LUIZ CARLOS CORREARD LIBÉLULAS: INCRÍVEIS DRAGÕES LUIZ CARLOS CORREARD Libélulas: Incríveis Dragões PESQUISA LOCALIZADA EDIÇÃO DO AUTOR _______________________________________________________________________________ Título Libélulas: Incríveis Dragões © 2010 – Luiz Carlos Correard Pereira Direitos de edição pertencentes ao autor. Todas as fotos foram obtidas na internet. Revisão LCCP Capa Libélula Diastatops intensa, Família Libellulidae Foto: Domínio Público _______________________________________________________________________________ 2 Aos que gostam da Natureza. Delectabile est oculis videre veritas 3 ÍNDICE 1. INTRODUÇÃO ........................................................................ 5 2. O QUE SÃO LIBÉLULAS? ................................................... 6 3. MORFOLOGIA ...................................................................... 7 4. EVOLUÇÃO E CLASSIFICAÇÃO ...................................... 9 5. CICLO DE VIDA .................................................................. 11 6. ALGUMAS LIBÉLULAS INTERESSANTES .................... 14 7. CURIOSIDADES, HISTÓRIAS E MITOS ......................... 28 8. REFERÊNCIAS ..................................................................... 30 4 1. INTRODUÇÃO Além da minha curiosidade em relação aos seres vivos de um modo geral, eu pouco conhecia desses insetos alados que inglês são conhecidos como dragonflies – (e logo saberemos o porquê). Com um olhar um pouco mais cuidadoso sobre as várias espécies que convivem perto de nós e, na maioria das vezes, sequer vemos ou prestamos atenção, passei a achá-las cada vez mais espetaculares e representativas da diversidade da Vida que é capaz de encantar qualquer um que verdadeiramente ama a Natureza. Interessante é saber que a maior parte da vida desses insetos passa-se fora de nossas vistas de leigos: dentro da água. Da mesma maneira que sapos, rãs e pererecas, as libélulas possuem dois ciclos de vida distintos - dentro e fora da água - com a diferença fundamental de que as larvas das libélulas já nascem predadoras, na água, se alimentando – entre outros - de girinos – que por sua vez serão predadores das libélulas quando ambos estiverem na sua maturidade biológica. Assim, repetindo o que já escrevi em outros trabalhos, procuro trazer um pouco de informação interessante e divertida, cientificamente embasada. Também observo novamente que não tenho a pretensão de fazer nenhum tratado científico ou enfocar tudo o que se estudou e publicou a respeito desses fantásticos seres. Meu único objetivo é um pouco de entretenimento e, para facilitar o que pretendo expor, procurei seguir uma classificação reconhecida (ver referências), buscando as mais estranhas e interessantes espécies, acrescentando eventualmente algum comentário e/ou informação que possa enriquecer o livro. Também na mesma lógica de trabalhos anteriores, deixo registrados alguns links para os devidos créditos e também para quem quiser se aprofundar um pouco mais nesse fascinante mundo da Classe Odonata. Brincadeiras com libélulas 5 2. O QUE SÃO LIBÉLULAS? As conhecidas libélulas, ou lavadeiras, são insetos pertencentes à Ordem Odonata, de acordo com a classificação biológica (ver capítulo à frente). Como todos os insetos, o corpo das libélulas é dividido em três partes: cabeça, tórax e abdômen, com três pares de patas ligadas ao tórax.. A maior parte da cabeça é ocupada pelos grandes olhos. O tórax é relativamente pequeno e compacto, enquanto o abdome é fino e longo. São predadores vorazes e alimentam-se de outros insetos. Possuem um par de antenas minúsculas junto à cabeça. Apresentam dois pares de asas membranosas e rígidas (devido à grande rede de nervos que apresentam) também ligadas ao tórax. Chegam a medir de 2 a 16 cm de comprimento e envergadura. Existem no Brasil mais de 1.200 das mais de 5.700 espécies de libélula que povoam o mundo inteiro. Apesar das várias denominações vulgares, como lavadeira, cavalinho do diabo, pito e canzil, seu nome mais comum, libélula, pode ter-se originado de dois termos latinos: libellulus, o diminutivo de “livro” (liber) - devido à semelhança de suas asas com um livro aberto - ou libella, que significa balança - e aí o movimento de suas asas, que oscilam levemente durante o vôo, daria respaldo a esta interpretação. Graças ao fantástico aparelhamento biológico que possui, uma libélula consegue planar, o que é impossível para a maioria dos insetos alados. De acordo com a espécie, o tempo de vôo pode variar de dias - como ocorre com as espécies migratórias que possuem asas mais largas e conseguem planar nas correntes aéreas - a alguns minutos por dia. Em média, elas se mantêm voando por 5 a 6 horas diariamente. O absoluto controle de vôo da demoiselle (“Senhorita”, como a libélula é chamada pelos franceses), inspirou o brasileiro Alberto Santos-Dumont na criação de seu modelo mais bem sucedido. Predadora voraz em seu ambiente, se alimenta apenas de outros insetos voadores - abelhas, moscas, besouros, vespas, outras libélulas menores, pernilongos etc. Vivendo apenas de um a dois meses com suas asas, depois de ter passado até cinco anos no ambiente aquático, ela tem pouco tempo para encontrar parceiros e procriar, antes que um predador a encontre primeiro. Enquanto vive na água, a libélula tem de fugir dos sapos, peixes e pássaros (ver capítulo Ciclo de Vida). Com asas, ela terá outros inimigos, principalmente aranhas, batráquios e pássaros. É interessante observar que sob o nome genérico de “libélulas” existe um grupo um pouquinho diferente, formado pelas chamadas “Donzelinhas” ou “Libelinhas”. As Donzelinhas (“Damselflies”, em inglês) são menores e mais delicadas e, quando pousadas, mantém as asas juntas, para cima do corpo (com raras exceções), ao contrário das verdadeiras libélulas que pousam com as asas abertas, perpendicularmente ao corpo. 6 3. MORFOLOGIA Libélula e Donzelinha: muito semelhantes, mas com diferenças sutis 7 Olhos e boca de uma libélula Os olhos da libélula são compostos de centenas de milhares de minúsculos “olhinhos” hexagonais, cada um com apenas 0,04 mm de diâmetro. As libélulas têm quase 360 graus de visão, inclusive para trás. A boca possui dois pares de peças bucais - mandíbulas e maxilas – ou seja, as libélulas não picam (mas, se elas forem grandes o suficiente, podem teoricamente morder o seu dedo...). Libélula de boca aberta 8 4. EVOLUÇÃO E CLASSIFICAÇÃO Os principais registros fósseis de libélulas datam do Carbonífero (mais de 300 milhões de anos) foram encontrados na França e têm até 70 centímetros de envergadura de asas. Outros fósseis interessantes e muito bem preservados foram encontrados na região de Solnhofen, na Bavária, Alemanha, entre Nuremberg e Munique. São do Jurássico e têm aproximadamente 155 milhões de anos. Em âmbar, há depósitos na República Dominicana, no Caribe, e na Europa. Os fósseis brasileiros já são bem mais recentes, do Cretáceo (aproximadamente 100 milhões de anos), encontrados na Área de Proteção Ambiental da Chapada do Araripe, na divisa de três Estados: Ceará, Piauí e Pernambuco. Impressionam pela diversidade e pela aparente pouca mudança na forma básica do inseto. Fósseis de libélula do período Cretáceo 9 A classificação biológica desses insetos segue o padrão internacional inicialmente estabelecido por Linneu (Carolus Linnaeus, criador do “Sistema de Classificação Binária” ou “Nomenclatura Binominal”, que lança as bases da Biologia moderna): Domínio, Reino, Filo, Classe, Ordem, Família, Gênero e Espécie, com subdivisões, quando necessário. Aqui, utilizamos a classificação do Systema Naturae 2000 (ver http://sn2000.taxonomy.nl/, completada com o número de espécies da Puget Sound (ver http://www.pugetsound.edu/academics/academic-resources/slater-museum/biodiversityresources/dragonflies/the-families-and-genera-of-odo/ ). Outras classificações consideram o grupo Anisoptera como uma Subordem. O que diferencia uma família de outra são detalhes morfológicos como tamanho e formação das asas e dos olhos, estrutura dos maxilares e da boca, comprimento e número de segmentos do corpo etc – incluindo também os ciclos larvais. Classe: Insecta Ordem: Odonata 5.767 sp SubOrdem Epiprocta (Libélulas) Infraordem Epiophlebioptera (Anisozygoptera) Superfamília Família Epiophlebiidae (Libélulas "antigas" ) 2sp Anisoptera Aeshnoidea Petaluroidea Aeshnidae Austropetaliidae Neopetaliidae Corduliidae Libellulidae Petaluridae Gomphoidea Gomphidae Cordulegastroidea Cordulegastridae Leistoidea Lestidae Megapodagrionidae Perilestidae Pseudolestidae Synlestidae Hemiphlebiidae 2.912sp Libelluloidea Zygoptera (Donzelinhas) 2.853sp Hemiphlebioidea Coenagrionoidea Calopterygoidea Platystictidae Isostictidae Platycnemididae Coenagrionidae Pseudostigmatidae Lestoideidae Amphipterygidae Chlorocyphidae Heliocharitidae Polythoridae Euphaeidae Calopterygidae 10 4. CICLO DE VIDA Duas a três semanas depois de postos os ovos, surgem as larvas das libélulas. Começa então um longo ciclo de vida aquática, que, em algumas espécies, pode durar até cinco anos. Em sua existência submersa, a larva se alimentará de pequenos organismos, girinos e filhotes de peixes - e passará por até 15 sucessivas metamorfoses até se transformar em uma Náiade (como são chamadas as larvas nesta fase) que já se assemelha ao inseto adulto, mas se movimenta no meio aquático através de jatos de água que saem pelo reto, como um sifão. Detalhe da boca de um tipo de larva de libélula Larva de libélula se alimentando 11 Outras larvas de libélula se alimentando 12 Em um dado momento, atendendo aos chamados do relógio biológico, a Náiade faz a transição do meio aquático para o terrestre, onde fará sua última metamorfose. A escalada do trampolim para o novo mundo é feita geralmente à noite, para escapar dos predadores. Subindo pela haste de alguma planta, a larva se mantém imóvel, em preparação para a mudança. Veja uma sensacional seqüência: 13 5. ALGUMAS LIBÉLULAS INTERESSANTES A Família Epiophlebiidae, com 2 espécies, é o único grupo representante da Infraordem Anisozygoptera é interessante porque, por semelhanças na forma das asas, achava-se que essas espécies seriam um intermediário entre as libélulas e as donzelinhas. Essa idéia foi abandonada com a descoberta de que esse grupo representa o mais recente ancestral das libélulas atuais (daí serem “libélulas antigas”). O gênero Epiophlebia evoluiu adaptando-se às alturas do Himalaia, entre altitudes de 1.800 a 3.500 m, em regiões que incluem Kathmandu e Nepal. São insetos robustos, sem a impressão de delicadeza que costumamos associar às libélulas. A outra espécie é atualmente encontrada no Japão. Himalayan Relict Dragonfly Epiophlebia laidlawi Japanese Relict Dragonfly Epiophlebia superstes 14 Na Infraordem Anisoptera, estão classificadas todas as demais libélulas, algumas espetaculares, como essas abaixo: Não pesquisei as referências quanto ao gênero e espécie das libélulas dessas fotos, mas são indivíduos da Família Libellulidae. As seguintes, de diversas famílias. 15 Libellula lydia, Família Libellulidae Waterfall Dragonfly Austropetalia patricia , Famíly Austropetaliidae 16 Petalurus Hesperia, Família Petaluriidae Dragonfly Family Neopetaliidae 17 Ictinogomphus australis, Family Gomphidae Cordulegaster diastatops & Other, Family Cordulegastridae 18 Dragonfly Family Cordulidae Cuban Grasshawk Dragonfly Neurothemis fluctuans 19 Uma das maiores libélulas existentes é a gigante européia mostrada abaixo, com cerca de 80 mm de comprimento e 120 mm de envergadura: Blue Emperor Dragonfly Anax imperator, Family Aeshnidae 20 Já uma das menores não passa de 15 mm de comprimento, ocorrendo na Malásia e Japão. Confira: Libélula pigméia Nannophya pygmaea, Família Libellulidae Outra pequenina: Libélula pigméia Rhyothemis graphiptera Mostro a seguir algumas belas libélulas que não identifiquei: 21 22 23 Agora, algumas donzelinhas. Dá para perceber as diferenças com as libélulas? Uma das maiores (cerca de 60 mm de comprimento) é mostrada abaixo: Damselfly Lester eurinus, Family Lestidae Uma das menorzinhas (cerca de 20 mm de comprimento) é essa abaixo: Damselfly Ischnura elegans, family Coenagrionidae 24 Algumas belas imagens: 25 26 27 7. CURIOSIDADES, HISTÓRIAS E MITOS Libélulas não picam. Embora possam ser assustadoras quando vistas de perto (principalmente as maiores), as libélulas não tem pinças ou ferrões que possam causar qualquer dano a humanos. Se tem libélula, a água está limpa Verdade. Quem tiver dúvidas quanto à qualidade da água de um rio ou lago pode fazer o "teste da libélula", que consiste na simples observação se há libélulas na área. Todo rio ou lago com águas limpas tem libélula. No entanto, a menor alteração físico-química da água ou do ar já será suficiente para expulsá-las, além de impedir que dos ovos saiam novas larvas. Deste modo, a presença do inseto funciona como um excelente bioindicador da qualidade do meio ambiente. A grande ameaça à vida das libélulas é a poluição ambiental. Na água, a poluição provoca mudanças drásticas em suas características físicas, como os sedimentos em suspensão, e químicas, tais como alteração do PH, da condutividade e do nível de oxigênio dissolvido na água. No ar, ocorrem processos semelhantes, incluindo as mudanças climáticas. As duas metades de um coração Para as donzelinhas, o tempo de procriação pode variar de alguns minutos em pleno vôo até várias horas de um acasalamento pousado. O que não muda é a posição insólita em forma de coração, formada pelo corpo retorcido do macho e da fêmea. A fêmea, então, faz também um contorcionismo... e formam um coração! Depois da fecundação, os ovos são liberados dentro da água ou em alguma planta submersa. 28 A libélula no mundo A libélula é adorada no Japão, onde simboliza a coragem. Na Ásia mais oriental e em algumas tribos ameríndias (como os Navajo) , as libélulas representam água pura. Já para os vietnamitas elas são úteis na previsão meteorológica: se voam baixo é sinal de chuva, se voam alto é porque o sol vai brilhar e se voam a um nível médio é sinal de céu nublado. Em muitos países da América do Sul (inclusive o Brasil), a libélula é chamada de “mata cavalos” ou “cavalinho do diabo”. Na Holanda, “morde cavalos”, nos Estados Unidos “médica de cobras” - pois é crença popular dos estados mais ao sul que elas “vigiam as cobras e que, quando estas se machucam, cuidam dos seus ferimentos”. Na Inglaterra, é chamada de “agulha do diabo” ou “corta orelhas”. Na Romênia, segundo uma lenda, a libélula foi em tempos um cavalo possuído pelo diabo. Na Suécia, uma crença antiga diz que o diabo utiliza as libélulas para pesar as almas humanas. Na Alemanha, “instrumento do demônio”. No Japão antigo, traziam boa sorte. Para os chineses, o equilíbrio entre a estabilidade e a fraqueza. Na Escandinávia, são santas criaturas. No Taiti, a libélula seria a sombra de Hiro, o deus dos ladrões. E, para mim, são simplesmente um fantástico exemplo da bela diversidade da Natureza... 29 8. REFERÊNCIAS Existem muitas e muitas referências, com informações e fotos fantásticas. Siga os links. - Marcelo Szpilman,em http://www.institutoaqualung.com.br/info_libelula18.html - Luiz Antonio Figueiredo, em http://www.biodiversityreporting.org/article.sub?docId=23671&c=Brazil&cRef=Brazil&year=2007 &date=October%202006 http://en.wikipedia.org/wiki/Dragonfly http://tolweb.org/Odonata/8266 http://dragonflywebsite.com/faq.htm www.snh.org.uk/.../dragonfly/breedandfeed.asp www.richard-seaman.com/.../Odonata/index.html http://www.dmoz.org/Science/Biology/Flora_and_Fauna/Animalia/Arthropoda/Insecta/Odonata// http://www.pugetsound.edu/academics/academic-resources/slater-museum/biodiversityresources/dragonflies/the-families-and-genera-of-odo/ Filminho: http://aslibelulasdeportugal.blogspot.com/2008_09_01_archive.html . http://en.wikipedia.org/wiki/Epiophlebia_laidlawi Ótimas informações, em inglês: http://www.dragonflysoc.org.uk/faq.html#size Dragonfly Museum http://www.discoverlife.org/mp/20q?search=Macromia+illinoiensis http://bugguide.net/node/view/190 FIM LCCP, Maio de 2010 30