o poder disciplinar no caps de joaçaba

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O PODER DISCIPLINAR NO CAPS DE JOAÇABA
Autores: Letícia GOMES, Caroline Ramos FERREIRA, Gabriela Leite GOULART, Antonio Cavalcante DE
ALMEIDA (Orientador IFC - Campus Luzerna)
Introdução
O filósofo francês Michel Foucault (1926-1984) estudou e conceituou o poder
e suas formas de manifestação, sendo a forma mais conveniente e eficaz de garantir a
ordem. O poder é uma prática social que foi se formando ao longo do tempo e varia com
cada época e sociedade. Segundo Foucault, o poder é exercido pelos “opressores” sob
os “oprimidos”, e depende de uma rede de relações, e não somente de um sujeito. A
partir do século XVII, o poder foi exercido através de instrumentos disciplinares, como
a vigilância, para garantir a obediência dos indivíduos (RAMOS, 2011).
Este trabalho, realizado sob o escopo da disciplina Sociologia do 2 º ano do
curso técnico em Segurança do Trabalho do IFC - Campus Luzerna, analisará a atuação
do CAPS - Centro de Atenção Psicossocial - de Joaçaba sob o viés da teoria de Foucault
sobre o poder disciplinar.
Material e Métodos
No dia 15 de julho de 2016, foi realizada uma entrevista com um profissional
do CAPS de Joaçaba. Por meio de pesquisas bibliográficas, principalmente através de
Ramos (2011), houve o estudo da teoria de Michel Foucault sobre o poder disciplinar.
Com os dados obtidos na entrevista, foi possível analisar e compreender o conceito
foucaultiano na prática.
Resultados e Discussão
Verificou-se que o CAPS é um programa do governo federal, que repassa
recursos para os municípios montarem unidades de atendimento especializado. O
CAPS, que funciona de portas abertas, atende pessoas com transtornos mentais graves e
severos, ou seja, com depressão, esquizofrenia e bipolaridade, por exemplo; e também,
com transtornos relacionados a substâncias psicoativas, ou seja, ao álcool e outras
drogas.
Figura 1 - Vista lateral do CAPS de Joaçaba
Fonte: Fotografia dos autores.
Antigamente, as pessoas que não se encaixavam nos padrões da sociedade
eram internadas, e muitas passavam anos, e até mesmo a vida num hospital, sendo
excluídas da sociedade e também, da família. Houve uma reforma psiquiátrica, e surgiu
o CAPS, criado para reduzir as internações hospitalares, fazendo o tratamento
medicamentoso e terapêutico. Este, além de inserir novamente essas pessoas na
sociedade, fortalece os vínculos familiares e as insere no mercado de trabalho. Muitas,
em função dos transtornos, não possuem alfabetização, e através do CAPS, têm a
oportunidade de estudar. Ademais, recebem auxílio em outras etapas, como na
elaboração de currículos.
Há uma equipe de profissionais que trabalham no CAPS de Joaçaba: há uma
recepcionista, um motorista, uma merendeira, uma monitora de arte, uma
musicoterapeuta, um médico, uma enfermeira, uma técnica em enfermagem, uma
psicóloga, duas assistentes sociais, uma agente de serviços gerais e duas estagiárias.
Este funciona das 7:30 horas às 17:30 horas, de segunda-feira a sexta-feira. Possui
atualmente 152 pacientes, que são acompanhados toda semana. Alguns se dirigem ao
local uma vez por semana, outros duas, outros a semana toda. A intensidade com que
cada paciente frequenta o CAPS vai de acordo com a necessidade de cada um, depende
da situação clínica.
Alguns pacientes são encaminhados por meio de uma unidade de saúde; outros
por alguma política do município, como por exemplo pelo CRAS (Centro de Referência
de Assistência Social) e pelo CREAS (Centro de Referência Especializado de
Assistência Social); ou pelo conselho tutelar; ou buscam atendimento por livre e
espontânea vontade. Quando os pacientes ficam estabilizados, são encaminhados para
unidades de saúde.
Há várias oficinas, grupos e projetos terapêuticos, como as oficinas de feltro e
EVA, horta e jardim, marcenaria, patchwork e patchcolagem, reciclagem, tintura em
tecido e tela, tricô e crochê; os grupos de autoconhecimento, autoestima, caminhada,
dependência química, educação e saúde; e os projetos “Mexa-se” e “Soletrando”.
Quando o paciente entra no CAPS, em um primeiro momento é feito um
acolhimento com escuta qualificada, e o acolhido conta quais são os seus sofrimentos.
Não é feita nenhuma pergunta. O paciente é ouvido e são feitas anotações. Esse
acolhimento é fundamental porque é preciso saber como é a vida desse paciente, como é
a sua rotina, quais são as suas sensações a partir do momento em que acorda até o
momento em que vai dormir, como é o seu relacionamento com a família, e até como
foi a sua infância. Depois desse acolhimento, o paciente é encaminhado para o médico,
e por fim, recebe as orientações referentes ao seu tratamento, como em relação aos
medicamentos.
Toda sexta-feira, no período matutino, se sucede uma reunião da equipe. Cada
caso é estudado e é feito o projeto terapêutico singular, que encaixa cada paciente em
um grupo, de acordo com sua patologia. O profissional entrevistado explica: “(...) a
equipe se reúne, fala a situação dele [do paciente] e acha assim ‘Ó, pela patologia dele,
ele tem que ser incluído nesse grupo.”
Posterior a isso, ocorre um diálogo com cada paciente, e cada um fica ciente
dos grupos em que seria interessante ser incluso. O projeto então é construído junto com
os pacientes, para que se encaixe em seu perfil. Isto é, não adianta incluir um paciente
claustrofóbico em um grupo cuja sala lote de pessoas.
“A gente chama esse paciente, (...) conversa com ele, e diz assim ‘Ó, você vai
frequentar esse grupo, mas tem esse grupo, e esse, que seria interessante você
participar. Você quer?’ Então é construído com ele o projeto dele, porque não
adianta colocar uma pessoa que tem depressão, e que não consegue ficar em
ambiente fechado, com muita gente, inserir ela num grupo, que seja
totalmente diferente da situação dela. Porque mais ou menos a gente põe as
mesmas patologias né, esquizofrenia tem um dia, depressão tem outro dia,
grupo só de homem, grupo só de mulher, grupos mistos a gente têm bastante,
(...) a gente faz atividade física com eles. Então têm várias situações, a pessoa
que precisa vir todos os dias, a gente fala pra ela assim ‘Ó, você tem que vir
todos os dias. Então assim, de manhã têm as atividades e de tarde têm as
atividades. Terça e quinta você vai ser obrigado a fazer essas atividades que a
gente ta propondo pra você, mas você pode optar por outra atividade na
segunda e na quarta, porque sexta-feira não têm atividade (...)’. Daí ele
escolhe, então é construído com ele esse projeto terapêutico singular.”
Quando o projeto terapêutico singular é entregue aos pacientes, as regras são
citadas. Uma das regras é a seguinte: o café da manhã é servido das 8:30 horas às 9:00
horas, e quem chega após este horário, fica sem café e fora das atividades. Outra regra:
é proibido o uso de celular. Por meio de planilhas e prontuários internos, o CAPS
mantém o controle da situação de cada paciente. Tudo o que o paciente relata é anotado,
assim como cada detalhe do tratamento.
O paciente recebe uma carteirinha, em que estão indicados os dias da semana
que o paciente têm atividades e precisa dirigir-se ao CAPS. Essa carteirinha serve para o
paciente se orientar, mostrar para os seus familiares, e mostrar no ônibus, pois os
pacientes ganham vale transporte.
Quando é necessário medicar o paciente, os medicamentos não são entregues a
ele, e sim, ficam no CAPS. O paciente só leva para casa, em um envelope, o que será
ingerido no dia. Por exemplo, um paciente que frequenta o CAPS durante todo o
período em que este fica em funcionamento. Este paciente ingere um comprimido no
período matutino e um no período vespertino, no CAPS. De segunda-feira a sexta-feira
leva para casa um envelope contendo sua medicação que deve ser ingerida no período
noturno. Na sexta-feira, leva para casa um envelope contendo os medicamentos que
deverão ser ingeridos no final de semana. Supondo que este paciente seja analfabeto,
escrever sobre cada medicamento em que período deve ser ingerido não basta. É por
isso que, se o medicamento deve ser ingerido no período matutino, está escrito “manhã”
e tem a figura de um sol. Se o medicamento deve ser ingerido no período vespertino,
está escrito “tarde” e tem a figura de um prato de frutas. Se o medicamento deve ser
ingerido no período noturno, está escrito “noite” e tem a figura de uma estrela. É a
medicação assistida.
Conclusão
Por muitas vezes em sua vida, o ser humano se encontra em uma situação de
vulnerabilidade biopsicossocial. Vê-se frágil, e precisa da ajuda de especialistas. Nessas
situações, a pessoa enferma precisa da confiança naqueles ao seu redor, justamente por
sua fragilidade. No caso do CAPS, os pacientes não têm controle sobre si, sua
alimentação, seus horários ou medicamentos. Nem sempre a situação de poder é
negativa, porém, é necessária a confiança dos “oprimidos” e a consciência dos
“opressores”. O estudo realizado no CAPS evidencia a teoria sociológica do poder
disciplinar como algo sutil e existente nas relações do espaço social da entidade em tela.
Referências
MACHADO, I. J. de R.; AMORIM, H.; BARROS, C. R. de. Sociologia hoje. São
Paulo: Ática, 2013.
RAMOS, Fábio Pestana. A questão do poder disciplinar em Foucault. In: Para
entender a história... ISSN 2179-4111. Ano 2, Volume mai., Série 17/05, 2011, p.0106. Disponível em: <http://fabiopestanaramos.blogspot.com.br/2011/05/questao-dopoder-disciplinar-em.html>. Acesso em: 20 jul. 2016.
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