Oração de Sapiência - Ordem dos Economistas

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Oração de Sapiência
A Responsabilidade Social do Economista
Exmo. Senhor
Presidente do Conselho de Administração da Universidade Lusófona,
Prof. Manuel Damásio
Exmo. Senhor
Administrador Delegado
Dr. Carlos Vieira
Exmo. Senhor
Director
Prof. Miguel Varela
Minhas Senhoras e Meus Senhores,
Gostaria em primeiro lugar de agradecer o amável convite que me foi
dirigido e que muito me honrou, para vos falar numa data tão simbólica e
importante como é o formal início do ano lectivo.
Estando numa Escola de Economia e Gestão, sendo essa a minha formação
e exercendo, actualmente, as funções de Bastonário da Ordem dos
Economistas é sobre a profissão de Economista e, nomeadamente, sobre a
responsabilidade social de que ela se reveste que eu gostaria de vos falar.
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A formação de economista marcou desde sempre o meu pensamento e
ajudou-me a lidar com os desafios que tenho enfrentado nas minhas
responsabilidades profissionais e públicas.
Na sociedade actual, o papel do economista é crucial. O domínio das
ciências económicas é fundamental, quer para os poderes públicos
administrarem com eficiência, equidade e sentido estratégico os recursos
do Estado, quer na gestão de empresas sujeitas cada vez mais ao confronto
crescentemente competitivo no mundo global.
A Economia em si mesma, como sabem, é uma ciência social que para se
tornar verdadeiramente útil se deve assumir como ciência instrumental, isto
é, como ciência ao serviço do desenvolvimento. Era esta a opinião várias
vezes expressa pelo Primeiro Bastonário da Ordem dos Economistas Prof.
António Simões Lopes que recentemente nos deixou, reconhecendo que é a
assunção do seu carácter instrumental que a emancipou de outras ciências
sociais, apoiando-se em métodos quantitativos para a construção dos seus
instrumentos de análise e de apoio à decisão.
Há uma necessidade de formação de base comum para a Economia e para
as Ciências Empresariais-vulgarmente designadas por Gestão-e de suporte
dessa formação nos instrumentos de análise, nomeadamente matemáticos.
Mas, seja pela abrangência da sua formação específica, seja pela
capacidade que adquirem para integrar diferentes conhecimentos e áreas do
saber, os economistas tendem a ser actores principais e decisivos na
modernização da economia e, consequentemente, da sociedade.
O Presidente da República relembrou na abertura do II Congresso Nacional
dos Economistas que os economistas podem contribuir para a
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racionalização dos meios, para a inovação dos métodos e para a
responsabilidade social dos agentes económicos, quer públicos, quer
privados.
Têm ainda um papel importante a desempenhar como agentes promotores
das mudanças necessárias para garantir o progresso económico e social. E
estão especialmente preparados para entenderem a importância da inovação
como factor de competitividade das empresas e como instrumento capaz de
melhorar a eficiência e a qualidade das políticas públicas. Deles,
igualmente, se esperam soluções políticas que permitam contemplar, no
processo de necessária e inevitável mudança, preocupações de equidade e
de coesão social.
Aqueles que desenvolvem a sua actividade profissional como gestores têm
a possibilidade de adquirir uma privilegiada percepção da responsabilidade
social das empresas. Esta é uma dimensão superior da actividade
empresarial que é tanto mais importante quanto mais avançamos na
globalização dos mercados. Embora hoje seja genericamente aceite que
competitividade e orientação social das empresas não são incompatíveis, tal
como enunciaram em 2002 Michael Porter e Mark Kramer em
contraposição a teses , como a de Milton Friedman, que em 1970 afirmou
que a responsabilidade social da empresa se resume ao aumento dos seus
lucros, ainda há um caminho a fazer no sentido de integrar devidamente a
responsabilidade social como um dos activos de afirmação e de sucesso,
contribuindo para a sustentabilidade competitiva de uma empresa.
Há, na actualidade, uma visão sistémica das relações que uma empresa
mantém com o que a rodeia. Ao assumir responsabilidades sociais, uma
empresa reconhece as necessidades e prioridades dos intervenientes da
sociedade e avalia as consequências das suas acções no plano social, com a
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finalidade de melhorar o bem-estar da população e, simultaneamente
proteger os interesses da sua organização e dos seus accionistas.
Como dizia o professor de Harvard, James Austin, citando a tese de
Friedman, “O negócio dos negócios é criar valor social além de económico.
Porque o valor económico nem sempre cria valor social, mas o valor social
sempre cria valor económico, numa espiral virtuosa”.
A questão da responsabilidade social tem vindo crescentemente a ser
discutida a nível das mais diversas instituições.
Já em 2001, o Livro
Verde da Comissão Europeia definia responsabilidade social como um
conceito segundo o qual as empresas decidem, numa base voluntária,
contribuir para uma sociedade mais justa e para um ambiente mais limpo.
Quer dizer, a gestão das empresas não deve ter como único objectivo o
cumprimento de interesses dos seus stakeholders, mas também a
consideração de outros intervenientes nos processos económico-sociais,
como é o caso dos trabalhadores, dos clientes, dos fornecedores, das
autoridades públicas e, da sociedade em geral.
Estes desenvolvimentos quanto à responsabilidade social são consequência
da globalização e da mutação industrial, em larga escala, mas também o
são pelo emergir de novas preocupações e expectativas dos cidadãos, dos
consumidores, das autoridades públicas, dos investidores.
Em suma, os critérios sociais devem nortear as decisões destes agentes.
É assim que, em 2002 surge o conceito de Elkington relativo aos três
pilares da sustentabilidade, ou no termo inglês “triple bottom line” (TBL),
o qual defende o equilíbrio entre o desenvolvimento económico, social e
ambiental – também conhecido pelos 3 p’s: profit, people e planet.
John Elkington, que foi fundador de uma Empresa de consultoria britânica
chamada de SustainAbility, defendeu que as empresas devem preparar-se
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em três diferentes “bottom-lines”. O primeiro, consiste na medida
tradicional de lucro das empresas, é o “bottom-line” do lucro e do prejuízo.
O segundo é o “bottom-line” relativo às pessoas na empresa, isto é, a
medida de como uma organização é socialmente responsável nas suas
operações. O terceiro, é o “bottom-line” da empresa no planeta, ou seja, a
medida da sua responsabilidade ambiental.
Reforçando o que temos vindo a expor, a responsabilidade social tem a ver
com o cumprimento dos deveres e obrigações dos indivíduos e das
empresas para com a sociedade em geral.
E há várias visões da responsabilidade social: como atitude empresarial
ética e responsável, como um conjunto de valores, como estratégia
empresarial, como estratégia de relacionamento, como estratégia de
marketing institucional, como estratégia de valorização das acções da
empresa, como estratégia de recursos humanos, como estratégia de inserção
na comunidade, como estratégia social de desenvolvimento, como
promotora da cidadania, como responsabilidade ecológica ou até como
estratégia de inserção social.
Também no que se refere ao sector público, a responsabilidade social do
economista se reveste da maior importância, uma vez que a definição das
políticas económicas decorre das análises da conjuntura económica e dos
resultados dos trabalhos efectuados em áreas tão importantes como
o
planeamento, o orçamento e o financiamento da economia.
A acção dos economistas é igualmente muito relevante no que respeita ao
desenvolvimento da iniciativa empreendedora, nomeadamente nos jovens.
Da criatividade, da iniciativa e da experiência de muitos economistas têm
surgido conceitos, modelos, instrumentos com impacto estruturante na
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economia e, consequentemente, na sociedade. Numa Escola com muitos
jovens que fazem a sua preparação para entrarem depois na vida activa ou,
já trabalhando, aperfeiçoam e alargam os seus conhecimentos, a iniciativa
empreendedora pode ser um caminho a escolher para um futuro melhor.
Racionalização, inovação, responsabilidade social e empreendedorismo são
cada vez mais determinantes no exercício da profissão de economista. Da
alta qualidade da sua prestação dependerá, em grande parte, a
competitividade das nossas empresas e o desempenho capaz e eficaz das
políticas públicas portuguesas. Pela sua formação de base, pela experiência,
pela cultura de acção os economistas têm uma importante palavra a dizer
que deve ser convenientemente escutada. Palavra dos mais experientes, em
várias áreas e sectores, mas também palavra dos mais jovens, aqueles que
estão iniciando os seus percursos profissionais. O contributo dos jovens
economistas, o seu talento e cultura de risco e de inovação, bem como a sua
capacidade de empreender constitui um recurso ímpar que é necessário
estimular e valorizar.
A profissão de economista só foi reconhecida há pouco mais de catorze
anos, depois de um processo muito longo mas que acabou por consagrar a
criação da Ordem dos Economistas, como associação profissional pública
semelhante a outras mais antigas relativas a outras profissões. No futuro, a
Ordem adquirirá ainda maior importância por força da recente aprovação
da nova lei-quadro das associações públicas profissionais, publicado em 10
de Janeiro último que, entre outras disposições, legisla sobre o acesso e o
registo dos profissionais, a carteira profissional europeia, os deveres e os
direitos dos membros.
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Os actuais Estatutos da Ordem definem já os deveres a que devem
obedecer os Economistas. E, entre o seu articulado, gostaria de realçar a
norma que impõe que os membros da Ordem se recusem, na sua actividade
profissional, a intervir em iniciativas e realizações que contrariem a lei e a
ética profissional, a dar o seu aval a documentos elaborados por terceiros
que comprometam a dignidade da profissão e a cooperar com quaisquer
entidades em práticas condenáveis, ética e socialmente, bem como o
envolvimento em empreendimentos de objectivos duvidosos. E este
normativo é também reforçado pelo Código Deontológico que estabelece,
em matéria de responsabilidade social, um princípio geral que assenta no
dever de cada economista reconhecer o papel fundamental que a ciência
económica e a sua actividade profissional desempenham na promoção do
bem-estar comum.
Como tal, o economista deve actuar de forma prudente, de modo a
minimizar consequências económica e socialmente negativas, ciente de que
a sua intervenção pode minorar ou agravar as assimetrias de informação
dos agentes económicos.
O mesmo Código Deontológico desenvolve este princípio geral, impondo o
acatamento dos seguintes deveres específicos, em sede de responsabilidade
social: pugnar pelo aperfeiçoamento e boa aplicação da ciência económica
tendo em conta, em particular, as consequências que podem advir para a
sociedade da sua incorrecta aplicação; recusar a intervenção em iniciativas
e realizações que contrariem a lei ou as normas do Código Deontológico;
recusar a cooperação com quaisquer entidades em práticas ética ou
socialmente condenáveis ou em actividades que tenham em vista a
obtenção de vantagens ilícitas ou ilegítimas para si ou para outrem; recusar
conceder o aval a documentos elaborados por terceiros que comprometam a
dignidade da profissão; evitar actuações que possam ter sinergias negativas,
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ainda que racionais do ponto de vista individual; e identificar e ponderar os
riscos, não só na perspectiva individual, mas também colectiva.
O incumprimento dos deveres fixados, quer pelos Estatutos, quer pelo
Código Deontológico podem dar origem à aplicação de penas disciplinares
que vão da simples advertência até à suspensão de membro.
Neste momento, a Ordem tem cerca de 12000 membros, repartidos por
quatro Colégios da Especialidade (Economia Política, Economia e Gestão
Empresariais, Auditoria e Análise Financeira) e, muito brevemente, de
acordo com a recente legislação atrás referida, vai rever os seus Estatutos e
entrar numa nova era, muito semelhante ao que existe noutros países
europeus, em que a entrada na vida profissional e o exercício posterior da
profissão vai exigir o registo na Ordem, comprovativo da preparação do
economista para a profissão que escolheu. Vivemos já tempos de mudança
e de evolução, pelo que para além do comportamento ético e deontológico,
se deve consagrar as garantias de formação e de actualização de
conhecimentos de forma a que o economista possa realizar o seu trabalho
com todas as condições.
O economista é, sem dúvida, um profissional com um vasto campo onde
pode pôr à prova a sua preparação desde o primeiro momento em que
começa a trabalhar. Entre outras responsabilidades, tem uma relevante
responsabilidade social. E tem também uma responsabilidade relativamente
às gerações futuras, na medida em que dispõe de saberes de poder que
fazem com que o destino dessas gerações repouse nas suas mãos.
Tal como escreveu o economista Jonas Ridderstrele "Age de maneira tal
que os efeitos da tua acção sejam compatíveis com a permanência de uma
vida autenticamente humana sobre a terra e os efeitos da tua acção não
destruam a possibilidade futura dessa vida".
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