8 0.2.3 Rotacional O rotacional de num campo vectorial V num ponto r é um vector cujas componentes se definem a partir do seguinte limite: 1 (rotV(r)) · n = lim ∆σ→0 ∆σ V(r) · dλ (24) λ em que λ V(r) · dλ é a circulação do campo V ao longo do percurso fechado λ que delimita a superfı́cie ∆σ. (rotV(r)) · n é a componente do rotational na direcção n perpendicular à superfı́cie ∆σ. A partir desta definição segue-se de forma (quase) imediata o teorema de Stokes, integrando o rotacional numa área finita σ: σ rotV(r) · dσ = V(r) · dλ (25) λ Expressão do rotacional em coordenadas cartesianas O rotacional pode ser calculado a partir do seguinte determinante formal: êx êy êz ∂ ∂ ∂ rotV = ∇ × V = ∂x ∂y ∂z Vx Vy Vz (26) Significado fı́sico Para ilustrar o significado do rotacional, consideremos uma massa de água que roda com velocidade angular constante ω em torno de um eixo central vertical êz . A velocidade das partı́culas de água à distância r do eixo é (em coordenadas cilı́ndricas) v = ω r êφ . O rotacional de v, calculado a partir da definição, é: 1 (rotV(r)) · êz = lim ∆σ→0 ∆σ 1 v(r) · dλ = lim 2 r→0 πr λ ωr ω r êφ · dλêφ = lim 2 r→0 πr λ dλ = 2ω λ (27) A componente do rotacional na direcção de êz corresponde pois ao dobro da velocidade angular. 0.2. CAMPOS E OPERADORES DIFERENCIAIS 0.2.4 9 Laplaciano O laplaciano de um campo escalar φ é um operador diferencial de segunda ordem que corresponde à divergência do gradiente desse campo: lap φ = div(grad φ) = ∇ · ∇φ = ∇2 φ (28) O uso do operador ∇ permite-nos obter imediatamente as componentes cartesianas do operador laplaciano: ∇2 φ = ∂ 2φ ∂ 2φ ∂ 2φ + + 2 ∂x2 ∂y 2 ∂z (29) Significado fı́sico Através de um desenvolvimento em série de Taylor em torno de um ponto r0 , é possı́vel demonstrar que o laplaciano nesse ponto é proporcional à diferença entre o valor médio φ̄ do campo no elemento de volume em torno do ponto e o valor φ0 do campo em r0 . Este resultado permite-nos interpretar imediatamente as equações que contenham o operador laplaciano. Um exemplo particularmente importante é o da equação de Laplace que (conforme veremos mais adiante na disciplina), governa o potencial electrostático no vazio: ∇2 V = 0 (30) Esta equação basicamente informa-nos então que o valor médio do potencial em torno de um ponto P é igual ao valor do potencial no próprio ponto P. 0.2.5 Alguns resultados importantes Seguem-se alguns resultados particularmente importantes: O rotacional do gradiente de um campo escalar V é nulo. ∇ × (∇V ) = 0 (31) Então, a um campo vectorial V cujo rotacional seja nulo pode ser associado, com imensas vantagens de cálculo, um campo escalar φ. É o que acontece, por exemplo, com o campo electrostático E, a que se associa o potencial electrostático V , convencionando-se, 10 conforme veremos no decurso da disciplina, E = −∇V . A divergência do rotacional de um campo vectorial A é nula. ∇ · (∇ × A) = 0 (32) Então, a um campo vectorial B cuja divergência seja nula também pode ser associado, com algumas vantagens de cálculo, um outro campo vectorial A. Conforme veremos, é o que acontece, por exemplo, com o campo magnetostático B, a que se pode associar o potencial vector A, convencionando-se B = ∇ × A. 0.2.6 Equações de Maxwell Esta revisão dos operadores diferenciais justifica-se pelo facto de as leis básicas do electromagnetismo poderem ser escritas de forma muito compacta e elegante na forma de um conjunto de equações diferenciais que relacionam os campos eléctrico E e magnético B com as densidades de carga ρ e de corrente j presentes. Trata-se das célebres equações de Maxwell, que constituem o principal objecto de estudo desta disciplina e que apresentamos desde já: ∇·E= ρ 0 ∇×E=− ∂B ∂t ∇·B=0 (33) (34) (35) ∂E j + (36) ∂t 0 Estas equações traduzem as propriedades básicas dos campos eléctrico e magnético, e já eram praticamente todas conhecidas antes de Maxwell: a lei de Coulomb (eq. 33), a inexistência de cargas magnéticas (eq. 35), a lei de Faraday (eq. 34) e a lei de AmpèreMaxwell (eq. 36). No caso estático (∂E/∂t = 0, ∂B/∂t = 0), as equações de Maxwell reduzem-se a dois pares de equações, que envolvem os campos eléctrico e magnético separadamente, e que correspondem a dois domı́nios importantes designados electrostática e magnetostática. Há toda a vantagem em estudá-los separadamente, dando depois lugar ao estudo da electrodinâmica. c2 ∇ × B = Electrostática 0.3 Lei de Coulomb Na Natureza existem dois tipos básicos de cargas eléctricas, ditas cargas positivas e cargas negativas. A interacção básica entre duas cargas eléctricas q1 e q2 em repouso conduz a uma força (dita força de Coulomb) que tem as seguintes propriedades: • diminui com o quadrado da distância r entre as cargas; • aumenta proporcionalmente a cada uma das cargas presentes; • actua na direcção r̂ da linha que une as cargas; • é repulsiva entre cargas do mesmo tipo e atractiva entre cargas de tipos diferentes. Estas propriedades podem ser sintetizadas matematicamente na expressão da lei de Coulomb para a força F21 que actua na carga q2 devido à carga q1 : F21 = k q1 q2 r̂21 r2 (37) em que r̂21 = (r2 − r1 )/r e r = |r2 − r1 |, sendo r2 e r1 as posições das cargas q2 e q1 , respectivamente. k é uma constante, dita constante de Coulomb que depende do sistema de unidades utilizado. No sistema internacional (SI), k costuma exprimir-se em função de uma outra constante 0 , designada permitividade eléctrica do vazio: k= 1 4π0 (38) 0 é designada permitividade eléctrica do vazio e o seu valor é, por definição: 0 = 107 ∼ 8.85 × 10−12 F/m 4π c2 11 (39) 12 onde c = 299 792 458 m/s é a velocidade da luz no vazio 0.4 2 . Princı́pio da sobreposição e campo eléctrico A lei de Coulomb traduz a força entre duas cargas eléctricas em repouso mas não responde à questão: existe alguma alteracção a essa força na presencça de uma terceira carga? A resposta é: não. Isto significa que a força resultante na terceira carga Q devido à interacção com as duas cargas iniciais q1 e q2 corresponde simplesmente à soma (vectorial) das forças entre Q e q1 , e Q e q2 , consideradas separadamente: FQ = FQ1 + FQ2 = k qi Q q1 Q q2 r̂Q1 + k 2 r̂Q2 = Q k 2 r̂Qi = QEQ 2 rQ1 rQ2 rQi q (40) i Esta propriedade importante da força de Coulomb é conhecida por princı́pio da sobreposição. Daqui segue também a definição, com vantagem, do campo eléctrico EQ na posição da carga Q, devido às outras cargas presentes: EQ = qi k qi r̂Qi 2 rQi (41) O conhecimento do campo eléctrico numa dada zona do espaço permite-nos determinar a dinâmica de uma carga Q que lá seja colocada: FQ = QEQ 0.4.1 (42) Aproximações macroscópicas A carga eléctrica encontra-se quantificada na Natureza. As cargas conhecidas constitutem múltiplos inteiros da carga elementar3 , correspondente à carga do protão: e = 1.6 × 10−19 C (43) Esta carga elementar é de tal forma reduzida em comparação com as cargas envolvidas em muitos dos processos eléctricos que se torna útil em muitas situações tomar as 2 Actualmente, no SI, o valor da velocidade da luz no vazio é definido, e é deste valor e da definição de segundo que decorre a definição do metro. 3 O protão é constituı́do por quarques, cuja carga é e/3 ou 2e/3, mas os quarques não existem isolados na Natureza. Mas se existissem (existirem) isolados, isso também não alteraria o princı́pio da quantificação da carga. 13 0.5. LEI DE GAUSS distribuições de carga como sendo aproximadamente contı́nuas. Esta abordagem tem a vantagem de se poder utilizar a ferramenta poderosa do cálculo diferencial e integral. É costume definir-se assim a densidade de carga, ρ: ρ= dq dτ (44) O campo eléctrico criado por uma distribuição ρ de carga obtém-se considerando: qi → dq = ρ(r)dτ (45) e aproximando a soma de todas as cargas por uma soma de Riemann, i.e., um integral em todo o volume τ onde se define ρ: → k qi (46) τ A eq. 41 pode então ser reescrita: E= τ ρ(r)dτ r̂ r2 (47) Podem-se obter expressões análogas para outras distribuições em que a carga esteja concentrada em regiões reduzidas do espaço, podendo ser descrita aproximadamente por densidade superficiais ou até lineares de carga, σ e λ, respectivamente: E= k σ(r)dS r̂ r2 (48) k λ(r)ds r̂ r2 (49) S E= 0.5 l Lei de Gauss Uma ferramenta usada frequentemente para facilitar a visualização do campo eléctrico é a noção de linhas de campo, que divergem a partir das cargas positivas e convergem em cargas negativas, sendo tangentes ao campo em causa em todos os pontos do espaço. A intensidade do campo é sugerida neste tipo de representação pela densidade de linhas 14 de campo. Por exemplo, no caso de uma carga pontual q, a densidade de linhas de campo que atravessa uma superfı́cie esférica de raio r centrada na carga cai com o inverso do quadrado do raio, o que traduz a dependência do campo eléctrico com o inverso do quadrado da distância à carga. Uma forma mais precisa de traduzir este conceito é através da noção de fluxo dφ do campo E através de uma superfı́cie elementar dS. O fluxo é uma quantidade que é tanto maior quanto maior for a superfı́cie e quanto maior for a componente E⊥ = E⊥ n̂ do campo perpendicular á superfı́cie (a componente paralela E à superfı́cie não a ”atravessa” e portanto não contribui para o fluxo): dφ = E⊥ dS = (E⊥ n̂) · (dSn̂) = E · dS (50) Se a superfı́cie S em causa for fechada, é possı́vel demonstrar que o fluxo do campo eléctrico criado por uma carga eléctrica q através da superfı́cie tem o seguinte valor: E · dS = S q/0 se a carga estiver no interior da superfı́cie 0 se a carga estiver no exterior da superfı́cie (51) Atendendo ao princı́pio da sobreposição, o campo em qualquer ponto do espaço é simplesmente a soma dos campos criados individualmente por cada uma das cargas presentes. O resultado 51 pode exprimir-se então, de forma geral, como: E · dS = S Qint 0 (52) onde Qint é a carga contida no interior da superfı́cie S. Este resultado, conhecido por lei de Gauss, é equivalente à lei de Coulomb, no caso estático. Ao contrário do que acontece com a lei de Coulomb, permanece válido quando as cargas se encontram em movimento. 15 0.5. LEI DE GAUSS 0.5.1 Forma diferencial da lei de Gauss Conforme vimos na secção 0.4.1, é particularmente útil e apropriado considerar as distribuições de carga como sendo aproximadamente contı́nuas, definindo em particular a densidade (volúmica) de carga ρ. A lei de Gauss (eq. 52) pode assim reescrever-se: 1 E · dS = 0 S ρ(r)dτ (53) τint onde tauint é o volume contido na superfı́cie S. Usando o teorema de Gauss, ficamos com: 1 div E dτ = 0 τint div E = ρ 0 ρ(r)dτ (54) τint e, logo, (55)