inclusão? sou a favor, mas não tenho formação.

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INCLUSÃO? SOU A FAVOR, MAS NÃO TENHO
FORMAÇÃO.
Suzana Moreira Pacheco
Resumo
O presente artigo visa contextualizar a temática educação inclusiva no cenário educacional atual e a problemática
que envolve a formação de professores. Inicialmente, o conceito de inclusão é apresentado, focalizando-o em suas contradições filosóficas e no seu potencial para o estabelecimento
de políticas de diferenças. No desenvolvimento da discussão,
as idéias de MACEDO (2005) e MANTOAN (2003) sobre
educação e inclusão e de PERRENOUD (2001) acerca do
fracasso escolar são balizadas com exemplos de práticas educativas que apontam uma direção, no sentido da possibilidade
de um projeto de formação continuada eficiente à construção
da escola de qualidade para todos.
Palavras-chave
Resumen
Diálogo
Educação, Inclusão, Formação de Professores.
En el texto, se hace el confronto de la idea de una
educación inclusiva con la problemática actual de la formación
de maestros. El concepto de inclusión está puesto frente a sus
contradicciones filosóficas y su potencial para el establecimiento
de políticas educativas, que tengan en cuenta las diferencias físicas, económicas y sociales - existentes entre el alumnado.
Las opiniones de MACEDO(2005) y MANTOAN(2003) sobre
inclusión y de PERRENOUD(2001) sobre fracaso escolar son
invocadas en pro de la posibilidad de cementarse un proyecto
viable de una escuela de calidad para todos.
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Palavras clave
Educación, inclusión, formación de maestros.
Para início de conversa
Ao escrever um artigo, que pretende articular a temática inclusão escolar e
formação de professores, logo me veio em mente o título acima, pois em diversas
oportunidades em que se discute a problemática da inclusão, tal afirmação é recorrente. É um bom momento para refletir sobre esse sentimento de falta, de receio de
não saber o que fazer, que quase sempre nos leva a pensar que essa tarefa - acolher
e ensinar a todos os alunos - é para outra pessoa, em uma outra sala de aula que não
a nossa.
O que se entende por inclusão? Em que medida nos sentimos implicados
neste processo? Que tipo de formação é necessário ao professor, tratando-se de
educação inclusiva? Longe de tentar encontrar respostas conclusivas a todas estas
questões que, com certeza, se fazem presentes na vida profissional do educador
contemporâneo, proponho-me a organizar algumas idéias sobre o assunto, convidando o leitor a comigo compartilhá-las. Assim, no processo de escrita e leitura que
nos envolve, talvez se possa estabelecer alguma parceria que represente avanço, na
caminhada tortuosa da educação inclusiva, em nosso país.
A título de apresentação
Ao longo de minha trajetória profissional - sendo que aí já se vão duas
décadas e meia de envolvimento nas atividades de docência, na pré-escola e no
currículo por atividades ou, como denominamos hoje, na Educação Infantil e nos
Anos Iniciais - ensinar a todos os meus alunos e alunas instigava-me.
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Atualmente, desenvolvo meu trabalho em dois eixos distintos e comple-
mentares: como Orientadora Educacional de uma escola pública municipal de ensino fundamental, com alunos do primeiro e segundo ciclo, e como docente no Curso
de Pedagogia do Unilasalle, ministrando, dentre outras, a disciplina denominada
Educação e Inclusão. Em ambas funções, tenho me dedicado à tarefa de tornar
possível a educação inclusiva, ora através da orientação educacional, auxiliando a
comunidade escolar na tarefa concreta de organizar um cotidiano viável de convivência e aprendizagem, ora com os acadêmicos do curso de pedagogia – futuros
professores e professoras dos primeiros ciclos da educação básica –, problematizando o conceito de inclusão e incentivando-os a pesquisar possibilidades de construir a escola para todos. Portanto, a formação de professores que irão atuar no diaa-dia das escolas, com uma diversidade de alunos cada vez maior, é uma responsabilidade que também me compete e me impulsiona a discutir o tema.
Inclusão: uma categoria conflitante
Analisando os estudos sobre a evolução do conceito de inclusão, percebe-se
que, conforme SASSAKI (2003, p. 27 ): “A citação dos conceitos inclusivistas é, a
rigor, recente na literatura especializada [...]”. O ideário construído em torno da
diferença, especialmente, quando esta se caracteriza por algum tipo de deficiência,
têm suas bases históricas no “modelo médico da deficiência”, que persistiu com
força, no meio social, até a década de 70, evoluindo para concepções mais abrangentes e complexas, mas que se constituíam, ainda, como modelos pré-inclusivistas
na década de 80.
Essa perspectiva centrava as alternativas de participação, nas condições a
priori do sujeito considerado “diferente”; naquele que ocasionava o estranhamento
e, não nas possibilidades de adaptação às diferenças, quer por parte da sociedade,
quer por parte da própria escola.
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O termo “inclusão” vem sendo utilizado no cenário das discussões educacio-
nais e representa um avanço em relação aos conceitos anteriores, pré-inclusivistas,
como o da “integração”, radicalizando a idéia de que nenhum aluno fique de fora da
escola regular. De acordo com Maria Teresa Mantoan:
As escolas inclusivas propõem um modo de se constituir o sistema educacional que
considera as necessidades de todos os alunos e que é estruturado em virtude dessas
mudanças de perspectiva educacional, pois não se limita a ajudar somente os alunos que
apresentam dificuldades na escola, mas apóia a todos: professores, alunos, pessoal administrativo, para que se obtenham sucesso na corrente educativa geral. (MANTOAN,
apud SASSAKI, 2003, p. 114).
Nesta primeira década do século XXI, o conceito de inclusão vem ganhando cada vez mais espaço, suscitando polêmicas em torno de sua aplicabilidade na
educação; ao mesmo tempo, seduz aqueles que se atrevem a experimentar novas
maneiras de gerenciar as práticas educativas, com a finalidade de levar um maior
número de sujeitos a aprender na escola. Por outro lado, é inegável que esse conceito provoca um certo incômodo, se pensarmos em relações de alteridade, em perspectivas filosóficas e políticas.
Analisemos a crítica, à qual me associo, decorrente do pensamento pósestruturalista, ao conceituar a diferença, apontada por Tomaz Tadeu da Silva:
Para a concepção pós-estrutruralista, a diferença é essencialmente um processo lingüístico e
discursivo. A diferença não pode ser concebida fora dos processos lingüísticos de significação. A diferença não é uma característica natural: ela é discursivamente produzida. Além
disso, a diferença é sempre uma relação: não se pode ser “diferente” de forma absoluta; ése diferente relativamente a alguma outra coisa, considerada precisamente como “nãodiferente”. (...) Na medida em que é uma relação social, o processo de significação que
produz a “diferença” se dá em conexão com relações de poder. (1999, p. 87).
Sendo assim, o termo inclusão pressupõe uma relação de poder e submissão entre o sujeito do centro, o que está dentro, o incluso e aquele que está fora,
excluído dessa centralidade. São os sujeitos do centro, da comunidade escolar, conDiálogo
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siderados discursivamente “normais”, que vão decidir como e quando incluir os
ditos “diferentes”.
No contexto educacional, a categoria “sujeitos do centro” inclui também a
nós professores, seja na via indireta da formação de docentes para a educação básica
ou, diretamente, na interação com os estudantes situados no campo da diferença que
nos preocupa e não encontra lugar nem forma em nossas representações escolares.
É pensando desse modo que o termo “inclusão” me incomoda: referir-se-á
aos “outros”, que pensamos em trazer para perto de nós e que, com o passar do
tempo, vão se tornando parecidos conosco ou aos “outros”, que tocando nossa
sensibilidade benevolente, suscitam o apelo à nossa capacidade de tolerância?
Neste sentido, esclarece Carlos Skliar:
Há, então, um outro que nos é próximo, que parece ser compreensível para nós, previsível, maleável, etc. E há um outro que nos é distante, que parece ser incompreensível,
imprevisível, maleável. Assim entendido, o outro pode ser pensado sempre como exterioridade, como alguma coisa que eu não sou, que nós não somos. Mas a mesma dualidade [...] existe também em termos de interioridade, quer dizer, que esses outros também
podem ser eu, sermos nós. [...] O outro da educação foi sempre um outro que devia ser
anulado, apagado.” Entretanto, a escola já não suportaria mais tamanho abandono e,
através de novas reformas tenta a “captura maciça do outro” para, contendo-o, controlá-lo. (2003, p. 26-27)
Em certa medida, concordo com o autor. É bem provável que a Escola,
instituição socializadora, transmissora de conhecimentos, que há séculos vem tentando homogeneizar corpos e mentes, nesses tempos de aceleradas transformações,
do virtual e da simultaneidade, esteja a reivindicar a diversidade por uma questão de
sobrevivência.
Entretanto, ainda que essa idéia insista em perturbar-me, porque faz sentido, ao mesmo tempo me ajuda a ter clareza de que minha urgência pedagógica é
tensionar as fronteiras do território escolar para que se ampliem o mais que possam,
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para além da mesmice, viabilizando uma escola para todos. E aqui confesso minha
crença na escola, discordando de quaisquer reformas que apenas aludam a novos
métodos e técnicas de ensino para me associar a efetivos projetos que queiram discutir uma educação mais solidária e “inclusiva”, rendendo-me, temporariamente,
a este termo, na falta de outro melhor.
Sobre inclusão e (falta de) formação de professores
É compreensível, em certa medida, o sentimento de impotência dos professores que hoje recebem, em suas salas de aula, um contingente cada vez maior de
alunos, que suscitam outras abordagens educacionais, fora dos padrões habituais,
para conseguirem adaptar-se, conviver com os colegas e aprender. Também é verdade que a escola mudou muito pouco em sua estrutura física e curricular, desde seu
surgimento como um ideal republicano, até os dias de hoje, se comparada às inúmeras transformações da sociedade, que repercutem na maneira própria de ser criança
e jovem no século XXI.
As pesquisas em educação apontam para o fato de que a escola, levando-se
em conta seu caráter social, não tem conseguido ser eficaz à maioria dos alunos.
O fracasso escolar não só atinge apenas os sujeitos cujas diferenças são da ordem da
deficiência física ou mental ou aos alunos cultural e socialmente marginalizados,
como também àqueles que não causam estranhamento algum à escola, mas que por
razões de identidade não conseguem atribuir-lhe sentido.
Como afirma Jaqueline Moll (et al., 2005, p. 41-42), “o quadro crônico de
produção de fracasso no âmbito do trabalho desenvolvido pela instituição escolar
[...] e a saída extemporânea da escola por parte de crianças e jovens, [...] no futuro
(próximo) engrossam as fileiras de analfabetos jovens e adultos”; portanto, é funda-
mental a clareza de que a necessidade de se (re)pensar a formação de professores,
no contexto da inclusão, assume uma dimensão ampla e urgente. É mister que se
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reinvente a dinâmica da escola, seja no que tange aos seus princípios filosóficos e
curriculares, como na forma com que as relações e interações humanas se processam. Se vamos fazer isso motivados pela demanda da inclusão da alteridade deficiente, não vejo problema algum; mas, com certeza, as necessidades que realmente
justificam esse empreendimento de renovação, assim como seu alcance, são bem
mais abrangentes e aí está o desafio.
O primeiro ponto a destacar, em relação à formação dos profissionais da
educação, é exatamente a importância da consciência de que não estamos “dando
conta do recado”, ou seja, nas palavras de Philippe Perrenoud (2001,p. 15): “Em
primeiro lugar, é preciso que o fracasso (escolar) incomode!” Concordo com o au-
tor. É necessário que nos importunemos com a não aprendizagem dos alunos, não
para que nos sintamos culpados, mas para que possamos pensar juntos um projeto
de escola mais interessante e eficiente. Assumir, coletivamente, nossos sentimentos
de frustração, nossos medos e desejos - a partir de um saudável exercício de autocrítica que auxilie a melhor compreender a diversidade que hoje habita a escola - buscar compreender as razões pelas quais é tão difícil afastar-nos de um ensino homogeneizador, pode ser um bom começo!
Lino de Macedo propõe um modelo explicativo acerca da organização escolar,
pelo qual existem duas formas de fazê-la: pela lógica da classe ou pela lógica do gênero:
Um modo não exclui o outro: coordenam-se, ora como meio, ora como fim. O que define
a exclusão é como os articulamos e como negamos um ou outro. Na educação inclusiva,
propõe-se uma forma de articulação entre eles diferente daquela à qual estamos acostumados. (MACEDO, 2005, p. 17)
Mais adiante, o autor exemplifica:
Se uma criança tem dificuldade de aprendizagem ou de convivência em sala de aula, se
suas limitações causam “problemas” quanto aos hábitos pedagógicos do professor (estratégias de ensino, organização do espaço e do tempo didáticos, etc.,), pela lógica da classe
a dificuldade é do aluno, e não necessariamente do professor. Na lógica da relação, o
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“problema” é de todos, o que desafia o professor a refletir sobre a insuficiência de seus
recursos pedagógicos nesse novo contexto, a rever suas formas de se relacionar com os
alunos, a estudar temas que pensava nunca ter de estudar. Tudo isso altera muito a
situação tradicional da escola, por mais que ela também seja julgada insatisfatória.
(Op.cit 2005, p. 21)
Costumo afirmar que a inclusão é contemporânea. Portanto, é a partir dos
relatos de nossas experiências; da reflexão sobre nossos erros e acertos ao trabalhar-
mos com políticas de diferenças; dialogando com quem já vem fazendo isso, na
prática e no plano das idéias, teorizando, articulando estes conhecimentos específicos do “saber-fazer” com áreas afins ao campo da ciência educacional, como a
filosofia, a sociologia e a psicologia; é que vai se constituindo o escopo teórico sobre
educação inclusiva. Conseqüentemente, estamos envolvidos nisso “dos pés à cabeça”, prova de que não há um tempo, um interstício entre estarmos preparados e
sermos, de fato, professores que lecionam em espaços escolares inclusivos. Esse é
um processo que só pode acontecer de forma simultânea.
Um dos elementos que podemos analisar, como indicativos de frustração
por parte dos educadores, encontra-se justamente na expectativa que nutrem sobre
o rumo que assumem os projetos de formação de professores. A esse respeito,
Maria Teresa Eglér Mantoan afirma:
Na formação em serviço, os professores [...] estão habituados a aprender de maneira
fragmentada e essencialmente instrucional. Eles esperam uma preparação para ensinar
os alunos com deficiência e/ou habilidades de aprendizagem e problemas de indisciplina, ou melhor, uma formação que lhes permita aplicar esquemas de trabalho pedagógico
predefinidos às suas salas de aula, garantindo-lhes a solução dos problemas que presumem encontrar nas escolas ditas inclusivas. Grande parte desses profissionais concebe a
formação como sendo mais um curso de extensão, de especialização, com uma terminalidade e um certificado que convalida a capacidade de ser um professor inclusivo. Não se
trata de uma visão ingênua do que significa ser um professor qualificado para o ensino
inclusivo, mas de uma concepção equivocada do que é formação em serviço e do que
significa a inclusão escolar. Mais uma vez a imprecisão de conceitos distorce a finalidade
de ações que precisam ser concretizadas com urgência e muita clareza de propósitos,
retardando a inclusão. (2003, p. 79)
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A esta altura, é importante considerar que o aspecto central na formação de
professores é justamente a possibilidade de refletir acerca da concepção que se tem
sobre escola, conhecimento, aprendizagem, diferenças, papel do docente, etc. Enfim, há uma necessidade de reorganização das idéias sobre o que temos em matéria
de projeto educativo e o que precisamos e queremos, a fim de construirmos práticas
possíveis de uma educação de qualidade para todos:
Tem-se um ensino de qualidade a partir de condições de trabalho pedagógico que
implicam formação de redes de saberes e de relações, que se entrelaçam por caminhos
imprevisíveis para chegar ao conhecimento; existe ensino de qualidade quando as
ações educativas se pautam na solidariedade, na colaboração, no compartilhamento
do processo educativo com todos os que estão direta ou indiretamente nele envolvidos.
(MANTOAN, 2003, p. 62-3)
Os coordenadores dos processos pedagógicos das escolas – orientadores,
supervisores educacionais ou diretores - mesmo não tendo a sala de aula como o
local imediato de atuação, ocupam papel de destaque, no processo da educação
inclusiva. São eles que facilitam a formação dessas “redes de saberes”, que, aos
poucos, vão se transformando também em redes de apoio e proteção à escola
inclusiva.
Está posto aí a necessidade de um projeto político-pedagógico que possa
servir como ponto de referência para o fortalecimento do coletivo da escola, com
vistas a ações integradas em prol da efetivação de uma educação para todos. Con-
forme Jaqueline Moll, “esse projeto pedagógico deve contemplar a indissociabilidade entre gestão administrativa e pedagógica, formação docente e trabalho cole-
tivo, garantindo a construção de uma identidade coletiva capaz de assegurar a estabi-
lidade necessária para as realizações e transformações necessárias.” ( MOLL et al.,
2005, p. 73).
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Exemplificando...
Analisando a experiência desenvolvida pela EMEF Gilberto Jorge Gonçalves
da Silva1 (GJ), no que se refere ao projeto de formação permanente de seus professores, instala-se também a discussão sobre a construção do trabalho coletivo, o qual
qualifica e redimensiona seu espaço e leva à constituição de um grupo comprometido
com um projeto comum. A formação permanente é parte da rotina escolar.
O grupo de professores construiu, ao longo dos anos, postura questionado-
ra e pesquisadora, fruto da institucionalização do estudo e da reflexão sobre as
relações entre teoria e prática. Cada um de seus membros torna-se responsável pela
qualificação da sua prática pedagógica.
Não atribuir demasiada importância às queixas de quem procura situar nos
alunos, suas famílias e no “sistema” os impedimentos para a realização de um bom
trabalho, é uma característica do coletivo de professores da GJ. É através da análise
dos problemas, dos desafios, que se implementa a formação, que se busca suporte
teórico para pensar, repensar e avaliar o fazer pedagógico, criando alternativas que
se fundamentem no estudo, no diálogo, na troca e na parceria para a elaboração dos
projetos pedagógicos de cada ciclo.
Projetos, aparentemente ambiciosos, se concretizam na ação compartilhada
da equipe, que discute seus resultados e falhas no debate, no confronto de idéias e
na escuta, principalmente, dos alunos.
A organização da escola por Ciclos de Formação proporcionou avanços no
trabalho coletivo. Esta forma de organização, que ultrapassa a idéia de seriação,
programas anuais, reprovação, etc., favorecem a diferenciação dos percursos, a for1
Experiência registrada em: PERSCH, Maria Isabel; PACHECO, Suzana Moreira; MONTEIRO,
Maria Rosangela. (Org.) Uma escola para todos, uma escola para cada um. Porto Alegre: PMPA/
SME, 2006.
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mação de equipes docentes, a progressão continuada, entre outros aspectos. Os
professores hoje estão pensando como seus todos os alunos de um ciclo e não
apenas nos das turmas em que lecionam.
Maria Teresa Eglér Mantoan ( 2003, p. 66) também reconhece vantagens
neste sistema de organização da escola por ciclos: “Os ciclos de formação provocam mudanças na avaliação do desempenho escolar dos alunos, pois concedem a
estes mais tempo para aprender, eliminando a seriação e articulando o processo de
aprendizagem com o ritmo e as condições de desenvolvimento dos aprendizes”.
Recentemente, José Pacheco organizou a obra Caminhos para a Inclusão:
um guia para o aprimoramento da equipe escolar, cujo subtítulo já sugere que ali há
um material riquíssimo para auxiliar no processo de reflexão dos professores. Trata-
se de uma espécie de divulgação do relatório de pesquisa realizada, em parceria,
pelas equipes da Áustria, da Islândia, de Portugal e da Espanha, através do Projeto
Leonardo Da Vinci, intitulado Melhoramento da Habilidade dos Professores quanto à Inclusão, o qual, em inglês, é conhecido pela sigla ETAI. A pesquisa baseou-se
em vários estudos de caso, focalizando práticas bem-sucedidas de ensino inclusivo,
em escolas regulares, nos referidos países.
Os exemplos de procedimentos interessantes e eficazes, presentes nos resultados do projeto ETAI, são muitos e envolvem diferentes aspectos, tais como:
planejamentos curriculares, práticas em sala de aula, colaboração lar-escola e interação social dos alunos. No que tange a este último aspecto, José Pacheco destaca:
A importância da interação social, dos relacionamentos e da participação precisa ser
reconhecida no processo de inclusão. A escola faz parte de um todo maior, incluindo
outras unidades como o lar e a comunidade da criança, que inclui amigos e suas famílias, serviços e ofertas de recreação. A escola precisa ser uma promotora-chave nesse
processo. [...] A aprendizagem cooperativa e a promoção de afeição genuína, que é
assegurada pela continuidade, são essenciais. Os professores precisam ser apoiados na
aquisição de habilidades e na compreensão de como melhorar as maneiras de comunicação e as relações sociais. (2007, p. 55)
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Finalizando...
A cada ano que passa, novos trabalhos vão noticiando diferentes experiên-
cias. Alguns acertos, muitos tropeços; essa experiência vai deixando claro que é
preciso mais do que apenas definir conceitualmente e encontrar um lugar politicamente correto para se refugiar, no discurso da inclusão/exclusão escolar. É substancial problematizar a formação que muitos professores julgam não ter, bem como a
ilusão de que esse fato os deixará de fora!
Chegando ao fim, é provável que o leitor, assim como eu, perceba a enormi-
dade de assuntos que devem ser discutidos, estudados e divulgados no campo da
educação inclusiva, necessárias à acessibilidade material e social da escola para todos.
As considerações que ora faço, em parte são frutos de minhas leituras na
busca constante de responder a este sentimento comum aos professores que são
desafiados a trabalhar com diferenças; em parte, são estabelecidas a partir de minha
própria história de professora, orientadora de situações escolares, as quais hoje estamos denominando inclusivas. Em outras palavras, dialogar sobre a tal “formação
que falta” é realizado aqui na perspectiva da práxis, do constante exercício de interlocução com aqueles que acreditam ser possível avançar na direção do desafio da
utopia uma escola para todos. Voar, também, foi uma utopia dos humanos até Santos
Dumont.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MACEDO, Lino de. Ensaios pedagógicos. Porto Alegre: Artmed, 2005.
MANTOAN, Maria Teresa E. Inclusão escolar. São Paulo: Editora Moderna, 2003.
MOLL, Jaqueline. (Org.) Múltiplos Alfabetismos: diálogos com a escola pública
na formação de professores. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2005.
PACHECO, José. Caminhos para a Inclusão. Porto Alegre: Artmed, 2007.
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PERRENOUD, Philippe. A pedagogia na Escola das Diferenças: fragmentos
de uma sociologia do fracasso. Porto Alegre: Artemed, 2001.
SASSAKI, Romeu Kasumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio
de Janeiro: WVA, 2002.
SILVA, Tomaz Tadeu. Documentos de Identidade: uma introdução à teoria dos
currículos. 2. ed. Belo Horizonte, 1999.
SKLIAR, Carlos. Pedagogia (improvável) da Diferença: e se o outro não estivesse aí? Rio de Janeiro: DP&A, 2003.
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