gestação de termo na vigência de mioma uterino - BVS SMS-SP

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Hospital do Servidor Público Municipal
GESTAÇÃO DE TERMO NA VIGÊNCIA DE MIOMA UTERINO
GIGANTE: RELATO DE CASO E REVISÃO DE LITERATURA
KELLY CHRISTINA SINATRA
SÃO PAULO
2012
Hospital do Servidor Público Municipal
GESTAÇÃO DE TERMO NA VIGÊNCIA DE MIOMA UTERINO
GIGANTE: RELATO DE CASO E REVISÃO DE LITERATURA
KELLY CHRISTINA SINATRA
MIGUEL ARCANJO PEDROSA
SÃO PAULO
2012
KELLY CHRISTINA SINATRA
GESTAÇÃO DE TERMO NA VIGÊNCIA DE MIOMA UTERINO
GIGANTE: RELATO DE CASO E REVISÃO DE LITERATURA
Trabalho
de
Conclusão
de
Curso
apresentado à Comissão de Residência
Médica do Hospital do Servidor Público
Municipal para obter o Título de Residência
Médica
Área: Ginecologia e Obstetrícia
Orientador: Professor Doutor Miguel Arcanjo
Pedrosa
São Paulo
2012
AUTORIZO A INCLUSÃO APENAS DO RESUMO DO TCC DE MINHA
AUTORIA NA BIBLIOTECA VIRTUAL EM SAÚDE DO MUNICÍPIO DE SÃO
PAULO/SP
__________________________________
KELLY CHRISTINA SINATRA
Hospital do Servidor Público Municipal
KELLY CHRISTINA SINATRA
GESTAÇÃO DE TERMO NA VIGÊNCIA DE MIOMA
UTERINO GIGANTE: RELATO DE CASO E REVISÃO DE
LITERATURA
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Comissão de
Residência Médica do Hospital do Servidor Público Municipal
para obter o Título de Residência Médica na área de
Ginecologia e Obstetrícia
Aprovado em:
Banca Examinadora:
______________________________________
Examinador 1
Instituição
______________________________________
Examinador 2
Instituição
______________________________________
Examinador 3
Instituição
Dedicatória
Dedico este trabalho à minha querida família e ao
ilustre mestre e orientador Dr. Miguel Arcanjo
Pedrosa.
Agradecimentos
À Deus, sempre e por tudo.
À minha amada mãe, Rosmeire, incentivadora e companheira em todos os
momentos, sempre me auxiliando a superar as adversidades.
À minha querida irmã, Keilla, que sempre teve muito orgulho das minhas
vitórias e teve grande participação nas mesmas.
Ao meu amado noivo, Fábio, que nunca desistiu das minhas causas,
tomando-as para si e agindo sempre em meu benefício.
À minha grande amiga, Tatiana, que me ofereceu grandes oportunidades
tendo refletido em melhorias para mim e minha família.
Aos meus estimados mestres, Dr. Miguel Arcanjo Pedrosa, Dr. Luiz Alberto
Pereira Soares, Dra. Ida Maria Badin, Dr. José Roberto Miele, Dr. Cláudio Furtado
Verdadeiro, Dra. Lígia Guarilla, Dr. Franklin Albert Shoji Kono (in memoriam), Dr.
Gonçalo Peinado, Dr. João Baptista Santos Jr., Dr. Roberto Lojelo, que contribuíram
decisivamente para minha formação médica e ascensão profissional e pessoal.
À todos os médicos assistentes e amigos da enfermagem do Hospital do
Servidor Público Municipal, que generosamente me acolheram e auxiliaram durante
essa jornada.
Às pessoas que direta ou indiretamente contribuíram para a elaboração deste
trabalho, destacando a paciente que foi generosa e permitiu tal realização.
Resumo
O leiomioma uterino é o tumor benigno mais comum do trato genital
feminino, principalmente entre os 30 e 40 anos de idade, momento da vida
feminina que tem sido escolhido, atualmente, para que ocorra a gestação. A
associação de miomatose uterina à gestação leva ao aumento de casos de
abortamentos,
partos
prematuros,
restrição
de
crescimento
fetal,
apresentações anômalas, descolamento placentário, acretismo placentário,
maior número de cesáreas e hemorragia no pós-parto, além de quadros de
dor abdominal e até mesmo abdome agudo atribuídos à miomatose, que
levam, inclusive, à necessidade de procedimento cirúrgico de urgência
durante a gestação. A diversidade e a gravidade das complicações de tal
associação deveriam gerar maior número de pesquisas na área, entretanto,
realizando revisão de literatura, encontram-se poucos artigos sobre o tema,
sendo a maioria deles relatos de caso ou experiências individuais de cada
serviço, não existindo um consenso sobre a conduta a ser seguida.
Este trabalho tem como objetivo relatar um caso de gestação que
chegou a termo na vigência de miomatose uterina gigante e realizar revisão
literária sobre o tema, utilizando-se para tal, de revisão de prontuário médico e
pesquisa bibliográfica nos diversos bancos de dados disponíveis na internet.
Palavras-chave: Leiomioma uterino, Miomatose uterina, Gestação.
Abstract
Uterine leiomyoma is the most common benign tumour in the female
genital tract, especially between 30 and 40 years old, the moment in feminine
life that has been nowadays commonly chosen for pregnancy. The association
between uterine myomatosis and pregnancy results on an increase of the
numbers of abortions, preterm births, fetal growth restriction, anomalies,
placental abruption, placenta accreta, higher numbers of caesarean and post
birth haemorrhaging, besides the cases of abdominal pain as well as acute
abdomen attributed to myomatosis, which requires urgent surgical procedure
during pregnancy. The variety and severeness of the complications caused by
this association should result in a higher amount of researches on the subject.
However, carrying out a literature review, just a few articles about this subject
were found, being the major part of it case studies or individual experiences of
each service, not providing a consensus about the conduct to be followed.
This essay has objected to narrate a case of gestation that came to an
end during a period of giant uterine myomatosis and to attain literature review
about the subject, applying for that sake, a survey of medical record and
bibliographical research through databases available in the internet.
Keywords: Uterine leiomyoma, uterine myomatosis, pregnancy.
Sumário
1. Introdução
1
1.1 Indicações de miomectomia na gestação
11
1.2 Indicações de miomectomia durante a cesárea
12
2. Relato do caso
15
3. Discussão
26
4. Referências bibliográficas
28
5. Anexos
30
5.1 Aprovação do relato de caso pelo C.E.P. do HSPM
30
1. Introdução
O leiomioma uterino é o tumor mais comum do trato genital feminino. É um
tumor benigno estrógeno-dependente e ocorre em 40% das mulheres, sendo o mais
comum do trato reprodutivo feminino 1. Comum em mulheres entre 30 e 40 anos e é
cerca de 3 a 9 vezes mais frequente na raça negra (Parker, 2007). Menos que 25%
das pacientes com mioma têm sintomas. O sintoma mais comum é o sangramento
uterino anormal. Pacientes com mioma comumente apresentam dismenorréia e/ou
menorragia e podem ter sintomas compreensivos incluindo urgência urinária,
distensão abdominal e constipação.
Os leiomiomas são os tumores benignos mais comuns nas mulheres, são
também chamados de miomas ou fibromas. São tumores de músculo liso e estroma
conjuntivo vascular, dependentes de estrogênio 2. São classificados de acordo com
a localização anatômica em submucoso (Figura 1), intramural e subseroso. Os
submucosos são os que distorcem a cavidade uterina. Os intramurais não distorcem
a cavidade e tem menos de 50% abaulando a serosa. Já os subserosos têm 50% ou
mais do nódulo abaulando a serosa do útero, podendo ser sésseis ou pediculados 2.
Figura 1. Imagem ultra-sonográfica transabdominal de uma gestação de 16 semanas mostrando um mioma distorcendo a
cavidade uterina. A placenta está localizada anteriormente enquanto um grande (4,8 x 4,3 cm) mioma submucoso pode ser
2
visto na parede posterior. Adaptado de Ouyang et al .
A incidência do leiomioma durante a gravidez varia de 0,09 a 3,9% e é mais
frequente na atualidade que no passado 1. Tal fato seria a tendência atual da mulher
moderna em postergar suas gestações, sobretudo após os 30 anos, ocasião em que
os leiomiomas são mais comuns 1. Em decorrência da hipertrofia miometrial, da
maior vascularização, existe, na gravidez, a possibilidade de crescimento do
leiomioma. No entanto, a própria atividade uterina no trabalho de parto e a atuação
de fatores de crescimento juntamente com a atuação de princípios endócrinos
relacionados à lactação são fatores favorecedores da degeneração do mioma.
Miomas e gravidez se manifestam com dores abdominais, mal-estar,
sangramento genital e até abortamento espontâneo no 1º trimestre. Nos 2º e 3º
trimestres, a presença do leiomioma é fator de risco para o parto prematuro,
descolamento prematuro da placenta, restrição de crescimento fetal. As indicações
de miomectomia durante a gestação são a ocorrência de dor abdominal severa,
síndrome do mioma doloroso, crescimento rápido do tumor e nódulo localizado no
segmento uterino inferior distorcendo o sítio placentário. No momento do parto,
podem ser ressecados os miomas subserosos ou pediculados e aqueles localizados
no segmento uterino, inferior devendo ser evitados os miomas fúndicos, volumosos
e intramurais.
A análise com ultra-sonografia permite o diagnóstico e monitora o leiomioma
durante a gravidez, sua relação com a placenta deverá ser complementada com
ultra-sonografia Doppler após a 26ª semana de gestação, visando não somente
estudar a circulação feto-placentário, mas também a eventual presença do acretismo
placentário.
O avanço da ultra-sonografia obstétrica durante o pré-natal facilitou o
diagnóstico
2.
No passado, o diagnóstico na gestação era feito clinicamente e
somente para grandes miomas palpáveis, estando o tratamento cirúrgico
frequentemente empregado 2. Atualmente, porém, com a identificação de muitos
casos pouco sintomáticos ou assintomáticos de diagnóstico exclusivo ultrasonográfico, o acompanhamento clínico ambulatorial é suficiente na maioria das
vezes e a cirurgia não é uma constante na abordagem das leiomiomas durante a
gravidez 2.
A ultra-sonografia é uma arma propedêutica de fundamental importância na
avaliação ginecológica, com grande papel na idade reprodutiva. Nos casos de
leiomioma uterino é o primeiro método diagnóstico, tanto nos casos de infertilidade
quanto na gestação. Apresenta alta sensibilidade (90% a 100%) e especificidade
(87% a 98%), com altos valores preditivos positivos e negativos 2. A via transvaginal
é a mais indicada, complementada ou não com a transabdominal, sobretudo em
úteros volumosos e para melhor definir a topografia.
Ao estudo ecográfico o leiomioma uterino se apresenta como um nódulo
hipoecóico, de limite bem definido, sem efeito acústico posterior, com vascularização
periférica ao estudo Doppler, o que o diferencia do miométrio, principalmente na
gestação, em que não há a interface endometrial 2.
Na gestação, a identificação da posição da placenta em relação ao mioma
também é de grande importância, sendo realizada através da ultra-sonografia
(Figura 2). Além do diagnóstico, o seguimento na gestação tanto do crescimento do
nódulo quanto do desenvolvimento e apresentação fetal serão também realizados
pela ultra-sonografia, permitindo um planejamento obstétrico adequado 2.
Figura 2. Imagem ultra-sonográfica por via transabdominal de uma gestação de 18 semanas mostrando um mioma retroplacentário. A placenta está localizada anteriormente e o feto está em apresentação pélvica. Um grande (3,6 x 3,3 cm) mioma
2
submucoso pode ser visto atrás da placenta. Adaptado de Ouyang et al .
Em casos de dor abdominal, o estudo ultra-sonográfico pode demonstrar a
presença de leiomiomas volumosos (acima de 200 cm³) e achados de degeneração,
com ecos heterogêneos e áreas anecóicas
2.
O leiomioma degenerado poderá
também perder sua característica ao Doppler, de vascularização periférica, em anel,
dificultando ainda mais o diagnóstico 2.
A ultra-sonografia
também
desempenha
importante
papel
em
guiar
procedimentos invasivos na gestação, como a amniocentese e biópsia de vilo corial,
os quais se tornam tecnicamente mais difíceis em úteros miomatosos 2.
A gestação tem um efeito variado e inesperado sobre o crescimento do
mioma, dependente da genética, de fatores de crescimento na circulação sanguínea
e de receptores localizados no mioma. Observou-se em um estudo realizado em Los
Angeles que em 69% dos casos dos miomas na gestação não ocorreu aumento e
em 31% aumentaram seu tamanho principalmente no período compreendido até 10
semanas de gestação. Concluíram que o crescimento do mioma na gestação não
está relacionado com seu volume inicial e seu decréscimo ocorre após 4 semanas
do parto3. O mioma na gestação pode ser assintomático ou causar sintomas clínicos
dependentes do tamanho e da localização do tumor, podendo provocar abortamento,
descolamento ou retenção placentária, restrição do crescimento fetal, síndrome da
compressão fetal e trabalho de parto prematuro. Em 5 % dos casos pode ocorrer
degeneração do mioma na gestação, relacionado com a obstrução venosa tumoral
periférica, levando a dor abdominal intensa.
A influência da gravidez sobre os miomas não tem sido completamente
estabelecida. As duas principais alterações que ocorrem no leiomioma durante a
gravidez são: a alteração em seu tamanho e a degeneração vermelha ou
degeneração rubra. Diz-se que os leiomiomas aumentam de tamanho durante a
gravidez, fato este devido: aos altos níveis de esteróides sexuais durante o ciclo
gestatório e a presença de hormônio lactogênico placentário (HPL) que tem
atividade semelhante à do hormônio do crescimento (GH) que, por sua vez tem uma
atuação sinérgica junto ao 17β-estradiol, promovendo o aumento destes tumores.
Porém, em trabalhos atuais, não foi este o comportamento encontrado. Apenas 20%
dos leiomiomas aumentaram de tamanho durante a gestação, enquanto nos
restantes, 60% permaneceram inalterados e 20% diminuíram de tamanho.
A degeneração rubra que atinge cerca de 10% dos leiomiomas quando
associados à gravidez, ocorreria devido à ruptura de arteríolas no interior do tumor
devido à obstrução venosa na periferia do tumor, dificultando a drenagem sanguínea
1.
Os efeitos relatados do leiomioma sobre a gestação dependem do tamanho,
do número e da localização dos tumores. É descrito aumento da incidência de
abortamento, de partos prematuros, de apresentações fetais e distócicas, aumento
da incidência de cesarianas, descolamento placentário, acretismo placentário e
hemorragia no pós-parto. Outras consequências menos comuns: gestação cervical,
inversão uterina, coagulação intravascular disseminada, retenção urinária e
anomalias fetais 1.
Miomas uterinos causam principalmente dor durante a gravidez
1
também
chamada “síndrome dolorosa dos leiomiomas na gravidez”, presente em 10% dos
casos. Consiste classicamente de dor localizada, náusea, vômito, febre baixa,
leucocitose e aumento da atividade uterina, principalmente no segundo e início do
terceiro trimestre de gravidez, seu tratamento é eminentemente clínico, com o uso
de antiinflamatórios não esteroidais 1.
Sangramento no 1º trimestre é comum em mulheres com miomas. O risco de
aborto espontâneo pode estar aumentado 1. Em um estudo observacional de 113
gestantes com miomas, os abortos precoces foram mais comuns com miomas
localizados no corpo uterino quando comparados àqueles em seguimentos mais
baixos 1.
Gestantes com miomas têm índices de parto pré-termo em mais de 21,5% e
os fatores predisponentes incluem volume do mioma acima de 600cm3 e a presença
de miomas múltiplos 1.
A incidência de restrição de crescimento fetal é de, aproximadamente, 14 %,
em gravidezes com miomas submucosos, retroplacentários, e de 6,6% em
gravidezes onde não se detectou miomas. Este elevado índice de restrição de
crescimento fetal não foi evidenciado com miomas intramurais ou subserosos 1. No
entanto, em estudo com 670 mulheres submetidas ao parto cesárea, não houve
diferença no índice de restrição de crescimento fetal entre gestantes com miomas e
outras sem a patologia
1.
O estudo mais amplo com 12.708 mulheres não
demonstrou nenhum aumento no índice de restrição de crescimento fetal nas 492
gestantes com miomas 1.
Miomas grandes podem exercer efeitos de pressão sobre o feto. Em um
estudo recente da chamada síndrome da compressão fetal, em um mioma de
grande volume (11.1 x 6,67 cm) resultou em dolicocefalia, moldando a cabeça fetal,
assimetria de ventrículos cerebrais e restrição de crescimento fetal 1. A dolicocefalia
foi evidenciada após estudo ultra-sonográfico nas primeiras 24 semanas de gravidez
e amniocentese confirmaram cromossomos fetais normais. Em 1971, Beacham y
col., definiram como "gigantes" os miomas que pesam mais de 11,3 kg. Em 2001
Briceño y col., reportaram uma série de 11 casos que pesaram menos de 11,3 kg em
gestações com mais de 12 semanas e os catalogaram como "grandes" miomas
uterinos.
O índice de cesárea é dobrado nas mulheres com miomas. Com base no
estudo em 2000 gestantes o parto disfuncional e distócia de apresentação foram
mais comuns com miomas localizados em segmento uterino quando comparados
em outra localização 1. Há trabalhos que elegem a incisão segmentar corporal como
a indicada em casos de miomas grandes.
Indicações atuais de cesárea corporal
► cesárea corporal prévia
► cesárea com histerectomia programada
► cesárea postmorten
► segmento inferior inacessível (aderências, miomas, etc.)
► grandes varizes no segmento inferior
► carcinoma de colo uterino comprometendo o segmento inferior
► situação transversa irredutível, especialmente dorso inferior
► prematuridade extrema com fatores desfavoráveis associados
Tabela 1. Indicações atuais de cesárea corporal4
Da mesma forma que os miomas causam menorragia em paciente
ginecológicas, os miomas também resultam em hemorragias no pós-parto. Porém,
as incidências ainda são limitadas. Num estudo controlado de 183 gestantes, o
índice de hemorragia pós-parto foi similar em ambos grupos, bem como o índice de
retenção placentária 1. No entanto, um estudo anterior de 113 mulheres grávidas
com mioma constatou elevado índice de retenção placentária e sugeriu que isto
pode ser resultado de baixo desenvolvimento do mioma obstruindo a dequitação
placentária 1.
A metástase benigna de um leiomioma é uma condição rara caracterizada por
tumores benignos das mais diferenciadas células musculares e de tecido conjuntivo,
a maioria, geralmente, localizados nos pulmões,porém, pode ser encontrada em
sistema renal, peritôneo, pericárdio. Pode ser diagnosticada após radiografia de
tórax ou através de clínica como disfunção respiratória, tosse não produtiva,
dispnéia e taquipnéia 1. Pode, no entanto, prejudicar a gravidez levando a um parto
cesárea de emergência 1. O tratamento pode ser clínico, geralmente envolvendo
tratamento hormonal com estrógeno e receptores de progesterona incluindo acetato
de medroxiprogesterona, tamoxifeno e análogos de GnRH. O tratamento cirúrgico
envolve
ooforectomia
bilateral,
que
geralmente
resulta
em
regressão
ou
estabilização das lesões pulmonares 1.
O tratamento tradicional dos miomas em gestantes é conservador, com
controle da dor e monitorização fetal. Entretanto, o tratamento cirúrgico durante a
gravidez foi considerado saudável levando ao bem-estar materno-fetal. A segurança
dos procedimentos cirúrgicos para miomas durante a gravidez se dá, principalmente,
ao controle das hemorragias para que o feto não sofra riscos 1. Entretanto, a decisão
pela indicação cirúrgica para o tratamento dos leiomiomas concomitantes à gravidez
é difícil
1
porque além dos riscos anestésicos e cirúrgicos para a mãe, há um pior
prognóstico fetal. A técnica cirúrgica a ser utilizada deve ser individualizada para
cada paciente e a experiência do cirurgião é fundamental. A laparoscopia
diagnóstica ou mesmo cirúrgica em alguns casos é considerada segura e menos
agressiva durante o primeiro e o segundo trimestre da gestação. A retirada dos
leiomiomas durante o parto operatório é interessante e pode ser realizada,
principalmente se forem subserosos ou pediculados, já que não há diferença entre
os riscos cirúrgicos de sua retirada ou a sua permanência em pacientes previamente
selecionadas 1.
1.1 Indicações de miomectomia na gestação
A miomectomia é indicada em três condições selecionadas: (1) na dor
abdominal severa não responsiva a antiinflamatórios não hormonais; (2) no rápido
crescimento da tumoração causando dor; (3) dependendo de sua localização 3.
Segundo Phelan 3, a dor abdominal pode ocorrer devido à alteração degenerativa do
mioma em 5 a 8% dos casos, caracterizando a síndrome do mioma doloroso que
compreende dor associada a náuseas, vômitos, febre, ocorrendo principalmente no
segundo trimestre na gestação. Há casos relatados de dor decorrente do
encarceramento do mioma em hérnia umbilical e por torção do pedículo do mioma
subseroso 3.
O mioma localizado no segmento inferior uterino distorcendo o sítio
placentário e distando mais que 5 mm do endométrio tem sua indicação cirúrgica.
Estudo realizado na Grécia por Lolis com 622 gestantes com miomas, observou que
2,6% destas tiveram complicação necessitando de internação e 2,1% foram
submetidas à miomectomia. Nos casos de miomectomia, receberam internação por
72 horas, com uterolítico, retirando-se o dreno intrabdominal no primeiro dia pósoperatório. Após a alta, fizeram seguimento ultra-sonográfico de 2/2 semanas. Este
caso de abortamento foi relatado na paciente com 40 anos de idade cujo mioma se
localizava em segmento uterino inferior e intramural, com um volume de 1570 g.
Concluíram que as duas complicações mais comuns da miomectomia na gestação
eram aborto e hemorragia 3.
1.2 Indicações de miomectomia durante a cesárea
Ainda é muito controversa a realização da miomectomia na cesariana, é um
dilema de muitos obstetras por medo de hemorragia intra e após cirurgia com
consequente indicação de histerectomia, assim muitos são treinados a evitar a
miomectomia durante a cesariana.
Realizado levantamento de estudos, nos quais os autores indicaram a
miomectomia dependente da localização, do número e tamanho dos miomas e sua
proximidade com grandes vasos. Estudos comparativos entre dois grupos, os que
foram submetidas à miomectomia durante a cesariana e apenas cesariana.
Kant , em 2007, relatou 9 casos de miomectomia na cesariana, dois miomas
eram submucosos e 7 intramurais. Foi realizada histerorrafia em dois planos, com fio
Vicryl 0, administrado ocitocina intra e pós-operatória, associados antibióticos e
analgésicos. Observando variação de apenas 10% dos valores de hemoglobina.
Michalas et al
3,
relataram 18 casos de miomectomia na gestação, sendo 8
localizados em segmento inferior uterino. Não observaram complicações.
Ehigieba
3
relatou 25 casos, sendo mais frequentes os miomas subserosos,
intramurais e submucosos por ordem decrescente, 12 não tiveram complicações e
os demais constataram anemia. Kwawukume
3
relatou 12 casos de miomectomia na
cesariana sem complicações. Roman relatou 111 casos 3, 24% eram intramurais,
24% subserosos, 25% pediculados e os demais com localizações múltiplas.
Concluindo que não havia diferença significativa em relação à hemorragia intraoperatória, tempo operatório, estados febris e estadias hospitalares.
Kaymark
3
relatou 40 pacientes operadas, com miomas maiores que 8,1 cm,
notando uma diferença de hemorragia de 12,5% nas cesarianas com miomectomia
comparado a 11,3% naquelas com cesariana relacionando este valor com valores
hematométricos iniciais com o pós-operatório. Li
3
estudou 1242 gestantes divididas
em 3 grupos: 200 submetidas à cesariana, 145 de cesarianas com miomas, 51
cesarianas com miomectomia. Observando que no grupo em que se realizou a
miomectomia, as pacientes tinham idades maiores às demais, com partos mais
precoces e miomas múltiplos. Não foi realizado miomectomia nos casos de miomas
em região cornual que eram únicos.
Nos estudos, os autores observaram que não houve diferenças em relação à
morbidade, febre no período pós-cirurgia, tempo de estadia no hospital, necessidade
de transfusão e em relação a variações significativas dos valores de hematócrito no
pós-operatório entre os grupos controles.
A miomectomia na cesariana apresenta o benefício de reduzir custos de
internação, menor exposição aos anestésicos para as pacientes. Trata-se de um
procedimento seguro quando realizado por cirurgiões hábeis, dependente da
localização, principalmente nos casos de miomas subserosos ou pediculados e os
localizados no segmento uterino inferior que dificulta a histerotomia segmentar
transversa. Deve ser evitada nos casos de miomas volumosos, fúndicos, intramurais
e os localizados na região cornual podendo comprometer a fertilidade futura 3. Tipo
de parto deverá seguir padrões obstétricos excetuando-se nos casos de miomas
volumosos ou cervicais 3.
A embolização da artéria uterina (EAU) é recente modalidade terapêutica
conservadora do mioma sintomático, que pode ser uma alternativa para as mulheres
que desejam preservar o útero. A EAU foi primeiramente descrita em 1995
1
e, em
1997, foi publicado o resultado do primeiro ensaio clínico americano
1.
É um
procedimento radiológico intervencionista, que utiliza a angiografia para visualização
da circulação sanguínea. Subsequentemente, o fluxo da artéria uterina é bloqueado
ou interrompido, causando infarto do mioma 1. É aceito que o crescimento do mioma
é restringindo pela vascularização. Consequentemente, os miomas são mais
sensíveis à redução do fluxo arterial do útero. Entretanto, a integridade do útero
geralmente não é afetada por causa da adequada circulação colateral proveniente
da artéria ovárica e vaginal
1.
As complicações têm sido comparáveis a
histerectomia e o grau de satisfação da paciente é alto. As complicações da EAU
são várias. As duas mais comuns são: amenorréia e dor pós-operatória.
É importante ressaltar que há maior incidência de acretismo placentário e
atonia uterina no 3º e 4º período do parto independente da via de parto. A
assistência ao parto obedecerá preceitos básicos obstétricos sendo reservada a
indicação primária para cesárea de extensa miomatose ou de leiomioma cervical
atuando como tumor prévio.
2. Relato do Caso
Paciente:
E.O.S.N, 33 anos, união estável, professora, branca.
Queixa e Duração:
Deu entrada no Pronto Socorro Obstétrico deste Serviço em 23/02/10
referindo sangramento genital há 15 dias.
Anamnese:
Secundigesta, com 1 parto normal prévio.
Data da Última Menstruação: 18/12/09
Trazia Ultra-som realizado em 04/02/10 que mostrava miomatose uterina, com
volume uterino estimado em 870ml.
Ao exame:
Bom estado geral, corada, hidratada, eupnéica
Especular: sangramento coletado moderado
Toque: colo grosso, posterior, impérvio, útero com volume aumentado,
palpável na altura da cicatriz umbilical
Hipóteses Diagnósticas:
Miomatose uterina
Gestação em curso
Ameaça de abortamento
Conduta:
Solicitado exame de B-HCG sérico.
Evolução:
Após cerca de 1 hora, foi liberado o resultado de B-HCG como positivo,
o que confirmou a hipótese de gestação em curso com ameaça de
abortamento.
Foi realizado ultra-som pélvico na mesma data, o qual evidenciou saco
gestacional presente, com embrião presente e batimento cardíaco fetal
presente, na vigência de miomatose uterina (ultra-som realizado sem laudo,
pelo plantonista).
Devido diagnóstico de ameaça de abortamento, optou-se pela
internação da paciente para avaliação do sangramento.
Em 24/02/10, a paciente apresentou melhora do sangramento e
encontrava-se
assintomática,
tendo
recebido
alta
hospitalar,
já
com
encaminhamento para retorno no dia seguinte no Pré-Natal de Alto Risco
(neste mesmo Serviço).
Pré-Natal:
Em 25/02/10, ocorreu a primeira consulta de Pré-Natal, com 9 semanas
e 6 dias de gestação e altura uterina de 20cm.
A paciente realizou 6 consultas de Pré-Natal ao todo, sendo a última
em 26/08/10, quando encontrava-se com 35 semanas e 6 dias de gestação e
altura uterina de 43cm.
Cabe ressaltar que durante toda a gestação, a paciente manteve altura
uterina incompatível com a idade gestacional, sendo sempre uma medida que
suplantava o valor de normalidade adequado à idade gestacional, o que foi
atribuído à presença de miomatose uterina diagnosticada anteriormente.
Intercorrências:
Retornou ao Pronto Socorro Obstétrico em 09/09/10 referindo
"contrações" a cada 20min, encontrava-se então com 38 semanas e 4 dias de
gestação (calculada pelo ultra-som precoce de 12 semanas e 5 dias realizado
em 12/03/2010).
Ao Exame:
Altura Uterina: 43cm;
Batimento Cardíaco Fetal: + 142bpm;
Movimentação Fetal presente;
Dinâmica Uterina presente;
Toque: colo grosso, posterior, impérvio.
Conduta:
Internação para resolução via alta (cesárea) em virtude da miomatose
uterina gigante.
Intra-operatório:
A cesárea foi realizada, tendo sido extraído feto único, vivo, feminino,
peso 2745g, Apgar 8/9.
Durante
tentativa
de
dequitação,
diagnosticou-se
presença
de
acretismo placentário (placenta increta), tendo-se indicado histerectomia
subtotal, a qual foi realizada sem intercorrências, tendo sido ressecado o
corpo uterino ainda contendo a placenta, cujo peso foi 3995g (enviado para
exame anatomopatológico).
Figura 3. Útero miomatoso contendo placenta increta. Fotografado por Kelly C. Sinatra.
Figura 4. Corpo uterino contendo placenta após histerectomia puerperal. Fotografado por Kelly C. Sinatra
Figura 5. Área de acretismo placentário identificada após ressecção de corpo uterino e abertura do mesmo por incisão
mediana. Fotografado por Kelly C. Sinatra
Figura 6. Placenta após dequitação. Em destaque a área de acretismo. Fotografado por Kelly C. Sinatra
Figura 7. Miomas submucosos. Fotografado por Kelly C. Sinatra
Puerpério imediato:
No pós-parto, aventou-se possibilidade de trissomia do cromossomo 21
no recém-nascido, tendo sido realizado cariótipo do mesmo, cujo resultado
não confirmou a suspeita.
A paciente e o recém-nascido evoluíram bem, sem complicações,
tendo ambos recebido alta hospitalar após 3 dias de internação.
Resultado de exame anatomopatológico:
Em 13/09/10 recebemos o resultado do exame Anatomopatológico:
- exame macroscópico:
1. útero puerperal previamente aberto no sentido longitudinal pela face
posterior, com 3200g e 20cm de comprimento e cerca de 15x15cm de
diâmetro, com colo apagado, serosa lisa, endométrio adelgadaçado de 0,1cm
e vinhoso, miométrio amolecido e espessado com até 12cm de espessura e
com múltiplos nódulos miomatosos de 0,5 a 7,0cm de diâmetro.
2. placenta discóide monocoriônica e monoamniótica que mede
19x15x3cm e pesa 625g. O cordão umbilical tem inserção paracentral, mede
37cm de comprimento e 1,3cm de diâmetro médio com 3 vasos identificáveis
à macroscopia. A membrana corial está parcialmente lacerada, é translúcida e
mede 0,1c m de espessura. Na face interna há diferenciação em 3 cotilédones
mal delineados.
- exame microscópico:
1. útero puerperal (mioipertrofia miometrial, edema intersticial,
endométrio decidualizado e congestão)
2. leiomiomas intramurais múltiplos, dissociado por edema
3. coto tubário congesto
4. não há indícios de malignidade
5. placenta monocoriônica e monoamniótica do terceiro trimestre, com
congestão
6. membrana corial e cordão umbilical sem particularidades.
3. Discussão
Tal caso é de extrema importância pelo fato de envolver duas condições tão
comuns às mulheres, como a gestação e a miomatose uterina, condições essas que,
individualmente, são bem discutidas na literatura, porém quando associadas, geram
condutas ainda não protocoladas, justamente pela falta de trabalhos publicados
provando que uma ou outra conduta traga melhores resultados. É certo que
realmente o melhor seja avaliar cada caso isoladamente e aplicar uma conduta
adequada a cada um, já que nem todos os casos encontrados na literatura têm as
mesmas características. O objetivo de se relatar este caso é divulgar nossa
experiência e o resultado positivo que obtivemos, já que pelo fato de a paciente já
ter prole constituída a histerectomia foi uma solução adequada e de fato resolutiva.
A revisão da literatura realizada nos permitiu ter acesso à experiência de
outros serviços tanto em nosso país, como no exterior. Percebemos que a
miomectomia durante a gestação tem sido umas das condutas mais executadas
4,8,9,
principalmente nos casos em que as pacientes acabam desenvolvendo a
"síndrome dolorosa" ou entram em quadro de abdome agudo durante a gestação
devido torção de miomas subserosos. Não encontramos relatos de miomectomia
preventiva, ela só é indicada quando a paciente se torna sintomática. A grande
maioria dos casos de gestação associada à miomatose não necessita de maiores
cuidados, desde que a paciente esteja fazendo um Pré-Natal adequado e que avalie
a gestação e a evolução da miomatose. Miomas submucosos estão mais associados
a quadros de abortamentos e trabalho de parto prematuro, além de quadros como
placenta acreta, que foi o que aconteceu com a nossa paciente e que foi algo
decisivo para que optássemos pela histerectomia.
Precisamos ressaltar que a histerectomia, por ser uma conduta extremista,
deve ser bem avaliada. Em nosso caso, tornou-se a única conduta cabível, pela
presença do acretismo placentário. A paciente foi notificada em sala cirúrgica,
durante a cesárea, que seria necessário a histerectomia e, no caso dela, era uma
boa solução, já que a mesma já tinha prole constituída e o recém-nascido nasceu
em ótimas condições, mesmo porque tratava-se de uma gestação de termo. Nos
casos de primiparidade ou prematuridade há de se optar, se possível, por conduta
conservadora, a fim de manter a capacidade reprodutiva da paciente.
O diagnóstico de miomatose prévio à gestação permitiria instituir uma
terapêutica clínica ou até mesmo cirúrgica, por histeroscopia nos casos de miomas
submucosos e por videolaparoscopia e/ou laparotomia exploradora nos casos de
miomas subserosos e, portanto, melhorar as condições de uma possível gestação,
diminuindo riscos de intercorrências gestacionais.
4. Referências Bibliográficas
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na gestação. EURP, 2009.
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Efeitos do leiomioma uterino na fertilidade e gestação. EURP, 2010.
3. Fernandez, Ana Cristina; Martins, Welington; Mauad, Francisco. Miomectomia
durante a gestação e o parto. EURP, 2010.
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Indicaciones actuales de la histerotomia corporal y de la miomectomia en el
transcurso de una cesárea. Revista Toko Ginecología, ed. 707 - 2009. págs.
199-202.
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Ginecologia e Obstetrícia. 2005. 80-85.
9. Leite, Guilherme; Korkes, Henry; Viana, Arildo; Pitorri, Alexandre; Kenj, Grecy;
Sass, Nelson. Miomectomia em gestação de segundo trimestre: relato de
caso. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia. 2010. 198-201.
5. Anexos
5.1 Aprovação do relato de caso pelo C.E.P. do HSPM
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