MULTICULTURALISMO E A QUESTÃO DA TOLERÂNCIA E

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MULTICULTURALISMO E A QUESTÃO DA TOLERÂNCIA E
INTOLERÂNCIA DE GÊNERO
Luiz Paulo de Jesus Bitarães1
Janaina da Costa Binda2
Luana Poltronieri Souza3
Luciane Infantini da Rosa Almeida4
Ricardo Silveira da Paixão5
RESUMO
O artigo tem como objetivo verificar os principais aspectos e correlações associados à intolerância e intolerância na
perspectiva do multiculturalismo e as questões de gênero. Inicia com considerações gerais sobre ser tolerante ou
intolerante em se tratando de gênero para discutir com as principais concepções teóricas o multiculturalismo que
envolve cultura, noções de identidade e gênero, elementos que contribuem para a compreensão o conceito e objetivos
do multiculturalismo. A pesquisa bibliográfica permitiu concluir que as sociedades, em geral, são um misto cultural,
ou seja, tem influência de diferentes culturas que fazem parte do cotidiano nacional. Essa diversidade de cultura
enriquece o conhecimento, mas também é uma questão polêmica em termos sociais e, principalmente, de gênero.
Palavras-chave: Tolerância. Intolerância. Multiculturalismo. Gênero.
1 INTRODUÇÃO
A forma como a sociedade concebia a questão de gênero possibilitou ao homem mais
direitos e poder em relação a mulher. A mulher tem sua presença associada à família e isto
limitou seu papel à submissão das atividades familiares, por sua natureza de mãe e dona de casa.
Ao homem eram destinadas atividades e responsabilidades da esfera pública, construir
civilização, mas não o isentava do direito de até agredir física ou verbalmente a mulher.
Compreender o aspecto gênero é um processo que parte da interpretação e do multiculturalismo
(BARBOSA, 2007).
O termo gênero sempre se mostrou aparentemente neutro, desprovido de propósito
ideológico imediato, contudo, as mudanças sociais, comportamentais e culturais passaram a
1) Tecnólogo em Gestão Ambiental. Especialista em Gestão e Educação Ambiental.
2) Bacharel em Administração. Especialista em Marketing e TI e Gestão de Projetos. MSc em Administração.
3) Bacharel em Administração e Licenciada em Matemática. MSc em Educação (Matemática).
4) Psicóloga. DSc. em Serviço Social.
5) Bacharel em Ciências Econômicas. Licenciatura em Matemática. MSc em Economia.
interferir no posicionamento feminino em diferentes vertentes: sexo, educação, trabalho. A
caracterização das diferenças biológicas se tornou desigualdade, estereótipos e preconceitos. É
interessante destacar que a definição de gênero tem sua origem, entre as feministas que
buscavam, através de seus estudos, desnaturalizar as condições das mulheres na sociedade e
desconstruir as ideias de tudo relacionado à mulher está na natureza feminina (SILVA, 2007).
É uma questão de diversidade cultural que para ser incorporada no cotidiano escolar, das
relações sociais a construção de uma cultura é necessário escola que, curricularmente seja
considerada as manifestações humanas que compõem a sociedade brasileira. Partindo de uma
convivência baseada no respeito é possível no contexto geral educar cidadão para a diversidade.
O multiculturalismo, ainda nas primeiras décadas do século XX constituiu uma temática pouco
debatida na sociedade brasileira e na atualidade a situação é diferente, principalmente no tocante
à educação onde a discussão da multiculturalidade é uma demanda emergente no âmbito
educacional (FREITAS, 2011).
Os procedimentos metodológicos que contribuem para o desenvolvimento deste artigo é a
pesquisa bibliográfica por sua estrutura partir de material já elaborado, subsidiado por livros e
artigos, teses, dissertações e diferentes periódicos apresentados em seminários e/ou congressos
(GIL, 2010).
Neste contexto, este paper tem como objetivo verificar os principais aspectos e
correlações associados à intolerância e intolerância na perspectiva do multiculturalismo e as
questões de gênero.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 TOLERÂNCIA E INTOLERÂNCIA NA PERSPECTIVA DO GÊNERO: DIVERSIDADE
CULTURAL
Conhecimento em Destaque, Serra, ES, v. 12, n. 01, jan./jun. 2016.
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A diversidade cultural em termos das relações sociais deveria ser fonte de aquisição de
conhecimento. Em alguns aspectos é assim concebida, em outros é vista com preconceito e
discriminação, comportamento e reação descaracterizadas pelo ‘jeitinho brasileiro’ de mascarar a
nossa realidade social. A história do Brasil é cercada de nuances duvidosas quanto a veracidade
de muitos fatos devido à necessidade de dissimular ou reparar dados e informações sejam de
caráter cultural, social ou político (SANTOS, 2010).
A classificação social considera o poer econômico, a etnia, a tendência partidária, o grau
de escolaridade e, sobretudo, o sexo. Esses elementos configuram o tipo de tratamento será
destinado ao cidadão. Para Santos (2010, p.76), a modernidade em seu aspecto cultural
“constituiu-se antes de o modo de produção capitalista se ter tornado dominante e extinguir-se-á
antes de este último deixar de ser dominante”.
Há muitas sisutações que levam à intolerância seja por falta de conhecimento, falta de
questionamento ou excesso de ‘arrogância e pseudosaber tudo’. Nenhum ser humano tem
conhecimento absoluto ou pleno de tudo. São os acontecimentos que levam à criação do saber, do
diferenciar para agregar. Enfim, ser tolerante porque segundo explica Arendt (1987, p. 50) “nós
não nascemos iguais: nós nos tornamos iguais como membros de uma coletividade em virtude de
uma decsão conjunta que garanta a todos direitos iguais”.
A Figura 1 mostra os direitos garantidos legalmente no que tange à diversidade em
diferentes aspectos da sociedade brasileira, inclusive a de gênero.
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Figura 1 – Pelo direito à diversidade
Fonte: Wordpress (2016)
Algumas mudanças significativas ocorrem na categoria gênero e possibilitando um caráter
mais dinâmico, ou seja, da variável binária arbitrária que reforçava dicotomias rígidas está sendo
compreendido como uma categoria relacional e contextual. De origem latina (tolerantia), a
palavra tolerância segundo Daher (2009, p. 3) “é uma atitude de respeito aos pontos de vista dos
outros e de compreensão com suas eventuais fraquezas [...]”.
De modo mais simples, os significados de tolerância significa, dependendo do ponto de
vista, “sofrer, suportar, não interditar, denotar ação de erguer, ter liberdade para enfrentar
dificuldades e superar obstáculos. Tolerante é aquele que desculpa, é indulgente, que admite e
respeita opiniões contrárias à sua” (DAHER, 2009, p. 5).
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As práticas de tolerância e intolerância podem ser vista em diferentes perspectivas:
religião, política, classe social. Nos tempos atuais, em se tratando de gênero, a mulher deixou ser
foco central deste processo os debates e discussões passaram a tratar de temas relacionados à
orientação sexual, identidade de gênero e outras questões.
Muitas pessoas, fugindo de se mostrar intolerante, assume a postura de um ser humano
tolerante. A esse contexto, Paulo Freire ensinou de acordo com Daher (2009) que:
[...] a pessoa que é tolerante não é tolerante porque é superior, mas é tolerante porque
reconhece na outra pessoa, alguém que possui uma posição diferente da sua.Falo da
tolerância como virtude da convivência humana. Falo, por isso mesmo, da qualidade
básica a ser forjada por nós e aprendida pela assunção de sua significação ética e
qualidade de conviver com o diferente (DAHER, 2009, p. 5).
É importante destacar que existe a falsa tolerância que se supõe infalível e pura, adotando
o silêncio compassivo em face de todos os eu não adotam o seu modo de pensar e agir.
“As práticas da tolerância podem refletir ceticismo ou indiferença. Mas, é a prática da
tolerância ou intolerância como um empreendimento político que introduz a assimetria associada
ao conceito, e não as atitudes subjacentes, quaisquer que possam ser” (WILLIANS, 2009, p.5).
É um contexto de complexa discussão devido a subjetividade de entendimento. Mas a
partir do momento que despontam mecanismos legais para assegurar o direito do ser humano em
suas opções no que tange ao gênero constata-se que a intolerância é maior. São leis para
assegurar o direito à diversidade. A diversidade em todas as suas vertentes respalda o
multiculturalismo e juntas tornam o ser humano menos intolerante e mais aberto a conviver com
o diferente, principalmente no que se refere ao gênero.
2.2 MULTICULTURALISMO
A preocupação com a cultura é antiga e já se expressava na antiguidade devido a
diversidade de comportamento entre os povos. Não foram poucas e comuns as tentativas de
explicar tais diferenças a partir das variações dos ambientes físicos. Em seus estudos, Barbosa
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(2007, p. 16) enfatiza que “a preocupação com o pluralismo cultural, multiculturalidade,
interculturalismo leva a considerar e respeitar as diferenças, evitando uma pasteurização
homogeneizante”.
A capacidade de questionar valores e preconceitos é o que denomina posicionamento
multiculturalista, nesta perspectiva, os grupos culturais que se imbricam podem ser identificados
pela raça, gênero, orientação sexual, idade, locação geográfica, renda, idade, classe social,
ocupação, educação, religião” (BARBOSA, 2007, p. 18)
O primeiro conceito de cultura, conforme Laraia (2001, p.8) foi formulado por Edward
Tylor que buscou “demonstrar que cultura pode ser objeto de um estudo sistemático, pois se trata
de um fenômeno natural que possui causas e regularidades” e assim permite um estudo objetivo e
análise que proporcionam formulação de leis sobre o processo cultural e a evolução.
O multiculturalismo permite a convivência em um país, região ou local de diferentes
culturas e tradições porque envolve culturas, visões de vida e valores e ter como principal
característica ser pluralista haja vista que engloba diferentes pensamentos sobre um mesmo tema,
rejeitando a unicidade de pensamento único, privilegiando o diálogo entre as culturas. Segundo
Moreira (2001):
Numa sociedade que se percebe cada vez mais multicultural, cuja pluralidade de
culturas, etnias, religiões, visões de mundo e outras dimensões das identidades infiltrase,
cada vez mais, nos diversos campos da vida contemporânea. O multiculturalismo surge
como um conceito que permite questionar no interior do currículo escolar e das práticas
pedagógicas desenvolvidas, a superioridade do saber geral e universal sobre os saberes
particulares e locais (MOREIRA, 2001, p.41).
Mas há pontos contraditórios. Segundo Werneck (2003, p. 10) por um lado, insiste-se na
“tolerância, no acolhimento das diferenças, no multiculturalismo, no pluralismo de opiniões e de
ideias, de modos de ser e de viver. Por outro, nunca foi tão forte e intenso o controle do Estado e
numerosas as regras de bem viver e de bem pensar”.
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Uma das condições para que efetivamente exista a sociedade multicultural é integrar sua
essência (democracia política, identidade e liberdade do indivíduo) com a libertação cultural
(mercado e tradição) desconsiderando aspectos herdados da modernidade. Nesse sentido, Candau
(2002, p. 70) afirma que “o multiculturalismo é um termo importante e polissêmico, com sentido
aprofundar para nos aproximar das questões relativas às articulações entre educação e cultura.
Configura um termo amplo e polêmico, que pode ser entendido a partir de diferentes
perspectivas”.
Romper as próprias limitações é uma das maiores qualidades do ser humano e em se
tratando de gênero masculino e feminino deixou de ser animal frágil, provido de insignificante
força física e dominou a natureza e se transformou em predadores, comprovando sua diferença e
mostrando ser o único que possui cultura. De acordo com Silva (2007, p. 80) o multiculturalismo,
assim como a cultura contemporânea é ambíguo: é um “movimento legítimo de reivindicação dos
grupos culturais dominados e não pode ser separado das relações de poder que, antes de mais
nada, obrigam essas diferentes culturas raciais, étnicas e nacionais a viverem no mesmo espaço”.
Um dos grandes desafios da sociedade contemporânea é avaliar o fenômeno do
multiculturalismo, oque também é uma necessidade, pois de acordo com Moreira e Candau
(2008, p. 7) "quer usado como meta, conceito, atitude, estratégia ou valor, o multiculturalismo
costuma referir-se às intensas mudanças demográficas e culturais que têm "conturbado" as
sociedades contemporâneas".
O movimento social o multiculturalismo está ligado à tomada de consciência do direito à
identidade e à inadmissão de qualquer modo de discriminação social.
O multiculturalismo pode consistir na justaposição ou presença de várias culturas em uma
mesma sociedade e na relação entre elas e segundo Torres (2001, p. 196), “é uma orientação
filosófica, teórica e política que não se restringe à reforma escolar e que aborda o tema das
relações de raça, sexo e classe na grande sociedade".
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2.3 QUESTÕES DE GÊNERO
O conceito de gênero surgiu entre estudiosas feministas em contraposição ao pensamento
de essência, rejeitando explicações pautadas no determinismo biológico para justificar os
comportamentos de homens e mulheres, contribuindo para justificar as desigualdades entre os
sexos tendo como base suas diferenças físicas. Na discussão sobre as relações de gênero é
importante debater os processos de construção ou formação histórica, linguística e social,
instituídas na formação de mulheres e homens. É preciso ressaltar, no entanto, que os estudos
feministas tiveram como preocupação as relações de poder entre mulheres e homens (COSTA,
BRUSCHINI, 1992).
O conceito de gênero em alguns trabalhos têm abordagem neutralizante e fixo,
apresentado como sinônimo de papéis, estereótipos ou identidades sexuais e se apresenta de
diversas formas, em situações até equivocadas ou banalizadas O gênero é um sistema de
significados atribuídos ao masculino e feminino. Segundo Moraes (1998):
Gênero, como categoria analítica elaborada nos estudos feministas, tem a função de
colocar luz sobre as diferentes posições ocupadas por homens e mulheres nos diversos
espaços sociais, dando destaque ao modo como as diferenças construídas socialmente
resultam em critérios de distribuição de poder, portanto, em como se constroem as
relações de subordinação (MORAES, 1998, p.25).
O termo gênero sempre se mostrou aparentemente neutro, desprovido de propósito
ideológico imediato. Nesta interpretação supostamente “despolitizada”, não estaria a priori
questionando sobre a desigualdade ou o poder, ou tomaria partido pela “parte lesada”, sendo
usado como sinônimo de mulheres. Surge, então, a definição de gênero. Trata-se de uma palavra
que “necessariamente pede explicações a respeito de seu significado, pois serve para classificar
fenômenos diversos tais como gêneros de literatura, de cinema, de música, dos seres vivos [...]”
(CARVALHO, CASAGRANDE, LUZ, 2009, p.21).
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A categoria gênero se desenvolve fundamentadas pelas teóricas do feminismo
contemporâneo sob a perspectiva de compreender e responder, dentro de parâmetros científicos, a
situação de desigualdade entre os sexos e como esta situação de desigualdade entre os sexos
opera na realidade e interfere no conjunto das relações sociais. Mas, “não basta que um dos
gêneros conheça e pratique atribuições que lhes são conferidas pela sociedade é imprescindível
que cada gênero conheça as responsabilidades do outro gênero” (CARLOTO, p.46).
É importante enfatizar que sexo e gênero são duas palavras bem distintas: sexo, “um dado
biológico e gênero, uma construção cultural e prática de papéis dicotomizados considera que a
representação de masculino e feminino é aprendida através do desempenho de papéis
determinados” socialmente para homens e para, com características contrárias e opostas
(CARVALHO, CASAGRANDE, LUZ, 2009, p.24).
A caracterização do gênero em termos da sexualidade é repassada de geração a geração e
neste processo, as ações, atitudes e comportamentos da mulher é sempre comparado e diminuído
em relação ao homem, como mostra a Figura 2.
Figura 2 – Questões de gênero masculino e feminino
Fonte: Wordpress (2016)
Durante gerações, o poder do imaginário social instituiu que as mulheres ficassem em
casa cuidando dos filhos e acreditassem que o trabalho realizado por elas fora da unidade
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doméstica era desprezível e pobre. Apesar desse imaginário grande contingente feminino,
geralmente constituído pelas camadas mais pobres, participou da força de trabalho desde as
instalações das primeiras fábricas têxteis no Brasil. Quando não trabalhavam em fábricas,
exerciam atividades manuais, como a produção de artigos baratos, feitos por encomendas ou não,
tipo de doces, brinquedos, costura. O trabalho manual a domicílio se apresentava como única
opção para mulheres, pois se a família necessitava de sua contribuição financeira, necessitava
também dela dentro de casa, onde suas atividades como mãe e esposa não poderiam ser
prejudicadas (NADER, 2001).
As questões de gênero perderam seu espaço limitado ao sexo masculino e feminino e em
face das mudanças sociais passou a convier com outras denominações que exacerbam, em alguns
casos, a tolerância ou intolerância. A Figura 3 caracteriza nos tempos atuais, as diferenças
existentes entre as terminologias sociais relacionadas ao gênero.
Figura 3 – Genero: terminologias atuais
Fonte: Wordpress (2016)
A instabilidade da compreensão de gênero remete ao conceito de identidade, formulado a
partir de diferentes abordagens teóricas, sendo que algumas procuram explicar como são
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produzidas as identidades de gênero ou as identidades sexuais e têm como bases estruturas de
interação bem restritas, além disso, ignoram que as relações de gênero se conectam a outros
sistemas sociais, econômicos, políticos ou de poder. Compreender esse fenômeno é um processo
que ocorre a partir da própria interpretação, pois segundo Nader (2001),
[...] a historiografia realizava da tutela que o homem exercia sobre a mulher, tutela está
diretamente relacionada à ordem econômica e ao controle político da sociedade. Na
primeira, pela dependência econômica da mulher para com o homem e a rígida divisão
social do trabalho, e, no segundo, pela manutenção da supremacia masculina (NADER,
2001, p. 29).
É neste cenário marcado por preconceito e discriminação associados às diferenças
impostas sobre o sexo masculino e feminino que o conceito de gênero foi se definindo e se
consolidando. A adoção de estratégias para defender, contrapor e confrontar das mulheres, não
enquanto sexo, mas sim como gênero promoveu mobilização pela igualdade das condições de em
todos os sentidos, considerando a educação, o trabalho, a sociedade, a política e a cultura
(CARVALHO, 2001).
Por muito tempo persistiu, por mais notáveis que fossem as mudanças sociais, culturais e
econômicas, a concepção das mulheres como seres frágeis, dotadas de docilidade e sensibilidade
demais para exercer funções que não fossem as subordinadas ao homem que, por outro lado, era
visto como um ser forte e protetor, cuja finalidade e obrigação eram desempenhar as funções de
comando e de vida pública (SILVA, NADER, FRANCO, 2006).
Nos anos 70 e 80, mesmo com a mulher atuando em atividades classificadas como
femininas (professora, costureira, pedagoga), muitas desenvolvem “atividades que até pouco
tempo eram típicas dos homens, como por exemplo, até técnica em edificações, engenharia,
topografia, eletrotécnica, venda de imóveis e seguro, inclusive no curso de metalurgia [...]”
(SILVA, NADER, FRANCO, 2006, p.171).
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No contexto histórico brasileiro, a mulher tem sua presença marcada e associada à família
e este fato limitou seu papel à submissão das atividades relacionadas a instituição familiar,
cabendo a elas atividades e tarefas relacionadas à esfera privada de sua natureza de mãe e dona de
casa. Por meio dos discursos masculinos o feminino é procurado nos mitos, na “poesia, na
história, nos romances, nos tratados médicos e filosóficos, na legislação, na iconografia e nessa
imensidão documental destacam-se imagens, contudo elas não apresentam as mulheres e sim a
imagem que os homens fazem delas” (MORAES, 1998, p.11).
Algumas mudanças significativas ocorrem na categoria gênero e possibilitando um caráter
mais dinâmico, ou seja, da variável binária arbitrária que reforçava dicotomias rígidas está sendo
compreendido como uma categoria relacional e contextual. Em contrapartida, ao homem eram
destinadas atividades e responsabilidades associadas à esfera pública, construir civilização. Por
longos anos a mulher aceitou com submissão e passividade a tarefa de ser esposa, mãe e dona de
casa (NADER, 2001).
A instabilidade da compreensão de gênero remete ao conceito de identidade, formulado a
partir de diferentes abordagens teóricas, sendo que algumas procuram explicar como são
produzidas as identidades de gênero ou as identidades sexuais e têm como bases estruturas de
interação bem restritas, além disso, ignoram que as relações de gênero se conectam a outros
sistemas sociais, econômicos, políticos ou de poder (SCOTT, 1995).
Mesmo na comunidade cientistas algumas áreas do conhecimento e do comportamento
são ou eram características típicas do sexo. Quando se trata de analisar a identidade associada a
sexo, é importante ressaltar que o “sujeito assume identidades diferentes em diferentes
momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um ‘eu’ coerente. Dentro de nós há
identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções [...]” (HALL, 1997, p. 13).
Mas, o movimento feminista em sua proposta trouxe novos aspectos à contestação política
ao abordar temas relacionados à família, sexualidade, trabalho doméstico, o cuidado com as
crianças,
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[...] enfatizou, como uma questão política e social, o tema da forma como somos
formados e produzidos como sujeitos generificados. Isto é, ele politizou a subjetividade,
a identidade e o processo de identificação (homens/mulheres, mães/pais, filhos/filhas)
(...) aquilo que começou como um movimento dirigido à contestação da posição social
das mulheres expandiu-se para incluir a formação das identidades sexuais e de gênero
(HALL, 1997, p.49).
Associado à identidade, em relação ao gênero ninguém nasce mulher, torna-se mulher.
Em se tratando de gênero na perspectiva da cultura religiosa, a utilização da imagem de Eva teve
profunda ressonância e forte efeito moral.
Entre 1150 e 1170 foi escrita uma peça teatral em que esclarece mais ainda a transposição
de realidades sociais. A construção do drama adapta-se bem aos costumes do tempo,
reproduzindo os traços do feudalismo: Adão é representado como vassalo de Deus; o paraíso
como o feudo, um bem que estreitas suas relações; Eva aparece como vassala de Adão, e apenas
como segunda vassala do criador. No segundo plano da peça satã tenta iludir Adão sem obter
sucesso, este permanece fiel a deus. Satã seduz Eva, e seduzida Eva leva adão ao pecado e Deus
como um senhor feudal exemplar expulsá-los do paraíso e confisca o feudo cedido a Adão. Este
cheio de rancor, culpa a mulher: sucumbira diante dos maus conselhos da companheira
(MACEDO, 2002).
Verifica-se que a socialização traz consigo uma construção das perspectivas inerentes ao
ser homem e ao ser mulher, aprisionando, assim, ilusoriamente, as pessoas e sua dimensão
dinâmica de compreensão da vida, incidindo na capacidade dos seres sociais que se encontram
em permanente movimento, em constante busca de superação do já conhecido, do já vivido e de
suas percepções preestabelecidas ou aceitas pelo coletivo, ficando pautados em um processo de
formatação do feminino e masculino (LOURENÇO, 2004).
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O multiculturalismo cuja base é composta pelas diferenças culturais se expressa por meio
descrenças, credos, arte, culinária, vestimenta, festas populares. Na realidade, estes são os
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elementos que compõem a cultura de um povo e que é repassada de geração a geração com o
objetivo de preservar seus valores. A evolução humana por si só mostra a necessidade de
crescimento e desenvolvimento dos sexos. Acompanhar ou não este processo, em muitos casos,
implica em retrocesso, manutenção de um sistema que privilegia alguns e oprime outros.
Em se tratando das questões de gênero, algumas mudanças significativas ocorrem na
categoria gênero e possibilitando um caráter mais dinâmico, ou seja, da variável binária arbitrária
que reforçava dicotomias rígidas está sendo compreendido como uma categoria relacional e
contextual. Contudo, não é encarado como desvantagem, estas ressignificações do conceito são
necessárias e trazem uma maior vitalidade para a compreensão das relações de gênero.
O multiculturalismo contribui para melhor entender a diversidade cultural, as questões de
gênero e sua importância no contexto da educação e das relações sociais. Socialmente a educação
é o canal, o caminho de acesso à formação e construção de valores. Nessa perspectiva, o
multiculturalismo para existir organizadamente necessita que as ululas e os diferentes gêneros
sejam respeitados para consolidar seu principal objetivo: integrar e construir o cidadão de modo a
ser capaz de se colocar perante outros.
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