PERFIL METABÓLICO E FREQUÊNCIA DE RESISTÊNCIA À INSULINA EM PACIENTES COM ARTRITE REUMATÓIDE Caio Henrique Bonaldo de Oliveira (PIBIC/CNPq-UEL); Marcell Alysson Batisti Lozovoy; Andréa Name Colado Simão (Orientador), e-mail: [email protected] Universidade Estadual de Londrina/Centro de Ciências da Saúde/ Departamento de Análises Clínicas, Patologia e Toxicologia/Londrina, PR Ciências Biológicas, Imunologia, Imunologia Aplicada. Palavras-chave: Artrite Reumatoide, Resistência à insulina. Resumo A artrite reumatoide (AR) é uma doença multissistêmica crônica inflamatória de etiologia desconhecida, com proliferação sinovial predominante, destruição óssea e degradação da cartilagem articular. Apresentam, além do aumento da prevalência de resistência à insulina (RI), outras alterações metabólicas, como alterações no perfil lipídico. O objetivo do presente estudo foi avaliar a prevalência de RI em pacientes com AR atendidos pelo ambulatório de reumatologia do Hospital Universitário de Londrina, e observação do perfil metabólico dos mesmos. Selecionou-se 100 pacientes com AR e 148 saudáveis. Avaliou-se os níveis plasmáticos colesterol total e frações, glicose, insulina e índice de RI (HOMA-RI). Pacientes com AR eram mais velhos (p<0,0001) e apresentam maior IMC (p<0,0001), maiores níveis de triglicerídeos (p=0.003), glicose (p=0,026), insulina (p<0,001) e HOMA-IR (p<0,001) quando comparados ao grupo controle. O ajuste de p pela idade não alterou a significância obtida para os diversos parâmetros. Porém, ao realizar o ajuste das variáveis pelo IMC, os níveis de colesterol total (p=0,010) e insulina (p=0,009) foram significativamente maiores no grupo AR quando comparado ao grupo controle. No entanto, os níveis de LDL foram significativamente menores (p=0,030) no grupo AR e os demais parâmetros não diferiram entre os grupos. A frequência de RI foi significativamente superior no grupo com AR, mas essa diferença não se manteve após o ajuste pelo IMC. Nossos dados demonstram que pacientes com AR apresentam importantes alterações metabólicas, possivelmente devido ao processo inflamatório crônico. O aumento na frequência de RI parece estar relacionado ao aumento de peso presente nestes pacientes. Introdução e objetivo: A artrite reumatoide (AR) caracteriza-se pela inflamação do tecido sinovial de múltiplas articulações, levando a destruição tecidual, dor, deformidades e 1 redução na qualidade de vida do paciente. Acomete cerca de 0,5% a 1% da população mundial adulta, sendo sua ocorrência observada em todos os grupos étnicos (ALARCÓN, 1995). Os pacientes com AR apresentam redução da expectativa de vida, sendo a doença cardiovascular (DCV) a principal causa de morte, sendo o infarto agudo do miocárdio até quatro vezes mais frequente nesses pacientes (DESSEIN et al., 2004). Pacientes com AR tem sensibilidade à insulina reduzida (HOMA-IR) e prejuízo na função da célula β pancreática (HOMA-B) (CHUNG et al., 2008; DESSEIN et al., 2006). Este trabalho tem como objetivo avaliar e comparar a frequência de resistência à insulina (RI) e as alterações metabólicas em pacientes com AR e indivíduos saudáveis. Procedimentos Metodológicos: Foram selecionados 100 pacientes com diagnóstico de AR, atendidos pelo ambulatório de reumatologia do Hospital Universitário (HU) de Londrina e 148 indivíduos saudáveis (controles) entre os doadores de sangue atendidos pelo Hemocentro Regional de Londrina. O diagnóstico de AR foi definido de acordo com os critérios do Colégio Americano de Reumatologia (ACR) de 1987 e/ou novos critérios classificatórios ACR/EULAR 2010. No grupo controle, foram excluídos indivíduos com presença de doença autoimune, cardíaca, renal ou hepática, uso de medicamentos antiinflamatórios e doença infecciosa crônica. As análises de glicose, triacilgliceróis, colesterol total e frações foram efetuadas em um auto-analisador bioquímico (Dade AR®), utilizando-se kits Dade Behring®. A determinação de insulina foi realizada por quimioluminescência em micropartículas no equipamento Arcchitect (ABBOTT). Foi calculado o Índice de Resistência à Insulina (HOMA - Homeostasis Model Assessment) de acordo com a fórmula (Haffner et al., 1997): HOMA-IR = insulina jejum (uU/mL) X glicose jejum (nmol/L)/22,5. Foi considerado RI quando HOMA-IR ≥2,11. A análise estatística foi realizada pelo programa SPSS 20.0. As variáveis categóricas foram analisadas usando o teste de Qui-quadrado ou exato de Fisher quando apropriado, e foram expressas em números absolutos (n) e porcentagens (%). As variáveis contínuas foram analisadas usando One Way ANOVA, e os resultados expressos como média (±SD). Regressão logística binária foi utilizada para ajuste das variáveis pela idade e IMC. Resultados de p <0,05 foram considerados significativos. Resultados e discussão A tabela 1 apresenta os dados clínicos e laboratoriais de pacientes com AR. Pacientes com AR eram mais velhos (p<0,0001) e apresentam maior IMC (p<0,0001), maiores níveis de triglicerídeos (p=0.003), glicose (p=0,026), insulina (p<0,001) e HOMA-IR (p<0,001) quando comparados ao grupo controle. O ajuste de p pela idade não alterou a significância obtida para os diversos parâmetros. No entanto, quando se realizou o ajuste das variáveis pelo índice de massa corpórea (IMC), os níveis de colesterol total (p=0,010) e 2 insulina (p=0,009) foram significativamente maiores no grupo AR quando comparado ao grupo controle. No entanto, os níveis de LDL foram significativamente menores (p=0,030) no grupo AR enquanto os demais parâmetros não diferiram entre os grupos. (Tabela 2). Indivíduos com AR apresentam o metabolismo lipídico alterado, o que contribui para o aparecimento de distúrbios cardiovasculares. Kerekes e colaboradores (2014) relataram que a AR é um fator de risco independente ao desenvolvimento de doenças cardiovasculares, isso devido a uma maior ocorrência de síndrome metabólica nestes indivíduos. No entanto, um “paradoxo lipídico” tem sido descrito em pacientes com AR, uma vez que estes indivíduos apresentam redução nos níveis de colesterol total e LDL. A diminuição dos níveis de LDL nestes pacientes pode ser explicada pelo uso de hidroxicloroquina, um antimalárico utilizado no tratamento da AR, que tem efeitos favoráveis no perfil lipídico. No entanto, Morris e colaboradores (2011) encontraram níveis elevados de LDL em pacientes com AR independente do uso de Hidrocloroquina. Segundo Wasko e colaboradores (2011), vários estudos demonstram a relação entre doenças inflamatórias crônicas e alterações no perfil metabólico, em especial a RI, devido a componentes imunorregulatórios, como o fator de necrose tumoral (TNFα) e a interleucina-6 (IL-6). Pacientes com AR demonstraram ter maior frequência de RI quando comparado ao grupo controle (p<0,001) (figura 1). A análise de regressão logística binária demonstrou que a presença de RI foi diretamente associada ao aumento do IMC (p<0,0001). Tabela 1: Dados clínicos e laboratoriais de pacientes com artrite reumatoide (AR) atendidos pelo ambulatório de Reumatologia do Hospital Universitário de Londrina. Características Artrite reumatoide (n = 100) Anti-CCP positivo (%) 75 (78,1) Fator Reumatoide (%) 65 (67,0 DAS 28 3,58 (±1,42) Medicamentos Anti-TNF α (%) 19 (20,21%) Metotrexato (%) 70 (74,47%) Hidroxicloroquina (%) 36 (37,5) IMC: Índice de massa corpórea; DAS 28: Disease Activity Score 28; CCP: Cyclic Citrullinated Peptide; TNF α: Fator de necrose tumoral alfa Tabela 2: Perfil metabólico lipídico e glicêmico em pacientes com artrite reumatoide e controles Controle Artrite Reumatoide (n= 148) (n= 100) 35,99 (±10,12) 55,99 (±12,31) Masculino 27 (18,24% ) 15 (15%) Feminino 121 (81,76%) 85 (85%) Características Idade (anos) Valor de p F ou χ2 Valor de p 191,24 <0,0001 --- 0,504 --- ajustado* Sexo (%) 0,446 Etnia (%) 3 Caucasiano 119 (80,40%) 75 (75%) Não caucasiano 29 (19,59%) 25 (25%) 24,84 (±4,39) 27,67 (±5,40) <0,0001 --- 188,09 (±41,51) 194,03 (±44,08) 0,287 0,010 IMC (kg/m²) Colesterol total (mg/dL) Triacilglicerídeos (mg/dL) 1,024 0,312 --- 102 (±70,48) 134,54 (±92,95) 9,148 0,003 0,770 HDL (mg/dL) 57,02 (±13,37) 59,05 (±17,83) 1,023 0,313 0,803 LDL (mg/dL) 118 (±108,78) 107,61 (±38,16) 0,910 0,341 0,030 Glicose (mg/dL) 89,65 (±23,33) 98,76 (±38,80) 5,00 0,026 0,391 Insulina (uU/mL) 8,07 (±4,47) 11,30 (±6,33) 21,53 0,000 0,009 HOMA-IR 1,79 (±1,20) 2,78 (±2,00) 22,89 0,000 0,088 IMC: Índice de massa corpórea; HDL: Lipoproteína de alta densidade; LDL: Liproteína de baixa densidade; HOMA-IR: homeostatic model assessment- insulin resistance Figura 1: Frequência de resistência à Insulina (RI) em pacientes com Artrite reumatoide (AR) e controles. p<0,0001 Conclusão Nossos dados demonstram que pacientes com AR apresentam aumento de colesterol e maior frequência de RI. Estas alterações podem contribuir para o aumento do risco cardiovascular e estão relacionadas ao processo inflamatório crônico e ao aumento do IMC. Referências ALARCÓN, G.S. et al. Epidemiology of rheumatoid arthritis. Rheum Dis Clin North Am 1995; 21:589-604. CHUNG C.P. et al. Prevalence of the metabolic syndrome is increased in rheumatoid arthritis and is associated with coronary atherosclerosis. Atherosclerosis 2008; 196(2):756-63. DESSEIN, P.H. et al. Glucocorticoids and insulin sensitivity in rheumatoid arthritis. J Rheumatol 2004; 31(5):867-74. DESSEIN, P.H; JOFFE, B.I. Insulin resistance and impaired beta cell function in rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum 2006; 54: 2765–75. KEREKES, G. et al. Rheumatoid arthritis and metabolic syndrome. Nat. Rev. Rheumatol 2014; 10: 691-696. MORRIS, S.J. et al. Hydroxychloroquine use associated with improvement in lipid profiles in rheumatoid arthritis patients. Arthritis care & research, v. 63, n.4, p. 530-4, abr. 2011. 4 5