O fio de prumo e a vertical local

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O fio de prumo e a vertical local
Você já deve ter visto um fio de prumo: um pesinho preso na extremidade
de um barbante ou fio de náilon. Em construções, o assentamento dos tijolos
nas paredes deve ser guiado pelo fio de prumo para as paredes ficarem verticais.
Então, um fio de prumo serve como um pêndulo na posição de equilíbrio e indica
a direção da vertical no local. Essa vertical nem sempre passa pelo centro da
Terra. Para ver isso, note que a Terra gira em torno de seu eixo de rotação, que
vou batizar de eixo z. Seja ω o vetor velocidade angular de rotação da Terra em
torno do eixo z. Então,
ω
= ωẑ
(1)
Em um sistema de coordenadas fixo à Terra, isto é, que gira em torno do eixo
z com velocidade angular dada pela Eq. (1), há a força centrífuga agindo sobre
o pesinho do fio de prumo. Nesse sistema de coordenadas, a força centrífuga
empurra o pesinho para longe do eixo z, com uma aceleração centrífuga de
módulo dado por
ac
=
ρω 2 ,
(2)
onde ρ é a distância do pesinho até o eixo de rotação da Terra. Se o ângulo da
latitude no local do fio de prumo é α, então
ρ =
R cos α,
(3)
onde R é o raio da Terra, que estamos supondo como esférica. Aqui, na cidade
de São Carlos, SP, a latitude é aproximadamente −22, 0175◦ . Então,
cos α
≈ 0, 9270694.
(4)
Estou mantendo 7 casas decimais na Eq. (4) para poder reproduzir o ângulo de
−22, 0175◦ sem ambiguidade, pois arccos (0, 9270694) ≈ 22, 017499◦ , enquanto
que arccos (0, 92707) ≈ 22, 017407◦ , por exemplo, indicando a necessidade de
pelo menos 7 casas decimais na Eq. (4) para poder definir as 4 casas decimais da latitute dada, ao tomarmos o inverso do cosseno. O raio da Terra é,
aproximadamente,
R
≈ 6371km.
(5)
Substituindo as Eqs. (4) e (5) na Eq. (3), obtemos
≈ 6371000 × 0, 9270694m = 5906359, 1474m.
ρ
(6)
A Terra dá uma volta em torno de seu eixo em 23 horas, 56 minutos e 4, 09
segundos e, portanto, seu período é dado por
T
=
(23 × 60 × 60 + 56 × 60 + 4, 09) s = 86164, 09s.
1
(7)
Então, a frequência angular da Terra é obtida dividindo 2π radianos pela Eq.
(7):
ω
=
2π
2π
=
rad s−1 ≈ 7, 2921159 × 10−5 rad s−1
T
86164, 09
e, portanto,
ω2
≈
5, 3175 × 10−9 rad2 s−2 .
(8)
Substituindo as Eqs. (6) e (8) na Eq. (2), obtemos
ac
≈
5906359, 1474 × 5, 3175 × 10−9 m s−2
≈
0, 0314070647663m s−2 ≈ 3, 14cm s−2 .
(9)
A aceleração da gravidade padrão é definida por
g
=
9, 80665m s−2 .
(10)
Comparando as Eqs. (9) e (10), obtemos
ac
g
≈
0, 0314070647663m s−2
≈ 3, 2 × 10−3 .
9, 80665m s−2
(11)
Com relação à direção da vertical, o que temos a fazer é somar os vetores da
aceleração centrífuga com o da aceleração da gravidade; a direção da resultante
dessa soma é a direção da vertical. A aceleração da gravidade aponta para o
centro da Terra. A aceleração centrífuga aponta perpendicularmente ao eixo z,
em direção ao espaço, longe da Terra (o adjetivo “centrífugo” refere-se a algo que
que foge do centro). Esses dois vetores não são paralelos e, portanto, formam
um plano que gira junto com a superfície da Terra. Vou batizar esse plano de
plano xz, já que o eixo z, obviamente, está contido nesse plano formado pelos
vetores das duas acelerações. Então, dada a latitude de São Carlos, SP, de
−22, 0175◦ , podemos escrever o vetor aceleração da gravidade como
g
≈
−x̂g cos (−22, 0175◦ ) − ẑgsen (−22, 0175◦ ) .
(12)
O vetor aceleração centrífuga é dado por
ac
= x̂ac .
(13)
A resultante da soma das Eqs. (12) e (13) dá a aceleração da gravidade efetiva
local:
ge
= g + ac ≈ x̂ [−g cos (−22, 0175◦ ) + ac ] − ẑgsen (−22, 0175◦ ) .
Substituindo as Eqs. (9) e (10) na Eq. (14), obtemos
ge
≈ x̂ [−9, 80665 cos (−22, 0175◦ ) + 0, 0314070647663] m s−2
−
ẑ [9, 80665sen (−22, 0175◦ )] m s−2 ,
2
(14)
isto é,
ge
≈
−9, 06003801m s−2 x̂ + 3, 67641274m s−2 ẑ.
(15)
A magnitude de ge é dada por
q
2
2
ge = |ge | ≈
(−9, 06003801) + (3, 67641274) m s−2
≈ 9, 77754056m s−2 .
(16)
O versor que aponta na direção de ge e que é paralelo à vertical local é dado
por
v̂
=
ge
.
ge
(17)
Substituindo as Eqs. (15) e (16) na Eq. (17), obtemos
v̂
≈
≈
3, 67641274m s−2
9, 06003801m s−2
x̂
+
ẑ
9, 77754056m s−2
9, 77754056m s−2
−0, 92661728x̂ + 0, 37600588ẑ.
(18)
−
A direção vertical local não passa pelo centro da Terra. A que distância do
centro da Terra passa a vertical? A reta que passa pelo centro da Terra define
a direção de g. Essa direção é obtida pela divisão da Eq. (12) por g, isto é,
ĝ =
g
g
≈
−x̂ cos (−22, 0175◦ ) − ẑsen (−22, 0175◦ )
≈
−0, 9270694x̂ + 0, 3748898ẑ.
(19)
Note as minúsculas diferenças entre as respectivas componentes dos versores das
Eqs. (18) e (19). Um ponto no plano xz, na superfície da Terra, tem o vetor
posição dado por
R =
x̂R cos α + ẑRsenα.
(20)
Um ponto qualquer, com vetor posição r, pertencente à reta que passa pelo
ponto da Eq. (20) e tem a direção da vertical é dado por
r
= R + λv̂,
(21)
onde λ é um parâmetro real. A Eq. (21) é a equação paramétrica da reta
vertical que passa pelo ponto R, com parâmetro λ. Substituindo as Eqs. (18) e
(20) na Eq. (21), obtemos
r
≈
x̂R cos α + ẑRsenα + λ (−0, 92661728x̂ + 0, 37600588ẑ) ,
isto é,
r
≈ x̂ (R cos α − λ0, 92661728) + ẑ (Rsenα + λ0, 37600588) .
3
(22)
Sobre o eixo z, o valor de λ deve ser tal que anule a componente ao longo do
versor x̂ da Eq. (22), isto é,
λ
=
R cos α
.
0, 92661728
Usando as Eqs. (4) e (5), obtemos
λ
≈
6371 × 0, 9270694
km ≈ 6374, 10857km.
0, 92661728
(23)
Substituindo a Eq. (23) na Eq. (22), obtemos
r
≈
ẑ (6371sen (−22, 0175◦ ) + 6374, 10857 × 0, 37600588) km,
r
≈
ẑ (−6371 × 0, 3748898 + 6374, 10857 × 0, 37600588) km,
isto é,
ou seja,
r
≈
(8, 279km) ẑ.
(24)
Assim, a vertical de São Carlos, SP, passa 8, 279km acima do centro da Terra,
quando cruza seu eixo de rotação. Uma aproximação em que a vertical passa
pelo centro da Terra dá um erro relativo de
E
≈
8, 279
× 100% ≈ 0, 13%.
6371
4
(25)
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