Lição 13: “Tu nos fizestes para ti mesmo, e nosso coração não tem

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ECLESIASTES Lição 13 – Embusca de uma Filosofia de Vida
ECLESIASTES
“Tu nos fizestes para ti mesmo, e nosso coração não tem descanso
até que repouse em ti”Agostinho
Ao terminar esta série de reflexões sobre As Palavras do Koheleth, é possívelolhar para a vida com
resolução e não com ansiedade.Três diferentes reflexões são propostas. Podemos resumi-las nos títulos
que escolhemos para as três partes que abrangem os dois últimos capítulos do livro:
(1) Sê Corajoso!
(2) Alegra-te!
(3) Teme a Deus!
Teme a Deus!
12:1
Lembra-te também do teu Criador nos dias da tua mocidade,
antes que venham os maus dias, e cheguem os anos em que dirás: Não tenho prazer neles;
2
antes que se escureçam o sol e a luz, e a lua, e as estrelas, e tornem a vir as nuvens depois da chuva;
3
no dia em que tremerem os guardas da casa, e se curvarem os homens fortes, e cessarem os moedores, por já serem
poucos, e se escurecerem os que olham pelas janelas,
4
e as portas da rua se fecharem; quando for baixo o ruído da moedura, e nos levantarmos à voz das aves, e todas as
filhas da música ficarem abatidas;
5
como também quando temerem o que é alto, e houver espantos no caminho; e florescer a amendoeira, e o
gafanhoto for um peso, e falhar o desejo; porque o homem se vai à sua casa eterna, e os pranteadores andarão
rodeando pela praça;
6
antes que se rompa a cadeia de prata, ou se quebre o copo de ouro, ou se despedace o cântaro junto à fonte, ou se
7
desfaça a roda junto à cisterna, e o pó volte para a terra como o era, e o espírito volte a Deus que o deu.
8
Vaidade de vaidades, diz o pregador, tudo é vaidade.
Se a nossa intenção tem sido olhar além das vaidades terrenas para Deus, que nos fez para si, então o título
Criador foi bem escolhido. Este título aponta para passagens anteriores no livro: que(1) só Deus vê o
padrão da existência como um todo (3:11), que (2)nós estragamos a obra de suas mãos com as nossas
“astúcias” (7:29) e que (3)a sua criatividade é contínua e inescrutável (11:5). A nossa parte –lembra-te dele
– não é um ato puramente mental. Significa deixar de lado a nossa pretensão à auto-suficiência,
entregando-nos a ele.
Neste trecho em particular, há uma profusão de imagens, algumas das quais evocam aspectos do
envelhecimento e da morte. São muitas as luzes da vida sujeitas a serem apagadas, além dos sentidos e das
faculdades, quando os velhos amigos vão partindo um a um, os costumes familiares vão mudando e
esperanças há muito acalentadas têm de ser abandonadas. Tudo isto chegará num estágio da vida quando
já não haverá mais a capacidade de recuperação da juventude ou a perspectiva de uma compensação.
A falta de naturalidade da marcha lenta e dura do velho, uma paródia da flexibilidade e leveza da
juventude, apresenta-se através da metáfora de um (v.5) gafanhoto – personificação da leveza e agilidade
– arrastando-se pesadamente em virtude de algum acidente ou do frio.
O Pregador conclui que estes fatos inevitáveis podem ser melhor enfrentados, não na idade avançada, mas
na mocidade – quandoainda podem nos levar à ação –sem desespero e arrependimentos vãos. Jesus, ao
curar um cego de nascença [Cf. João 9] nos alerta que “Enquanto é dia[entenda-se a juventude], precisamos realizar
a obra daquele que me enviou. A noite se aproxima[neste caso, a velhice], quando ninguém pode trabalhar” (João
9:4).
É impressionante como as figuras do v.6 captam a beleza e a fragilidade do ser humano: uma(1)obra-prima
criada como a mais fina obra de arte (somos seu poema segundo Efésios 2:10), mas(2)tão frágil quanto
uma peça de cerâmica e, afinal,(3)tão inútil quanto um pneu furado. Nov.7 há um lembrete da
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consequência trágica desta sequência – a escolha fatal que conduz à sentença: “Porque tu és pó e ao pó
tomaras”.1
Esta não é a única alusão que o escritor faz à queda do homem: em 7:29 ele pontua nossa condição
espiritual em seu devido lugar: “Deus fez o homem reto, mas ele se meteu em muitas astúcias”. Parece
haver uma nota de esperança no final do v.7 – e o espírito volte a Deus, que o deu – mas o contexto só nos
permite uma conclusão: a vida não nos pertence. O corpo reverterá ao seu próprio elemento; e o fôlego da
vida sempre pertenceu a Deus e a Deus cabe tomá-lo.
Ao concluir o trecho com o característico bordão “Vaidade de vaidades” o pregador deixa claro que nada
que nos seja oferecido debaixo do sol nos pertence de fato.
Eis a questão final: como é que se vive bem?
Os últimos versículos do Eclesiastes apresentam algumas sugestões.
12:9
Além de ser sábio, o pregador também ensinou ao povo o conhecimento, meditando, e estudando, e pondo em
ordem muitos provérbios.
10
Procurou o pregador achar palavras agradáveis, e escreveu com acerto discursos plenos de verdade.
O que surge nestes dois versículos é a grande importância que o autor dá ao seu papel de ensinador. Ele
não é o orgulhoso pensador que não tem tempo para as mentes menos privilegiadas; antes, aceita sua
vocação com lucidez e humildade.
A sugestão destes versículos é um convite para viver em reflexão humilde, ou seja, ouvir criteriosamente o
que as pessoas têm a dizer, o que as situações podem revelar, observar a existência e as relações humanas
com cuidado e atenção aos detalhes, buscando ler as entrelinhas da vida em busca de discernimento.
Quem reflete com humildade sabe que a sabedoria extrapola o conhecimento intelectual de uma verdade.
Muita gente sabe muito, mas vive mal. Saber usar a informação é tão ou mais importante quanto deter a
informação.
12:11
As palavras dos sábios são como aguilhões; e como pregos bem fixados são as palavras coligidas dos mestres, as
quais foram dadas pelo único pastor.
12
Além disso, filho meu, sê avisado. De fazer muitos livros não há fim; e o muito estudar é enfado da carne.
A segunda sugestão é viver com uma moderação corajosa. De acordo com o Eclesiastes, para ser
corajosamente moderado é preciso empurrar e depois frear: Oaguilhão faz os animais andarem, e os
pregos os mantêm sob controle. É o equilíbrio que faz a coisa funcionar. O ser humano também carece de
limites, educação, controle.
Observe os conselhos do Eclesiastes. Primeiro ele recomenda ao jovem que “siga por onde o coração
mandar, até onde a vista alcançar” (11:9). Mas também adverte: “mas saiba que por todas essas coisas
Deus o trará a julgamento” (12:14). Isso é moderação corajosa.
Observe que estas recomendações são palavras de autoridade dadas pelo único pastor (v.11), isto é,
provêm de Deus. Este segundo termo aplicado a Deus, “o único Pastor”, é um complemento apropriado ao
majestoso título do v.1, “teu Criador”. O Deus "distante", cuja ordem alcança a todos, também é o Deus
"próximo", que conhece e pode ser conhecido, que nos fala de forma clara e decisiva.
O curioso é que esta afirmação não nos agrada. Nos tornamos viciados – apaixonados – pelas nossas
perguntas mais difíceis (“Não são as respostas que movem o mundo, são as perguntas”– atribuído a Albert
Einstein).
1
Num eco claro de Gênesis 3
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O Eclesiastes não apresenta uma declaração emblemática do tipo “o sentido da vida é...”. Não há resposta
para o dilema a respeito do sentido da vida. A sugestão é que, em vez de se desgastar na busca da
elucidação do enigma do sentido da vida, o melhor mesmo é buscar um sentido para a própria vida.
12:13
Este é o fim do discurso; tudo já foi ouvido: Teme a Deus, e guarda os seus mandamentos; porque isto é todo o
dever do homem.
14
Porque Deus há de trazer a juízo toda obra, e até tudo o que está encoberto, quer seja bom, quer seja mau.
Até agora, nenhum dos caminhos levou a parte alguma. Eles acabaram muito antes de alcançarmos
qualquer coisa eterna e absoluta. Mas o caminho a que nos trouxe este capítulo aponta para Deus, o
Eterno, para quem “a eternidade no coração do homem” (3:11) foi criada para ali habitar e viver.
v.13“porque isto é todo o dever do homem” no hebraico poderia ser traduzido assim: “porque isto é o todo
do homem”. É verdade que, entre outras coisas, é o seu dever; mas o hebraico não diz isso; deixa esse todo
indefinido, afirmando, desta forma, a confissão de Agostinho que ilustra o título desta lição.
A terceira sugestão do Eclesiastes para quem quer viver bem é a devoção reverente. Seu conselho é simples
e direto: “Tema a Deus e guarde seus mandamentos” (12:13). Temor é diferente de medo. O temor é uma
espécie de reverência que nos deixa pasmos diante da santidade que chega às raias da beleza. O medo
congela e paralisa, o temor inspira a caminhar com sabedoria. Seja um devoto reverente. Essa sugestão
vem a reboque de outro comentário do Eclesiastes: “o ímpio pode cometer uma centena de crimes e apesar
disso, ter uma vida longa, mas sei muito bem que as coisas serão melhores para os que temem a Deus”
(8:12-13).
Quando o Eclesiastes diz que “as coisas serão melhores para os que temem a Deus” está se referindo ao
julgamento divino. Independente das coisas ruins que a vida nos reserva, Deus não coloca seus filhos numa
bolha de proteção. Apesar dos muitos adversários que os justos podem colecionar, nada melhor do que
dormir com a consciência tranquila. O Dia do Juízo vai chegar: “Deus trará a julgamento tudo o que foi feito,
inclusive tudo o que está escondido, seja bom, seja mau”, e nesse dia, finalmente, compreenderemos que
“as coisas serão melhores para os que temem a Deus”.
Teme a Deus é uma convocação que nos coloca no nosso devido lugar, e a todos os demais temores,
esperanças e perplexidades nos seus devidos lugares. Se Deus se importa tanto assim com os fatos da
nossa vida, então nada pode ser sem sentido.
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