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26 de Março a 01 de Abril de 2007 nº 369
A solução é a agroecologia, diz Marc Dufumier
Na última semana, o Núcleo de Estudos
Agrários e Desenvolvimento Rural (NEAD) do
Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA)
recebeu a visita do especialista em
desenvolvimento rural Marc Dufumier (foto). O
pesquisador é engenheiro agrônomo e diretor da
Unidade de Formação e Pesquisa “Agricultura
Comparada e Desenvolvimento Agrícola” do
Instituto Agro-Paris-Tech, antigo Instituto Nacional Agronômico Paris-Grinon, na
França.
Dufumier, autor de publicações como Agriculture et paysanneries des Tiers
mondes (Karthala, Paris, 2004), participou de um ciclo de palestras e encontros
com autoridades e organizações da sociedade civil em Brasília. No dia 22 de
março, os temas tratados foram “Políticas e os programas de desenvolvimento
rural no Sul do mundo” e “Campesinato, segurança e soberania alimentar”.
Em entrevista ao NEAD Notícias Agrárias, Dufumier falou sobre a questão da
agricultura e dos OGM – Organismos Geneticamente Modificados, assuntos
também abordados na palestra “Agricultura Sustentável e Transgênicos podem
coexistir?” realizada pelo pesquisador na Universidade de Brasília (UnB) no dia
23. Confira:
NEAD Notícias Agrárias - É possível que a agricultura sustentável possa ser
desenvolvida ao lado do crescimento da liberação dos transgênicos?
Marc Dufumier - Definitivamente não. Antes mesmo dos transgênicos, com a
agricultura convencional, já eram encontrados problemas de não-sustentabilidade
nos sistemas de culturas e criação de animais com o que se chamou de
Revolução Verde. Antes da Revolução Verde, a seleção genética era feita pelos
próprios produtores. Os agricultores e criadores selecionavam as variedades e as
raças animais, mas conforme o ecossistema, ou seja, eram escolhidos os que
melhor podiam crescer e se desenvolver em seus distintos ecossistemas. Era a
criação de variedades adaptadas a lugares e sítios ecológicos diversos.
Com a Revolução Verde, antes dos transgênicos, já há uma mudança no conceito
da seleção genética. Foi uma seleção por parte de empresas privadas ou públicas
com uma inversão de capital muito alta, buscando gerar poucas variedades que
pudessem se desenvolver em muitos lugares. A idéia era basicamente a economia
de escala. Isso foi feito em campos experimentais, comparando o rendimento das
distintas variedades, mas em condições totalmente controladas. Era necessário
provar que as diferenças de rendimento provinham do fator de variedade e não de
outras causas, como uma erva daninha, ou pragas, ou outras enfermidades, ou
ainda fertilidade do solo; era importante assegurar que a diferença do rendimento
provinha do fator genético. Dessa forma, para eliminar pragas e diferenças de
fertilidade naturais do solo, teve início a utilização de agrotóxicos, pesticidas,
herbicidas e fertilizantes.
É importante lembrarmos que foi feita uma avaliação das variedades em
condições que já não são as de pequenos produtores, são condições altamente
artificializadas. Somente os agricultores capazes de artificializar e simplificar o
ecossistema com agrotóxicos e máquinas poderiam comprar essas sementes.
Como sabemos, um ecossistema mais simples e com menos biodiversidade é um
ecossistema sumamente frágil.
O desenvolvimento de transgênicos pretende corrigir os problemas da Revolução
Verde, com o desenvolvimento de sementes resistentes a herbicidas totais como o
glifosato ou o glifosinato de amônio. Isso significa, entretanto, mais simplificação e
mais fragilização do ecossistema, com a ampliação das monoculturas. E, ainda, a
produtividade não aumenta tanto. Em um primeiro momento, os custos diminuem,
pois o glifosato elimina rapidamente a erva daninha, diminuindo a mão-de-obra.
Mas sabemos que no Sul do Brasil apareceram três ervas daninhas nas
plantações de soja, que proliferam em grandes quantidades, significando que, em
um segundo momento, vai ser preciso um outro produto químico para eliminá-las.
É muito cômodo para as transnacionais que vendem os agrotóxicos, mas não para
o produtor ao final. Sabemos também que no monocultivo há risco de aparição de
novas enfermidades.
Esses são os primeiros acontecimentos que nos permitem dizer que uma
agricultura com transgênicos não vai ser econômica nem ecologicamente
sustentável. Dentro de dez, 15 anos, vai ser pior, com mais ervas daninhas e
novas doenças.
NEAD Notícias Agrárias – Como é a questão da liberação dos transgênicos na
Europa? Países como França, Espanha e Hungria têm resistido mais aos OGM.
Marc Dufumier - Há situações bastante similares entre Brasil e Europa. Na Europa
há também conselhos consultivos de biologia para transgênicos, como a CTNBio
(Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) no Brasil. Na França, temos um
organismo mais ou menos parecido, também com representação de distintas
disciplinas científicas e com representação da sociedade civil. A pressão das
transnacionais também é igual nos diferentes lugares, com a tentativa de impor
dossiês que aprovam totalmente os transgênicos com pouco tempo de estudos.
Mas para provar que não há riscos, para que não haja incerteza, precisamos de
vários anos de avaliação. No campo de segurança alimentar, por exemplo, ou
para a liberação da comercialização de um produto farmacêutico, são necessários
vários anos de pesquisas.
A Europa talvez venha resistindo um pouco mais, mas na França, por exemplo, o
governo acaba de firmar um decreto – que não passou pela tramitação normal de
uma lei porque o Parlamento não estava de acordo – que libera sementes de
milho transgênico, e a opinião pública está totalmente contra.
NEAD Notícias Agrárias – Em artigo de sua autoria publicado recentemente no
jornal francês Le Monde Diplomatique, o senhor contestou a tese de que os OGM
poderiam contribuir para a solução do problema da fome no mundo, ressaltando
que a verdadeira saída é a valorização do saber camponês. Como, na prática,
esse saber pode ser aproveitado?
Marc Dufumier - Os que têm fome são pobres e têm fome por não possuírem
poder de compra de alimentos e não serem agricultores em nível mundial. Três
quartos da população pobre que tem fome são formados por agricultores. A quarta
parte é formada por pessoas que vivem em favelas, ou seja, foram para esses
locais devido ao êxodo rural, eram pequenos produtores que não puderam
competir.
O problema da fome deve ser resolvido com novos sistemas de produção que
permitam a essas pessoas produzirem mais com maior competitividade. O
transgênico não é a solução para pequenos produtores nessas condições, a
solução é agroecológica.
Isso significa o produtor fazer o melhor uso da energia solar em seus pedaços de
terra, criar consórcios de cultivo, por exemplo. Esta é a via que vislumbramos para
todos os que têm fome. E posso dizer que em quase todos os ecossistemas que
tive a oportunidade de visitar no mundo, mesmo na África semi-árida, há soluções
técnicas pela via agroecológica, sempre em consórcio de cultivo, com cereais e
leguminosas. Há soluções técnicas e em quase todos os lugares do mundo.
> Festival Nacional da Juventude Rural
em Brasília
> Sistemas agroflorestais são alternativa
para áreas degradadas
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