Liberdade Brasil

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Liberdade Brasil: nasce uma campanha
Plenária realizada em 20 de julho, com a presença de lideranças sindicais e
populares, parlamentares e intelectuais, deu os primeiros passos para a
organização de uma jornada nacional que pretende agitar a sociedade brasileira nos
próximos meses.
Trata-se da campanha pelo controle dos capitais financeiros, batizada,
consensualmente, por seus idealizadores com o sugestivo nome Liberdade Brasil.
Seu objetivo é demonstrar que, atualmente, o país é prisioneiro da ditadura
financeira, que suga todo o esforço produtivo nacional e torna o Estado refém dos
ambiciosos interesses da oligarquia rentista mundial. Mais do que isto: a campanha
visa apontar a urgência do Brasil adotar medidas para o controle do fluxo de
capitais.
Conforme o acordado na plenária, o lançamento oficial da jornada ocorrerá no 10º
Grito dos Excluídos, na cidade de Aparecida do Norte – SP – em 7 de setembro –
durante a manifestação anual organizada pelas pastorais da Igreja que deu um
sentido progressista, de luta por soberania e justiça, às comemorações do Dia da
Independência.
Outro momento importante para a sua difusão será o V Fórum Social Mundial, no
final de janeiro em Porto Alegre – RS. Para esquentar o clima da campanha, os
organizadores decidiram investir de imediato no trabalho de informação, com a
edição de um livrete e a criação de uma página na internet, e de formação dos
lutadores sociais. O primeiro curso de formadores foi agendado para outubro.
Ainda segundo os organizadores, a campanha deverá ganhar as ruas no primeiro
quadrimestre do próximo ano através da coleta de centenas de milhares de
assinaturas para um projeto de lei de iniciativa popular propondo medidas
concretas para o controle da entrada e saída de capitais especulativos. Este
mecanismo democrático, assegurado na Constituição de 1988, será o instrumento
legal para massificar a jornada junto aos setores populares, democráticos e
nacionalistas da sociedade. Como afirma o slogan do Grito dos Excluídos deste ano,
mudança para valer é o povo quem pode fazer. O objetivo da campanha Liberdade
Brasil é conscientizar, organizar e mobilizar a sociedade na luta contra a ditadura
do capital financeiro.
Paraíso dos especuladores
A campanha pelo controle de capitais vai adquirindo musculatura no momento
certo. Por um lado, cresce a consciência de que é impossível emplacar o tal
espetáculo do crescimento com a manutenção do tripé econômico neoliberal –
política monetária restritiva – juros altos e metas artificiais de inflação –, arrocho
fiscal – superávit primário – e livre fluxo de capitais. Mesmo a recente melhora
tênue de alguns indicadores econômicos confirma os limites desta política, sendo
encarada com cautela pelo próprio presidente Lula e taxada de vôo de galinha por
economistas opostos à ortodoxia liberal. Por outro lado, acumulam-se os sinais de
novas turbulências internacionais, com a elevação dos juros nos EUA e a atual crise
do petróleo.
Diante desse cenário, a adoção de medidas de controle da entrada e saída de
capitais especulativos é vista como indispensável para destravar o crescimento da
economia nacional e superar a grave vulnerabilidade externa do país. Ela permitiria
desatar o nó satânico do tripé neoliberal, reduzindo os juros de forma mais
acelerada e liberando os recursos hoje entesourados no Estado. Nesse sentido,
representaria uma medida estrutural no rumo das mudanças exigidas nas urnas.
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Enfrentaria a perversa lógica do capital financeiro, que saqueia o grosso das
riquezas produzidas pela nação e desestimula a produção, a geração de emprego e
renda. Dessa forma, o controle de capitais é estratégico para construção da
alternativa ao neoliberalismo.
Algumas notícias recentes só reforçam a urgência do combate à ditadura do capital
financeiro. Um estudo feito pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário –
IBPT –, com base no balanço de duas empresas, comprovou que é mais vantajoso
investir na especulação do que na produção no Brasil.
Enquanto o setor produtivo arca com até 61 impostos e taxas – o total varia
conforme o setor –, a aplicação financeira paga, no máximo, seis tributos. A
simulação indica que uma das empresas gastou com impostos o equivalente a
435% do lucro acumulado entre 1999/03; já a outra foi abocanhada em 889%. Se
tivessem investido o mesmo valor no mercado financeiro, teriam desembolsado
36,6% de impostos sobre os rendimentos.
Outra pesquisa demonstra que um investidor que fez uma aplicação conservadora
no mercado financeiro nos últimos nove anos ganhou, em média, quatro vezes mais
do que um empresário que investiu no setor produtivo. O retorno médio anual de
18,3% dos fundos DI, entre 1995 e 2003, superou em muito a rentabilidade média
de 3,6% das empresas de capital aberto não-financeiras no mesmo período. Para
Rubens Ricupero, secretário-geral da Unctad, estes números só confirmam a
libertinagem financeira existente. Numa economia que há mais de dez anos vive
sob o império de taxas de juros altíssimas, essa é a conseqüência lógica. O efeito
inevitável do desestimulo à produção é a explosão do desemprego!
Por último, como prova de que o Brasil continua sendo o paraíso dos
especuladores, vale registrar recente levantamento do Banco Central revelando
que, no primeiro trimestre deste ano, os bancos pagaram 54% a menos de
impostos. De janeiro a março, as instituições financeiras gastaram R$1,487 bilhão
em tributos; no mesmo período do ano passado, a União recebeu R$3,218 bilhões.
Estes e outros dados evidenciam que continua a prevalecer no país a lógica do
capital especulativo. Esta absurda libertinagem financeira é justificada como único
meio para atrair dinheiro externo e para manter em funcionamento nossa frágil
economia. Tudo é feito para agradar o mercado financeiro, sob o pretexto do medo
da fuga de capitais.
Batalha de idéias
Para reverter essa lógica perversa, matando o mal pela raiz, o controle do fluxo de
capitais seria o remédio mais indicado. Nessa hora, porém, surgem os adoradores
do deus-mercado para afirmar que esta medida afugentaria o capital e
representaria uma intervenção indevida do Estado no livre mercado. Como diabo
que foge da cruz, muitos xiitas neoliberais inclusive radicalizam o discurso e,
antevendo o caos, propõem maior autonomia ao Banco Central e novas medidas de
liberalização do fluxo. Difundem o mito de que o capital financeiro é intocável e de
que não há alternativas à lógica especulativa hegemônica no planeta.
Diante dessas manipulações, que contam com a amplificação da mídia venal, fica
patente que a campanha Liberdade Brasil precisará priorizar a batalha de idéias.
Intelectuais de renome, como Gonzaga Belluzzo, Ricardo Carneiro, Paul Singer e
João Sicsú, entre outros, já estão dando valiosas contribuições teóricas. Nesse
rumo, vale recomendar dois textos recentes que reforçam com sólidos argumentos
a campanha que se inicia. O primeiro, com o título controle de capitais: um bem
necessário?, foi publicado na revista do Instituto de Economia da Unicamp; já o
segundo, assinado por César Benjamin, saiu no sitio Outro Brasil.
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Entre outros aportes, o primeiro artigo detona por completo a tese de que a
restrição dos fluxos levaria ao colapso a economia. Após detalharem as
experiências do Chile, Malásia e China, que há tempos aplicam distintos
instrumentos diretos – administrativos – e indiretos – precificados – de controle da
entrada e saída de capitais, os autores chegam exatamente à conclusão oposta.
Para eles, tais medidas reforçam as defesas da economia diante das turbulências
mundiais e permitem a retomada do crescimento. O caso mais citado é o da China,
que adota controles duradouros e extensivos, o que permitiu ao país escapar da
grave crise asiática em 1997/98 e ainda ser o recordista mundial na captação de
investimentos diretos do exterior.
Conforme demonstram as diferentes formas de controle costumam conferir maior
autonomia na gestão de políticas macroeconômicas, que ganha independência
perante os mercados financeiros de curto prazo... Os controles de capital tendem a
reduzir o poder de veto dos agentes do mercado internacional a políticas prócrescimento, reforçando a autonomia da política econômica para canalizar a riqueza
financeira e o animal spirits dos empresários mais para investimento em ativos de
capital fixo, geradores de renda e emprego, e menos para os ganhos especulativos,
de curto prazo, em mercados de ativos líquidos.
Já o artigo de César Benjamin, escrito em parceria com Rômulo Tavares, tem o
mérito de desmascarar outro mito neoliberal: a de que o controle de capitais é uma
experiência aventureira, sem fundamentação teórica. A experiência história
demonstra o contrário. Até quase final do século XX, nenhum economista sério, de
qualquer filiação doutrinária, considerou digna de exame a idéia de que países com
contas externas vulneráveis pudessem liberar os movimentos de capital. Todo o
pensamento econômico consolidado e tradicional não só defende, mas recomenda e
muitas vezes exige a regulamentação.
Tanto isto é verdade que a Conferência de Bretton Woods – 1944 –, berço do FMI,
recomendou o controle dos fluxos de capitais. Ele sempre foi regra, nunca exceção.
Até mesmo dos EUA lançaram mão desse controle quando, na década de 1960,
instituíram o chamado ‘imposto de equalização’ sobre a saída de capitais que
migravam para a Europa. No Velho Continente, todos os países, inclusive a liberal
Inglaterra, usaram controles extensamente até a década de 1990. O Japão, na
prática, os mantém até hoje, apesar das pressões norte-americanas. A
desregulamentação da conta de capitais nos países periféricos só começou nessa
década, e em poucos anos produziu crises em todos os continentes... No Brasil, ela
foi impulsionada pelo governo Fernando Collor, aprofundada pelo governo FHC e
mantida pelo governo de Lula.
Para corroborar com toda essa argumentação, o FMI acaba de divulgar relatório
revelando que dos 186 países membros do organismo, apenas dez não adotam
nenhum tipo de controle de capitais. Na maioria dos casos, as medidas são tímidas,
geralmente cosméticas, e tiveram seu alcance ainda mais reduzido nos últimos
anos – como no Brasil. O FMI lembra que o artigo 6º de seu estatuto afirma que os
países podem impor os controles necessários para regular movimentos de capitais,
visando prevenir fugas de capitais em momentos de crise. Como se observa, a
campanha Liberdade Brasil tem sólidos argumentos para contagiar a sociedade e
interferir nos rumos da economia. O fundamental, agora, é colocar o bloco na rua!
Fonte
BORGES, Altamiro. Liberdade Brasil: nasce uma campanha. Disponível em: <
http://altamiroborges.blogspot.com/2008/11/crise-mundial-e-controle-de-capitais1.html>. Acesso em: 09 dez. 2008.
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