Método clínico-qualitativa

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O SOFRIMENTO DA MULHER MASTECTOMIZADA DIANTE DAS DEMANDAS
DO CONTEMPORÂNEO: UM OLHAR PSICANALÍTICO
SUFFERING IN WOMEN WITH MASTECTOMIES FRONT OF CONTEMPORARY
DEMANDS: A LOOK PSYCHOANALYTIC
Ana Beatriz Veneroni Hech
[email protected]
Mikhaéle Vanessa de Sousa Andrade
[email protected]
Nayara Maciel Cintra
[email protected]
Graduandas- UNISALESIANO Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium
Profº Orientador:Prof.º Dr. Orientador: José Ricardo Lopes Garcia
Titulação: Doutor em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo, USP,
Brasil
RESUMO
O câncer de mama é uma das neoplasias que mais atingem a população,
gerando sofrimento físico e psíquico, sendo que o órgão atingido é muito
significativo na vida da mulher devido suas representações (INCA, 2014c). Assim,
tal trabalho tem como objetivo analisar sob a ótica da psicanálise a relação entre a
feminilidade, estética e a experiência corporal das mulheres, identificando a
interferência deste processo nos papéis sociais, compreendendo assim o
sofrimento decorrente da mastectomia. Desta forma, entrevistamos seis mulheres
que tiveram câncer de mama e que se submeteram à mastectomia preventiva,
sendo essas usuárias do Sistema Único de Saúde (SUS) pelo serviço de Unidade
Básica de Saúde (UBS) da cidade de Lins-SP. Os dados coletados mediante a
entrevista semiestruturada foram analisados por meio da análise de conteúdo.
Assim, consideramos que o câncer possui a representação de uma ameaça à
vida, suscitando sentimentos na pessoa enferma e nos sujeitos que compartilham
dessa vivência. Propiciando uma reorganização familiar podendo consolidar ou
fragilizar os laços afetivos. A proposta cirúrgica provocou medo e ansiedade diante
dos
padrões
estéticos
postulados
na
contemporaneidade,
visto
que
o
procedimento propiciou modificações na vida social e pessoal da paciente,
produzindo alterações na autoimagem e autoestima, influências na vivência da
feminilidade e sentimentos de valor e papel diminuído.
Palavras-chave:
Câncer
de
Mama.
Mastectomia.
Mulher.
Psicanálise.
Feminilidade. Família.
ABSTRACT
Breast cancer is one of the cancers that most affect the population,
generating physical and psychological suffering, and the target organ is very
significant in women's lives because their representations (INCI, 2014c). So this
work is to analyze from the perspective of psychoanalysis the relationship between
femininity, beauty and body experience of women, identifying the interference of
this process in social roles, and therefore understanding the suffering caused by
mastectomy. Thus, we interviewed six women who had a diagnosis of breast
cancer and who underwent preventive mastectomy, and these users of the Unified
Health System (SUS) for the service of a Basic Health Unit (UBS) in the city of
Lins-SP. The data collected through semi-structured interviews were analyzed
using content analysis. However, we consider that the cancer has the
representation of a threat to life, giving rise to feelings in the sick person and those
who share this experience. Providing a family reorganization may consolidate or
weaken the emotional ties. Surgical proposal provoked fear and anxiety about the
aesthetic standards postulates nowadays, since the procedure provided changes
in the social and personal life of the patient, producing changes in self-image and
self-esteem, influences the experience of femininity and feelings of worth and
diminished role.
Keywords: Breast Cancer. Mastectomy. Women. Psychoanalysis. Femininity.
Family.
INTRODUÇÃO
Segundo o Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva
(INCA, 2014e), câncer é o nome usado para denominar mais de cem tipos de
doenças. O processo de formação, em geral ocorre lentamente, podendo demorar
anos para que uma célula cancerosa se multiplique e resulte num tumor visível.
Informações advindas do INCA (2014a) ressaltam que os agentes cancerígenos
são responsáveis pela iniciação, instauração, avanço e inibição do tumor. Não se
pode excluir o fato de que fatores externos e internos podem se inter-relacionarem
potencializando o risco da formação do câncer.
De acordo com o INCA (2014c) o câncer de mama é o segundo tipo de
câncer mais frequente entre as mulheres no mundo, respondendo por 22% dos
casos novos a cada ano. O câncer de mama divide-se em subtipos, sendo estes o
carcinoma ductal in situ e o carcinoma ductal invasivo. Com a realização mensal
do autoexame ou ao palpar a mama, é possível perceber o aparecimento de
nódulos indolores, surgimento de manchas, inchaço em parte do seio, irritação da
pele ou aparecimento de irregularidades na pele.
Segundo dados do A. C. Camargo Câncer Center (2014b), dentre as
possibilidades terapêuticas dessa modalidade, estão o tratamento localizado, que
tem como objetivo tratar o tumor sem afetar o restante do organismo, como a
cirurgia e a radiação. E o tratamento sistêmico, que atinge todo o corpo, como no
caso da quimioterapia, hormoterapia e imunoterapia.
O tratamento do câncer de mama representa um grande avanço para a
saúde da mulher, e um dos tratamentos mais utilizado consiste na realização de
cirurgia para retirada da massa tumoral, denominada mastectomia. Esta é uma
cirurgia de retirada total ou parcial da mama, associada ou não à retirada dos
gânglios linfáticos da axila (esvaziamento axilar) (INCA, 2014d).
Vale ressaltar que antes da constatação do tumor, existe outra modalidade
de mastectomia, que tem como objetivo a prevenção. Neste caso, a mastectomia
preventiva ou profilática é indicada para mulheres que possuem diagnóstico
precoce sob alto índice do desenvolvimento de câncer de mama.
Neste sentido, atualmente há possibilidades de restaurar a forma,
aparência e tamanho da mama após a retirada total ou parcial da mama, com
utilização do silicone ou a partir da retirada do tecido do abdômen. Os resultados
da reconstrução da mama podem ser muito satisfatórios, minimizando o impacto
físico e psicológico, representando uma possibilidade de reabilitação bastante
atual para as mulheres que necessitam realizar a mastectomia radical como o
tratamento principal para o câncer de mama. (DUARTE; ANDRADE, 2003).
Segundo o A.C Camargo Câncer Center (2014a) o câncer de mama é
considerado entre as mulheres uma das doenças mais temidas, tanto pelo aspecto
físico (pela possibilidade de uma mastectomia), quanto pelo aspecto psicológico.
A mama é um órgão dotado de uma representação simbólica muito importante
para a mulher, que perpassam pela feminilidade, maternidade, sexualidade e a
autoestima, fatores estes que podem ser alterados pelo processo da mastectomia.
O diagnóstico de câncer tem, geralmente, um efeito devastador na
vida da pessoa que o recebe, seja pelo temor às mutilações e
desfigurações que os tratamentos podem provocar, seja pelo
medo da morte ou pelas muitas perdas, nas esferas emocional,
social e material, que quase sempre ocorrem. Portanto, a atenção
ao impacto emocional causado pela doença é imprescindível na
assistência ao paciente oncológico. (SILVA, 2008, p. 232)
Entender o sofrimento da mulher com câncer de mama ligado às
demandas do contemporâneo é de extrema importância para adentrarmos no
universo psíquico da mesma, considerando que aspectos culturais, sociais e as
representações do feminino atuais interferem diretamente no modo com que essas
mulheres lidam com a nova condição de adoecida.
É inegável que na atualidade a imagem corporal está cada vez mais ligada
com a hermenêutica subjetiva do auto conceito, as mulheres estão incorporando
sua identidade através da projeção corporal regida pela padronização dos poderes
sociais. Ressaltando que essa construção está determinada pelo momento
histórico, interligadas situações do cotidiano e variando de acordo com o ambiente
que encontra-se inserida.
No processo histórico da mulher brasileira, consta-se que a gênese da
representação feminina originou-se da subordinação ao sistema patriarcal, seu
papel restringia-se a procriação/amamentação, educação dos filhos e cuidados do
lar. Atualmente, na sociedade do espetáculo, as mulheres realizam a passagem
da subordinação ao patriarca para subordinação dos poderes e discursos
idealistas da mídia. Nesse aspecto, Valença (2003) reflete o lugar ocupado pelo
feminino na contemporaneidade ao expor a ênfase adotada ao redor da imagem
corporal e do narcisismo, posto que produções de subjetividades marcam a
atualidade, alterando a própria configuração ao trazer um novo modelo de
feminilidade:
A mulher, dos nossos dias, experiência a sua sexualidade voltada
para o corpo, obtendo o prazer no corpo narcísico e no cultivo
desse corpo, para que ele se mantenha belo e desejado,
reconhecido e valorizado na cena espetacular. (p. 71)
A autora traz a contribuição da Psicanálise no contexto ocupado pelo
feminino na contemporaneidade. Ela recorda que no período Freudiano, as
histéricas espetaculosas eram percebidas de forma negativa e hoje com o advento
da mídia e dispositivos culturais é convidada a investir libidinalmente em seu
próprio corpo, exibi-lo e erotizá-lo em excesso.
Com as leituras freudianas podemos compreender a representatividade do
corpo para a mulher através da descoberta da castração, que fez com que a
mulher se voltasse para ele como uma “tentativa de suprir a falta do falo”.1
Wolff analisa ainda, que a castração é um processo em que a mulher
reconhece que não há prazer no falo devido sua castração, porém ela transforma
seu desejo num investimento narcísico de seu corpo (2009). Assim o corpo
simbólico passa a ter um significado a mais para elas, pois representará a mulher
na sua delicadeza, saúde e juventude, e que possui o poder de atrair o outro.
Essa conversão do investimento da mulher nos auxilia a compreender a
complexidade da mulher, pois a partir desse conceito podem ser explicadas
algumas características psíquicas presentes nas mulheres e que tem uma
intensidade maior do que em homens, como por exemplo, a vergonha, o ciúmes, a
vaidade e a necessidade de ser amada.
Através de todos esses conceitos psicanalíticos que traz com que a
mulher sempre sofreu com a “impotência e a falta”
2e
com os padrões da
sociedade contemporânea, podemos perceber a preocupação da mulher atual
com o corpo até mesmo com fatores externos, pois sabemos que existe uma forte
influência do modelo exigido pela mídia e pela sociedade em si, que determina
com rigidez o manequim e os aspectos femininos ideais, no qual a mulher tende a
se espelhar.
Sobre o ser feminino são esperadas algumas vaidades e condutas para
que a mesma seja de fato reconhecida na sociedade e para que ela mesma a
reconheça. Alguns exemplos das principais buscas são os de ser mãe, esposa,
saudável
e
bela,
assim
a
mulher
que
“não
cumprir”3
as
exigências
contemporâneas pode sentir-se incompleta, ou seja, estaria transgredindo as
normas e padrões, não atingindo o ideal de mulher.
Nesse sentido, o sistema familiar pode propiciar a proteção e garantia da
sobrevivência da espécie humana, que inicia desde os primeiros anos e pode se
1
GRIFO NOSSO
2
GRIFO NOSSO
3
GRIFO NOSSO
estender até o fim da vida. Além disso, a família fornece o alimento afetivo e
respalda no controle das emoções e dificuldades encontradas ao longo de sua
existência. (OSORIO, 2002)
Mas vale ressaltar ainda que tais características não são encontradas em
todas famílias, devido a interferência de diversos fatores, como sociais,
ambientais, econômicos, sociais, e pelo fato de existir várias modalidades e
organizações familiares.
Assim ao falar da mulher mastectomizada, nos damos conta que os
impactos decorrentes da situação não afetam apenas a pessoa em questão, e sim
todos os sujeitos envolvidos, ou seja, todos que estão próximos são atingidos de
alguma forma, porém uma situação de crise pode propiciar uma reorganização do
sistema familiar.
Então, quando a família possui uma boa relação, comunicação e união, ao
se deparem com tal situação, o grupo tende a se consolidar em benefício da
mulher acometida, fornecendo afeto, auxílio nas necessidades e cuidados
decorrentes do tratamento. Assim serão contribuintes para uma melhor aceitação
do estado atual e auxilia também a criação de uma estabilidade na luta contra a
doença. (ALMEIDA, 2006).
De fato, o apoio familiar é muito importante para as mulheres
mastectomizadas, é fonte de suporte para as pacientes. Porém não se pode
definir que sempre irá existir, pois é necessário levar em conta que a família
também sofre com diversos fatores e possui uma estrutura familiar que pode ser
ou não capaz de superar fatores estressores e intensos como no caso do câncer,
que irá exigir uma reorganização em prol das situações futuras.
MÉTODO
Método clínico-qualitativa
A pesquisa foi realizada com base na abordagem do método clínicoqualitativa que é multimetodológica, e dentre eles incluem a abordagem
interpretativa e naturalística. Turato (2000) descreve que a inclusão da expressão
clínico-qualitativo refere-se ao estudo teórico da descrição e análise da vivência do
sujeito no setting da saúde.
O autor afirma que os sentidos e os significados dos fenômenos são o
cerne para os pesquisadores qualitativos. Em destaque, as maiores metas do
pesquisador frente à entrevista (método escolhido para coleta de dados de nossa
pesquisa), é ouvir, observar a entrevistada, bem como se sujeitar as
interpretações do que pode ser trazido à luz, ou seja, as demonstrações de
sentimentos psicológicos de uma pessoa só ocorrem enquanto situados.
Participantes
Foram pesquisadas seis mulheres que tiveram o diagnóstico do câncer de
mama e que realizaram tratamento de neoplasia mamária submetendo-se à
mastectomia preventiva. Sendo essas usuárias do Sistema Único de Saúde (SUS)
pelo serviço de Unidade Básica de Saúde (UBS) do município de Lins-SP, com
idades compreendidas entre 44 e 66 anos de idade.
Neste estudo analisamos se as mulheres que passaram pelo processo
cirúrgico de retirada da mama (mastectomia) por decorrência do câncer de mama
sofrem com o processo em si, as possíveis interferências que este acontecimento
pode ter tido nas suas relações afetivas e/ou sexuais e as influências do mundo
contemporâneo.
Após a aprovação da pesquisa em 05 de Agosto de 2014 pelo Comitê de
Ética sob o processo nº 738.668, foi feito um levantamento da população através
de prontuários da Unidade Básica de Saúde “Dr Nilton Nicolau Naufal” e “Dr
Mohanna Adas”, e as entrevistas foram realizadas na Unidade Básica de Saúde
“Dr Nilton Nicolau Naufal” e Clínica-escola do Unisalesiano da cidade de Lins.
Com o objetivo de respaldar as participantes e o pesquisador envolvido,
sob qualquer eventualidade em virtude da pesquisa, apresentamos o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Instrumento
Para
coleta
de
dados
foi
utilizado
o
instrumento
de
entrevista
semiestruturada, pois este possibilita a interação de ambos os envolvidos na
entrevista, assim como descrito por Turato:
A escolha pela entrevista semidirigida, como instrumento auxiliar
para a pesquisa clínico-qualitativa, dá-se então pelo motivo de que
ambos os integrantes da relação têm momentos para dar alguma
direção, representando ganho para reunir os dados segundo os
objetivos propostos. (2003, p. 313)
As entrevistas foram elaboradas com o objetivo de abordar os temas que
responderam aos objetivos dessa pesquisa. Assim elencamos os principais
aspectos como categorias, que são eles: câncer, mastectomia e família.
Método de Análise de Conteúdo
Na realização desta pesquisa científica utilizamos o método de análise de
conteúdo, ferramenta que é utilizada para a análise de dados qualitativos no
campo da saúde. Assim após a coleta de dados, buscamos descobrir
singularidades que ampliaram nosso conhecimento e familiarizamos com essa
técnica propondo uma síntese de sua gênese que ainda é muito recente se
compararmos com o método quantitativo.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Sabe-se que os métodos de diagnóstico e tratamento para o câncer tem
tido progresso no que diz respeito à medicina e aos avanços tecnológicos.
Entretanto, essa doença ainda é vista como uma “sentença de morte”, ou seja, o
acometido por tal doença passa a acreditar que sua vida está sob ameaça. Ao
estudarmos as experiências e vivências da mulher com câncer de mama,
percebemos que tal significação é mantida e que acarreta grande sofrimento em
todos os âmbitos de sua vida.
Segundo Salci; Sales; Marcon (2009) com o impacto da nova realidade, ou
seja, sabendo de seu diagnóstico, a mulher a se ver acometida pelo câncer de
mama depara-se com o medo da morte e com a incerteza do amanhã, mesmo
tendo consciência dos avanços tecnológicos e de tratamento para tal. Elas
apresentam uma difícil elaboração e aceitação da sua nova condição e deparamse com uma multiplicidade de sentimentos onde inicia-se a experiência de viver
uma nova identidade, esta que pode comprometer o bem estar físico, mental e
social. Para Duarte e Andrade (2003) o diagnóstico de câncer é visto como uma
ameaça para a mulher e sua família em todas as esferas de sua vida. Neste
sentido, nota-se que o câncer de mama deve ser abordado por uma equipe
interdisciplinar composta por médico, enfermeiro, psicólogo, fisioterapeuta,
terapeuta ocupacional, assistente social e nutricionista, cuja intervenção deve
abranger o diagnóstico, durante e após o tratamento, recorrência da doença e
cuidados paliativos, identificando as necessidades da mulher em cada etapa, de
modo a evitar ou amenizar as consequências negativas da doença e dos
tratamentos. Inca (Instituto Nacional do Câncer)4 (2004, apud, SANTOS, 2012).
A Cirurgia é uma das formas de tratamento de câncer, considerada parte
importante do processo. Notamos que o enfrentamento sobre possível realização
de cirurgia mamária provoca medo e ansiedade nas mulheres, além disso, a
autoestima e autoimagem podem ser influenciadas pela alteração da imagem
corporal. A insatisfação com o próprio corpo após a cirurgia, processo
radioterápico e quimioterápico relaciona-se à dependência física, abandono do
4
INSTITUTO NACIONAL DO CANCER. Controle do Câncer de Mama. Documento de Consenso. Rio de
Janeiro, 2004.
emprego e a impossibilidade de continuar a realizar os serviços domésticos. Neste
sentido, percebemos a produção de sofrimento, já que sentiram seu valor
diminuído e papel perdido.
As incompletudes vivenciadas pelas pacientes as tornam sujeitos
desejantes, uma vez que o investimento libidinal se dá no sentido de compor a
falta. No entanto, a falta vivida por essas mulheres quando se observam mutiladas
pela ausência do seio parece corresponder ao signo da castração.
Embora possa haver o investimento pela falta, nesse caso nos parece que
ausência enuncia a impotência. O seio, muitas vezes visto com elemento fálico no
corpo feminino, na experiência da mastectomia é tomado pela mulher como
experiência concreta da ameaça vivida pela angústia de castração.
Almeida (2010) explica que na abordagem psicanalítica o seio ocupa um
lugar importante e singular. É um órgão definidor na vida da mulher, cheio de
investimento erógeno e ao ser mutilado fere a própria essência da feminilidade e
altera a percepção do corpo elencando sentimentos de baixa autoestima,
mobilizando sentimentos de inferioridade e medo da rejeição.
O câncer de mama acarreta muitas alterações estruturais da mulher tanto
da parte física como psíquica. Ele atinge um órgão representante da
amamentação e sexualidade, que a concretiza como mulher de fato. Então, é
esperado que ao receber o diagnóstico do carcinoma mamário surjam receios
quanto ao andamento da sua relação conjugal e/ou afetivo-sexual.
Sabemos que as modificações decorrentes do câncer dependerão de
como as relações foram estabelecidas anteriormente e da capacidade pessoal e
da dinâmica familiar em questão, pois tanto a pessoa acometida, quanto as
pessoas que estão ao seu redor sofrem interferência deste momento de crise. É
perceptível também que esse momento além de ser considerado crítico, é também
um promovedor de ressignificações pessoais, familiares e até sociais que poderão
ser tanto positivas como negativas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir desta pesquisa foi possível perceber que o câncer de mama ainda
possui uma representação de morte, ou seja, as pessoas acometidas pela
neoplasia sentem-se inseguras quanto a possibilidade de cura e vivenciam a
sensação iminente de risco à vida.
O surgimento dessa nova situação implica numa reorganização familiar,
sendo que esta pode se dar de forma positiva ou negativa, aprofundando,
ampliando ou rompendo os laços. Percebemos através dos relatos a importância
do apoio familiar para o enfrentamento da enfermidade, visto que seus membros
são um dos principais colaboradores/fornecedores do sustento afetivo e de outras
necessidades advindas dessa nova condição.
Evidenciamos uma interferência nas relações conjugais e/ou afetivosexuais na rotina das mulheres que participaram dessa pesquisa devido a
mutilação ocasionada pela mastectomia, implicando em receios e sentimentos de
inferioridade quanto às suas experiências sexuais.
Embora os recursos terapêuticos e de cuidados de reparação estética
tenham avançado consideravelmente, a mastectomia provocou um sofrimento
importante para as mulheres diante das expectativas postuladas sobre padrões
estéticos próprios da contemporaneidade.
A cirurgia influenciou a insatisfação com o próprio corpo produzindo
sofrimento, alterações na autoestima e autoimagem, sentimentos de inferioridade
e medo da rejeição. Visto que no campo feminino ocorreram modificações na vida
pessoal e social das pacientes, a cirurgia foi relacionada às influências na vivência
da feminilidade, pois sentiram seu valor e papel diminuído, já que este em alguns
casos traz o agravante da perda do cabelo e mutilação dos seios.
Compreendendo que os seios assume a representação de um dos
elementos mais importantes na integração da imagem corporal feminina,
entendemos com isso que a reconstrução da mama pode colaborar para
autoimagem e autoestima dessas pacientes.
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