algodoeiros de fundo de quintal dos estados do

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ALGODOEIROS DE FUNDO DE QUINTAL DOS ESTADOS DO PARÁ E DO AMAPÁ
Vanessa Cavalcante de Almeida (Embrapa Algodão), Paulo Augusto Vianna Barroso (Embrapa Algodão /
[email protected]), Joaquim Nunes da Costa (Embrapa Algodão), Valeska Silva Lucena (Embrapa
Algodão), Jeane Ferreira Jerônimo (UFPE)
RESUMO - Acredita-se que parte da variabilidade genética de G. barbadense presente nos estados esteja
sendo perdida. O primeiro passo para reduzir a perda de diversidade e estabelecer estratégias de
conservação in situ e ex situ é realizar um diagnóstico de como a espécie se encontra nos locais em que
ocorre. Este trabalho teve como objetivo identificar o modo com que algodoeiros arbóreos são mantidos
nos estados do Pará e Amapá. A caracterização in situ foi realizada por entrevistas com os proprietários
das plantas e pela análise do ambiente em que estavam inseridas. Coletou-se 179 plantas em 21
municípios do Pará e 117 em nove cidades do Amapá. A maioria das plantas é da espécie G. barbadense
e está presente em fundos de quintais. No estado do Amapá predomina a variedade botânica barbadense
ou quebradinho, enquanto que no Pará predomina a variedade brasiliense ou rim-de-boi. Como não foram
encontradas plantas em ambientes naturais nos dois estados, a criação de reservas e o emprego de outros
métodos convencionais de manutenção in situ não parecem ser aplicáveis a G. barbadense nesses
estados. Sendo assim, a adequada conservação dessa espécie deve ser realizada em coleções de
germoplasma mantidas ex situ.
Palavras-chave: Gossypium barbadense, germoplasma, conservação.
INTRODUÇÃO
O uso de Gossypium barbadense L.autor no país é antigo, sendo cultivado por indígenas antes da
chegada de Cabral ao Brasil. Embora não seja nativa do país, sua origem é atribuída ao sul do Equador e
norte do Peru (BRUBAKER et al., 1999). Acredita-se que um processo de perda de diversidade
relativamente grande esteja ocorrendo com a espécie, em virtude de problemas econômicos, culturais e
agrícolas (BARROSO et al., 2005b). Além disso, parte das áreas em que este algodoeiro ocorre está
sendo, aos poucos, ocupada pelo plantio do algodoeiro herbáceo.
Na atualidade, a região Norte do País é responsável pelo plantio de, apenas, 1344 hectares com
algodão herbáceo, produzindo 2847 toneladas de algodão (IBGE, 2005). Uma eventual expansão da
lavoura para os cerrados da Região Norte pode ser acompanhada por alterações em costumes e tradições
associadas ao uso e manutenção de G. barbadense, como o ocorrido no Mato Grosso (BARROSO et al.,
2005a). O primeiro passo para reduzir a perda de diversidade e estabelecer estratégias de conservação in
situ é realizar um diagnóstico de como a espécie se encontra nos locais em que ocorre (BARROSO et al.,
2005b).
Este trabalho descreve o modo com que algodoeiros arbóreos são mantidos nos estados do Pará e
do Amapá.
MATERIAL E MÉTODOS
Realizaram-se expedições em Novembro de 2004, visando caracterizar as populações de G.
barbadense e de outros tipos de algodoeiros ocorrentes nos estados do Pará e Amapá. A caracterização in
situ de G. barbadense foi realizada por meio de entrevista ao proprietário da planta, da análise do ambiente
em que as plantas estavam inseridas e de observações culturais e fenológicas. Os dados foram tabulados
e sistematizados em gráficos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
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80
60
Amapá
40
Pará
20
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Frequência relativa (%)
Foram coletadas 179 amostras de plantas em 21 municípios no estado do Pará e 117 amostras de
plantas em nove municípios do estado do Amapá.
Tanto no Pará como no Amapá, a maioria das plantas foi encontrada em propriedades urbanas,
82% e 68%, respectivamente. Poucas plantas foram encontradas em residência rural e apenas algumas
em beira de estrada e em pequenas e médias propriedades (Fig. 1). A freqüência de domicílios e de
habitantes em zonas urbanas é de 68,4 e 66,5% no Pará , respectivamente. Enquanto que, no Amapá,
88,9% dos domicílios e 89,0% dos habitantes estão na zona urbana (IBGE, 2000). Portanto, para ambos os
estados, a freqüência de plantas coletadas em domicílios na zona urbana é similar à população e à
freqüência de residências nestes locais. Sendo assim, a proporção de residências na zona urbana e rural
que contêm plantas de G. barbadense é similar.
Tipo de propriedade
Figura 1. Percentagem de plantas segundo o tipo de propriedade.
A espécie G. barbadense prevaleceu em ambos os estados, sendo encontrados apenas 2% e 6%
de acessos pertencentes à G. hirsutum no Amapá e no Pará, respectivamente (Fig. 2). As plantas ocorrem
em fundo de quintal, beira de estradas e de modo espontâneo (Fig. 3). Da mesma forma que relatado por
Barroso et al. (2005a) para o estado do Mato Grosso, as plantas de fundo de quintal foram mais
freqüentes, sendo usadas principalmente para fins medicinais.
Frequência relativa (%)
100
80
60
Amapá
Pará
40
20
0
G. barbadense
G. hirsutum
Espécie
Figura 2. Percentual de plantas coletadas segundo a espécie.
Frequência relativa (%)
100
80
60
Amapá
Pará
40
20
0
Fundo quintal
Beira estrada
Espontânea
Tipo de População
Figura 3. Percentual de plantas segundo o tipo de população.
As populações dos dois estados diferiram quanto à coloração das folhas e à frequência de plantas
com sementes aderidas (tipo rim-de-boi). No Pará, as sementes de cada loja do fruto estavam
predominantemente ligadas umas às outras, formando estrutura conhecida como rim-de-boi, e uma
proporção relativamente alta das plantas possuíam folhas roxas (Figs. 4 e 5). No Amapá, predominavam as
sementes soltas e a proporção de plantas com folhas roxas foi muito inferior ao observado nas plantas
provenientes do Pará. O tipo de semente remete à variedade botânica de G. barbadense, sementes unidas
caracterizam a variedade brasiliense e sementes separadas caracterizam a variedade barbadense. A
predominância de plantas com sementes agrupadas e a grande proporção de indivíduos com folhas roxas
no Pará provavelmente deve-se à população deste estado atribuir propriedades medicinais mais intensas
em indivíduos com estas características. No Mato Grosso, também se atribui propriedades medicinais mais
intensas em algodoeiros com sementes tipo rim-de-boi (BARROSO et al., 2005a).
Frequência relativa (%)
100
80
60
Amapá
Pará
40
20
0
Sem.
Separadas
Rim firme
Rim fraco
Sem
sementes
Tipo de Semente
Figura 4. Plantas amostradas segundo a presença e o tipo de semente
Cor da Folha - Amapá
Cor da folha - Pará
Verde
Roxa
Figura 5. Plantas amostradas segundo a cor da folha no estado do Amapá e no estado do Pará.
Tanto no Pará quanto no Amapá poucos moradores têm o hábito de armazenar ou beneficiar as
sementes. No Pará, apenas 1% dos proprietários relataram realizar o armazenamento e o beneficiamento.
No estado do Amapá 11% dos proprietários realiza o armazenamento e 17% faz o beneficiamento das
sementes. O armazenamento é feito em sacos plásticos ou em vidros com a finalidade de realizar o
replantio ou para fornecer para outras pessoas. O beneficiamento é feito exclusivamente de forma manual
e para fins doméstico da fibra, em assepsias de ferimentos e em limpezas de modo geral.
Os proprietários das plantas nessas localidades as usam exclusivamente para fins caseiros, não
sendo detectado nenhum uso têxtil da fibra, inclusive artesanal. Do mesmo modo que o observado por
Barroso et al. (2005a) no Mato Grosso, o uso medicinal é o principal motivo para a conservação de G.
barbadense no Pará e Amapá. A manutenção das plantas é feita pela parcela menos favorecida da
população, em geral, na periferia das cidades. A expansão do atendimento médico público pode resultar na
substituição de plantas medicinais por remédios alopáticos. Caso isto ocorra, as plantas de algodoeiro
podem perder sua utilidade e diminuir a freqüência com que ocorrem in situ.
As buscas em ambientes naturais nos dois estados resultaram em insucesso, concordando com o
relato de moradores sobre a ausência de algodoeiros em ambientes sem modificações humanas recentes.
Portanto a criação de reservas e o emprego de outros métodos convencionais de manutenção in situ não
são aplicáveis.
Diante das evidências de acentuada perda de diversidade genética em G. barbadense em ambos
os estados, a conservação da diversidade em bancos de germoplasma (ex situ) é a maior e melhor
garantia da preservação a longo prazo dos recursos genéticos existentes, sendo necessário intensificar as
ações de coleta e avaliação.
CONCLUSÕES
•
•
•
•
•
Gossypium barbadense é a espécie mais difundida nos dois estados;
A grande maioria das plantas é encontrada em fundo de quintal;
No estado do Amapá predomina a variedade botânica barbadense ou quebradinho, enquanto no
estado do Pará predomina a variedade brasiliense ou rim-de-boi;
A manutenção in situ de G. barbadense está intimamente ligada ao uso caseiro de diferentes
partes da planta, particularmente no preparo de medicamentos.
Mantidas as condições atuais, a apropriada conservação dos recursos genéticos de Gossypium
presentes nos dois estados deve ser realizada em coleções ex situ de germoplasma.
CONTRIBUIÇÃO PRÁTICA E CIENTÍFICA DO TRABALHO
A espécie G. barbadense tem passado por um processo de perda de diversidade genética
relativamente grande. O primeiro passo para estabelecer estratégias de conservação é realizar um
diagnóstico da situação in situ. Por meio deste estudo foi possível concluir que a conservação ex situ é o
único método capaz de manter a diversidade genética de algodoeiros que ocorrem no Pará e no Amapá.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROSO, P.A.V.; COSTA, J.N.; CIAMPI, A.Y.; RANGEL, L.E.P.,HOFFMANN, L.V. Caracterização in
situ de populações de Gossypium barbadense do estado do Mato Grosso. Campina Grande:
Embrapa Algodão, 2005a. 8p. (Comunicado Técnico, 244)
BARROSO, P.A.V.; FREIRE, E.C.; AMARAL, J.A.B.; SILVA, M.T. Zonas de exclusão de algodoeiros
transgênicos para a preservação de espécies de Gossypium nativas ou naturalizadas. Campina
Grande: Embrapa Algodão, 2005b. 7p. ( Comunicado Técnico, 242)
BRUBAKER C. L.; BOURLAND F. M.; WENDEL J. F. The origin and domestication of cotton. In: SMITH, C.
W.; COTHEN, J. T. (Ed.). Cotton: origin, history, technology and production. New York: John Wiley, 1999.
p.23-32.
IBGE. Produção agrícola municipal: cereais, leguminosas e oleaginosas. Rio de Janeiro, 2005.
IBGE. Sinopse preliminar do censo demográfico 2000. Rio de Janeiro, 2000. v.7.
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