1 INDONÉSIO CALEGARI O PRINCÍPIO DA SIMILITUDE NO TRATAMENTO DE QUEIMADURAS: RELATO DE CASO NA ESTRATÉGIA DA SAÚDE DA FAMÍLIA Dourados - MS 2011 2 INDONÉSIO CALEGARI O PRINCÍPIO DA SIMILITUDE NO TRATAMENTO DE QUEIMADURAS: RELATO DE CASO NA ESTRATÉGIA DA SAÚDE DA FAMÍLIA Relato de caso apresentado à Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, como requisito para conclusão do curso de PósGraduação em nível de especialização em Atenção Básica em Saúde da Família. Orientadora: Profa. Me. Elizandra de Queiroz Venâncio. Dourados - MS 2011 3 Dedico este trabalho a todos os pacientes que acreditaram no método e suportaram com paciência e empenho até o objetivo maior: a cura. 4 AGRADECIMENTOS Externo os meus sinceros agradecimentos àqueles que contribuíram para a efetivação deste trabalho. Aos amigos e parceiros de labor, Ana Amélia Gomes, José Carlos Godoi e Marcos Magalhães da Silva, pela colaboração prestada na fase de elaboração deste estudo. A todos os pacientes, que confiaram na força deste método e contribuíram para a avaliação da evolução do mesmo. À minha esposa, Roselinda, pelo estímulo e sugestões, e meus filhos Lara e Arthur, nova luz em minha vida. 5 “O álcool é um dos melhores remédios contra as queimaduras de todo o gênero. Quando se aplica parece, a princípio, aumentar a dor, porém é passageiro, e logo é substituído por um sentimento de agradável calma. Nunca é tão poderoso esse método como quando se submerge a parte no álcool, porém se não pode praticar a emersão, é mister manter a queimadura constantemente coberta com uma compressa embebida neste líquido.” Samuel Hahnemann (Organon da Arte de Curar, 1810). 6 RESUMO O presente relato de caso objetiva descrever as experiências vividas, em uma Unidade Básica de Saúde da Família, no período de janeiro a março de 2011, na qual se atendeu vítimas de queimaduras, sob a luz do enfoque da similitude, princípio fundamental da Homeopatia. Apresentam-se, dessa forma, dois relatos de casos, cujas evoluções dos quadros foram registradas em prontuários e também através de material fotográfico. No tratamento, realizouse um único curativo com uma solução constituída de água morna e álcool, aplicado uma única vez em forma de compressa sobre a queimadura. No que diz respeito aos cuidados póscurativo, os banhos constituíram-se apenas com a água em temperatura agradável, e mantevese a ferida seca e limpa. O procedimento realizado apresentou resultados de cura rápida, com pouca queixa de dor pelos pacientes e excelentes resultados de cicatrização. Palavras-chave: Homeopatia, Terapêutica Homeopática, Queimadura. ABSTRACT The objective of this study was to observe the action of homeopathic medicines in a Health Basic Family Unit, where victims of burns have been treated with the homeopathic method which is based on the application of the principle of therapeutic similitude, using medicines that cause effects similar to the symptoms of disease in order to stimulate the reaction of the organism against disturbances, from January 2011 to March 2011.We present two cases of burns whose medical records include reports and photographs. The treatment consisted of applying a bandage with a solution of tepid water and alcohol in the wound once only. Following this procedure patients were asked to run cold water over the burn and gently blot area dry and keep it clean. Patients had few complaints of pain and the outcome of this treatment was wound repair and regeneration. Key-Words: Homeophaty, Homeophathic Therapeutic, Burm 7 1 INTRODUÇÃO O ingresso da homeopatia efetivou-se, inicialmente, com o médico alemão Samuel Hahnemann, quando o mesmo sustentava o conceito da lei das semelhanças de Hipócrates, ou seja, de que todo composto ativo provoca no organismo algo semelhante a uma doença. Diante desse conceito, entende-se que para combater uma doença deve-se utilizar de uma doença artificial semelhante à primeira, sendo essa designada como contra-doença (LOCKIE, 2000; PRISTA et al., 2002; FONTES, 2005; KAYNE, 2006). É importante ressaltar que a homeopatia baseia-se no princípio da dinamização, isto é, consiste em diluir ou dividir substâncias elementares com matérias inertes; sendo assim possível graduar as potências contra a doença, não sendo isso prejudicial ao organismo devido à sua intensidade (PRISTA et al.,2002). Vale lembrar que a utilização da homeopatia ainda não é generalizada, mas a curiosidade e o interesse pela mesma são cada vez mais crescentes tanto por futuros pacientes quanto por profissionais da saúde. Esse fator torna-se se claro em decorrência do objetivo que é o da cura de seu semelhante, ou seja, o semelhante é curado por seu próprio semelhante, denominado por princípio da similia (LOCKIE, 2000; KAYNE, 2006). Sendo assim, a homeopatia baseia-se no princípio da similitude, apoiando-se na observação experimental de que toda substância quando proporcionada em doses adequadas, que provoca determinados sintomas em indivíduos saudáveis, é capaz de curar um doente que tem os sintomas semelhantes. Isso porque a homeopatia tem o seu alicerce baseado na premissa de que a doença é produzida pelos semelhantes e pelos semelhantes o paciente retorna à saúde (FONTES, 2005). Desde muitos anos atrás, a homeopatia vem se destacando pelo seu potencial junto a curas de doenças, confirmadas por estudos científicos que sugerem sua eficácia. No Brasil, em 1840, a homeopatia sofreu inúmeras críticas da medicina oficial que, por receio de perder seu poderio, marginalizava a mesma através de seu racionalismo científico, enfatizando um caráter obscuro e místico na medicina de Hahnemann (MÍKOLA, 2011). No que diz respeito à queimadura, sabe-se que esta se trata de uma lesão dos tecidos orgânicos produzida por alterações de origem térmica, oriundas da exposição ou contato com fogo, frio, superfícies quentes, líquidos quentes, substâncias químicas, ou ainda radiação, eletricidade, atrito ou fricção. Consequentemente há uma grande quantidade de exsudato como resultado do impacto do calor na pele e dos tecidos subjacentes produzindo destruição tissular (NOVAES, 2003). 8 Diante do exposto, este trabalho objetiva relatar experiências vividas no período do mês de junho de 2010 a julho de 2011, em que se atenderam vítimas de queimadura a luz do enfoque da similitude, princípio fundamental da Homeopatia. Nesse período, buscou-se retratar a evolução do processo de cicatrização no intuito de divulgar essa prática que é um dos eixos da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde (SUS), como possível e necessária dentro das Estratégias de Saúde da Família. 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 Homeopatia A Conferência Internacional sobre Atenção Primária em Saúde, realizada em AlmaAta Genebra (1978), é tida como marco inicial de uma nova forma de pensar saúde e recomenda a todos os Estados membros da Organização Mundial da Saúde o estabelecimento de diretrizes a serem incorporadas nas atividades de Atenção Primária da Saúde. Do mesmo modo, aponta para o conhecimento das práticas acumulado através de gerações que utilizava remédios tradicionais. Tal aporte potencializa as ações nos planos de saúde, tornando o enfoque mais totalizante, e com o tempo que deixe de ser somente fragmentada a abordagem do ser (BRASIL, 2006). Pensar saúde obriga cada vez mais ampliar a percepção dessa abordagem humana que também é chamada de integral, holística e, mais recentemente, de modelo biopsicossocial. Sendo assim, no século XVIII, quando surge a Homeopatia, na Alemanha, com o médico Samuel Hahnemann, após uma longa pausa em sua prática médica, ele começa a estruturar um novo modelo de saúde fundamentado no princípio da similitude. Tal modelo busca o princípio ativo nas substâncias dos três reinos da natureza: vegetal, mineral e animal, método que vem se aperfeiçoando através das novas gerações de médicos homeopatas (HAHNEMANN, 1984). A Homeopatia se fundamenta principalmente na lei da semelhança, também chamada de similitude. Esta consiste na utilização da tomada de sintomas desencadeados pela experimentação do medicamento homeopático no homem, que teoricamente se assemelham aos sintomas do enfermo (LOCKIE, 2000; KAYNE, 2006). 9 No Brasil, em 1979, é fundada a Associação Médica Homeopática Brasileira, e já em 1980 o Conselho Federal de Medicina (CFM) reconhece a Homeopatia como especialidade médica. Em 1992, é aplicada a prova para título da especialidade farmacêutica. Ainda, em 1988, por meio da Resolução 4/88, a Homeopatia passou a ser inserida na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS (PNPIC), o que normatizou o atendimento de homeopatia na rede pública (BRASIL, 2006). Em seus estudos, Hahnemann (1810), relata algumas considerações sobre o tratamento de queimaduras pelo método homeopático. Segundo o médico, as reiteradas aplicações de álcool nas queimaduras são preferíveis em relação ao uso de outro método. Isso porque o álcool é um dos melhores remédios contra as queimaduras de todo o gênero. Quando aplicado, parece, a princípio, aumentar a dor, porém é passageira, e logo é substituída por um sentimento agradável de calma. Isso ocorre pelo seu expressivo poder. Esse método requer a cobertura constante da queimadura por meio de compressas embebida neste líquido. Dessa forma, vale ressaltar que caso não se possa praticar a emersão, deve-se realizar o curativo com as compressas nas queimaduras. Entretanto, quando, em tais ferimentos, o organismo vivo requer, como sempre ocorre, a ação dinâmica ativa para lhe possibilitar a tarefa de sarar, como, por exemplo, quando há febre violenta, resultante de grandes contusões, bem como de músculos lacerados, tendões e vasos sanguíneos, há a necessidade de se remover mediante remédios internos, ou ainda quando a dor externa de áreas escaldadas ou queimadas precisam ser homeopaticamente vencidas, os serviços do médico dinâmico e sua valiosa homeopatia se fazem necessários (HAHNEMANN, 1810). 2.2 Similitude A evolução de qualquer ramo da ciência jamais ocorreu por meio de atos isolados de um único cientista. Assim, mesmo que uma descoberta seja atribuída a uma única pessoa, esta, certamente, está embasada em conhecimentos anteriores. Assim aconteceu com a homeopatia, construída sobre concepções como o princípio dos semelhantes, as doses infinitesimais, o medicamento único, dentre outros (HAHNEMANN, 1810). Ao objetivar descobrir a cura com o semelhante, Hahnemann idealizou uma nova forma de tratamento, embasada na cura pelos semelhantes. Isto é, criou-se, portanto, os alicerces da medicina homeopática, que divergem dos conceitos terapêuticos alopáticos da medicina tradicional. Ressalta-se que as concepções hahnemannianas surgiram muito da 10 tradição hipocrática, que leva em consideração a atenção ao regime alimentar, a importância dos fatores climáticos, ecológicos, psicológicos, e a existência da energia vital (CORRÊA, 1994). 2.3 Queimaduras Queimaduras são ações diretas ou indiretas do calor sobre o organismo humano. A despeito do prognóstico ter melhorado e avançado atualmente, as queimaduras ainda configuram como causa importante de mortalidade, pois a infecção pode evoluir com septicemia, assim como a repercussão sistêmica, com possíveis complicações renais, adrenais, cardiovasculares, pulmonares, musculoesqueléticas, hematológicas e gastrointestinais (BARRET, 2003). Além do risco de vida, as queimaduras resultam em considerável desenvolvimento de sequelas. Entre as mais graves, está a incapacidade funcional, especialmente quando atingem as mãos, as deformidades inestéticas, sobretudo, da face, e também aquelas de ordem psicossocial. Além disso, dependendo da localização, podem ainda causar complicações neurológicas, oftalmológicas e geniturinárias (WASSERMANN, 2002). As queimaduras de primeiro grau comprometem somente a epiderme. Apresentam eritema, calor e dor, mas não há formação de bolhas. Evolui para o quadro de descamação em poucos dias, e não deixa cicatrizes. Já as queimaduras de segundo comprometem totalmente a epiderme e parcialmente a derme. Apresenta dores, eritema, edema, bolhas, erosão ou ulceração. A regeneração é espontânea. Ocorre ainda reepitelização a partir dos anexos cutâneos; a cicatrização, por sua vez, é mais lenta, e pode deixar sequelas (NOVAES, 2003). No que tange às queimaduras de terceiro grau, estas destroem as camadas da pele, atingem até o subcutâneo, podendo atingir tendões, ligamentos, músculos e ossos. Estas causam lesão branca e marrom, seca, dura; sendo indolor. Ademais, não há regeneração espontânea; necessitando, em certos casos, de enxertia. Eventualmente, pode cicatrizar, porém com retração das bolhas (NOVAES, 2003). 2.4 Homeopatia na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde (SUS) Diante de uma nova realidade do SUS, os coordenadores do sistema viram a necessidade de estabelecer políticas cujo objetivo seja garantir a integralidade na atenção à 11 saúde. Dessa forma, surge a ideia de se implantar a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS. Essa implementação envolve justificativas de natureza política, técnica, econômica, social e cultural. Tal política atende, sobretudo, à necessidade de se conhecer, apoiar, incorporar, e implementar experiências que já vêm sendo desenvolvidas na rede pública de muitos municípios e estados. Dentre essas, destacam-se aquelas no âmbito da Medicina Tradicional Chinesa-Acupuntura, da Homeopatia, da Fitoterapia, da Medicina Antroposófica e do Termalismo-Crenoterapia (BRASIL, 2006). No que se refere à Homeopatia, na década de 80, alguns estados e municípios brasileiros começaram a oferecer o atendimento homeopático como especialidade médica aos usuários dos serviços públicos de saúde. Porém, como iniciativas isoladas e, às vezes, descontinuadas, por falta de uma política nacional. Diante dessas necessidades, foram fixadas normas para o atendimento em Homeopatia nos serviços públicos de saúde, e, em 1999, o Ministério da Saúde inseriu na tabela SIA/SUS a consulta médica em Homeopatia (BRASIL, 2006). A implantação da Homeopatia no SUS representa uma importante estratégia para a construção de um modelo de atenção centrado na saúde, uma vez que recoloca o sujeito no centro do paradigma da atenção. Do mesmo modo, compreende o mesmo nas dimensões física, psicológica, social e cultural, e fortalece a relação médico-paciente como um dos elementos fundamentais da terapêutica. Isso promove a humanização na atenção, estimula o autocuidado e a autonomia, além de contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos usuários e para o uso racional de medicamentos. Assim, contribuindo para a redução da fármaco-dependência (BRASIL, 2006). 3 METODOLOGIA No período de janeiro a março de 2011, realizaram-se tratamentos de queimaduras em pacientes da rede pública de saúde, por meio do método homeopático com solução formada por água morna e álcool aplicado sobre a queimadura com compressa local até o alívio total da dor. Entre os tratamentos realizados foram selecionados dois casos para serem relatados neste trabalho. A metodologia adotada nos tratamentos de queimaduras consistiu-se de procedimentos simples no qual o princípio da similitude foi empregado. Esses procedimentos se consistiram de duas fases distintas: 12 1a Fase: realizada no início dos estudos, constou do tratamento de pacientes com queimaduras pequenas, recentes de 1o grau, por meio do método homeopático de um único curativo com solução constituída por água morna (temperatura entre 38° e 41oC) e álcool na proporção de 2 litros de água para 200ml de álcool aplicado sobre a queimadura com compressa local, por cerca de 40 minutos a 2 horas, até o alívio total da dor. 2a Fase: a partir da experiência adquirida na 1a fase, passou-se a tratar pacientes com queimaduras de 2o e 3o graus, com até 15 dias após a queimadura. Utilizou-se o mesmo método homeopático da primeira fase, dependendo da extensão e profundidade da queimadura, até o alívio total da dor. Além disso, realizaram-se cuidados higiênicos, como banhos em chuveiro a cada 3 ou 4 horas. Para a realização dos procedimentos, os pacientes e os responsáveis foram orientados minuciosamente sobre a técnica utilizada e o registro por imagem. No final, concordaram em assinar o documento de ciência e autorização do uso de imagem. Em conformidade com a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que trata dos aspectos éticos de pesquisa com seres humanos, solicitou-se aos participantes assinaturas no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE e no Termo de Ciência e Uso da Imagem – TCUI. Também fez necessário ler e explicar minuciosamente esses termos para autorização das imagens, as quais demonstram evolução da ferida causada devido a queimaduras. Dessa forma, garantiu-se a preservação da ética e da confidencialidade das imagens dos sujeitos. Ressalta-se que o TCLE e o TCUI do caso I foram assinados pelo pai do menor, e do caso II pela própria paciente. 4 Relato de aprimoramento da técnica utilizada Os trabalhos com pacientes queimados foram realizados de forma mais intensa nos anos de 1995 e 1996. Entretanto, atualmente, o método vem sendo utilizado e aprimorado. Os estudos realizados com esta metodologia, até este momento, demonstraram como importantes para o bom êxito do tratamento as seguintes variáveis: 1º - Extensão da área corporal queimada e grau de acometimento dos tecidos: é determinante para estabelecer se a conduta será multidisciplinar ou não, bem como o tempo de curativo; 2º - Tempo de duração do curativo: o tempo de duração do curativo é variável. Para queimaduras de 1o e 2o graus com pequena área de extensão, verificou-se que a margem de tempo que assegura a eficácia é de no mínimo 40 minutos, enquanto que para um grande 13 queimado poderá levar até 2 horas de curativo. O parâmetro final é o paciente ficar sem dor. É importante lembrar que os primeiros 5 minutos de curativo intensificam a dor local, nesse caso, orienta-se o paciente de que quando aumentar a dor ele deve avisar ao médico ou a quem estiver realizando o curativo para que seja retirada a compressa. Ao aliviar a dor, coloca-se novamente a compressa e, assim, sucessivamente até suportar por mais tempo. Quando o paciente apontar alívio da dor, mantém-se o local aquecido com água morna sobre a compressa; 3º - Temperatura da água: a temperatura da água deverá permanecer entre 38° e 41° e nunca se deve deixar esfriar para reiniciar o curativo, pois se a água esfriar e houver o reinício do curativo, este funcionará como noxa, ou seja, como fator agressor externo; 4º - Tecido utilizado para a realização do curativo: o tecido que se mostrou mais adequado foi à compressa de centro cirúrgico ou toalha de rosto felpuda e macia, nunca sendo recomendável o uso de tecido fino. Os tecidos finos agem como noxa, chegando quentes demais ao local e esfriando rapidamente, o que causa dor ao paciente; 5º - Local adequado para a realização do curativo: Neste item deve-se levar em consideração a extensão da queimadura. Para as pequenas queimaduras, deve-se escolher locais arejados e limpos e de fácil acesso, em que a circulação do pessoal não provoque acidentes. Além disso, necessita-se evitar problemas de contaminação, e nunca se deve esquecer que o álcool é altamente inflamável. Para os grandes queimados, a conduta deverá ser intra hospitalar com suporte de Centro de Tratamento Intensivo (CTI); 6º - Evolução da cicatrização: é importante descrever como ocorre o processo de cicatrização para que se tenha segurança no resultado final. Após o curativo, a orientação dada ao paciente, familiares ou paramédicos, é de que os banhos de chuveiro devem ser de 3 em 3 horas ou de 4 em 4 horas. A ferida deve ser lavada e não esfregada, sem romper eventuais bolhas. Depois do banho, é preciso secar bem a ferida, deixando-a exposta e livre, sem jamais enfaixá-la. Do mesmo modo, deve-se evitar o manuseio da ferida, e se necessário o manuseio, é necessário fazê-lo de forma muito sutil. Tem-se observado que nos locais em que ocorrem pequenos pontos de sangramento devido ao manuseio da ferida, a cicatrização apresenta quelóide ou retrações neste local. O aspecto da ferida nos primeiros dias da evolução apresenta uma secreção serosa; nos dias subsequentes, pode-se também ver tecido de granulação e, geralmente, após a primeira semana, a ferida torna-se mais seca, quando deve ocorrer o espaçamento dos banhos. Nesse período, observa-se a cicatrização de forma centrípeta. Dependendo da profundidade que a queimadura atinge no tecido, a ferida torna-se escavada até esse nível, o que pode causar dúvidas quanto à qualidade de cicatrização; 14 7º - Estratégia medicamentosa homeopática: deverá ser conduzida com critério técnico no mínimo de primeiro nível, ou seja, modalizando os sintomas do paciente e se possível de segundo nível, mosaico de sintoma. Quando se utiliza o medicamento Homeopático, a evolução torna-se mais favorável, rápida e com melhor qualidade. Caso não seja possível fazer primeiro ou segundo nível, é recomendável que se faça apenas o curativo seguido das orientações já expostas, juntamente com a observação diária da evolução clínica; 8º - Orientação ao paciente: o mesmo deverá ser orientado a evitar o consumo de qualquer substância que seja alérgico (alimento, medicamento), além de bebidas alcóolicas. Do mesmo modo, o paciente deverá ser orientado, ainda, a ser rigoroso em relação à higiene, pois este fator é determinante para o êxito do tratamento através do método homeopático com o curativo. Logo após a cicatrização completa, deve-se informar ao paciente a necessidade de evitar a exposição direta da área queimada ao sol e usar protetor solar fator 30. 6 RESULTADOS E DISCUSSÃO Caso I: Paciente L. S. T., sete anos, sexo masculino com queimadura de 1º e 2º graus que atingiram face, lobo da orelha, ombro, tórax, axila e região proximal do braço do lado direito. A queimadura foi provocada por álcool, no dia 30 de janeiro de 2011. Porém, o primeiro dia do curativo homeopático foi dia 2 de fevereiro de 2011, ou seja, no terceiro dia da queimadura. A figura 1 mostra o paciente, recebido na Unidade Básica de Saúde, com o curativo alopático (Fig. 1). Após explicações aos familiares de como seria o procedimento do curativo Homeopático, tirou-se todas as dúvidas possíveis sobre o procedimento e esclareceu-se como seria o mesmo, assim como seria fundamental a colaboração destes durante na evolução do caso. Em seguida, foi retirado o curativo alopático (Figs. 2 e 3). O procedimento iniciou-se com a aplicação de vaselina sobre as gazes na região da queimadura, que foram mantidas por 30 minutos para que as mesmas se soltassem da ferida, logo se seguiu com o curativo homeopático, com uma hora de duração. Ao retirar a gaze, verificou-se a presença de pontos pequenos e isolados de sangramento; nesse momento, o paciente foi colocado em decúbito dorsal e deu-se início ao curativo com compressas embebidas com solução de álcool e água morna, como descrita na metodologia, sobre a ferida por 1 hora interruptamente. Ao final do curativo, observou-se nítida redução da área hiperemiada próxima à queimadura. 15 A orientação dada aos responsáveis do paciente constou em: realizar três a quatro banhos diários de chuveiro com a temperatura morna e agradável ao paciente, e após o banho, secar com delicadeza a ferida com toalha limpa. Foi receitada a medicação dipirona gotas em caso de muita dor, bem como o retorno para controle médico da ferida no dia seguinte no mesmo horário. Após o curativo, o paciente relatou que não sentia mais dor no local da queimadura, sendo tal afirmação perceptível à inspeção do semblante do enfermo. Figura 1 – Recebimento do paciente na USB Figura 2 – Retirada do curativo alopático Fonte: Calegari, (2011). Fonte: Calegari, (2011). Figura 3 – Remoção do curativo alopático Fonte: Calegari, (2011). No dia seguinte, após a realização do curativo homeopático, foi possível verificar a delimitação da área queimada (Figs. 4 e 5). O local das feridas e bolhas apresentava-se com bom aspecto, limpo e com serosidade (Fig. 6). Paciente relatou não ter sentido dor nos locais da ferida. 16 Figura 4 – Dia seguinte após o curativo homeopático. Figura 5 – Aspecto da área queimada. Fonte: Calegari, (2011). Fonte: Calegari, (2011). Figura 6 – Área queimada com bolhas. Fonte: Calegari, (2011). No 6° dia do curativo homeopático, as feridas apresentavam-se secas e com bom aspecto (Figs. 7 e 8). Foi a partir desse momento que se iniciou o processo de cicatrização, de forma rápida e centrípeta com descamação das crostas do tecido necrosado mais na região da periferia. A bolha em região tênar não se rompe e o tecido da bolha não pode ser removido, pois o mesmo é utilizado como proteção do local das queimaduras. 17 Figura 7 e 8 – Área queimada apresentam-se seca e com bom aspecto Fonte: Calegari, (2011). No 8° dia do curativo, a ferida está limpa, seca e com bom aspecto nas áreas de cicatrização (Fig. 9). Há início de formação de áreas de tecido cicatricial despigmentado de cor branca (Fig. 10). Figura 9 - Ferida seca, limpa, com bom aspecto. Figura 10 – Início de tecido cicatricial. Fonte: Calegari, (2011). No 13° dia de curativo homeopático, a ferida está seca, limpa, e com bom aspecto. Verifica-se que quase toda área cicatrizada se apresenta despigmentada, sem retração ou quelóide. O responsável e a criança foram orientados para que o local não sofresse exposição ao sol sem protetor solar, a fim de evitar manchas na pele devido esta apresentar melanócitos novos. 18 Figura 11 – Área cicatrizada. Figura 12 – Ferida sem retração ou queloídes. Fonte: Calegari, (2011). Fonte: Calegari, (2011). No próximo atendimento, o paciente mostrou-se com completo restabelecimento e cicatrização com bom aspecto, apresentando pequena área de quelóide apenas na região proximal do braço direito (Fig. 13), e já na face do lado direito, na região cervical e no lobo da orelha direita não havia retrações e quelóides. Apesar da orientação sobre o uso do protetor solar, a criança não utilizou este produto. Figura 13 – Quelóide região proximal braço direito. Fonte: Calegari, (2011). Figura 14 – Cicatrização da face lado direito. Fonte: Calegari, (2011). Caso 2: Paciente E. C. L. S., com 42 anos, sexo feminino, com queimadura de 1º e 2º graus na região anterior da perna direita e esquerda. A queimadura foi provocada por óleo de fritura fervendo no dia 13 de março de 2011. O primeiro dia do curativo Homeopático foi no dia 14 de março de 2011, ou seja, no segundo dia da queimadura. Quando deu entrada na Unidade Básica de Saúde, a paciente se queixava principalmente de dor intensa e ardência no local da ferida, quando foi proposto e esclarecido o curativo Homeopático. Explicou-se à 19 mesma de como seria o tratamento, e qual deveria ser sua conduta e participação ao longo do mesmo; a paciente prontamente aceitou e se iniciou o procedimento. A paciente foi colocada em decúbito dorsal e começou-se o curativo com compressa sobre a ferida por 1 hora, a partir de solução já descrita na metodologia. Orientou-se a paciente de que deveria tomar seis banhos diários de chuveiro na temperatura de água morna, sendo dois banhos pela manhã, dois banhos pela tarde e dois banhos à noite; bem como retornar à Unidade Básica de Saúde (USB) para controle médico no dia seguinte. Paciente apresentando queimadura de 1º e 2º graus ao longo da região anterior da perna direita (Figs. 15 e 16). Figuras 15 e 16 – Queimadura de 1o e 2o graus em região anterior da perna direita. Fonte: Calegari, (2011). A paciente retornou no dia seguinte ao curativo homeopático para reavaliação da ferida e de seu estado geral. As feridas apresentavam bom aspecto com redução da área queimada. A paciente não sentia dor e deambulava normalmente. Assim, fica claro, neste caso, que a área mais acometida está localizada nas regiões que apresentam as bolhas (Figs. 17 e 18). 20 Figuras 17 e 18 – Área mais acometida, com bolhas. Fonte: Calegari, (2011). No 4º dia do curativo homeopático, a ferida está com bom aspecto, bem como limpa, com bolhas e sem secreção, e não há dor local a deambulação (Figs. 19, 20 e 21). Figuras 19, 20 e 21 – Área queimada com bom aspecto, com bolhas sem secreção. Fonte: Calegari, (2011). No 8º dia do curativo homeopático, a ferida está com bom aspecto, bem como limpa, seca, e com as bolhas rompidas; e a paciente não apresenta queixa de dor local (Figs. 22 e 23). 21 Figuras 22 e 23 – Área queimada com bom aspecto, sem bolhas. Fonte: Calegari, (2011). No 12º dia do curativo homeopático, verifica-se a ferida totalmente seca com crostas e cicatrização de forma centrípeta (Figs. 24 e 25). Figuras 24 e 25 - Ferida totalmente seca com crostas e cicatrização de forma centrípeta. Fonte: Calegari, (2011). No 16º dia do curativo homeopático, percebe-se evolução plenamente favorável pelo tempo decorrido do ferimento por se tratar de um membro inferior com varizes, fator importante pelo tamanho das mesmas, e também cicatrização de forma centrípeta (Figs. 26 e 27). 22 Figuras 26 e 27 - evolução plenamente favorável pelo tempo decorrido do ferimento. Fonte: Calegari, (2011). Depois de 60 dias do início do curativo homeopático, o tecido apresenta-se restabelecido, sem retração ou quelóide. A paciente relata que achou uma melhora rápida, sem dor e sem limitação do membro em momento algum (Figs. 28, 29 e 30). Figuras 27, 28 e 30 – A paciente retornou 60 dias após o curativo homeopático e mostra uma cicatrização sem retração e quelóide. Fonte: Calegari, (2011). 23 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este relato de experiência demonstrou a utilização da homeopatia na atenção primária como instrumento eficiente para o tratamento tanto de pequenos como de grandes queimados. Entretanto, no caso de grandes queimados, é recomendável que o procedimento seja em nível hospitalar e com acompanhamento da evolução diária pelo médico. Em ambos os casos, a cicatrização das feridas foi mais rápida, pois através das imagens é visível a eficácia do tratamento homeopático proposto aos pacientes queimados atendidos nas Unidades Básicas de Saúde. A aceitação por parte dos pacientes foi imediata a partir do momento que eles e seus responsáveis foram esclarecidos sobre o método e de como seria a participação de cada um durante o tratamento. Além disso, destacou-se a fácil execução e o baixo custo, o que torna o procedimento acessível a todas as camadas sociais. Diante do exposto e por acreditar na terapêutica homeopática na saúde e na vida das pessoas, este trabalho, consciente da limitação de sua abrangência, traz uma contribuição importante para difusão do método, quer pelos bons resultados obtidos, quer pela escassez da bibliografia existente sobre o assunto. Ademais, os casos aqui relatados podem auxiliar outros profissionais no uso da homeopatia na atenção básica, assim como estimular estratégias e políticas públicas que visem à melhoria da saúde da população. No mesmo sentido, os relatos desses casos podem ainda servir de incentivo a novas pesquisas que possam embasar estratégias, políticas e práticas integrativas que visem a melhorias para a saúde da população. 24 BIBLIOGRAFIA BARRET, J.P, Herndon, D.N. Effects of burn wound excision on bacterial colonization and invasion. PlastReconstrSurg. p. 111:744-50; discussion 751-2. 2003. Brasil, Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. 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