ATIVIDADE 2 Questões 1) Pode-se afirmar que o processo de construção de expressões como “casa do botão”, “saía do pára-lama”, “costas do sofá”, “perna da mesa” é motivado iconicamente? Por quê? Resposta: Sim. Essas expressões foram concebidas por uma transferência metafórica: alguma semelhança dos objetos assim nomeados com outros existentes no mundo e já rotulados – saia, costas, perna. Assim, em lugar de serem criadas palavras inteiramente novas, são utilizados itens existentes no léxico. Por esse processo, relacionamse domínios semânticos diferentes (seres humanos x objetos) por algum ponto de interseção que há entre eles, 2) O que explica não flexionarmos o segundo elemento dos grupos sintáticos blusas rosa, carros vinho, estabelecendo uma concordância com o núcleo substantivo? Resposta: Na língua portuguesa, em relação à indicação de cores, existem palavras que são usadas especificamente para essa função e essas, ao se relacionarem com um substantivo, devem, por um princípio gramatical, estabelecer relações de concordância com ele (blusas vermelhas, sapatos brancos). A necessidade comunicativa, no entanto, leva os falantes a usarem palavras, a princípio, substantivos (por designarem seres no mundo) para denominar cores de objetos, com a intenção de uma representação mais exata do mundo. Um exemplo é a palavra lilás, nome de uma flor de cor arroxeada, que é usada para também representar a cor de um objeto do mundo (roupa, laço de cabelo etc.); além desse exemplo, existem muitos outros (blusa vinho, calça cinza, vestido rosa etc.). Como essas palavras – lilás, vinho, cinza, rosa – são substantivos, por sua características morfológicas e função de designar, a princípio, objetos, não estão sujeitas a regra de concordância quando colocadas ao lado de outro substantivo; por isso se diz blusas vinho (=blusa da cor do vinho), calças cinza (=calças da cor da cinza), vestidos rosa (=vestidos da cor da rosa). Acontece, no entanto, que o falante pode perder a consciência de que uma palavra que ele usa para representar cor é o nome de um objeto do mundo, por isso passa a flexionar a palavra quando esta forma um sintagma com outro substantivo: esse é o caso da palavras lilás, que aparece, nos dias de hoje, flexionada (blusas lilases). Nesse caso, entende-se que houve perda de iconicidade, pois o falante perdeu de vista a relação dessa palavra com um objeto do mundo (uma flor) e passou a ver nela um adjetivo puramente. Essa mudança de estatuto da palavra, ou seja, ser tomada como um adjetivo, uma vez que passou a concordar com o substantivo, é um caso de gramaticalização. 3) O que se entende por transposição metafórica por iconicidade? Resposta: É um processo cognitivo (realizado pela mente) pelo qual se estabelece uma relação entre referentes de domínios semânticos distintos do mundo, por se perceber algum tipo de semelhança entre eles. Muitos nomes dados a objetos são produzidos com base nesse fundamento de transferência metafórica. Diz-se, assim, “perna da calça” pela semelhança da parte da calça, assim denominada, com a perna humana; “pimenta-dedode-moça” pela relação da forma da pimenta com um dedo delicado, alongado, como o de uma moça. 4) A flexão de gênero da palavra presidente, no feminino “presidenta”, é exemplo de iconicidade ? Resposta: Sim. Sabemos que as palavras que têm a terminação em –e (estudante, cliente, agente etc.), de acordo com o sistema da língua, não sofrem flexão; mas também sabemos que as gramáticas podem se ajustar às necessidades comunicativas dos falantes. Mais recentemente, na língua, a palavra presidente passou a receber flexão “presidenta”, pelo menos por um grupo considerável de falantes, em vista de uma mulher ter ocupado o cargo da presidência do país. Essa flexão da palavra foi, sobretudo, uma opção daqueles falantes afiliados politicamente a essa dirigente da nação brasileira. 5) Existe uma relação icônica entre a expressão do gênero e o sexo dos seres (humanos e animais)? Resposta: Não existe, de modo geral, essa relação icônica, pois o gênero (masculino/feminino) é uma categoria gramatical que envolve todos os substantivos, quer se refiram a seres humanos, animais, objetos. Mesmo entre os substantivos que se referem aos seres de sexos diferentes, não há flexão para algumas palavras, como testemunha, criança, cônjuge (os chamados substantivos sobrecomuns), ou como jacaré, cobra, zebra, onça, caranguejo, tamanduá (os chamados substantivos epicenos). Não obstante esse fato, sabe-se que existe uma vinculação semântica entre gênero e sexo para uma boa parte de nomes substantivos que assumem diferentes formas (quer por flexão, quer por supletivismo) conforme designem homem ou mulher (aluno/aluna, menino/menina, professor/professora, médico/médica), macho ou fêmea (urso/ursa, gato/gata, leão/ leoa, cavalo/égua, bode/cabra). Portanto, a relação icônica entre gênero e sexo existe, sim, para muitos nomes substantivos da língua portuguesa. 6) Por que é logicamente adequado dizer “cem gramas de ameixas”, mas não “cem gramas de abacaxis”? Existe, nesse caso, uma explicação por motivação icônica? Resposta: Há, sim, uma explicação possível pela motivação icônica, considerando-se como se dá a partição de elementos no mundo. Para separar frutas, grãos, areia, água etc. (substâncias do mundo), fazemos uso de classificadores (quilograma, litro, punhado, braçada, xícara, colher, lata, pacote etc.), entre os quais alguns se oficializaram. No caso de uma receita culinária, usamos classificadores partitivos, na separação dos ingredientes. Por uma motivação icônica, fica claro que é preciso reunir certo número de ameixas (frutas de pequeno tamanho) para alcançar cem gramas; no entanto, em se tratando de abacaxi (uma fruta de maior tamanho), basta uma só fruta dessa espécie para dela retirarmos cem gramas, por isso dizemos “cem gramas de abacaxi”. 7)As silepses de gênero, número, pessoa ( Vossa Majestade é generoso; Os Lusíadas glorificou nossa literatura; Os brasileiros somos hospitaleiros) são concordâncias que se explicam pelo princípio da iconicidade? Resposta: Sim. No campo da estilística se reconheceu que a discordância gramatical entre nome e adjetivo, entre verbo e sujeito pode ser justificar em vista de uma concordância que se quer fazer com aquilo que está na mente: fala-se, então, em silepses de gênero, número e pessoa. Ora, à luz da linguística, não observar as regras de concordância (no caso das silepses) se justifica pelo fato de o falante considerar quem são os referentes no mundo aos quais os enunciados remetem (relação icônica). Assim, dizer “Vossa Majestade é generoso” se justifica pelo fato de que o enunciado se refere a um homem, por isso é mais adequado dizer “generoso” e não “generosa”. Também, ao construir o enunciado “Lusíadas glorificou nossa literatura”, o verbo fica no plural porque o nome Lusíadas se refere a uma obra (1 objeto no mundo). Por sua vez, o enunciado “Os brasileiros somos hospitaleiros” também está em relação icônica com o mundo representado, uma vez que “brasileiros” inclui o próprio enunciador. 8)Por que não se flexiona o verbo em enunciados como Campinas está exportando computadores; Valinhos produz figos? Resposta: Essas palavras designam cidades do Brasil, portanto representam não um conjunto, mais sim uma unidade. O fato de apresentarem uma terminação em –s, que pode nos induzir a pensar que é marca de plural, se explica por essas palavras fazerem referência, antes, a pequenas campinas (em um caso) e a pequenos vales (no outro) existentes na região em que se fundaram essas cidades, o que deve ter motivado a escolha dos nomes. Com o tempo, o falante perdeu a consciência sobre essa motivação, e essa perda do sentido antigo recebe o nome de gramaticalização.