Transtornos de humor na velhice

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Firmiana Guimarães

“Envelhecer é um acontecimento natural que compõe o
desenvolvimento normal e integral de qualquer pessoa, sendo
produto de um processo dinâmico de uma vida na qual o indivíduo
se modifica incessantemente. Assim, é um processo biológico
universal, pelo qual o ser humano é necessariamente levado à
velhice.” (Albuquerque, 1994; Fraiman, 1995; Santos, 1994).


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Juntamente com o início da aposentadoria e mudanças nos papéis
profissionais, os idosos passam também por mudanças cognitivas,
perceptivas e, muitas vezes, profundas mudanças nos
relacionamentos sociais;
As relações sociais nessa fase são permeadas mais intensamente
por influências de fatores psicológicos, físicos e da saúde mental;
Os aspectos socioculturais e condições econômicas também
desempenham papel no processo de envelhecer
Existem aqueles que vivenciam a velhice de uma forma mais
positiva, adotam uma postura mais ativa, com freqüentes
atividades físicas e de lazer. Certamente, os indivíduos que
experienciam a velhice de maneira negativa, que se afastam das
atividades diárias e dos relacionamentos sociais, apresentam uma
maior probabilidade de também vivenciarem emoções negativas.
Com o processo de
envelhecimento
surgem dificuldades
adaptativas fisiológicas
e psicológicas;
 O idoso passa a
significar fatos antigos
com novas emoções e
significados e surgem
novas formas de
interpretar os fatos.

 Para
Freud os determinantes patogênicos
envolvidos nos transtornos mentais podem
ser divididos em duas partes:
1- aqueles que a pessoa traz consigo para a
vida;
2- aqueles que a vida lhe traz.
 O equilíbrio psíquico do idoso depende,
basicamente, de sua capacidade de
adaptação à sua existência presente e
passada e das condições da realidade que o
cercam.

Disposições pessoais: O que o indivíduo
traz para a vida, ou seja, sua constituição.
"envelhece-se como se viveu“
(Ajuriaguerra)
A
prática clínica tem mostrado, embora
nunca de maneira absoluta, que os
indivíduos portadores de dificuldades
adaptativas em idade pregressa
envelhecem com maiores dificuldades.

Por outro lado, alguns autores
observaram uma significativa
melhora em poucos casos de
neuroses com o
envelhecimento, fato também
observável na prática
psiquiátrica. Isso nos mostra,
de fato, não haver uma
desestruturação psíquica no
envelhecimento mas sim, uma
alteração estrutural na
dinâmica psíquica, novos
arranjos psicodinâmicos e
nova arquitetura afetiva
distinta da anterior.
Mais comum na senilidade, entretanto, é o
agravamento e não a melhora das alterações
psíquicas anteriormente constatadas. No caso
das neuroses do idoso, assim como nas demais
idades, o transtorno decorre do grande esforço
interno em conseguir uma satisfação existencial
e uma adaptação à realidade;
 Assim sendo, mesmo diante de circunstâncias
existenciais favoráveis para alguns idosos, tal
satisfação adaptativa não seria conseguida
devido a certa fragilidade emocional própria de
seus traços afetivos.

 Dentre
as funções psíquicas alteradas
com e pelo envelhecimento, a
afetividade deve ser destacada.
 Afetividade: a
capacidade de experimentar
sentimentos e emoções, como um estado de
ânimo que proporciona a tonalidade do
relacionamento do indivíduo com o mundo e
consigo próprio.
Incontinência Emocional: uma forma de
alteração da afetividade peculiar à velhice que
se caracteriza pela grande facilidade em
produzir intensas reações afetivas e uma
subseqüente incapacidade para controlá-las;
 Labilidade afetiva: mudanças rápidas das
emoções.
 Tais alterações podem ser conseqüentes não
apenas ao psicodinamismo reestruturado dos
idosos mas, também, às alterações degenerativas
do SNC, seja do ponto de vista tecidual, seja
circulatório. Nos transtornos degenerativos a
afetividade costuma ser uma das mais precoces
manifestações.

Acompanhando ou não os estados degenerativos
do envelhecimento, as alterações afetivas serão
tanto mais proeminentes quanto mais
problemática tenha sido a personalidade prévia
do paciente.
 Além dos componentes da personalidade
sabemos, atualmente, dos aspectos familiares e
genéticos atrelados às doenças degenerativas da
senilidade.

Doença de Pick
Doença de
JacobCreustzfeldt
Coréia de
Huntington
Demência
Ateriosclerótica
Aspectos psicossociais: Os componentes
que a vida traz para o indivíduo, e que,
juntamente com as disposições pessoais,
resultarão no estado psíquico do idoso.
 Para Cavan (1965) o equilibrio
ambiental na velhice depende
principalmente de:

Um contato
social
suficiente
Uma ocupação
cheia de
significados
Uma certa
segurança
social
Um estado de
saúde
satisfatório
 Diante
dos itens
citados por Cavan
(1965), percebemos
as caricaturas
impostas ao idosos
pela sociedade em
relação ao contato
social, as ocupações
sociais, aos meios
de manutenção e a
saúde.
O
transtorno de humor é o problema
psiquiátrico que mais leva o idoso,
principalmente do sexo feminino, a
procurar atendimento médico (Almeida,
1999);
 Entre estes transtornos, os mais comuns
na velhice são a ansiedade e depressão;

No CID 10:
“Transtornos nos quais a perturbação fundamental é
uma alteração do humor ou do afeto, no sentido de
uma depressão (com ou sem ansiedade associada)
ou de uma elação. A alteração do humor em geral se
acompanha de uma modificação do nível global de
atividade, e a maioria dos outros sintomas são quer
secundários a estas alterações do humor e da
atividade, quer facilmente compreensíveis no
contexto destas alterações. A maioria destes
transtornos tendem a ser recorrentes e a ocorrência
dos episódios individuais pode freqüentemente
estar relacionada com situações ou fatos
estressantes.”




No caso da ansiedade, são freqüentes sintomas como insônia,
tensão, angústia, irritabilidade, dificuldade de concentração, bem
como sintomas físicos como taquicardia, tontura, cefaléia, dores
musculares, formigamento, suor. Para o diagnóstico de uma
síndrome ansiosa é importante verificar a intensidade dos
sintomas e seu impacto na vida do indivíduo;
A ansiedade ocorre diante de uma visão catastrófica dos eventos,
anunciando que algo perigoso e ameaçador pode acontecer;
A ansiedade nos idosos está relacionada às limitações vivenciadas
na velhice e, na maioria das vezes, interpretadas como
ameaçadoras;
As pessoas com altos níveis de ansiedade apresentam uma
tendência de antecipar sua inabilidade e questionar suas
habilidades intelectuais. Essas percepções negativas interferem na
atenção seletiva, na codificação de informações na memória,
bloqueando a compreensão e o raciocínio (Coes, 1991), o que
nessa fase da vida poderia ser a diferença entre uma saúde mental
boa ou comprometida.
 Em
um estudo epidemiológico com 18571
pessoas, Regier e cols. (1988) verificaram
que 5,5% dos idosos com mais de 65 anos
de idade apresentavam transtorno ansioso,
excluindo os casos mais comuns de
ansiedade generalizada. Esse índice
aumenta para 15% quando são incluídos
casos de ansiedade generalizada (Katona,
Manela & Livingston, 1996). No estudo de
Almeida (1999) com 398 idosos foi
encontrada uma prevalência de 15,4% de
idosos com transtorno de ansiedade.

No que tange à depressão, é
importante destacar que ela
tem sido considerada como um
dos transtornos que mais afetam
o idoso. Seu diagnóstico no
idoso é ainda mais complexo
quando comparado ao
diagnóstico em outras faixas
etárias, pois, como ressaltam
Piccoloto, Wainer, Benvegnú e
Juruena (2001), o próprio
processo de envelhecimento
apresenta algumas
características semelhantes aos
sintomas depressivos, o que
conduz à confusão no
diagnóstico.


F32 Episódios depressivos:
Nos episódios típicos de cada um dos três graus de
depressão: leve, moderado ou grave, o paciente apresenta
um rebaixamento do humor, redução da energia e
diminuição da atividade. Existe alteração da capacidade de
experimentar o prazer, perda de interesse, diminuição da
capacidade de concentração, associadas em geral à fadiga
importante, mesmo após um esforço mínimo. Observam-se
em geral problemas do sono e diminuição do apetite. Existe
quase sempre uma diminuição da auto-estima e da
autoconfiança e freqüentemente idéias de culpabilidade e
ou de indignidade, mesmo nas formas leves.
F33 Transtorno depressivo recorrente:
Transtorno caracterizado pela ocorrência repetida de
episódios depressivos correspondentes à descrição de um
episódio depressivo (F32.-) na ausência de todo
antecedente de episódios independentes de exaltação de
humor e de aumento de energia (mania)
Os argumentos que sustentam ser a depressão no
idoso um tipo diferente da depressão de outras
faixas etárias se apoiam nas diferenças de
sintomatologia;
 Nos idosos, por exemplo, a depressão se
apresentaria com sintomas somáticos ou
hipocondríacos mais freqüentes, haveria menos
antecedentes familiares de depressão e pior
resposta ao tratamento;
 Apesar disso, a tendência atual é não estabelecer
diferenças marcantes entre a depressão da idade
tardia e a depressão dos adultos mais jovens. De fato,
o que teria de diferente nos idosos seria, não a
depressão em si, mas as circunstâncias existenciais
específicas da idade.




DEPRESSÃO REATIVA (Reativa a alguma situação
vivencial traumática): De fato o idoso passa por uma
condição existencial problemática e, muitas vezes,
sofrível.
DEPRESSÃO SECUNDÁRIA (Secundária à alguma
condição orgânica): De fato o idoso costuma
desenvolver estados patológicos e degenerativos
que facilitam o desenvolvimento da depressão.
DEPRESSÃO ENDÓGENA (Endógena é constitucional,
atrelada à personalidade): Ora, de fato as pessoas
com depressão endógena ou constitucional
envelhecem e continuam depressivas

Situação existencial do idoso: É imperioso que a
sociedade de um modo geral, e a medicina se
aproximem e conheçam a dimensão subjetiva, a
problemática da saúde emocional e as
potencialidades subjacentes do idoso. Muito
pouco se sabe sobre como o idoso percebe a si
mesmo e a seu envelhecimento, e isso será
apenas o primeiro passo para estabelecer uma
atenção psicológica e rastrear os fatores
materiais e sociais que a determinam a angustia
e a depressão que rodeiam o envelhecimento.

Saúde mental: poderia ser entendida como o equilíbrio
psíquico que resulta da interação da pessoa com a realidade.
Essa realidade é o meio circundante que permite à pessoa
desenvolver suas potencialidades humanas e, normalmente,
essas potencialidades estão estreitamente associadas à
satisfação das necessidades humanas.
Alterações na aparência física: A grande maioria dos idosos se
percebe com menos cabelo, cabelos brancos (91.2%); manchas e
rugas na pele (81.1%); problemas de visão e de audição (74.9%);
déficit na força muscular (59.7%), etc.
 A isso se associa uma característica psicológica, que é um forte
apego ao passado (57.2%). A correlação entre Saúde Mental e
Percepção do Envelhecimento faz supor uma influência negativa
dos problemas psicológicos sobre a autopercepção dos idosos. A
presença de ansiedade, irritabilidade, sensação de insuficiência, de
inutilidade, entre outras, pode levar aos idosos a supervalorizar (e
em alguns casos extremos, a acelerar) alguns traços próprios da
velhice.

Autonomia Funcional: Entre as principais características da perda
progressiva da Autonomia Funcional estão os problemas de
mobilidade, de mover-se de um lugar a outro, principalmente entre
lugares distantes (40.9%). Outra limitação importante está no ato de
preparar seus alimentos (32.7%) e, finalmente, em conseguir as
coisas que necessitam (29.6%).
 Em síntese, muitos problemas da Autonomia Funcional podem ser
explicados a partir de fatores individuais, familiares e sociais. Entre
os fatores individuais, em primeiro lugar se encontra o perfil
psicológico e mental prévio da pessoa que envelhece, em seguida
vem o nível educacional, as experiências vitais críticas, os acidentes,
as doenças pregressas e atuais, a ocupação pregressa e atual, etc.
 Socialmente, está em primeiro lugar, sem dúvida, a contundente
influência restritiva que a sociedade exerce sobre os idosos,
limitando suas possibilidades de atuação, oprimindo-os sob os
modelos e padrões do "velho", e restringindo suas possibilidades de
participação. De modo geral, não existe uma velhice típica, padrão,
característica e igual. Existem múltiplas velhices; tantas como
sociedades, culturas e classes sociais.



A prevalência de depressão e transtornos depressivos nos
idosos, de um modo geral, oscila desde 10 até 20-27%
(Blazer, Hughes, George - 1987). Já em idosos
institucionalizados a taxa de prevalência de depressão vai
de 25 a 80% (Hyer y Blazer -1982). É bom saber também
que a depressão é 3 vezes mais prevalente em idosos com
alguma deterioração funcional que naqueles sem essa
condição;
Os sintomas mais freqüentes costumam ser inquietação
psicomotora (depressão ansiosa), sintomas depressivos
(insuficientes para categorias de diagnóstico formal),
somatizações variadas, sinais de alterações vegetativas,
perda da autoestima, sentimentos de abandono e
dependência, eventuais sintomas psicóticos, déficit
cognitivo variável, idéias de ou suicídio.
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E é assim que o idoso, considerado um peso social, frustrase com a subtração de seu espaço existencial,
anteriormente vivido com plenitude e sucesso. Experimenta
uma profunda reação de perda sem nada a substituir o
objeto perdido: o seu valor como pessoa. Desta forma,
mesmo indivíduos relativamente equilibrados
emocionalmente durante a vida pregressa, com a velhice
tendem a descompensar.



Ballone GJ, Moura EC Depressão e ansiedade no Idoso in. PsiqWeb, Internet, disponível
em www.psiqweb.med.br, revisto
em 2006;
Ballone GJ, Moura EC Transtornos Emocionais do
Envelhecimento, in. PsiqWeb,
Internet, disponível em
www.psiqweb.med.br, revisto em
2008;
Oliveira, K. L., Santos, A. A. A.,
Cruvinel, M., Néri, A. L. –
Relação entre ansiedade,
depressão e desesperança entre
grupos de idosos. Psicologia em
estudo, Maringá: 2006.
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