Educação física escolar e filosofia: uma prática consciente Maria

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Educação física escolar e filosofia: uma prática consciente
Maria Bernadete Schreiber
Introdução
Considerando o crescimento, a qualidade da literatura na área da Educação Física (Oliveira 1983, Bracht 1985,
Santin 1987, Kunz 1991, Tubino 1992, Freire 2003), entre tantos, percebe-se a evolução contínua da área,
conforme Freire (2001, p. 19) comenta "... a Educação Física não é, ela está sendo construída a cada instante, e
ainda bem".
Questionamentos referentes ao seu papel na sociedade, qual seu objeto de estudo? O que é Educação Física e para
quê? Tem servido como temas para discussões em debates, estudos, enfim, local onde haja pessoas interessadas
no desenvolvimento da disciplina.
Assim como na educação em geral percebemos que o foco de ensino deixou de ser somente o desenvolvimento do
raciocínio lógico ou a memorização de fórmulas e informações, na Educação Física as mudanças de ponto de
vista também acontecem, comprovando a dinâmica da área. Citamos como exemplo o fato de vários profissionais
refletirem sobre os aspectos negativos da supervalorização do esporte competitivo (TUBINO, 1992).
Relegada a um segundo plano, a Educação Física praticada nas escolas carece de uma reflexão mais aprofundada.
O professor tem geralmente sua atuação restrita a desenvolver a aptidão física dos alunos e a ensinar os
fundamentos técnico-tático dos esportes (OLIVEIRA, 1986). É discutível o fato de tais atividades serem de
responsabilidade do professor de Educação Física, entretanto, este profissional em sua ação pedagógica precisa
encontrar caminhos que apontem a descoberta de valores mais amplos para serem inseridos no planejamento dos
objetivos da Educação Física escolar. As contradições existentes no sistema educacional resultam em grande
parte, devido ao distanciamento que há entre a teoria e a prática.
Conforme Medina (1989), os professores apresentam dificuldade em perceber a importância da relação do
processo de reflexão em comunhão com as nossas ações.
Segundo Betti (1991) não há neutralidade no conteúdo da Educação Física, assim como de qualquer outra área.
Ele é instrumento para a formação de um homem, com uma visão antecipada de qual homem se deseja formar. O
conhecimento reflexivo e global sobre o saber prático do homem é encontrado na visão da Filosofia, pois a
mesma busca a visão de totalidade.
Freire (2003), em seu livro "Educação como Prática Corporal" aponta diversos pontos que por meio da reflexão
quanto à metodologia na Educação Física, acabam por se tornarem mais claros e objetivos para o professor e o
aluno. Os autores relatam uma abordagem filosófica reflexiva que orienta o educador para uma prática
consciente: "...levar a criança a aprender a ser cidadã de um novo mundo, em que o coletivo não seja sobrepujado
pelo individual..."(FREIRE e SCAGLIA, 2003, p.32).
Afirma Santin (1987, p.28) que:
... a Educação Física terá maior identidade e maior autonomia quando se aproximar mais do homem e menos das
antropologias; quando deixar de ser instrumento ou função para ser arte; quando se afastar da técnica e da
mecânica e se desenvolver criticamente. A Educação Física deve ser gesto criador.
Por intermédio de um maior comprometimento com a Filosofia, o professor em suas reflexões poderá reformular
conceitos que podem orientar a conduta do seu aluno e interpretar melhor o que ele faz do seu corpo, de seus
movimentos e das suas relações com o mundo (SANTIN, 1987). Consciente da importância da valorização do ser
como um todo, respeitando os seus limites o professor poderá tornar a sua ação pedagógica mais humanizada e
assumir a postura de quem está ciente do seu verdadeiro papel e função na sociedade.
A partir da dificuldade manifestada por parte dos profissionais da Educação Física escolar, em relação a maior
exploração de conhecimentos filosóficos, o presente estudo tem por objetivo contribuir com uma breve revisão de
literatura, convidando os educadores da área da Educação Física escolar para que em sua prática pedagógica
procurem caminhos que os conduza a possibilidades de melhor compreensão e mudanças significativas em sua
prática. É provável que por meio desta conscientização, o professor possa transformar sua ação pedagógica,
buscando a valorização do ser, bem como conscientizar sobre a necessidade de acrescentar à sua formação
disciplinas de conhecimento pedagógico-filosófico. A variedade de abordagens sobre a Educação Física depõe
contra o estabelecimento dos seus objetivos. O que a distingue das demais disciplinas é o movimento humano,
característica essencial da Educação Física. "Enquanto processo individual a Educação Física desenvolve
potencialidades humanas. Enquanto fenômeno social ajuda este homem a estabelecer relações com o grupo a que
pertence" (OLIVEIRA, 1986, p.105). Segundo este mesmo autor "... a colocação da disciplina nos centros de
saúde subverteu os seus objetivos. Educação Física é educação, portanto seu espaço é nos Centros de Ciências
Humanas e Sociais das universidades a que pertencem".
Para Oliveira (1994, p. 105), "A Educação Física no Brasil foi durante muito tempo considerada uma prática
neutra, sem conotação ideológica. Restringia-se a uma atividade física cujo movimento era apreendido pela
pedagogia do consenso em seus aspectos eminentemente biomecânicos". Não se pode esquecer que o corpo
humano não se move, age; não se pode confundir, pois, pedagogia do movimento humano com pedagogia do
deslocamento humano (Ferreira, 1990). Segundo Oliveira (1994, p. 105), "o panorama educacional brasileiro dos
anos 1980 parece que desmistificou esse estereótipo. Apesar de educação e política terem suas especificidades,
todo ato político pressupõe uma dimensão pedagógica, da mesma forma que toda pedagogia deixa transparecer
uma dimensão política".
Os benefícios que a prática de exercícios físicos podem trazer à saúde foram considerados argumentos suficientes
e decisivos para a inclusão da Educação Física na escola do século XIX. Considerando as ideologias as quais a
Educação Física tem servido, pensamos nos benefícios que a Filosofia da Educação Física nos aponta, entre eles:
"... a sabedoria filosófica não está apenas em conservar e utilizar o que nos foi deixado, está na transformação da
realidade através do desenvolvimento da razão e da emoção formadora da condição humana..." (TOMELIN,
2003, p.63).
Na constante busca por uma identificação e servindo as ideologias dominantes, a Educação Física já assumiu
diversos papéis na sociedade. Considerada como cultura do físico, como parte da medicina, como criadora de
sofisticadas técnicas esportivas dentre outras atribuições, esta área acabou por possuir diversos papéis que
geraram conflitos quanto à sua identificação.
Apesar da falta de reflexão teórica e de atitude científica que caracterizou a Educação Física como um todo até
poucos anos, houve avanços consideráveis nas áreas de influência biomédica e técnico-desportiva, mas os
avanços nesta área tendem a apresentar o professor como um formador de atletas, com tendências elitistas. Devese considerar que precisamos evoluir de forma mais conjunta, sendo capazes de formar mentes críticas e
conscientes (OLIVEIRA, 1986). Neste sentido, estaremos nos direcionando à conquista quanto a capacidade de
comprometimento e entendimento de conhecimentos filosóficos.
O pensamento pedagógico até o presente momento teve um real significado, pois possibilitou um aprimoramento
da prática docente, bem como uma evolução constante na forma de pensar a Educação Física Escolar brasileira.
Ao nos interarmos desse pensamento, novas concepções de ensinar, foram internalizadas, propiciando um
distanciamento de abordagens de ensino mecânico, pautado nos métodos ginásticos, que objetivam trabalhar o
corpo, fragmentando assim o direcionamento da Educação Física Escolar, que não pode preterir a influência da
mente sobre os comandos corporais.
Percebe-se nesta prática, que muitos profissionais que não possuem acesso a esse pensamento acadêmico, e
quanto tem, não o vê como possibilidade de mudanças em suas práticas docentes e, no entanto, desenvolvem o
seu trabalho de forma dinâmica, criativa, atingindo objetivos formadores reais, atendendo plenamente o trabalho
que a sociedade espera da Educação Física na escola.
De acordo com Pereira (1998, p. 170) "aos olhos dos professores, a teoria não é um problema, mas a relação
teoria-prática é que se constitui um problema prático". Esta citação explica a preocupação do estreito
relacionamento entre a teoria e a prática da Educação Física Escolar, porém o que temos percebido é o
distanciamento e o caminhar independente da teoria e da prática.
Entendemos que as discussões teóricas que ocorrem nos espaços acadêmicos culminam em conceitos cada vez
mais complexos. Por outro lado, nas ações docentes, na prática percebe-se que o exercício reflexivo sobre a ação
não tem muito espaço. Dessa forma, somos levados à compreensão de que há um extenso trabalho teórico da
Educação Física Escolar publicado que é decorrente do exercício da reflexão no espaço acadêmico que, nem
sempre, é um produto real de uma prática concreta e pouco se tem publicado côo resultado dessa prática real da
Educação Física Escolar.
De acordo com Oliveira (1986, p.5) está inserido na função social da Educação Física escolar:
... criar uma atmosfera que permita o despertar de uma consciência crítica que permitirá o futuro profissional estar
apto a cumprir a sua missão: educar; impedir, portanto, que a Educação Física - em especial a escolar transforme-se numa máquina de não fazer nada. Desta forma, o maior passo estará dado para que a Educação
Física encontre o seu verdadeiro lugar, onde nunca esteve e de onde nunca deverá sair.
Conforme Guerra (1998), a sociedade ainda traz consigo uma forte valorização do conhecimento técnico que
instrumentaliza o homem para a produção. Transferindo este pensamento para a Educação Física, nos
encontramos novamente pressionados pelo resultado, pela competitividade. A Educação Física esta em busca de
conhecimentos em bases mais amplas. Para tanto, sendo a educação, uma prática social que tanto influencia como
recebe influência dos valores e códigos sociais vigentes e precisa ser orientada para responder as necessidades
mais incisivas tanto dos indivíduos quanto da sociedade. Nesta busca surge a Filosofia, instigando reflexões que
possam validar a prática.
Para Medina (1983, p. 68)
A tarefa do novo profissional da Educação Física em sua função básica como agente renovador e transformador
de cultura subdesenvolvida em que vive só será possível de se concretizar por intermédio de uma prática. Some as
nossas ações é que poderão efetivar mudanças numa determinada situação. Aliás, seja qual for a área de atuação,
nada acontecerá de fato à realidade existente se não houver uma prática dinamizando esta mesma realidade.
Contudo, qualquer prática humana, sem uma teoria que lhe de suporte, torna-se uma atitude tão estéril (apenas
imitativa) quanto uma teoria distante de uma prática que o sustente.
O autor foi oportuno ao incitar os profissionais da área para se engajarem em mudanças que possibilitem uma
prática mais eficiente. Além disso, esse chamado sugere aos profissionais que façam uma reflexão em relação a
novas idéias a partir de suas práticas, pois, para Medina (1983, p. 83), "é deste elo entre a ação e reflexão que os
profissionais vão retirar os elementos que servirão de alavanca na mudança desta realidade por uma outra", ou
seja, a reflexão na ação e a reflexão da ação são condições importantes para dar um contorno geral para o
verdadeiro significado da Educação Física, principalmente no contexto escolar.
Medina (1983, p. 72):
... pode se definir como arte e a ciência do movimento humano que, através de atividades específicas, auxiliam no
desenvolvimento integral dos seres humanos, renovando-os e transformando-os no sentido de sua auto-realização
e em conformidade com a própria realização de uma sociedade mais justa e livre.
Kolyniak (2000), alerta para o fato que: mediante o desenvolvimento de uma atuação pautada no compromisso
com a construção do conhecimento, estaremos mais próximos de sermos profissionais que refletem e elaboram
sobre um saber específico.
A Educação Física é um componente importante no caminho de construção da cidadania, na medida em que seu
objeto de estudo é a produção cultural da sociedade, da qual os cidadãos têm o direito de se apropriar. Neste
sentido, entende-se a Educação Física como uma área de conhecimento da cultura corporal e de movimento
integra o ser humano, transformando-o num cidadão que vai produzi-la, reproduzi-la e transformá-la, para
usufruir os jogos, os esportes, as danças, as lutas e as ginásticas, em benefício do exercício crítico da cidadania e
até mesmo da melhoria da qualidade de vida da população em geral.
Frente à busca constante por uma melhor clareza de idéias e objetivos, nos encontramos caminhando em direção a
reflexões com tomada de consciência. Tal reflexão conduz a procura de uma adequada postura pedagógica. Ao
aproximar-se desta postura torna-se de fácil compreensão: "... Educação Física é educação, na medida em que
reconhece o homem como o arquiteto de si mesmo e da construção de uma sociedade melhor e mais humana.
Onde não será necessário levar vantagem em tudo" (OLIVEIRA, 1986, p. 106). É fato comum observarmos na
prática a deficiência apresentada por diversos representantes da Educação Física ao serem questionados em
relação às idéias e objetivos mais concretos com relação à disciplina em evidência. O mesmo desacerto se faz
presente ao perceber que existe um grande distanciamento entre as disciplinas curriculares oferecidas na
graduação e o que realmente necessitamos para um bom desenvolvimento do trabalho pedagógico. Grande parte
dos currículos atuais encontra-se fragmentado e desarticulado das idéias sócio político-pedagógico. Nas
faculdades de Educação Física o currículo deveria dar subsídios básicos ao futuro professor, tornando-o capaz de
acompanhar as transformações da sociedade e do conhecimento científico pedagógico (OLIVEIRA, 1986).
Para Ghiraldelli Júnior (1992, p. 23), as finalidades da Educação Física como componente curricular destaca o
seguinte:
A Educação Física pode contribuir para a autodisciplina, fortalecer a saúde, desenvolver os valores estéticos, os
valores cooperativos, o raciocínio e a presteza mental, sem esquecer que a ela cabe também o estudo da fisiologia,
a anatomia, das técnicas, da história, etc. Enfim, ela compõe o conjunto das disciplinas escolares e cumprirá o seu
papel quanto mais conseguir tornar-se Educação Física Escolar.
Segundo Escobar apud Tavares e Morais (1997, p.36.), as avaliações do atual o currículo de formação evidencia
um processo de ensino - aprendizagem desarticulado seqüencialmente e incoerente, o qual não solicita que o
aluno utilize as informações recebidas ou retidas e proceda a análises, trabalhe com opiniões pessoais e se
posicione criticamente.
Parte desta defasagem se dá em função dos desencontrados currículos oferecidos na grade curricular do curso de
Educação Física. A valorização de disciplinas técnicas e a insignificância ou até mesmo nenhuma importância
voltada as disciplinas de caráter reflexivo/filosófico resultam em desarticulação com a realidade.
Por não haver neutralidade no ato educativo, o próprio currículo traz explicitamente o aspecto político,
demonstrando o comprometimento com o interesse de uma outra classe social (Soares apud MORAIS e
TAVARES, 1997, p. 32).
Parte da fragmentação existente no currículo da área acontece pela preocupação demasiada em atender o mercado
de trabalho, fato que contribui para a desqualificação do profissional de Educação Física (Tavares apud MORAIS
e TAVARES 1997).
Nesta sociedade, competitiva, mecanizada é preciso conhecimento para não se deixar manipular. "A formação do
professor é um processo contínuo e permanente, mas a criação de uma predisposição do professor para esta
exigência de sua profissão tem de começar a ser construída na formação inicial". (MATOS apud MORAIS e
TAVARES, 1997, p. 33).
Ao vivenciar durante o curso de graduação a excessiva valorização do movimento técnico, onde a avaliação pode
comprometer a sua aptidão para a regulamentação da habilitação e somado às cobranças de trabalhos teóricos que
jamais são socializados ou discutidos, são fortes argumentos para dificultar o ideal de "educador"; "... o pior
acontece quando, já matriculados, aquele desempenho físico continua sendo fundamental no processo de
avaliação acadêmica. A preocupação dos cursos de graduação em Educação Física deveria ser, essencialmente,
ensinar a ensinar" (OLIVEIRA, 1986, p. 102).
O amadurecimento e a percepção do vazio costumam acontecer mais tarde, quando em sua atuação percebem que
existem situações questionadoras as quais não encontram respostas convincentes, orientações que lhe foram
passadas não apresentam o resultado esperado. Então, é hora de entrar em crise e buscar argumentos que o
conduzam a uma caminhada mais consciente, sem tantos desagrados.
Nesta sociedade competitiva e mecanizada é preciso conhecimento para não se deixar manipular. "A formação do
professor é um processo contínuo e permanente, mas a criação de uma predisposição do professor para esta
exigência de sua profissão tem de começar a ser construída na formação inicial". (Matos apud MORAIS e
TAVARES, 1997, p. 33).
Munaro (apud TAVARES e MORAES, 1997) destaca a falta de estímulo do professor diante das mais variadas
situações que acontecem na rotina inclusive ao constatar que as orientações recebidas durante a graduação
diferem da realidade. Comprovadamente há incoerência e insuficiência de conhecimentos ao longo do curso.
Segundo Morais e Tavares (1997), a formação dos professores deve abranger uma orientação mais profunda sobre
o homem, incluindo aspectos filosóficos, antropológicos e pedagógicos, com uma ampla fundamentação, para
uma atuação na escola básica não esquecendo sua participação sócio-política.
A formação de professores de Educação Física ainda tem sido centrada numa tradição cultural que preconiza a
transmissão e aquisição de conhecimentos, que privilegia conteúdos esportivos, com ênfase em aspectos
biológicos e neuro-comportamentais.
Para Sonoo et al (2002, p. 18):
Com o passar dos anos, a partir da evolução das necessidades da sociedade e do próprio conhecimento veiculado
na área, o espaço de intervenção deste profissional é ampliado. De fato, os profissionais desempenham suas
funções formulando e implementando programas de intervenção que, tendo como base a atividade corporal, são
altamente diferenciados em termos dos objetivos, clientela e meios.
Cabe aos profissionais manifestar opinião com relação às urgentes mudanças que se fazem necessárias com
relação ao currículo de Educação Física. Buscar uma formação pautada em qualidade, mais embasada
filosoficamente visando atuar de forma mais reflexiva, capaz de acompanhar e sugerir mudanças que venham ao
encontro ao crescimento de toda uma sociedade, evidenciando assim a valorização de toda a classe. Vivemos em
um mundo pragmático, isto é, voltado para as coisas práticas da vida, com uma posição imediatista para qualquer
situação. Sendo assim, com freqüência a Filosofia é repudiada como sendo inútil e conseqüentemente perda de
tempo.
Em todos os setores de conhecimento a Filosofia deve estar presente como reflexão crítica a respeito dos
fundamentos desse conhecimento, desse agir (ARANHA, 1989).
A Filosofia é natural e necessária ao homem. Demonstramos freqüentemente insatisfação diante de muitos
acontecimentos do nosso cotidiano. Estamos a todo instante buscando significações. Tomelin (2003) nos alerta
que: pela reflexão filosófica poderemos ter mais clareza sobre qual caminho tomar em nosso posicionamento
ético e político, de forma a contribuir para a construção de valores humanos.
Por meio da reflexão é possível que se tenha mais de uma dimensão dos fatos. A palavra Filosofia é de origem
grega: philos = amigos; Sophia = sabedoria. Neste sentido ser filosofo é ser amigo do saber e não seu dono.
Sabendo que ensinar a filosofar é ensinar a questionar, duvidar, admirar, conceituar implica numa postura de
maior abertura em tudo o que envolve o espaço da ação pedagógica (TOMELIN, 2003, p.56).
O conhecimento filosófico possibilita ao professor acompanhar de forma reflexiva e crítica a ação pedagógica
transformando a sua educação assistemática (de senso comum) em uma educação sistematizada (guiada pela
consciência filosófica).
As articulações mascaradas por trás de ideologias acabam por colaborar para o surgimento de novos caminhos,
desde que a sociedade tenha conhecimento capaz de identificar estes focos e contra-atacar. Gradativamente a
Educação Física apresenta-se mais credenciada para estar nestas lutas objetivando conquistas significativas para
toda a classe.
Para Betti (1998, p. 18):
A Educação Física não é uma ciência, como propõe a matriz científica, mas uma área de conhecimentos relativos
à cultura corporal de movimento, que sistematiza e critica conhecimento científicos e filosóficos, recebe e envia
demandas à prática, às ciências e à Filosofia. Concebemos a Educação Física como um campo dinâmico de
pesquisa e reflexão. Os problemas e as questões emergem da prática, e sua articulação vem a constituir uma
problemática que questiona as ciências e a Filosofia.
Como resultado da pesquisa científica e da reflexão filosófica, emergem novas perspectivas e questões sobre a
prática, e também indicações para a usa transformação em prática de melhor qualidade (humana). Conforme Betti
(1998, p. 18), assim:
Adquirimos da prática uma visão mais sofisticada, emergem questões mais complexas, aparecem problemas onde
tudo parecia estar bem. Novos questionamentos são enviadas às ciências e a Filosofia, a partir de uma prática
revisitada. Prática e conhecimento são indissociáveis em nosso entendimento na Educação Física.
Não podemos acreditar que encontramos na Filosofia o caminho exato para a resolução de todos os nossos
conflitos. Convém observar que não será apenas enfatizando a preocupação com as disciplinas das ciências
humanas que tornará o professor de Educação Física um educador completo. Espera-se que diante de uma visão
mais crítica este profissional possa estabelecer uma relação mais produtiva e real dos seus objetivos com valores
mais humanos e reflexivos. Conforme Betti (1998, p. 18), "só a Filosofia pode propiciar essa integração".
Entretanto os estudos nas áreas médica e esportiva devem continuar tendo seu papel de relevância sob pena de se
descaracterizar uma profissão que já tem um amplo e determinado mercado de trabalho (OLIVEIRA, 1986).
Para Santin (1987, p. 40), "a Filosofia desenvolve um gênero específico de raciocínio e lança mão de um número
mais ou menos ilimitado de recursos, através dos quais é possível ter acesso aos mais variados assuntos e às mais
complexas questões do mundo humano".
Medina (1989, p.63), afirma que:
...enquanto os profissionais da Educação Física não abrirem os olhos procurando penetrar em sua realidade de
forma concreta através da reflexão crítica e da ação, não serão capazes de promover conscientemente o homem a
níveis mais altos de vida, contribuindo assim com sua parcela para a realização da sociedade e das pessoas em
busca de sua própria felicidade.
Esse autor ainda considera de fundamental que todos os professores envolvidos com a Educação Física escolar
reflitam consideravelmente suas bases filosóficas, buscando resgatar a essência do ato verdadeiramente humano,
conhecer nossa realidade e encontrar caminhos diferentes daqueles até aqui trilhados.
Betti (1998, p. 19), entende que a principal tarefa da Educação Física na escola é:
Introduzir e integrar o aluno na cultura corporal de movimento, formando o cidadão que vai produzi-la,
reproduzi-la e transformá-la, instrumentalizando-o para usufruir do jogo, do esporte, da dança e das ginásticas em
benefício de sua qualidade de vida.
O mesmo autor relata ainda que a Educação Física também propicia aos alunos, como os outros componentes, um
certo tipo de conhecimento. Mas não é um conhecimento que se possa incorporar dissociado de uma vivência
concreta. A Educação Física não pode se transformar num discurso sobre a cultura corporal de movimento, sob
pena de perder a riqueza de sua especificidade, ela deve se constituir como uma ação pedagógica com aquela
cultura.
De acordo com Betti (1998, p. 19), essa ação pedagógica a que se propõe a Educação Física "será sempre uma
vivência impregnada da corporeidade do sentir e do relacionar-se. A dimensão cognitiva far-se-á sempre sobre
esse substrato corporal. O professor de Educação Física deve auxiliar o aluno a compreender seu sentir e seu
relacionar-se na esfera da cultura corporal de movimento".
Considerações finais
O suporte teórico mencionado nesta pesquisa tem a intenção de incentivar o professor de Educação Física para
que por meio de suas reflexões critico-filosóficas, em especial sobre educação e sociedade, consiga vincular a sua
prática com a teoria. Ainda são fatos isolados os momentos em que o professor transmite a visão de mundo,
despertando, ou não, no aluno o senso crítico e a capacidade de intervenção social, através de questionamentos e
reflexões sobre a realidade em que se vive. Enquanto permanece alienado e vazio, não percebe que está distante
de uma intervenção crítica na sociedade, portanto a possibilidade de êxito é nenhuma, a frustração é certa e a ação
de moldar vai continuar prevalecendo.
O momento atual sugere que se repense a Educação Física, para que ela venha á ocupar seu lugar dentro da
educação como um todo, ultrapassando a concepção de uma Educação Física com autoritarismo e massificação
dos movimentos, preocupada com a ordem, a disciplina e a mecanização do ser. Estas são algumas das questões
que geram inquietações na área e merecem uma reflexão filosófica e contínua. Observando como fator positivo à
ligação entre Educação Física e conhecimentos filosóficos, sugere-se em especial ao professor de Educação Física
escolar que procure suprir a defasagem filosófica encontrada nos cursos de graduação por meio da formação
continuada e pela busca incessante de novos caminhos, que venham contribuir para o fortalecimento deste
valoroso elo: Educação Física e Filosofia.
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FREIRE, João Batista. Educação como Prática Corporal. São Paulo: Spicione, 2003.
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GHIRALDELLI JÚNIOR, Paulo. Educação Física progressista: a pedagógica crítica-social dos conteúdos
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GUERRA, Ricardo Filosofia e Educação Física Vislumbres de Uma Relação. In: Revista Córporis, EsefUpe, ano 4, Vol 1, n.1, 1997.
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