GEOLOGIA BÁSICA PARA ESPELEÓLOGOS Curso Nível – II Índice

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GEOLOGIA BÁSICA PARA ESPELEÓLOGOS
Curso Nível – II
Índice
INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................3
1.
GEOLOGIA GERAL.................................................................................................................................................4
1.1
DEFINIÇÃO DE ROCHA ...........................................................................................................................4
1.1.1 ROCHAS ÍGNEAS.........................................................................................................................................5
1.1.2 ROCHAS SEDIMENTARES .............................................................................................................................6
1.1.3 ROCHAS METAMÓRFICAS ............................................................................................................................7
1.2
DEFINIÇÃO DE MINERAL.......................................................................................................................7
1.3
ONDE SE PODEM FORMAR AS GRUTAS .............................................................................................8
1.3.1 ROCHAS SEDIMENTARES .............................................................................................................................9
1.3.1.1
CALCÁRIO........................................................................................................................................................ 9
1.3.1.2
DOLOMITO ......................................................................................................................................................10
1.3.1.3
GESSO E HALITE.............................................................................................................................................11
1.3.1.4
ARENITO .........................................................................................................................................................12
1.3.2
ROCHAS ÍGNEAS.......................................................................................................................................12
1.3.2.1
ROCHAS ÍGNEAS EXTRUSIVAS - BASALTO..........................................................................................................12
1.3.2.2
ROCHAS ÍGNEAS INTRUSIVAS - GRANITO..........................................................................................................12
1.3.3 ROCHAS METAMÓRFICAS .........................................................................................................................13
1.4
INSTALAÇÃO DE ROCHAS CARBONATADAS À SUPERFÍCIE ......................................................13
1.5
COMO SE FORMAM AS GRUTAS ........................................................................................................15
1.6
SEDIMENTOS EM GRUTAS...................................................................................................................16
1.7
PRINCIPAIS ZONAS CALCÁRIAS DO PAÍS ........................................................................................17
1.8
CONCEITO DE DESCONTINUIDADE...................................................................................................19
1.8.1 FALHA .....................................................................................................................................................19
1.8.2 FRACTURA ...............................................................................................................................................20
1.8.3 DIACLASE ................................................................................................................................................20
1.8.4 SUPERFÍCIE DE ESTRATIFICAÇÃO ..............................................................................................................20
1.9
ALTERAÇÃO QUÍMICA DOS CALCÁRIOS.........................................................................................21
2.
CARSO – EXOCARSO ............................................................................................................................................22
2.1
PAISAGEM E MORFOLOGIA CÁRSICA ..............................................................................................24
2.1.1 LAPIÁS .....................................................................................................................................................24
2.1.2 ALGARES ..................................................................................................................................................25
2.1.3 DOLINAS ..................................................................................................................................................26
2.1.4 UVALAS ....................................................................................................................................................27
2.1.5 POLJES ....................................................................................................................................................27
2.1.6 SUMIDOUROS...........................................................................................................................................27
2.1.7 “PONOR”................................................................................................................................................28
2.1.8 SURGÊNCIAS OU NASCENTES .....................................................................................................................29
2.1.8.1
2.1.9
2.1.10
2.1.11
3.
TIPOS DE SURGÊNCIAS .....................................................................................................................................29
VALE EM CANHÃO .....................................................................................................................................30
VALES CEGOS ......................................................................................................................................30
TERRA ROSSA .......................................................................................................................................30
ENDOCARSO ...................................................................................................................................................30
3.1
3.2
DEFINIÇÃO DE GRUTA .........................................................................................................................31
GRANDES TIPOS DE GRUTAS..............................................................................................................31
Página 1
3.2.1
3.2.2
GRUTAS PRIMÁRIAS ..................................................................................................................................32
GRUTAS SECUNDÁRIAS .............................................................................................................................32
3.2.2.1
GRUTAS EXÓGENAS .........................................................................................................................................32
3.2.2.2
GRUTAS ENDÓGENAS .......................................................................................................................................33
Grutas de descontinuidade ...........................................................................................................................................33
Grutas cársicas .............................................................................................................................................................34
3.2.3 GRUTAS DE GELO E GRUTAS GLACIARES ....................................................................................................35
3.3
ZONAS HIDROLÓGICAS CÁRSICAS ...................................................................................................35
3.3.1 ZONA VADOSA .........................................................................................................................................36
3.3.2 ZONA VADOSA INACTIVA ..........................................................................................................................36
3.3.3 ZONA VADOSA SEMIACTIVA, ZONA SEMIACTIVA OU ZONA EPIFREÁTICA .....................................................38
3.3.4 ZONA FREÁTICA .......................................................................................................................................38
3.3.5 OS SUMIDOUROS E AS NASCENTES .............................................................................................................39
3.4
A SEDIMENTAÇÃO EM MEIO CÁRSICO ............................................................................................39
3.4.1 SEDIMENTOS CLÁSTICOS...........................................................................................................................39
3.4.2 SEDIMENTOS ORGÂNICOS .........................................................................................................................40
3.4.2.1
SEDIMENTOS FITOGÉNICOS ..............................................................................................................................40
3.4.2.2
SEDIMENTOS COPROGÉNICOS ...........................................................................................................................40
3.4.2.3
FOSFATOS .......................................................................................................................................................40
3.4.3
SEDIMENTOS TRANSPORTADOS EM SOLUÇÃO OU DE ORIGEM QUÍMICA .......................................................41
3.4.3.1
3.5
CONCREÇÕES ..................................................................................................................................................41
3.4.3.1.1
Concreções associadas a fluxos de água ...................................................................................................41
3.4.3.1.2
Lagos e diques ..........................................................................................................................................42
3.4.3.1.3
Depósito de lagos......................................................................................................................................43
3.4.3.1.4
Formas de gotejamento .............................................................................................................................44
3.4.3.1.5
Concreções de capilaridade.......................................................................................................................47
3.4.3.1.6
Outro tipo de concreções ..........................................................................................................................48
FASES DE DESENVOLVIMENTO DE UMA CAVIDADE...................................................................49
BIBLIOGRAFIA ..............................................................................................................................................................51
Página 2
INTRODUÇÃO
O fascículo de geologia constitui um documento de apoio a todos aqueles que pretendam
usufruir das grutas, quer numa perspectiva mais científica, ou numa abordagem mais
direccionada para a exploração e topografia, ou outras.
Qualquer espeleólogo independentemente da sua área de formação académica ou
profissional tem que possuir os conhecimentos mínimos para poder usufruir desses espaços
causando-lhes o menor número de danos ou impactos que ponham em causa a integridade da
gruta, o seu ecossistema, ou que ponha em risco a preservação dos vestígios e informação
científica aí presentes.
A par destes conhecimentos, vai tentar-se, neste capítulo da geologia, transmitir de forma
simples, conceitos essenciais para compreender o meio onde se inserem as grutas.
Este fascículo compreende apenas uma primeira abordagem ao que pode ser chamado de
espeleogeologia. Optámos por dividir este fascículo em 3 capítulos. O primeiro trata de
conhecimentos geológicos básicos, que irão ser precisos para a correcta compreensão dos
conceitos referidos nos outros dois capítulos. O segundo é referente ao Exocarso, ou seja
o carso que vemos à superfície. O terceiro trata do Endocarso, o carso que se encontra em
profundidade e para o qual as grutas são portas de entrada.
Ao construirmos este pequeno manual, deparámos com o facto de que estava demasiado extenso e
que não era possível abordar de forma correcta todo o seu conteúdo no espaço de duas horas, que é
o tempo contemplado neste curso, para a parte da geologia. Mesmo assim, optámos por manter toda
a informação, criando “caixas” cuja leitura pode passar a ser feita numa fase posterior. Surgiram
desta forma as “caixas” cinzentas, que têm ligação no texto através de uma chamada numérica
(normalmente correspondentes a definições), ou não, e que podem ser de leitura posterior.
Boa leitura!
Página 3
1.
1.1
GEOLOGIA GERAL
DEFINIÇÃO DE ROCHA
As Rochas compreendem o conjunto de materiais que constituem a crusta terrestre. Podem ser
compostas por:
- minerais;
- fragmentos de outras rochas;
- restos de organismos (conchas ou exosqueletos).
As rochas podem ser formadas quase exclusivamente por um tipo de mineral ou por vários
tipos diferentes de minerais. Por exemplo, o quartzito (enquanto rocha metamórfica) é
composto em cerca de 80% por quartzo, enquanto que o granito (rocha ígnea plutónica) é
composto por quartzo e feldspatos (cerca de 90%) e a parte restante, por outros minerais, tais
como, biotite, moscovite, piroxenas, anfíbolas, etc. (sendo que os dois últimos correspondem a
grupos de minerais1).
As rochas são classificadas consoante a sua génese, dividindo-se em:
- rochas ígneas – as que se formam a partir do arrefecimento do magma;
- rochas sedimentares – as que se formam a partir de constituintes de outras rochas ou de
restos vegetais ou animais;
- rochas metamórficas – se quaisquer das anteriores forem sujeitas a condições de pressão e
principalmente de temperatura que lhes provoquem alteração mineralógica, química e textural.
Cada um destes tipos de rochas pode dar origem a qualquer um dos outros, dependendo dos
fenómenos que possam ocorrer. Assim, por exemplo uma rocha ígnea plutónica (ex.: granito),
que tenha ficado exposta aos agentes erosivos e se tenha desagregado e dado origem a
fragmentos minerais (grãos de areia, por ex.), pode vir a constituir um sedimento, (componente
detrítica) dando origem a um arenito, isto é, uma rocha sedimentar. Um arenito, por sua vez,
pode sofrer processos tectónicos e ficar sujeito a um aumento de temperatura e pressão, que
lhe provoque recristalização mineral, de forma a transformar-se numa rocha metamórfica
(quartzito, por ex.).
Estas transformações de uns tipos de rocha noutros não estão sujeitas a uma ordem definida,
ocorrendo de acordo com o Ciclo Geológico.
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Figura 1_ Ciclo Geológico (in GEOLEX _ e-Geo, Ineti I.P.).
1-Grupos de minerais
Grupos de minerais admitem na sua estrutura (fórmula química), e numa mesma posição estrutural, diferentes elementos
químicos, desde que mantenham a estabilidade da molécula.
Veja-se a seguinte fórmula química de minerais do grupo das anfíbolas:
A0-1B2Y5Z8O22(OH,F,CL) , onde a ocupar a posição
A, podem existir iões de cálcio, sódio, potássio, chumbo, ou boro (Ca, Na, K, Pb ou B). À semelhança de A, a ocupar as
posições B, Y e Z podem existir uma série de elementos químicos, uns ou outros, que a molécula é estável e característica
de determinado mineral do grupo das anfíbolas.
1.1.1
ROCHAS ÍGNEAS
As rochas ígneas resultam do arrefecimento lento de grandes massas de material magmático
no interior da crusta, ou do arrefecimento rápido da lava à superfície.
O primeiro caso refere-se às rochas ígneas intrusivas e o segundo, às extrusivas.
Em qualquer dos casos, o material magmático resulta da fusão das rochas do manto (por
exemplo em zonas de “rifte”, ou zonas de colisão de placas tectónicas – zonas de subducção –
Fig. 10, bloco 3) ou ainda de áreas continentais que tenham sofrido subsidência2 ou
tectonismo3 associadas a condições de carácter Geotectónico favoráveis à fusão.
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2-Subsidência
A subsidência consiste no afundimento de uma porção de terreno rochoso, em relação ao restante. Pode estar
associado a processo orogénico, colapso gravítico, falhas, contracção térmica ou fenómenos de isostasia.
3- Tectónica
A tectónica refere-se aos processos geológicos que fazem movimentar massas rochosas a várias escalas (placas
litosféricas) provocando uma reorganização da crusta terrestre. As forças que causam estes movimentos
envolvendo massas crustais ou placas litosféricas denominam-se campos de tensões. Desta forma, pode haver
colisão entre placas (com geração de zonas de subducção e fusão parcial) ou, ainda, diapirismo associado a ascensão
de massas de rochas plutónicas como granitos.
Uma rocha intrusiva, tem origem em material magmático que solidificou no interior da crusta. Normalmente, estes
materiais
magmáticos
ascendem,
essencialmente
por
diferença
de
densidades,
ou
injecção
mecânica
tectónicamente controlada. O material fundido quando é menos denso que os materiais crustais encaixantes,
ascende na crusta deformando e fracturando as rochas encaixantes, até que “estaciona” quando se atinge o
equilíbrio.
Estas rochas quando se apresentam numa massa de dimensões consideráveis como, por exemplo, os maciços ígneos
plutónicos de Sintra ou do Gerês, denominam-se batólitos. Por outro lado, quando se instalam em espaços, tais
como, fracturas, falhas, ou fendas, denominam-se filões.
As rochas extrusivas que resultam da emergência do material magmático sob a forma de lava à superfície ou
arrefece muito perto desta, constituem na sua maioria os aparelhos vulcânicos e escoadas lávicas.
1.1.2
ROCHAS SEDIMENTARES
As rochas sedimentares resultam da acumulação de sedimentos numa bacia de recepção ou
sedimentação. Os sedimentos que depois de litificados4 dão origem a estas rochas, têm
origem na desagregação de rochas pré-existentes (ígneas, sedimentares ou metamórficas),
devido à acção dos agentes erosivos. Neste caso, estamos perante rochas sedimentares ou
detríticas, que variam desde os arenitos, conglomerados, arcoses, alguns calcários e argilitos,
entre muitas outras.
Além destas, são também consideradas rochas sedimentares as que resultam de precipitação
química (alguns calcários ou ricas em gesso, por ex.), ou as rochas bioconstruídas (edifícios
recifais, por ex.).
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4- Litificação
Processo através do qual os materiais não consolidados (sedimentos), se transformam em rocha sólida.
Esta transformação compreende diversos fenómenos, tais como, a desidratação dos sedimentos,
compacção e cimentação, no âmbito da diagénese.
1.1.3
ROCHAS METAMÓRFICAS
As rochas metamórficas resultam de uma alteração mineralógica e estrutural (textural) a partir
de qualquer outro tipo de rocha (ígnea, sedimentar ou mesmo metamórfica).
O metamorfismo5 ocorre sempre que uma rocha passe a estar sujeita a condições de pressão
e/ou temperatura diferentes das que lhe deram origem, ou seja, diferentes daquelas em que
essa rocha é estável química e fisicamente.
5- Metamorfismo
Conjunto de processos que ocorrem no interior da crusta terrestre, que provocam alterações químicas
e/ou físicas nas rochas, envolvendo o fenómeno de recristalização. O metamorfismo envolve rochas no
estado sólido e ocorre sempre que estas sejam submetidas a condições físico-químicas diferentes
daquelas em que se formaram. Isto acontece devido à dinâmica do planeta, que pode fazer com que os
materiais que existam próximo da superfície, sejam conduzidos para níveis profundos e, assim, tenham
que se adaptar às novas condições, tais como, o aumento de temperatura e pressão. A acção de fluidos
capazes de reagir quimicamente com a rocha, é também um factor de metamorfismo, tal como, a
quantidade de tempo durante o qual ocorrem estes fenómenos.
1.2
DEFINIÇÃO DE MINERAL
Substância química sólida caracterizada por ter determinadas propriedades químicas e físicas,
e uma estrutura atómica organizada (célula unitária6) que obedece a leis de simetria espacial.
Pequena lista de minerais e suas composições químicas:
Calcite _ CaCO3
Dolomite _ CaMg(CO3)2
Gesso _ CaSO4. 2H2O
Anidrite _ CaSO4
Halite/Salgema _ NaCl
Feldspato _ 2KALSi3O8
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6- Célula unitária
É a menor parte de um cristal que respeita todas as regras de simetria que o caracterizam. O cristal é
formado pela repetição tridimensional da sua célula unitária.
Figura 2_ Célula unitária de um cristal de calcite, dolomite e quartzo. Estas células quando repetidas
tridimensionalmente, dão origem a cristais de calcite, dolomite e quartzo, respectivamente.
Os minerais podem formar-se quando se dá o arrefecimento do magma, por precipitação química ou ter origem
biogénica.
No primeiro caso, temos como exemplo o quartzo, biotite ou as plagioclases. No segundo, temos por exemplo a
halite (cloreto de sódio - NaCl) que se forma, precipitando quimicamente devido à forte evaporação da água numa
bacia, em que haja uma alta concentração de sais na água (salmoura).
Por último, temos como exemplo de minerais biogénicos, a calcite ou a aragonite, que, além de poderem ser gerados
por precipitação química, constituem também o material de algumas carapaças e conchas de animais marinhos.
Estes minerais podem ainda, ser segregados por alguns organismos tais como os corais, constituindo os edifícios
recifais onde estes habitam.
Além de minerais carbonatados, também podem ocorrer minerais siliciosos de origem biogénica. A sílica é o
constituinte das carapaças de alguns organismos marinhos, tais como, as diatomáceas e os radiolários.
Os minerais são classificados em grupos consoante as suas características físico-químicas. Os grupos são:
Elementos nativos, Sulfuretos, Haletos, Óxidos, Hidróxidos, Carbonatos, Tungstatos e Molibdatos, Fosfatos,
Arsenatos e Vanadatos, Sulfatos, Boratos e Silicatos.
1.3
ONDE SE PODEM FORMAR AS GRUTAS
As grutas são cavidades naturais, subterrâneas, de dimensões variadas e com diferentes
origens e processos genéticos envolvidos. Podem ocorrer em quaisquer rochas:
- Sedimentares (carbonatadas, onde ocorrem mais frequentemente);
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- Ígneas;
- Metamórficas;
- Em glaciares e até em recifes de coral.
1.3.1
ROCHAS SEDIMENTARES
As rochas sedimentares resultam na sua maioria da deposição de detritos provenientes do
desmantelamento de outras rochas. Os materiais são transportados por meio aéreo ou
aquático e esse movimento deve-se essencialmente à acção da gravidade.
Esse percurso termina sempre que o agente de transporte (ar ou água) perca energia.
Normalmente os materiais depositam-se em zonas depressionadas de dimensões muito
variadas (métricas a quilométricas). A maior parte das vezes, a deposição dá-se sem
perturbações tectónicas e mostra uma gradação no tamanho dos sedimentos, desde o começo
da deposição (base da camada sedimentar), até ao fim desse episódio de sedimentação (topo
da camada sedimentar). A gradação normal ou positiva, mostra que os materiais mais pesados
e de maiores dimensões se depositam primeiro, na base, e os mais leves e de menores
dimensões, no topo. Assim sucessivamente, vão-se depositando os materiais em ciclos de
deposição ou camadas.
1.3.1.1 CALCÁRIO
Rocha sedimentar carbonatada constituída essencialmente por calcite (entre 50% a 95%).
Contém também dolomite e outros minerais em pequenas quantidades (argilas, óxidos e
feldspatos, entre outros).
É uma rocha que se forma em ambiente marinho e pode ser de origem química, detrítica ou
biogénica.
Os calcários que se formam por precipitação química são os mais puros e resultam da
precipitação (“cristalização”) da calcite a uma determinada profundidade, onde se reúnem as
condições óptimas de saturação, temperatura e pressão para que este fenómeno ocorra. Ex.:
calcário cristalino. Estes são calcários de origem inorgânica.
Quando se trata de calcários de origem detrítica, temos aqueles que resultam da acumulação
de conchas e carapaças (exosqueletos) cujos fragmentos foram cimentados7 formando uma
rocha coerente. Ex.: calcário fossilífero ou lumachela.
Por último, os calcários bioconstruídos resultam dos edifícios recifais formados por organismos,
tais como, os corais, que segregam material mineral carbonatado a partir do qual constroem o
local onde habitam. Ex.: recifes de coral. Estes últimos são calcários de origem orgânica
(bioedificados e bioacumulados).
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7- Cimentação
Processo que consiste na precipitação química de minerais siliciosos, carbonatados, metálicos ou
outros (cimento) que agrega as partículas numa rocha sedimentar, ou seja, preenche os espaços vazios
entre as partículas, agregando-as.
Figura 3_ Representação de forma muito simplificada, da zonação da deposição das rochas sedimentares,
desde a zona costeira até à plataforma distal.
Quanto mais perto da linha de costa, maior é a influência de materiais terrígenos transportados pelos rios.
Formam-se aí rochas como os arenitos e conglomerados (respectivamente formados a partir de areias e calhaus
de maiores dimensões). À medida que se caminha para a profundidade, o tamanho dos sedimentos tende a
diminuir, passando a ser cada vez mais finos e permanecendo em suspensão até se depositarem, dando origem
aos argilitos (a partir de argilas). Por fim, entra-se na zona onde se formam as rochas carbonatadas.
Os edifícios recifais são excepções a este ambiente de deposição dos calcários, uma vez que, os organismos que
os produzem, necessitam de condições de oxigenação, luz, temperatura e salinidade que se observam num
intervalo relativamente curto de profundidades.
1.3.1.2 DOLOMITO
Rocha sedimentar carbonatada idêntica a um calcário, mas constituída essencialmente por
dolomite.
A maior parte dos dolomitos derivam de calcários que sofreram uma alteração química
(dolomitização8) que lhes provocou a substituição do cálcio da calcite por magnésio, surgindo
assim o mineral dolomite.
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8- Dolomitização
Processo geoquímico em que se dá a substituição do ião cálcio pelo ião magnésio na calcite,
transformando-a em dolomite.
Neste processo há diminuição de volume dos minerais, consequentemente, da rocha, aumentando a
porosidade da mesma.
1.3.1.3 GESSO E HALITE
O gesso e a halite (salgema) são minerais que se formam por precipitação química em bacias
de sedimentação (continentais ou marinhas). Se a água de uma bacia estiver tão saturada de
sais, de maneira que se forme uma autêntica salmoura, as condições de saturação da água
atingem valores tais, que sempre que a taxa de evaporação seja superior à taxa de
precipitação, se formam grandes quantidades de minerais sulfatados e cloretados, constituintes
das rochas evaporíticas (gesso, halite/salgema).
Em associação permanente com estas rochas e minerais de origem evaporítica, existem
diversos minerais de argila e óxidos que, sendo “impurezas”, conferem as mais variadas cores
às rochas evaporíticas.
Os materiais evaporíticos podem ser soterrados em profundidade, na sequência da continuação da acumulação de
material sedimentar. No entanto, a partir de determinada altura e por diferença de densidade (à semelhança das
rochas ígneas intrusivas), estas massas de mineral tendem a ascender na crosta, “rompendo” as rochas que lhe estão
suprajacentes, podendo atingir a superfície. A este fenómeno chama-se diapirismo e, em particular quando são
envolvidas rochas salinas, denomina-se halocinese.
Figura
4_
Esquema simplificado representativo da génese de
evaporitos a partir de uma salmoura numa bacia (in GEOLEX _ e-Geo,
Ineti I.P.).
Figura 5_ Esquema simplificado do fenómeno de
diapirismo.
Adaptado
de
http://www.geovirtual.cl/geologiageneral/ggcap
05f.htm
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1.3.1.4 ARENITO
Rocha sedimentar detrítica que resulta da acumulação de fragmentos minerais (grãos de areia)
que foram cimentados7 (este cimento pode ser carbonatado, silicioso ou, menos
frequentemente, composto por óxidos de ferro ou outros metais). Os arenitos são compostos
por vários tipos de minerais sendo, no entanto, o quartzo o mais comum (entre 85% a 90%).
Podem conter feldspatos, biotite, moscovite, sulfuretos, óxidos, etc.. A quantidade de minerais
presentes, depende da alteração e da quantidade de transporte a que os sedimentos foram
sujeitos. Sendo o quartzo um dos minerais mais resistentes à alteração química e mecânica, é
aquele que entra em maior quantidade na composição dos arenitos.
1.3.2
ROCHAS ÍGNEAS
Apesar da grande variedade de rochas ígneas existentes, vamos descrever aqui, apenas o
granito e o basalto, uma vez que são aquelas onde mais frequentemente é possível a
existência de grutas.
1.3.2.1 ROCHAS ÍGNEAS EXTRUSIVAS - BASALTO
Rocha ígnea extrusiva, ou seja, forma-se pelo arrefecimento do magma basáltico à superfície
ou muito perto dela.
O basalto é uma rocha escura, composta essencialmente por olivinas, plagioclases e
piroxenas. É o principal constituinte da crusta oceânica, bem como de extensas extrusões em
ambiente continental.
Como é uma rocha que se forma pelo arrefecimento rápido do material magmático, os cristais
não atingem dimensões suficientes para serem identificados a olho nú, ou seja, a rocha tem
uma granularidade muito fina, podendo contudo transportar na massa líquida, cristais préformados de plagioclase, piroxena ou olivina.
1.3.2.2 ROCHAS ÍGNEAS INTRUSIVAS - GRANITO
Rocha ígnea plutónica, ou seja, que se forma a partir do arrefecimento de materiais
magmáticos diferenciados em profundidade, na crusta terrestre.
O granito é uma rocha clara, constituída essencialmente por quartzo e feldspatos (85% a 95%),
tendo também biotite, moscovite, piroxenas e anfíbolas, entre outros.
Como resulta do arrefecimento lento de materiais magmáticos, os cristais apresentam tamanho
milimétrico a centimétrico, o que nos permite identificá-los a olho nú, isto é, é uma rocha que
tem uma granularidade grosseira.
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Figura 6_ Esquema tridimensional com a zonação da instalação das rochas ígneas intrusivas, onde se
pode ver a posição relativa de Batólitos, Stocks, Diques ou Filões, Sills ou Filões camada e os
Lacólitos. Retirado de www.ufrgs.br
Figura 7- Esquema representativo da génese dos Túneis de lava, derivando de um aparelho vulcânico.
(Esquema de Nuno Farinha).
1.3.3
ROCHAS METAMÓRFICAS
As rochas metamórficas geram-se por alteração de outras já existentes (denominadas
protólitos). Isto é, qualquer rocha submetida a condições de metamorfismo5 torna-se numa
rocha metamórfica. Por exemplo, o calcário é o protólito da rocha metamórfica denominada
mármore.
1.4
INSTALAÇÃO DE ROCHAS CARBONATADAS À SUPERFÍCIE
Antes de passarmos ao tema seguinte, julga-se necessário compreender as razões que levam
a que as rochas geradas em ambiente marinho (dentro de água) apareçam em ambiente
Página 13
continental (fora de água), onde se torna possível aos espeleólogos explorar as grutas,
principalmente, as grutas calcárias.
As rochas carbonatadas surgem à superfície, muitas vezes numa posição elevada, por
exemplo, numa serra, como resultado dos processos tectónicos em episódios de colisão entre
placas tectónicas. A acção da erosão vai modelando a topografia, ao mesmo tempo que essas
rochas são expostas à acção física e química dos agentes erosivos (água, vento, calor, fauna,
flora e antrópicos).
9- Carreamento
Falha geológica inversa muito pouco inclinada (menos de 15º), que resulta de um campo de tensões
compressivo. Normalmente tem uma grande amplitude de movimento resultando num transporte
tangencial de material que pode atingir dezenas de quilómetros.
Na Figura 8 o bloco 3 corresponde a uma zona de subducção, isto é, a uma zona onde se dá a colisão de placas
(normalmente uma placa oceânica com uma continental) e onde as rochas que se formam em ambiente marinho são
transportadas pela acção de falhas (carreamentos9) para novas posições, em empilhamentos sucessivos, fazendo
com que rochas que se originam em ambiente marinho sejam depois encontradas em ambiente continental,
formando a maior parte das vezes, as cadeias de montanhas.
Figura 8_ Esquema representativo da dinâmica de placas crustais. Pode-se observar a zona de rift onde se gera a
crusta oceânica (bloco 1) e a zona de colisão de placas (bloco 3), onde se geram cadeias de montanhas por
enrugamento bem como acumulações de material vulcânico.
Após a instalação das rochas marinhas em ambiente continental, por efeito de processos de enrugamento
orogénico, começam a ocorrer os fenómenos de modelação do terreno e da topografia, ao mesmo tempo que se dão
os fenómenos de erosão e interacção água/rocha.
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Figura 9 – Esquema representativo de uma Cadeia de Montanhas.
1.5
COMO SE FORMAM AS GRUTAS
As grutas em rochas carbonatadas (calcários, dolomitos ou outras) têm como principal factor de
origem, a corrosão e dissolução, ou seja, a acção química da água. No entanto, a acção
mecânica da água em conjunto com fenómenos de natureza gravítica, têm alguma influência
na formação das grutas.
Os fenómenos químicos associados aos calcários serão abordados no ponto 1.10 – Alteração
química dos calcários, de forma mais aprofundada.
Relativamente às rochas evaporíticas (gesso, salgema, etc.), o processo de geração de grutas
deve-se quase exclusivamente à dissolução desses minerais, devido à passagem da água
através das fracturas, falhas e vazios.
Nas rochas ígneas, nomeadamente granitos e afins, o processo que dá origem a grutas,
consiste no aumento da abertura dos espaços entre os blocos, através da acção mecânica da
água e, também, de reacções químicas entre a rocha e a água (fundamentalmente a hidrólise).
A hidrólise vai transformar os minerais de feldspato dos granitos (e rochas afins) em minerais
de argila, carbonato de potássio e sílica, contribuindo assim para a desagregação da rocha e
abertura de espaços e potenciando a entrada e passagem de água quer através da rocha
desagregada (alterada) quer através das suas fracturas, falhas ou diaclases, ajudando à
formação de cavidades.
A reacção de hidrólise dos feldspatos traduz-se da seguinte forma:
2KALSi3O8 + H2CO3 + H2O
Feldspato potássico
K2CO3 + Al2Si2O5(OH)4 + 4SiO2
Carbonato de potássio + Caulinite + Sílica
Se considerarmos as rochas ígneas extrusivas (basalto) e grutas a elas associadas, referimonos a grutas que correspondem a algares e aos túneis de lava (que se formam durante as
erupções vulcânicas). Estes últimos, geram-se à medida que a lava se vai escoando e
arrefecendo na sua porção mais externa, mantendo cavidades na zona interior, onde a lava
Página 15
continua a escorrer. Assim, forma-se um canal com o exterior solidificado, continuando a lava
líquida móvel no seu interior.
As cavidades (algares e túneis) encontradas neste tipo de rocha estão relacionados
posicionalmente com os edifícios vulcânicos. Isto é, os túneis de lava tendem a ocorrer nas
zonas de escoamento da lava ao longo das vertentes do aparelho vulcânico, enquanto que, os
algares tendem a ocorrer associados a condutas ou chaminés de saída de lava, que, após o
cessar da actividade vulcânica tendem a colapsar. No entanto, os algares podem também
ocorrer ao longo dos túneis de lava, onde, se houver alguma zona de fraqueza, se possa gerar
por colapso do material, uma abertura vertical.
No caso das rochas metamórficas (aquelas onde é menos frequente o aparecimento de
grutas), as cavidades podem gerar-se em rochas estratiformes, devido ao desaparecimento de
horizontes intermédios, geralmente por dissolução associada a percolação de águas
subterrâneas, gerando assim espaços vazios.
Nos glaciares as grutas formam-se devido à fusão de partes do gelo, gerando assim vazios.
Estes episódios de fusão ocorrem pela acção da pressão da coluna de gelo supra jacente,
aliada a fracturas ou “bolsas” de ar. Estas grutas, tendem a ter um tempo de vida curto, uma
vez que, a água que circula nesses espaços, tende a congelar de novo, colmatando os
espaços abertos.
Os recifes de coral, como rochas calcárias que são, sofrem os mesmos processos químicos
que as restantes rochas carbonatadas. Além destes fenómenos, os recifes de grandes
dimensões, podem conter em si uma gruta, originada de forma natural e primária, ou seja,
contemporaneamente com a própria edificação coralina.
As rochas de natureza detrítica (arenitos ou conglomerados) são geralmente mais porosas que
as carbonatadas. A natureza do seu cimento pode ser e é, frequentemente, diferente dos seus
constituintes. Os fenómenos de dissolução e corrosão desse material provocam a
desagregação de parte da rocha, podendo dar origem a cavidades. Normalmente, tendem a
colapsar mais rapidamente que as grutas geradas noutro tipo de rochas.
1.6
SEDIMENTOS EM GRUTAS
Seja qual for o tipo de gruta e de rocha onde esta se forme, é quase sempre inevitável que
ocorra sedimentação de materiais, estranhos ou não, à gruta. Este assunto será tratado com
mais pormenor no capítulo 3.4.
Outro tipo de “sedimentos” que se podem encontrar dentro de grutas, são os que
correspondem aos vestígios da ocupação humana (ver Capítulo da Arqueologia).
Página 16
1.7
PRINCIPAIS ZONAS CALCÁRIAS DO PAÍS
Em Portugal continental, as mais importantes grutas calcárias localizam-se nas grandes
“manchas” calcárias do país: Algarve, Maciço Calcário Estremenho e Arrábida.
A fig. 9 corresponde à Carta Geológica de Portugal na escala 1/500 000, onde se salientam as
formações rochosas carbonatadas (calcários, dolomitos e outras), a fim de melhor se visualizar
as principais zonas calcárias em território nacional.
As zonas calcárias aqui representadas, correspondem a manchas em tom de azul e verde, e as
suas idades correspondem ao Jurássico (entre os 200 e os 145 milhões de anos,
aproximadamente) e ao Cretácico (entre os 145 e os 65 milhões de anos, aproximadamente).
g
C1A (C1A) Cretácico inferior orla ocidental: Grés de Torres Vedras; Grés de Almargem;
C1AOC (C1a) Parte inferior do Cretácico inferiordo Algarve Ocidental
C1AOR (C1a) Parte inferior do Cretácico inferior do Algarve Oriental
C1AR (C1) Cretácico inferior da Arrábida: Grés de Lagosteiros
C1BEL (C1B) \"Belasiano\"
C1BOC (C1b) Parte superior do Cretácico inferior do Algarve Ocidental; Margo-calcários de Porto de Mós
C1BOR (C1b) Parte superior do Cretácico inferior do Algarve Oriental
C1SC (C1) Cretácico inferior de Sintra-Cascais; Calcários ferruginosos;Calcários recifais;Margas; Grés superiores
C2 (C2) Cretácico médio: Calcários de Barcarena; Calcários com Rudistas
C3 (C3) Cretácico superior
CD (CD) Calcários dolomíticos; mármores
CF (CF) Mármores (Complexo Vulcano-Sedimentar carbonatado de Ficalho-Portel)
J1 (J1) Jurássico inferior: Dolomitos de Coimbra; Calcários e margas de Peniche
J1A (J1A) Calcários de Armação Nova e de Beliche
J1AD (J1AD) Jurássico inferior do Algarve: Dolomitos e calcários dolomíticos de Picavessa; Dolomitos de Boavista
J1D (J1D) Fácies com Paleodasycladus
J2 (J2) Jurássico médio do Algarve.
J2A (J2a) Calcários do Dogger: Calcários de Cabo Mondego; Calcários e calcários dolomíticos; Calcários de Póvoa da Lomba
J2O (J2O) Calcários oolíticos, Calcários e dolomitos do Dogger
J3 (J3) Jurássico superior
J3A (J3A) Jurássico superior do Algarve Ocidental
J3C (J3C) Jurássico superior do Algarve Oriental
J3E (J3E) Calcários do Jurássico superior do Algarve Oriental
J3F (J3F) Titoniano da Orla Ocidental: Calcários e margas do Cabo Espichel
J3G (J3G) Grés superiores: Grés superiores com restos de vegetais e dinossauros
J3P (J3P) Calcários e margas de Peral e Loulé
Y (J3P)
ML (ML) Miocénico de Lisboa
MLP (MLP) Formação carbonatada de Lagos-Portimão e Depósitos de Aljezur
MOA (Ma) Arenitos e calcários com seixos. Areias de Olhos de Água
MP (MP) Areias e argilas de Pombal e Redinha
MST (MST) Calcários de Santarém e Almoster
Página 17
Figura 10_ Mapa com as zonas carbonatadas de Portugal Continental, adaptado de Carta Geológica de
Portugal, à escala 1: 500 000 (Sistema de Coordenadas Hayford-Gauss, Militares, Dt. Lisboa).
Nos arquipélagos vulcânicos da Madeira e Açores, existem, obviamente, túneis e algares
associados às rochas basálticas.
Página 18
Figura 11 _ Foto de túnel de lava. Açores. (Fotografia de Pedro Cardoso).
1.8
CONCEITO DE DESCONTINUIDADE
Uma descontinuidade numa rocha é qualquer característica que quebre, obviamente, a sua
continuidade física, ou seja, uma diaclase, uma fractura, uma falha, a própria superfície de
estratificação, ou uma discordância estratigráfica.
As falhas e as fracturas têm origem em processos tectónicos, ou seja, são a resposta da rocha
a um campo de tensões que tende a deformá-la.
As diaclases são idênticas às fracturas, mas surgem como resposta da rocha ao alívio de
tensões a que esteve submetida quando em profundidade.
A superfície de estratificação tem origem nos fenómenos sedimentares.
1.8.1
FALHA
As falhas são planos de descontinuidade na rocha, gerados pela ocorrência de forças
compressivas ou tractivas, que provocaram o movimento relativo entre blocos de rocha. Podem
ter planos extremamente irregulares, ou não, e podem mostrar estrias de movimento, ou não.
Falha normal
Falha inversa
Página 19
Falha vertical
Falha horizontal ou de desligamento
Figura 12_ Esquema representativo dos vários tipos de falha. (in GEOLEX _ e-Geo, Ineti I.P.).
1.8.2
FRACTURA
As fracturas são superfícies de descontinuidade nas rochas onde não há movimento relativo
dos blocos e têm origem tectónica.
1.8.3
DIACLASE
As diaclases são um caso particular de fracturas, planos de descontinuidade na rocha onde
geralmente não há movimento relativo entre blocos. A sua origem deve-se essencialmente ao
alívio de tensões (descompressão) quando as rochas são exumadas e deixam de estar sujeitas
à carga de rocha supra jacente (pressão litostática).
As diaclases também podem ser formadas por retracção de corpos ígneos devido ao seu
arrefecimento.
1.8.4
SUPERFÍCIE DE ESTRATIFICAÇÃO
A superfície de estratificação é o plano de contacto entre duas camadas consecutivas de
sedimentação.
A estratigrafia apoia-se em vários princípios, entre os quais, o Princípio da Sobreposição, que diz que a camada de baixo é
mais antiga que a que está imediatamente acima, servindo assim de base, a um processo de datação relativa (este princípio
é igualmente usado nos estudos arqueológicos).
Figura 13_ Esquema representativo da sedimentação e do uso do principio da sobreposição dos estratos sedimentares.
Retirado de (http://e-geo.ineti.pt/geociencias/edicoes_online/diversos/guiao_fosseis/capitulo2.htm)
Página 20
1.9
ALTERAÇÃO QUÍMICA DOS CALCÁRIOS
As características químicas das rochas carbonatadas permitem-lhes ser dissolvidas pela água
da chuva, acidificada (gaso-carbónica) depois de atravessar a atmosfera e, eventualmente o
solo, pois este pode não estar presente.
As reacções químicas que ocorrem entre a rocha e a água vão ter como consequência o
alargamento de espaços.
Estes espaços correspondem às descontinuidades (que podem apresentar já, à partida, uma
certa abertura), através das quais, a água circula, abrindo-lhes cada vez mais espaço e
aumentando assim o seu grau de conectividade. Desta forma, é potenciada a existência de
espaços de dimensões cada vez maiores – as grutas!
A acidificação da água da chuva, que é pura, traduz-se na seguinte reacção, que consiste na
dissolução do dióxido de carbono na água:
H2O + CO2
Água + Dióxido de carbono
H2CO3
Ácido carbónico
A alteração química dos calcários compreende a dissolução dos minerais calcite e dolomite,
que são os principais componentes das rochas carbonatadas.
Tomando como exemplo a calcite, temos a seguinte reacção entre água e rocha:
CaCO3 + H2CO3
Calcite + Ácido carbónico
Ca(HCO3)2
Bicarbonato de cálcio
Desta forma, os minerais carbonatados vão sendo alterados e a água que circula pela rocha,
vai ficando cada vez mais saturada em bicarbonato de cálcio.
Quando a saturação da água em bicarbonato atinge determinados valores e quando ocorre a
diminuição da pressão do dióxido de carbono da água, ao serem atingidos espaços abertos,
ocorre a precipitação de calcite, dolomite ou aragonite (polimorfo10 da calcite).
10- Polimorfismo
Característica dos minerais que têm a mesma composição química, mas apresentam
estrutura cristalina e forma geométrica diferentes.
A precipitação destes minerais dentro das grutas é, por ventura, aquilo que lhes confere a
maior beleza e que mais e melhor as caracteriza em termos de mineralogia/geologia.
Página 21
A precipitação destes minerais na forma de espeleoformas traduz-se na seguinte reacção,
tomando novamente como exemplo, a calcite:
Ca(HCO3)2
Bicarbonato de cálcio
CaCO3 + H2O + CO2
Calcite + Água (evaporação) + Dióxido de carbono (libertação para a atmosfera)
A Figura 14 mostra num esquema muito simples, todo o percurso e fenómenos que ocorrem
neste circuito: água da chuva - dissolução da rocha - precipitação das espeleoformas dentro
das grutas.
Figura 14 - Retirado de http://www.cdcc.sc.usp.br/quimica/ciencia/cavernas.html
2.
O Carso
CARSO – EXOCARSO
é um tipo de morfologia que ocorre em rochas solúveis originado pela dissolução
1
química (corrosão) das mesmas, levando ao aparecimento de uma série de características
físicas típicas, tais como grutas, lapiás, dolinas, vales secos, vales cegos, rios subterrâneos,
canhões fluviocársicos e barreiras cársicas. O relevo cársico ocorre predominantemente em
terrenos constituídos de rochas calcárias, mas também pode ocorrer em outros tipos de rochas
1
O termo Carso deriva do alemão Karst, nome de uma região que se estende do norte da Itália
até o sudoeste da Eslovénia e ao noroeste da Croácia. O nome local em língua eslovena
Kras, significa aproximadamente "campo de pedras calcárias". A região também é chamada
Carso em italiano. Esta região possui um sistema geológico cársico e foi a primeira região
onde esse fenómeno foi estudado.
Página 22
carbonatadas, como o mármore e dolomitos. A dissolução química de uma rocha cria diversos
tipos de formas, constituindo testemunhos da acção da água. Algumas dessas formas são
visíveis no exterior, constituindo no seu conjunto o exocarso. Outras são subterrâneas,
representadas principalmente pelas grutas e são chamadas de endocarso.
Instala-se uma morfologia cársica quando existem condições favoráveis para o seu
desenvolvimento: como seja a ocorrência de: 1) rochas solúveis, 2) permeabilidade por
descontinuidades e 3) clima chuvoso.
1) rochas solúveis
O processo de carsificação ou dissolução química inicia-se pela combinação da água da chuva
ou de rios superficiais com o dióxido de carbono (CO2) proveniente da atmosfera ou do solo
(proveniente das raízes da vegetação e matéria orgânica em decomposição). O resultado é
uma solução de ácido carbónico (H2CO3), ou água ácida.
Também é importante a presença de vegetação para garantir que a água penetre no solo e não
seja perdida para a atmosfera. As regiões cársicas tipicamente não apresentam águas
superficiais, uma vez que a água da chuva é rapidamente absorvida pelo solo e acumula-se na
zona freática. Ao passar pelas fissuras (fracturas) a água corrói o carbonato de cálcio (CaCO3)
2
ou outros constituintes da rocha, como sulfato de cálcio (gesso) ou carbonato de magnésio
(magnesite). Os sais
3
removidos da rocha são transportados pela água em direcção às
camadas geológicas inferiores (mais baixas). Ao atingir a zona freática, a água pode correr em
rios subterrâneos abrindo cavidades na rocha, principalmente por erosão química, mas também
pode ocorrer erosão mecânica em zonas vadosas (acima do nível freático).
Quando a água é absorvida pelo solo apresenta um pH ácido. À medida que a água se infiltra
na rocha e o carbonato de cálcio se dissolve, o pH torna-se cada vez mais básico. Nos locais
em que esse processo ocorre é comum a presença de água dura (com alta quantidade de
magnésio e cálcio). O pH alcalino faz com que os sedimentos se precipitem rapidamente. Isso
favorece a formação de espeleotemas no interior das grutas e também mantém as águas de
regiões cársicas sempre límpidas.
2
No caso da corrosão da calcite, composta basicamente de carbonato de cálcio, o resultante
dessa
reacção
é
uma
solução
de
bicarbonato
de
cálcio:
CaCO3 + H2CO3 → Ca(HCO3)2
3
Os sais podem sedimentar-se em camadas geológicas ou serem arrastados para fora através
de nascentes ou ressurgências.
Página 23
2) Permeabilidade por fracturas
Define-se permeabilidade como a capacidade da rocha em permitir que um fluido passe
através dos seus vazios. A permeabilidade é resultado de grande porosidade da rocha, sendo
que no caso das rochas carsificadas essa porosidade deve-se essencialmente à presença de
descontinuidades, fissuras ou fracturas na rocha.
3) Clima chuvoso
É fundamental um suprimento de água de grande volume e frequente. Embora haja carsos em
regiões semi-áridas, isso é muito mais raro que nas regiões com grande pluviosidade. Este tipo
de paisagem ocorre principalmente em regiões com pluviosidade elevada, que garante um
fluxo de água suficiente para dissolver grandes porções de rocha.
2.1
PAISAGEM E MORFOLOGIA CÁRSICA
Ilustração e legenda adequada das principais formas cársicas.
Figura 15 –
LAPIÁS
2.1.1
Testemunhos superficiais da dissolução da rocha. Os lapiás são normalmente formados pela
dissolução da rocha nos seus pontos de entrada, ou seja, a rocha que inicialmente possuía
fissuras, abre-se cada vez mais e acaba por separar-se em blocos. Os lapiás apresentam
ranhuras ou caneluras que separam os blocos contíguos, evidenciando o caminho da água.
Página 24
Figura 16 – Lapiás agulha, ([CI.UC], [2008])
Figura 17 - Lapiás em mesa, Serra do Sicó.
São considerados formas cársicas menores, no entanto, são as que melhor evidenciam a
existência de processos de dissolução activos à superfície.
Entre as muitas classificações de lapiás, salientam-se quanto à morfologia três tipos: - lapiás
em agulhas: característicos pelas suas formas aguçadas e rendilhadas;
- lapiás em caneluras: característicos por se desenvolverem em superfícies rochosas
fortemente inclinadas e em paredes verticais;
- lapiás em mesa: característicos por se desenvolverem segundo um padrão de fracturação
ortogonal,
definindo
blocos
calcários
com
formas
superficiais
quadrangulares
ou
rectangulares.
ALGARES
2.1.2
4
Um algar é uma cavidade natural de desenvolvimento predominantemente vertical por onde a
água se escoa em profundidade. Formam-se devido a diversos factores como o abatimento de
abóbadas, derretimento das neves, alargamento de descontinuidades, dissolução exagerada
no fundo das dolinas, corrosão/erosão em sumidouros activos, etc.
Figura 18 - Boca do Algar dos Alecrineiros
4
Termo de origem árabe Al-gar. Gruta que pode ter várias origens, pode ser escavada por
águas que sobem ou descem. No caso de grutas vulcânicas como é caso dos Açores, por
movimentos de lavas bastante fluidas no interior da terra e que ao recuarem com alguma
rapidez deixaram uma gruta aberta no seu lugar. Em Portugal pode ainda adquirir outros
nomes como algarão ou algarocho. Estes podem ser de duas géneses: algar de dissolução e
algar de abatimento. O primeiro tem a forma de um poço, derivando da dissolução do calcário
na vertical, já o segundo tem a forma de um sino, uma vez que a sua origem se deve ao
abatimento da sala de uma galeria. Existe uma forma mista, que resulta da dissolução junto á
superfície e abatimento na sua base.
Página 25
DOLINAS
2.1.3
Dolina (do esloveno, pequeno vale) é uma depressão no solo característica de relevos cársicos
formada pela dissolução química ou também por desmoronamento do tecto de grutas,
caracterizadas por serem depressões fechadas de formato aproximadamente circular, mais
largas que profundas.
As dolinas
5
variam muito de tamanho, de pouco mais de um metro de diâmetro e pequena
profundidade a grandes dimensões com centenas de metros de diâmetro, podendo atingir
grandes profundidades. Em áreas habitadas, as dolinas podem ser um risco de contaminação
de águas subterrâneas, uma vez que formam o caminho preferencial da água em direcção ao
lençol freático, o despejo de detritos ou o uso turístico de dolinas pode levar contaminantes
directamente para a água, sendo uma das principais fontes de poluição nesse tipo de terreno.
5
Em alguns casos essas aberturas dão acesso a galerias inundadas que aparentam ser lagos,
embora sejam apenas uma parte de uma galeria freática ou de uma gruta, ou por outro lado
podem ainda ser secas e cheias de sedimentos, solo ou vegetação. Quando inundadas e
ligadas a uma gruta marinha, são chamadas cenotes (da língua maia dz'onot, sagrado). As
dolinas podem ser formadas pelo rebaixamento lento do terreno e são chamadas dolinas de
subsidência lenta. Quando causadas por desmoronamento de grutas, são chamadas dolinas
de colapso, que também podem dar origem a uma abertura na gruta. Quando formadas sob o
curso de um rio podem dar origem a um sumidouro. Em alguns casos, dolinas podem
expandir-se linearmente, formando longos vales semelhantes a canhões, não associados à
presença de rios. Em outros casos, três ou mais dolinas próximas podem se unir formando
conjuntos semelhantes a cachos de uva, chamados uvalas.
Dolinas de subsidência lenta
Também chamadas dolinas de dissolução. Quando a rocha é lentamente removida por
infiltração em fracturas o solo é rebaixado lentamente, sem formar cavidades subterrâneas. À
medida que a rocha é removida o terreno pode ser rebaixado vários metros, formando
grandes vales. Em muitos casos há exposição de rochas nas zonas laterais da dolina. Podem
ser inundadas, mas frequentemente são secas e apresentam vegetação no seu interior.
Dolinas de colapso
Quando uma gruta cársica é formada dentro da zona freática, as galerias podem alargar-se e
atingir grandes proporções. Em geral o tecto dessas galerias é sustentado pela pressão da
água que corre no seu interior. Quando o nível freático é rebaixado, o tecto perde a
sustentação e pode desabar, provocando o rebaixamento de toda a camada rochosa acima
da gruta e formando dolinas de colapso, que podem atingir centenas de metros de
profundidade. É comum que sejam inundadas e permitam o acesso a rios e lagos
subterrâneos. Este tipo de dolina era chamado pelos maias de cenotes (podem ter ligação
directa com grutas marinhas e em alguns casos possuem uma camada de água doce em
cima e água salgada por baixo. Este tipo de dolina é muito comum no México e na Flórida. Os
cenotes da península de Yucatan são populares pontos de mergulho).
Página 26
Figura 19 – Dolina do Peixeiro, Serra do Sicó, ([CI.UC], [2008]).
2.1.4
UVALAS
Uvalas são depressões de contornos irregulares. A sua formação é objecto de controvérsia, se
bem que parecem criar-se pela união de dolinas que crescem muito próximas e se
desenvolvem mais rapidamente em largura do que em profundidade.
POLJES
2.1.5
São depressões no carso, com dimensões consideráveis (na ordem dos quilómetros) e
vertentes abruptas, com o fundo plano e coberto de terra rossa, aluviões e coluviões. Podem
permanecer secos, ser atravessados por um curso de água ou serem inundados permanente
ou temporariamente. Com a subida do nível freático podem ser alimentados por exsurgências
ou por “ponors”, que podem funcionar como sumidouros quando este volta a baixar.
Figura 20– Polje de Minde, ([CI.UC], [2008]
Figura 21 – Polje de Minde inundado.
2.1.6
SUMIDOUROS
É uma abertura natural que comunica com uma rede de galerias pela qual um curso de água
entra no subsolo (os ponor ou algares podem servir de sumidouro). É um local onde a água
que escoa superficialmente desaparece, passando a ter um escoamento subterrâneo.
Uma das maneiras da água entrar no interior do maciço é de forma relativamente difusa seja
por infiltração através de terrenos de cobertura permeável, ou directamente através da rocha
carsificável, quando esta está exposta à superfície. Está assim aberto o caminho para que a
água proveniente da precipitação se infiltre no carso. Um outro modo de entrada de água é
Página 27
através de pontos bem definidos. Estes pontos são chamados de sumidouros e podem servir
como entrada de algumas cavidades. A água que se “some” nestes pontos provém de uma
linha de água que assim penetra no interior do carso.
Figuras 22 e 23: Sumidouro na Serra do Risco (Fotos: Francisco Rasteiro)
2.1.7
“PONOR”
.A definição de “ponor” varia de autor para autor. É o nome dado a uma abertura natural em
áreas cársicas que pode servir de sumidouro ou exsurgência consoante a altura do nível
freático no interior do maciço. Segundo alguns autores “ponor” é um sinónimo de sumidouro. O
ponor comunica com uma rede de galerias onde se dá a circulação de água.
Figura 24 – “Ponor”.
Página 28
2.1.8
SURGÊNCIAS OU NASCENTES
A água que circula em sub-superfície, pode sair do interior do maciço rochoso através das
denominadas surgências ou nascentes cársicas. São os pontos onde a água, que circula em
cavidades cársicas activas, sai do interior da rocha, seja para a superfície topográfica ou para
espaços vazios dentro do maciço (nascentes dentro de grutas).
Figuras 25 e 26 – A nascente do Alviela em carga e uma surgência dentro da gruta da Contenda.
2.1.8.1 TIPOS DE SURGÊNCIAS
Existe uma grande variedade de nascentes no que diz respeito à origem da água que brota
delas, ao tipo de estrutura geológica que as condiciona, ao seu caudal, à sua posição em
relação ao nível do mar e à periodicidade com que emitem água. Iremos apenas aqui referir a
classificação em relação à periodicidade e à origem da água.
Quanto à periodicidade as nascentes podem-se dividir em temporárias (têm água apenas parte
do ano) ou permanentes (têm água durante todo o ano).
Quanto à origem da água, as nascentes cársicas são classificadas como:
¾ Uma ressurgência quando a água provém de uma linha de água que se “perdeu”
(recorde-se a noção de sumidouro) no interior do carso e volta à superfície.
¾ Uma exurgência quando a água se infiltrou difusamente no carso
¾ Um termo menos usado e que se confunde muito com o anterior é o de emergência,
que se define como sendo uma nascente cársica onde a origem da água é
desconhecida.
Página 29
Faremos ainda menção a um tipo particular de surgência, as nascentes Vauclusianas (ver
figura 9) Este tipo de nascente caracteriza-se por apresentar um caudal extremamente
elevado, sendo que se pode considerar que brota delas um rio. Aliás não é de todo invulgar
encontrar azenhas junto a estas nascentes. A água subterrânea ascende, nestas
surgências, rapidamente à superfície, sendo que alguns autores consideram que este tipo
de nascentes corresponde a um ramo ascendente de um sifão.
2.1.9
VALE EM CANHÃO
Um vale em canhão é um vale encaixado com paredes muito íngremes, mais profundo do que
largo.
Figura 27 – Canhão fluviocársico do Poio
Figura 28 – Buracas, Serra do Sicó,
([CI.UC], [2008]).
2.1.10
VALES CEGOS
Vale cego no final termina abruptamente de encontro a uma barreira cársica (mais elevada que
o fundo do vale) e o curso de água perde-se num sumidouro, passando a correr no subsolo.
2.1.11
TERRA ROSSA
É um depósito residual tipicamente de cor avermelhada, consistindo num material detrítico
resultante da acumulação de argilas, areia fina e óxidos de ferro em virtude da dissolução dos
calcários, podendo ainda englobar antigas formações residuais de cobertura.
3.
ENDOCARSO
O endocarso consiste, à semelhança do exocarso, num modelado típico das zonas cársicas,
mas em que neste caso o modelado se encontra no interior do maciço. Pode ser definido como
o carso subterrâneo. O endocarso é de particular importância pois é através deste que se
processa a circulação subterrânea de águas, que é em última análise o principal motor da
evolução de um sistema cársico. Uma definição possível é: “Endocarso é a parte de um
sistema cársico estratificado verticalmente que se encontra sob a superfície. O endocarso inclui
Página 30
todo o espectro de vazios subterrâneos e as características de dissolução/corrosão presentes
nas rochas envolventes.”
De acordo com alguns pontos de vista o Exocarso pode ser encarado como uma consequência
do desenvolvimento do Endocarso. Do ponto de vista do espeleólogo os “vazios subterrâneos”
que nos interessam são as grutas e é sobre elas que se irá dissertar nos próximos pontos.
3.1
DEFINIÇÃO DE GRUTA
Antes de mais há que definir o que é uma gruta, sendo que esta definição será sempre algo
subjectiva e, deste modo variável de autor para autor. Uma gruta pode ser definida como “uma
cavidade subterrânea, natural, suficientemente grande para permitir a entrada de uma pessoa,
que pode estar completamente ou parcialmente preenchida com sedimentos, água ou ainda
gelo”.
De referir que esta definição é sempre feita à escala do Homem, basta recordar que as
grutas contêm geralmente pequenos troços onde um ser humano não passa, mas que
do ponto de vista hidrológico podem ser muito importantes. Estas passagens
intransponíveis podem ser classificadas como proto-grutas, sub-condutas ou fissuras.
Como foi visto a definição de gruta é arbitrária e deve ser usada com cautela.
3.2
GRANDES TIPOS DE GRUTAS
Como foi referido no Capítulo 1 as grutas desenvolvem-se numa larga variedade de ambientes,
em que variam as litologias (tipo de rochas), condições climatéricas, origem da água de
corrosão, temperatura, pressão e profundidade de desenvolvimento. Devido a estas variáveis
temos uma série de diferentes maneiras de uma cavidade se desenvolver sendo que, ao
trabalhar numa dada gruta se deve ter sempre em consideração o seu enquadramento local e
regional e evitar generalizações. A classificação de cavidades pode ser realizada de diferentes
maneiras, nomeadamente, com base na sua génese, nas suas dimensões, ou em algumas das
suas características. As últimas classificações são bastante arbitrárias, pelo que iremos tentar,
sempre que possível classificar uma gruta com base na sua génese.
A classificação de cavidades, mesmo em relação à sua génese varia consideravelmente de
autor para autor, iremos aqui guiarmo-nos essencialmente pela classificação publicada por
Alfred Bögli em 1980. Segundo este autor as cavidades podem ser classificadas em dois
grandes tipos: Grutas Primárias e Grutas Secundárias.
Página 31
3.2.1
GRUTAS PRIMÁRIAS
As grutas primárias formam-se em simultâneo com as rochas onde se inserem, ou seja, são
contemporâneas da formação da rocha. A sua origem não está relacionada com a circulação
subterrânea de água, desenvolvendo-se sobretudo em rochas ígneas (tubos de lava e
vesículas) e sedimentares (grutas de corais).
De uma forma geral as dimensões destas grutas, com excepção dos tubos de lava, são
reduzidas. Como curiosidade os tubos de lava chegam a atingir desenvolvimentos na ordem
das dezenas de km.
Figura 29 – Túnel de lava, Açores. (Fotografia de Pedro Cardoso).
3.2.2
GRUTAS SECUNDÁRIAS
As grutas secundárias desenvolvem-se quando as rochas já estão formadas. Estas cavidades
podem ser criadas por forças que trabalham a partir do exterior do maciço, grutas exógenas,
ou do interior, grutas endógenas.
3.2.2.1 GRUTAS EXÓGENAS
A alteração e erosão trabalham a partir do exterior, neste caso o resultado é uma gruta
tipicamente chamada de “abrigo”. Este tipo de gruta caracteriza-se por ser superficial, com um
fundo relativamente plano, sendo mais larga do que profunda (ver figura 28).
Página 32
Estas grutas podem ser classificadas com base no agente (vento, rio, mar, etc.)
predominante na sua génese, como por exemplo as Grutas de vento (o vento ou melhor a
corrasão provocada pelos sedimentos transportados pelo vento, são os responsáveis pela
formação da gruta), Grutas de margem de rio (formados pela erosão provocada por um
curso de água nas suas margens) e ainda Sapas (grutas formadas pela erosão marinha,
sobretudo pelo impacto das ondas sobre uma arriba).
3.2.2.2 GRUTAS ENDÓGENAS
As grutas endógenas são criadas por agentes activos no interior do maciço rochoso.. De uma
forma geral os processo tectónicos e a corrosão dão início à formação da cavidade, quando a
dimensão passa a permiti-lo ocorrem abatimentos que conjuntamente com a erosão passam a
contribuir para o desenvolvimento da cavidade.
As grutas endógenas são divididas em três tipos consoante o processo dominante da sua
formação. Estes tipos são as grutas tectónicas, grutas de descontinuidade e grutas cársicas
(grutas de corrosão). Deste tipo de grutas apenas as grutas de descontinuidade e as cársicas
têm, que se conheça, expressão a nível nacional, com especial destaque para o segundo tipo
de cavidades.
Grutas de descontinuidade
As grutas de descontinuidade caracterizam-se por
serem desenvolvidas ao longo de descontinuidades
(por exemplo fracturas e falhas), mas em que a
cavidade é gerada por processos gravíticos, como
movimentos
de
massa,
por
exemplo
o
deslizamento de camadas de calcário sobre uma
base mais plástica como uma camada de argila,
para uma zona adjacente.
Página 33
Figura 30 e 31 – Gruta do
Espichel,
formada
pelo
desaparecimento de uma parte de
uma
bancada
(Fotografias
de
sedimentar
Francisco
Rasteiro).
Grutas cársicas
As grutas cársicas ou grutas de corrosão são cavidades geradas essencialmente pela
circulação de água subterrânea, sendo esta a principal diferença destas grutas para os dois
tipos de cavidades anteriores. Estas grutas têm uma grande importância pois são as mais
frequentes, atingem maior desenvolvimento e possuem um papel de extrema importância nos
aquíferos cársicos.
De uma maneira muito simplista as grutas cársicas podem ser classificadas em grutas verticais,
onde o movimento da água é essencialmente vertical e, grutas horizontais onde a água flui
paralelamente ao nível de base local (nível mais baixo que as águas podem atingir por
circulação dentro do maciço). Esta classificação é puramente hidrogeológica sendo que muitas
das grutas onde a água flui na vertical não são de todo verticais, da mesma maneira que
muitas das grutas horizontais não são verdadeiramente horizontais, basta lembrar os sifões e
os poços que abundam em muitas das chamadas grutas horizontais.
Figura 32 – Lapa da Ovelha.
Página 34
Embora as grutas cársicas tenham como motor de desenvolvimento primordial a circulação
de água subterrânea, estas apresentam com frequência um controlo estrutural por
descontinuidades, como os referidos nos dois tipos de grutas anteriores, o mesmo é dizer
que estas grutas seguem muitas vezes, mas nem sempre, descontinuidades como fracturas,
diaclases, falhas, superfícies de estratificação, fendas de tracção ou mesmo o contacto
entre uma rocha carsificável e uma rocha insolúvel. Se nos lembrarmos que a água tem de
penetrar e circular no interior do maciço e que, pelo menos no caso do calcário, o material
rochoso tem uma permeabilidade muito reduzida, apercebemo-nos da importância que as
descontinuidades, com as suas aberturas, têm como porta de entrada de água.
3.2.3
GRUTAS DE GELO E GRUTAS GLACIARES
Dois outros tipos de grutas que iremos tratar à parte e apenas aqui referir por alto, são as
grutas de gelo e as grutas glaciares. As grutas de gelo são cavidades que podendo pertencer a
qualquer dos tipos de grutas acima referidos contêm permanentemente gelo no seu interior ao
longo de todo o ano. As grutas glaciares são grutas que se desenvolvem no interior de gelo.
3.3
ZONAS HIDROLÓGICAS CÁRSICAS
Continuando agora na senda das chamadas grutas cársicas, chegou a altura de deixarmos de
encarar as grutas isoladamente e de começarmos a considerar que as grutas se interligam
entre si formando sistemas. Por sua vez, estes sistemas estão inseridos a nível regional numa
área cársica e, de um modo geral, os vários sistemas podem estar ligados entre si. Vamos
então considerar que um dado maciço cársico pode ser zonado, em profundidade, com base
nas características hidrogeológicas que apresenta.
Classicamente segundo Swinnerton um maciço cársico é dividido em três zonas. Estas zonas
são, começando a partir da superfície, a Zona Vadosa inactiva, Zona Semi-activa ou Epifreática
ou ainda Vadosa semiactiva e a Zona Freática. Devemos referir que num dado maciço cársico
podem não estar presentes estas três zonas. As zonas mais profundas podem não existir em
alguns carsos, os chamados carsos superficiais.
Página 35
Figura 33 – Zonas hidrológicas cársicas (retirado de Bogli, 1980).
3.3.1
ZONA VADOSA
A Zona Vadosa engloba por um lado a região que se encontra sempre acima da zona
permanentemente inundada do carso, conhecida por Zona Vadosa Inactiva, por outro lado a
região do carso que se encontra temporariamente debaixo de água, designa-se por Zona
Semiactiva. A Zona Vadosa caracteriza-se pela presença permanente ou temporária de
atmosfera.
3.3.2
ZONA VADOSA INACTIVA
Devemos começar por afirmar que esta designação, embora clássica, não é a mais correcta
para esta zona, pois pode induzir em erro, dando a entender que esta zona não tem qualquer
actividade hidrogeológica. Esta zona tem um papel importantíssimo, pois é através dela que as
águas que se perdem na superfície, se infiltram em profundidade até atingirem as zonas
inferiores do carso.
Página 36
Figura 34 – Gruta em zona vadosa.
Este tipo de grutas apresenta formas de corrosão tipicamente freáticas como “cúpulas” de
corrosão, vagas de erosão, cúpulas de tecto, misturadas ou que se intersectam com formas
de erosão vadosa como sobreescavamentos de galerias em garganta e ainda a presença de
concreções e outro género de sedimentos. Recorde-se, em relação às concreções, que
temporariamente a Zona Semiactiva tem atmosfera presente, presidindo à deposição de
carbonato de cálcio os mesmos mecanismos que na Zona Vadosa.
Estas águas ao infiltrarem-se têm de uma forma geral capacidade de corroer o calcário, ou
seja, originam pelas suas características químicas e pelo movimento predominante vertical
da água nesta zona, um tipo de gruta particular conhecido pelos autores anglosaxónicos
como “vadose shaft”, que em português poderá ser traduzido como algar de infiltração. De
referir que os “vadose shats” não são exclusivos desta zona.
Existe inclusive um modelo hidrogeológico em que se considera a existência de um aquífero
relativamente superficial, que deve a sua existência à zona mais fracturada e alterada da
zona superficial do carso, designado por epicarso e que escoa as suas águas, para as
zonas profundas, através de fracturas de origem tectónica, desenvolvendo-se cavidades do
tipo “vadose shaft” ao longo dessas fracturas.
Página 37
A zona vadosa caracteriza-se ainda por nela se encontrarem antigas grutas freáticas,
conhecidas como grutas fosseis. Estas grutas formaram-se quando o nível da água estava
mais elevado do que o actual, podendo inclusive apresentar uma morfologia alterada ou
mesmo irreconhecível devido a abatimentos.
As cavidades que se encontram na zona vadosa apresentam tipicamente concreções,
pois o facto de existir atmosfera permite que a concentração em CO2 da água varie e
que assim se possa precipitar o carbonato de cálcio, desde que se verifiquem
determinadas condições (temperatura, pressão, etc)
3.3.3
ZONA VADOSA SEMIACTIVA, ZONA SEMIACTIVA OU ZONA EPIFREÁTICA
A Zona Vadosa Semiactiva caracteriza-se por se encontrar temporariamente abaixo ou acima
do nível freático. Isto é possível devido à proximidade com a zona activa. As grutas aqui
existentes são chamadas de grutas semiactivas como a zona onde se encontram. De notar que
quando esta zona se encontra totalmente debaixo de água dá-se circulação lateral da água. As
grutas semiactivas apresentam características mistas entre as grutas que se formam na zona
vadosa e na zona freática. Tipicamente as grutas da Zona Semiactiva são antigas grutas
activas de origem freática, que por efeito de uma descida do nível de base, que presidiu à sua
formação, ficam temporariamente acima do nível freático.
A Zona Semiactiva e a Zona Freática mais superficial são as zonas de maior intensidade de
formação de cavidades e constituem uma das áreas de maior interesse.
3.3.4
ZONA FREÁTICA
A Zona freática tem como principal característica encontrar-se permanentemente debaixo de
água, ou seja, abaixo do nível freático. A água existente nesta zona drena para o nível de base
local ou regional. Porém podem existir cavidades freáticas desenvolvidas abaixo do nível de
base. As grutas nesta zona são designadas por grutas activas.
Estas grutas apresentam uma predominância de formas de corrosão freática apesar de
poderem possuir concreções e até mesmo apresentar morfologias tipicamente vadosas. O
carso é um sistema em constante mudança e por isso o que em tempos foi uma gruta
freática, pode, por uma descida do nível de base, passar a ser semiactiva ou mesmo fóssil.
De modo inverso, por uma subida do nível de base, uma gruta semiactiva ou mesmo uma
gruta fóssil pode passar a ser de novo activa e apresentar uma série características
herdadas dos estágios anteriores. A subida ou descida do nível de base pode dever-se a
fenómenos como a variações eustáticas ou Página
ainda38a causas tectónicas.
FIGURA 35 - BLOCO DIAGRAMA DAS ZONAS HIDROLÓGICAS CÁRSICAS
3.3.5
OS SUMIDOUROS E AS NASCENTES
Como vimos acima o endocarso consiste basicamente numa série de formas, de um modelado,
causado directa ou indirectamente pela circulação de águas subterrâneas em rochas passíveis
de sofrer dissolução ou corrosão. Porém a água que circula no interior de um maciço cársico
tem que por um lado entrar no interior do maciço e por outro lado sair para que possa de facto
haver uma circulação.
3.4
A SEDIMENTAÇÃO EM MEIO CÁRSICO
Os sedimentos presentes em meios cársicos podem ser divididos em 3 grupos:
- sedimentos clásticos;
- sedimentos orgânicos;
- sedimentos químicos.
Como foi antes visto a água tem uma grande capacidade de alterar e erodir rochas do interior e
do exterior do maciço cársico. O material erodido é transportado pela água que circula no
interior do maciço cársico. Consoante a dimensão e as características químicas dos
sedimentos, diferente é o seu transporte. Alguns sedimentos são transportadas no seio da
massa de água, por exemplo: as argilas em suspensão, as areias por saltação e os calhaus por
arrastamento. Outro tipo de materiais sedimentares são transportados dissolvidos na água,
antes de precipitarem, como por exemplo o carbonato de cálcio.~
3.4.1
SEDIMENTOS CLÁSTICOS
Os sedimentos clásticos (calhaus, areias e argilas) tendem a ser depositados quando a
velocidade da massa de água diminui, pela ordem atrás referida. Deste modo a distribuição dos
sedimentos clásticos no interior de uma gruta pode revelar-nos a velocidade com que a água
circula ou circulou no interior de uma dada gruta.
Estes materiais são essencialmente detritos provêm do exterior, tais como, depósitos de areia,
argila (com origem externa ou resultante da alteração do calcário), etc, ou então, depósitos
detríticos grosseiros resultado do desmantelamento de partes do tecto ou paredes da própria
gruta.
Página 39
Em muitas grutas existem cursos de água, que, tal como à superfície, depositam os materiais
que transportam (areias, calhaus rolados e argilas), em zonas deprimidas, ou onde a energia
da corrente perde capacidade de os transportar. A gruta do Almonda, no Maciço Calcário
Estremenho, apresenta um excelente exemplo deste tipo de sedimentação.
As grutas que se formam junto ao mar, podem ter além de todos os referidos anteriormente,
depósitos de areia que se depositaram no seu interior. Sendo estas zonas de arriba marinha,
onde se pode observar frequentemente os avanços e recuos do nível do mar, através das
plataformas de abrasão marinha a vários níveis de altitude, as grutas que aqui se encontram,
foram igualmente sujeitas a estas variações, conservando no seu interior os depósitos
correspondentes a cada episódio desta natureza.
3.4.2
SEDIMENTOS ORGÂNICOS
Os sedimentos orgânicos caracterizam-se por serem constituídos ou por derivarem da matéria
orgânica. Destes distinguem-se os seguintes tipos:
3.4.2.1 SEDIMENTOS FITOGÉNICOS
Resultam da acumulação de restos de plantas. Encontram-se frequentemente perto da
superfície.
3.4.2.2 SEDIMENTOS COPROGÉNICOS
Resultam da acumulação de excrementos. É muito frequente encontrar depósitos de guano em
grutas que sirvam de abrigo a morcegos ou algumas espécies de aves que nidificam nas suas
entradas.
A acumulação de excrementos pode levar ao enriquecimento do solo em azoto, os
compostos com azoto podem ser oxidados originando nitratos. Estes nitratos, devido à sua
elevada solubilidade em água, apenas são preservados em grutas secas.
3.4.2.3 FOSFATOS
Os Fosfatos presentes em grutas são, quase sem excepção, de origem orgânica. Estes
sedimentos originam-se a partir de restos de animais. Como exemplos de restos animais que
podem originar fosfatos temos acumulações de ossos e cadáveres e guano.
Página 40
Em alguns casos, mais raros os fosfatos podem formar-se a partir da reacção química de
água de infiltração rica em fosfatos com sedimentos presentes na gruta formando-se solos
fosfatosos.
3.4.3
SEDIMENTOS TRANSPORTADOS EM SOLUÇÃO OU DE ORIGEM QUÍMICA
Já os sedimentos transportados em solução ou de origem química tendem a precipitar quando
as condições químicas são propícias. O carbonato de cálcio tende a precipitar da solução, em
que se encontra, cada vez que se verificam condições para se libertar CO2 da solução. Os
sedimentos de origem química, de longe mais vulgares em grutas são os polimorfos de
carbonato de cálcio. Os polimorfos mais frequentes são a calcite e a aragonite. A calcite, mais
estável e menos solúvel que a aragonite é o mineral mais abundante. A aragonite deposita-se
em menor quantidade, apenas sob certas condições, e tende ao longo do tempo a transformarse em calcite. Iremos por isso, no que diz respeito às concreções, referir apenas a calcite,
embora estas também possam ser constituídas por alguns dos outros polimorfos.
Os sedimentos carbonatados, geralmente presentes em grutas cársicas, dividem-se em dois
grandes tipos: o tufo calcário e as concreções, com grande predominância do segundo tipo.
Ambos os tipos de sedimentos são constituídos sobretudo por carbonato de cálcio, porém o
tufo é uma rocha porosa, friável, que muitas vezes apresenta uma componente vegetal (restos
de plantas), enquanto que as concreções são formadas por carbonato de cálcio cristalino, duro
e geralmente não poroso.
O tufo calcário é um tipo de sedimento muitas vezes associado a nascentes cársicas, e
visível com alguma frequência à superfície de zonas cársicas. Em alguns sítios formam
estruturas semelhantes a estalactites, mas no exterior das cavidades. Quanto às concreções
foram-se no interior de cavidades.
3.4.3.1 CONCREÇÕES
As concreções podem apresentar uma grande variedade de cores consoante as “impurezas”
que contenha a água responsável pela sua formação. As concreções apresentam uma larga
variedade de formas. Estas podem ser divididas com base no processo da sua formação.
Temos assim concreções associadas a fluxo de água, gotejamento, lagos, depósitos de lagos,
capilaridade e ainda algumas concreções cuja origem se mantêm desconhecida.
3.4.3.1.1 Concreções associadas a fluxos de água
Página 41
Estas concreções formam-se quando sobre a rocha corre uma película de água que deposita,
ao longo do seu percurso, calcite, podem inclusive chegar a colmatar canais existentes no chão
de cavidades. Podem cobrir quer o próprio calcário quer depósitos de areia e ou argila ou de
outro sedimento. Atapetam o “chão” de muitas cavidades.
3.4.3.1.2 Lagos e diques
Este tipo de formação caracteriza-se pela presença de uma barreira – o dique – que delimita
uma massa de água relativamente estagnada e de profundidade reduzida – o lago. Encontramse com frequência em superfícies ligeiramente inclinadas. O lago enche até a água passar o
dique, a água ao galgar o dique é agitada e liberta CO2, depositando calcite ao longo do dique.
Frequentemente os lagos e diques existem em sequência, formando uma “cascata” em que a
água passa dos lagos a maior altura para os lagos mais baixos. A dimensão dos diques é
variável, podendo ir desde os poucos milímetros a até casos conhecidos de 1m.
Figura 36 – Diques ou Gours. Lapa
do Coelho (Arrábida).
Figura 37 – Lago da Sala das
Tubulares. Gruta do Frade (Arrábida).
Página 42
3.4.3.1.3 Depósito de lagos
A água relativamente estagnada dos lagos precipita também calcite. A calcite cristaliza à
superfície da água. Os cristais são mantidos à superfície pela tensão superficial da água.
Quanto mais agitada (relativamente) for a superfície da água maior o número de cristais que se
formam. Os vários cristais podem juntar-se formando “ flores de calcite”. Estes cristais podem
acabar por se depositar no fundo do lago ou então acabarem por se ligar ás margens do lago.
Se a calcite precipitar rapidamente em água com algum movimento, as associações de cristais
podem adquirir formas arredondadas.
Figura 38 – Depósitos nas margens do lago.
Figura 39 – Depósitos no fundo do lago (à direita, Sala das Tubulares, Gruta do Frade
(Arrábida)).
Página 43
3.4.3.1.4 Formas de gotejamento
Engloba todas as concreções, pendentes do tecto ou das paredes ou ainda as formas que se
elevam do chão da cavidade, criadas pela precipitação de calcite a partir do gotejamento ou
escorrencia de água. Distinguem-se das formas de fluxo que são formados pelo fluxo de água.
Estalactites
As formas de gotejamentos mais conhecidas são as estalactites. As estalactites formam-se a
partir de água que goteja do tecto e que cai livremente para o chão da cavidade.
As estalactites podem ser divididas em dois tipos: as estalactites tipo 1 e as estalactites
tubulares ou tipo 2.
As estalactites tubulares ou tipo 2 são ocas por dentro, têm um diâmetro constante, são
muitas vezes transparentes. A água provém de um interstício (p.ex. uma fractura) na rocha e
circula através do interior do tubo.
As estalactites tipo 1 são maciças, ou seja não são ocas por dentro, apresentando anéis
relativamente concêntricos. A água, que deposita a calcite, escorre pelo exterior da
concreção depositando os anéis. Este tipo de estalactite origina-se por água que goteja a
partir de uma superfície e não de um interstício, ou de uma estalactite tubular cujo canal
central ficou obstruído.
Figura 40 – Estalactites tubulares ou tipo 2.
Página 44
Figura 41 – Estalactites tipo 2 que evoluiram para tipo 1. O corte transversal permite observar
ainda o antigo canal interior.
Cortinas ou bandeiras e mantos estalagmíticos
As bandeiras e cortinas formam-se através da precipitação de calcite, a partir da água que
escorre ao longo de uma parede ou tecto inclinado. A água que escorre ao longo das paredes
tende a evitar os obstáculos, fazendo um percurso sinuoso, o que confere a este tipo de
concreção um aspecto ondulado. As bandeiras podem chegar a atingir 1m de largura, vários
metros de comprimento e apresentam geralmente uma espessura ente 0,25 e 1cm. Dada a sua
reduzida espessura muitas das cortinas e bandeiras são translúcidas. Com alguma frequência
no bordo da cortina, existe uma série de pequenas estruturas em forma de gota, que se
formam pela precipitação localizada de calcite, em locais de gotejamento da água, que escorre
ao longo da bandeira. Estas estruturas, no seu conjunto, fazem lembrar os dentes de uma
serra, sendo conhecidas por dentes de cão. Algumas vezes na extremidade de uma bandeira
encontram-se estalactites de tipo 1.
Os mantos estalagmíticos são uma variante deste tipo de concreções, mas bastante mais
massivas, já sem o aspecto de bandeira, e que constituem uma camada ou conjunto de
camadas de calcite que recobre as paredes e que se precipitou a partir de água que escorria
ao longo de um parede.
Página 45
Figura 42 – Cortinas ou bandeiras, Gruta do Frade (Arrábida).
Medusas
As medusas são um tipo particular de concreção que apresenta características de concreções
de gotejamento e de fluxo. A água percorre uma zona relativamente horizontal precipitando
concreções de fluxo, a que se segue uma zona fortemente inclinada onde água forma
concreções de gotejamento, a existência de vários ciclos destes origina uma medusa.
Figura 43 – Medusas.
Estalagmites
As estalagmites apresentam um grande número de formas. São também originadas pelo
gotejamento de água, mas neste caso pela precipitação de calcite pela água que embate no
Página 46
chão da cavidade. As estalagmites são compostas por camadas sobrepostas de calcite. A
forma da estalagmite depende, de entre outros factores, do caudal de água, da concentração
de bicarbonato de cálcio da água e da altura da queda das gotas de água.
Figura 44 – Estalagmites. Sala Branca, Gruta do Frade (Arrábida)
Colunas
De uma forma geral, as estalagmites crescem sob uma estalactite e estas duas formas, ao
crescer podem-se unir formando uma coluna.
FIGURA 45
3.4.3.1.5 Concreções de capilaridade
As concrecções de capilaridade englobam outro grupo de concreções, cuja origem se deve à
água que se movimenta não pelo efeito da gravidade, como vimos nos casos anteriores, mas
devido à capilaridade. Como exemplos temos as excêntricas, formações de coral e discos.
Excêntricas
As
excêntricas
são concreções
que
crescem
contrariando
a
força
da
gravidade,
desenvolvendo-se em várias direcções, além da vertical, isto indica a presença, na sua origem,
de forças mais fortes que a força da gravidade. As excêntricas crescem a partir da rocha nua,
de bandeiras, de mantos estalagmíticos e especialmente em estalactites, embora menos
comuns, também se desenvolvem em concreções de fluxo que se encontram ao nível do chão.
As suas dimensões são geralmente reduzidas, bem como a sua espessura, sendo muito finas
(de 1 a poucos mm). As excêntricas têm um canal no seu interior ao longo do qual a água se
movimenta por efeitos de capilaridade. A massa de água no interior da canal é tão pequena,
que a força da gravidade é menor que a força da tensão superficial. A origem das excêntricas
ainda não se encontra completamente esclarecida.
Página 47
Figura 46 e 47 – Excêntricas. Gruta do Frade (Arrábida).
3.4.3.1.6 Outro tipo de concreções
Além das concreções atrás referidas existem outros tipos, dos quais iremos apenas referir um
exemplo.
Pérolas de gruta – São pequenos corpos de calcite, geralmente arredondadas, embora em
alguns casos possam ser ovais, e com uma superfície brilhante. O seu diâmetro costuma
rondar 1cm, embora em alguns casos extremos possam chegar até aos 15cm. As pérolas,
quando vistas em secção têm um núcleo composto por um fragmento de rocha ou de mineral
em torno do qual se depositaram camadas concêntricas de calcite. As pérolas formam-se em
lagos com água relativamente agitada, rica em carbonato de cálcio. O movimento das águas
provoca a precipitação de calcite, impede que a pérola se fixe ao fundo do lago e confere-lhe o
seu aspecto arredondado.
Página 48
Figura 48 – Pérolas de gruta. Gruta da Utopia, (Arrábida).
3.5
FASES DE DESENVOLVIMENTO DE UMA CAVIDADE
Uma cavidade sofre ao longo da sua vida várias fases de desenvolvimento. Estas fases não
dependem apenas do tempo, mas também do estado das rochas e de outros factores. Os
vários estágios a seguir apresentados estão relacionados, entre outros factores, com a zona
hidrológica cársica onde gruta se encontra. Para efeitos deste curso, iremos dividir a evolução
das grutas em 6 fases. Estas fases de desenvolvimento são:
1.º - Estado prévio: Uma cavidade encontra-se cheia de água sem que nada aconteça (ex.
uma descontinuidade preenchida com água “estagnada”).
2.º - Fase inicial: Começa a haver movimento de água no interior da cavidade. A água começa
a corroer a rocha, alargando-se os interstícios.
3.º - Fase jovem: A velocidade da água aumenta, bem como as dimensões da cavidade,
passando esta a caber na definição de gruta. A cavidade encontra-se na zona freática
encontrando-se completamente preenchida por água.
4.º - Fase matura: A dimensão da secção da cavidade continua a aumentar, até que surgem
os primeiros abatimentos. A cavidade encontra-se na zona semiactiva ou mesmo vadosa
inactiva.
5.º - Fase da velhice: Ocorrem abatimentos generalizados, especialmente a nível do tecto. Dáse a cobertura e destruição das formas típicas do estágio de maturidade. A cavidade encontrase geralmente na zona vadosa inactiva, raramente na zona freática.
Página 49
6.º - Fase da senilidade: A gruta é completamente destruída.
Os estágios de desenvolvimento acima referidos são uma generalização, não sendo obrigatório
que todas a grutas passem por estas fases e nem que estes estágios sejam todos válidos para
os carsos existentes.
Figura 49 - Fases de desenvolvimento de uma cavidade.
Página 50
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