- Hermeneia

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CARTA DE GARGÂNTUA A PANTAGRUEL:
ANÁLISE DA HISTORICIDADE DO
HUMANISMO RABELAISIANO
David Pessoa de Lira
Universidade Federal de Pernambuco
Introdução
François Rabelais (1494-1553) é conhecido por causa da
comicidade de suas obras. Muito tem sido discutido sobre a inÀXrQFLDGDVIHVWDVSRSXODUHVHS~EOLFDVPHGLHYDLVHPVXDVREUDV
como bem tem abordado Mikhail Bakhtin. No Livro Pantagruel,
capítulo 8, de Rabelais, é descrito como a personagem Gargântua
HQYLDXPDFDUWDSDUDRVHX¿OKR3DQWDJUXHORTXDOVHHQFRQWUDHP
Paris. O teor, o estilo e o próprio conteúdo da carta apresentam características que se diferenciam do resto de sua obra. Não se pode
pressupor que se trata de uma passagem espúria ou psedorrabelesiana. Trata-se de uma carta presente dentro do microcontexto do
capítulo 8 e do macrocontexto que engloba os capítulos 6, 7, 8 e
nove, onde a linguagem é o tema principal. A Carta de Gargântua
a Pantagruel é, amiúde, mencionada em livros de História para
descrever o Gentil-Homem do Renascimento. Ali sintetiza-se o
espírito da época na qual Rebelais também está inserido. O conteúdo da própria carta é um relato sobre os acontecimentos nos
últimos dois séculos de Renascimento (séc. XV e XVI).
3RGHUVHLDGLVFXWLUDTXLPDLVXPDYH]VREUHDLQÀXrQFLD
das festividades medievais de rua nas obras de Rabelais, mas é o
seu espírito humanista que será tratado por meio de uma análise
da historicidade do conteúdo da Carta de Gargântua a Pantagruel. Como um humanista renascentista, Rabelais é inspirado
49
por autores clássicos, e não somente pelas recreações nas feiras
e praças públicas. A carta não é tão diferente do próprio espírito
autoral de um pensador humanista do séc. XVI. Essa pressupõe
que Rabelais tenha coligido, nas palavras de Gargântua, aquilo
que ele conhecia e sabia do mundo livresco. O simples fato de
historiadores mencionarem a Carta de Gargântua a Pantagruel
como documento básico do Renascimento pressupõe que sua literalidade transpassou a historicidade como testemunha da época.
Essa carta, escrita ao estilo ciceroniano, segue de perto a obra
'H2I¿FLVou Dos DeveresGH&tFHURHQGHUHoDGRDVHX¿OKR0DUco. Ao que tudo indica, a obra de Cícero poderia ser endereçada a
qualquer pessoa que almejasse os cargos políticos em Roma. Em
última análise, a própria Carta de Gargântua a Pantagruel ajuda
a recontar a própria importância das Línguas e Literaturas Clássicas em seu tempo. O presente texto, a partir do Livro Pantagruel,
capítulo 8, objetiva apresentar as características da historicidade
de conteúdo na Carta de Gargântua a Pantagruel, perscrutando
as implicações humanistas renascentistas em François Rabelais,
WHQGRFRPRSUHVVXSRVWRDLQÀXrQFLDFOiVVLFDQRVHXWH[WROLWHUiULR
e no seu pensamento. Destarte, seguem-se três etapas importanWHV$,QÀXrQFLD&OiVVLFDQDCarta de Gargântua a Pantagruel
e no Pensamento Rabelaisiano; 2. A Historicidade do Conteúdo
da Carta de Gargântua a Pantagruel; 3. As Implicações do Humanismo Renascentista em François Rabelais.
$,QÀXrQFLD&OiVVLFDQDCarta de Gargântua a Pantagruel
e no Pensamento Rabelaisiano
Um trecho da carta é digno de menção justamente por causa
do seu teor extremamente humanista do séc. XV e XVI, do Período do Renascimento:
Já se restabeleceram todas as disciplinas e restauraram as línguas:
a grega, sem a qual é vergonha alguém dizer-se sábio; a hebrai-
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ca, a caldaica, a latina; a imprensa, hoje corrente, tão elegante e
correcta, que foi no seu tempo inventada por inspiração divina tal
como artilharia, em contraface, como invenção diabólica. Todo
o mundo se encheu de gente sábia, preceptores mui doutos, bibliotecas mui amplas, e em meu juízo nem no templo de Platão,
Cícero ou Paupiniano houve a comodidade de estudo que hoje
encontramos, já não havendo de ora avante que oferecer lugar
QHPFRPSDQKLDDRTXHQmRpEHPSROLGRSHODR¿FLQDGH0LQHUYD
Mais doutos vejo agora os salteadores de estrada, os carrascos, os
aventureiros, os palafreneiros, do que os doutores e os pregadores do meu tempo. O que dizer? Mulheres e raparigas aspiraram
a este louvor e maná celeste de boa doutrina. De tal forma que
eu próprio, na idade em que estou me vi obrigado a aprender as
letras gregas, não porque as tivesse desprezado, como Catão, mas
porque não tive o vagar de compreendê-las na minha tenra idade;
e de bom grado me deleito a ler as Morais de Plutarco, os belos
Diálogos de Platão, os Monumentos de Pausânias e as Antiguidades de Ateneu, esperando a hora em que aprouver a Deus, meu
Criador, chamar-me e ordenar-me que saia desta terra.
3RULVVRPHX¿OKRWHLQFLWRDHPSUHJDUDPRFLGDGHQRERPSURveito de estudos e virtudes. Estás em Paris e como preceptor tens
Epistémão, podendo aquela doutrinar-te com vivas e vocais instruções, o outro com louváveis exemplos.
Penso e quero que aprendas as línguas na perfeição: primeiro a
grega, como diz Quintiliano, em segundo lugar a latina e depois
a hebraica por causa das Sagradas Escrituras, tal como caldaica e
árabe; que formes estilo com a grega, imitando Platão, e Cícero
no que respeita à latina. Não haja história que não tenhas presente
QDPHPyULDQLVWRGHYHQGRDMXGDUWHDFRVPRJUD¿DGDTXHOHVTXH
a escreveram.
Das artes liberais, geometria, aritmética e música, algum gosto te
tinha dado eu quando eras pequeno entre os cinco e os seis anos
GHLGDGHSURVVHJXHFRPRUHVWRH¿FDDVDEHUGDDVWURQRPLDWRGDV
as regras; deixa porém de parte a astrologia divinatória e a arte de
Lúlio, pois abusos e frivolidades são.
Do direito civil quero que saibas de cor os belos textos e os comSDUHVFRPD¿ORVR¿D
E quanto ao saber dos factos da natureza, quero que te entregues
DHOHVFRPD¿QFRQmRKDMDPDUQHPULEHLUDQHPIRQWHGHTXH
51
não conheças os peixes; todos os pássaros do ar, tudo quanto é
iUYRUHDUEXVWRHPRLWDGHÀRUHVWDWRGDVDVHUYDVGDWHUUDWRGRV
os metais, escondidos no ventre dos abismos, as pedrarias de todo
o Oriente e do Sul, nada te seja desconhecido.
Depois, volta a passar cuidadosamente em revista os livros dos
médicos gregos, árabes e latinos, sem desprezar os talmudistas e
os cabalistas, e dissecando com freqüência adquire um perfeito
conhecimento desse outro mundo que o homem é. E começa algumas horas por dia, a visitar as Sagradas Escrituras; primeiro o
Novo Testamento e as Epístolas dos Apóstolos em grego, depois o
Velho Testamento em hebraico.
Em suma, que eu te veja um abismo de ciência, porque antes de
seres homem e te fazeres grande terás de abandonar a tranqüilidade e o repouso do estudo, aprender a cavalaria e as armas para
me defenderes a casa e em todo o caso de assalto de malfeitores
socorreres os nossos amigos.1
O gênero epistolar, com seu caráter formal, escrito ao estilo
retórico da época do Renascimento deixa evocar sua diferença em
relação ao gênero predominante de toda a obra de Rabelais. Nessa
passagem da epístola, Gargântua escreve como um humanista da
Renascença, embora ainda apegado às tradições da Igreja Católica Romana, é bem verdade. Ademais, é notório que Rabelais
colocou no ato da escrita da personagem Gargântua o linguajar
OLYUHVFR GH XP KXPDQLVWD FRP DV UHJUDV YHUEDLV R¿FLDLV HFOHVLiVWLFDV H FRP R DUFDtVPR DÀRUDGR HP VHX HVWLOR 3HUFHEHVH
1
2
3
RABELAIS, François. Pantagruel, Rei dos Dípsodos: restituído à verdade com seus
factos e proezas espantosos escritos pelo falecido mestre Alcofribas abstractor de
quinta-essência. Tradução, apresentação e notas de Aníbal Fernandes. Ilustrações
pelo Atelier G. Doré. 3. ed. Lisboa: Frenesi, 2006. p. 56-60.
BAKHTIN, Mikhail. Cultura Popular na Idade Média e no Renascimento: O Contexto de François Rabelais. 7. ed. São Paulo: HUCITEC, 2010. p. 354-355.
CARDOSO, Zelia de Almeida. A Literatura Latina. 3. ed. rev. São Paulo: WMF
Martins Fontes, 2011. p. 200-202. Sobre o latim ciceroniano no humanismo renascentista, cf. BAKHTIN, 2010, p. 410-413; ZEGURA, Elizabeth Chesney (Ed.). The
Rabelais encyclopedia. Westport (CT); London: Greenwood Press, 2004. p. 35-36,
86, 127, 134, 145, 261.
52
ainda que o universo verbal com tantas expressões veementes e
reverentes não é o mesmo do domínio lexical de toda a obra rabelaisiana das crônicas do Pantagruel.2
Essa epístola foi escrita ao estilo ciceroniano.3 O fato do
gênero predominante de Pantagruel ser uma comédia, em tons
jocosos e uma linguagem nada polida e nada livresca, não pressupõe que Rabelais não tenha se valido de fontes clássicas para
os seus escritos.
Quanto ao emprego de fontes antigas em relação à comicidade, o Renascimento, de fato, empregou-as como ajuda teórica
VREUHDWRPDGDGHFRQVFLrQFLDDUHVSHLWRGD¿ORVR¿DGRULVRGRV
ambientes públicos na Idade Média.4 Mas autores clássicos, como
$ULVWyIDQHV3ODXWRH7HUrQFLRQmRWLYHUDPLQÀXrQFLDQR5HQDVcimento, principalmente no Renascimento francês do séc. XVI.
3UHYDOHFLDP DV LQÀXrQFLDV GRV DXWRUHV GR ¿QDO GD ,GDGH$QWLJD
Luciano de Samosata, Ateneu, Plutarco, Macróbio, dentre outros.
2VDXWRUHVDQWLJRVTXHPDLVWLYHUDPLQÀXrQFLDVREUHDFRQFHSomR
rabelaisiana do corpo grotesco foram Plínio, Ateneu, Macróbio e
Plutarco, inclusive no que se refere ao banquete. É plausível que
Rabelais tenha lido Aristófanes, mas esse não é sua fonte de intertextualidade.5 O banquete e a comensalidade constituem elementos
fundantes na obra de Rabelais. Mikhail Bakhtin menciona6 que o
4
5
6
BAKHTIN, 2010, p. 133-134.
BAKHTIN, 2010, p. 58-61, 84, 145, 243-264, 311.
BAKHTIN, 2010, p. 145, 243-264. Na literatura grega antiga, há várias obras, de
vários autores, que retratam o ambiente simpótico, como, o Symposium de PlaWmR R 'HLSQRVR¿VWDV GH $WHQHX H R 6HSWHP 6DSLHQWLXP &RQYLYLXP GH 3OXWDUFR$ REUD 'HLSQRVR¿VWDV GH$WHQHX p GR VpF ,, (&$ SDODYUD įİȚʌȞȠıȠijȚıIJȒȢ
>GHLSQRVRSKLVWƝV@WDPEpPSRGHVLJQL¿FDURLQVWUXtGRQRVPLVWpULRVGREDQTXHWH&I
LIRA, David Pessoa de. O Batismo do Coração no Vaso do Conhecimento: Uma
Introdução ao Hermetismo e ao Corpus Hermeticum. Recife: Editora UFPE, 2015. p.
187-207. ATHENAEUS. The Learned Banqueters: books 3.106e-5. Edited and Tranlated by S. Douglas Olson. Cambridge (MA); London: Harvard University Press,
2006. v. 1-4.; PLATO. Lysis, Symposium, Gorgias. Edited by W.R.M. Lamb. Cambridge (MA); London: Harvard University Press, 1925. v. 3. 536p. (Loeb Classical
Library).
53
prólogo de Gargântua apresenta um vocabulário da praça pública
aliado aos elementos de uma ciência livresca do humanismo ao
Banquete de Platão. É bem verdade que Rabelais aprendeu sobre
as culturas e as linguagens das feiras, onde ocorriam apresentações e espetáculos de rua, como a Feira de Fontenay-le-Comte, a
Feira de Saint-Maixent e a Feira de Niort. No entanto, isso se dá
durante o período de estudos em ciência humanista e em grego
em Fontenay-le-Comte. Entre 1528 a 1530, Rabelais residiu em
várias cidades universitárias, tais como Bordéus, Toulouse, Bourges, Orléans, Paris e Montpellier (onde estudou medicina).7 São
esses lugares diversos que cooperam com o seu conhecimento
humanístico e literário.
Como escritor e pensador da Renascença, foi copiosamente
LQÀXHQFLDGRSHOD¿ORVR¿DGRULVRSHORF{PLFRHVDWtULFR2EYLDPHQWHQmRVHSRGHQHJDUTXH5DEHODLVWHQKDUHFHELGRLQÀXrQFLDV
GRULVRH[WUDR¿FLDOGRVDPELHQWHVSRSXODUHVGDVIHLUDVHGDVSUDças públicas, onde ocorriam os espetáculos. O Renascimento foi
capaz de trazer o riso do âmbito popular para dentro da literatura.
Em todo caso, como salienta Mikhail Bakhtin: “As recreações
escolares e universitárias tiveram uma importância grande na história da paródia medieval e, de maneira geral, em toda a literatura
medieval”.8 Não se pode negligenciar o fato de que o Renascimento é um liame medieval e moderno.
eSHUFHSWtYHOTXHDVIRQWHVSDUDD¿ORVR¿DGRULVRRXSDUD
a comicidade do Renascimento são clássicas: Hipócrates, Aristóteles e Luciano de Samosata. Rabelais conheceu as obras de Hipócrates quando ainda estudava em Montpellier. A obra atribuída
a Hipócrates, intitulada Romance de Hipócrates (possivelmente
XPDSyFULIRIRLDVVD]LPSRUWDQWHQRTXHGL]UHVSHLWRj¿ORVR¿D
do riso e à sua prática curativa e terapêutica. No ȆİȡȓȌȣȤ߱Ȣ'H
Anima)$ULVWyWHOHVD¿UPDTXHRVHUKXPDQRpR~QLFRDQL7
8
BAKHTIN, 2010, p. 133-134.
BAKHTIN, 2010, p. 62-64, 72.
54
PDOFDSD]GHVRUULU2¿OyVRIRJUHJRDLQGDVDOLHQWDTXHDFULDQoD
só se torna humana a partir do quadragésimo dia de seu nascimento, quando começa a sorrir plenamente; consequentemente
vindo a ser homem pleno. Mas é marcadamente o Diálogo dos
MortosGH/XFLDQRTXHPDLVLQÀXHQFLRX5DEHODLVSRUFDXVDGR
seu caráter cômico, principalmente no capítulo 30 de Pantagruel,
que descreve o episódio de Epistêmão nos Infernos.9
Obviamente, os renascentistas conheciam outras fontes que
retratavam sobre o riso, como Ateneu, Macróbio, Aulo Gélio. Deve-se salientar que o próprio Homero, ao mencionar sobre o riso
indestrutível (dos deuses), isto é, RܿȕİıIJȠȢȖȑȜȠȢ deve ter serviGRGHIRQWHSDUDD¿ORVR¿DGRULVRGR5HQDVFLPHQWR10
Em todo caso, a Carta de Gargântua a Pantagruel é escrita
em tonalidade ao estilo de Cícero. Assim, é bastante plausível que
'H2I¿FLVRX'RV'HYHUHVGH&tFHURGHYDWHUVLGRDLQÀXrQFLD
na composição da Carta de Gargântua. 'H2I¿FLV é endereçado
D0DUFR¿OKRGH&tFHURTXHVHHQFRQWUDHP$WHQDVHVWXGDQGR
FRP&UiWLSR7UDWDVHGHXPDREUDHQVDtVWLFDGHFDUiWHU¿ORVy¿FR
prático-moral, cujo proêmio caracteriza aquele estilo da Carta de
Gargântua a Pantagruel, principalmente, no que diz respeito à
IRUPDomRGHVHX¿OKR1DYHUGDGHSRGHUVHLDLQFOXVLYHHQTXDdrar 'H2I¿FLVFRPRXPDORQJDHStVWRODGHUHÀH[}HVFRQVHOKRV
e admoestações endereçada a qualquer leitor.11 Imitar Cícero ou
Platão era algo intimamente relacionado ao humanismo renascenWLVWD$DGPRHVWDomRGH*DUJkQWXDDRVHX¿OKR³TXHIRUPHVHVWLOR
9
10
11
BAKHTIN, 2010, p. 58-61; RABELAIS, 2006, cap. 30, p. 167-176; cf. o Diálogo
dos Mortos em FREIRE, António, S. J. Selecta Grega. 7. ed. Braga: Livraria A. I. ,
1991. p. 37-51.
BAKHTIN, 2010, p. 60-61. Cf. Ilíada 1.599 e Odisseia 8.326-327, HOMERO. Ilíada: de Homero. Tradução de Haroldo de Campos. Introdução e organização por
Trajano Vieira. 5. ed. São Paulo: Arx, 2008. v.1. p.; HOMERO. Odisseia. Edição
bilíngue. Tradução, posfácio e notas de Trajano Vieira. Ensaio de Italo Calvino. São
Paulo: Editora 34, 2011. p. 64.
PEREIRA, Maria Helena da Rocha. (VWXGRVGH+LVWyULDGD&XOWXUD&OiVVLFD&XOWXra Romana. 5. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2013. v. 2. p. 165-177.
55
com a grega, imitando Platão, e Cícero no que respeita à latina” é
seguida por ele mesmo na própria composição da carta. Deveras,
é o estilo de François Rabelais, como humanista renascentista,
TXHGHL[DDÀRUDUHVVDWHQGrQFLDQDSUySULDSHUVRQDJHP12
2. A Historicidade do Conteúdo da Carta de Gargântua a
Pantagruel
Costumeiramente a Carta de Gargântua a Pantagruel é
mencionada em livros de História para descrever o Gentil-Homem do Renascimento.13 É sabido que o Renascimento marcou o
início dos Tempos Modernos, principalmente no plano artísticoOLWHUiULR H LQWHOHFWXDO ,VVR DVVLQDOD XP SHUtRGR QR ¿P GR PHdievo, culminando nos séc. XV e XVI.14 O texto de Rabelais que
serviu como epígrafe presente ensaio aponta vários elementos comuns à mentalidade do Renascimento.15
A priori, faz-se necessário salientar alguns pontos importantes. Vários pesquisa-dores diferenciam Renascimento de Renascença: um seria intelectual e literário; o outro seria a marca artística dos grandes pintores e escultores. No presente texto, as duas
terminologias são intercambiáveis porque a literatura é um produto cultural e artístico. Outro dado é que Renascimento não pode
ser considerado como uma nova luz ou um renascer de algo que
estava morto (como a Idade Média Ocidental). O Renascimento
só foi possível por causa da preservação da tradição cultural latina (no Ocidente) e grega (no Oriente). Sem essa preservação,
seria impossível pensar no Renascimento. Ademais, na verdade, a
PHQWDOLGDGHUHQDVFHQWLVWDpRPDUFR¿QDOGDSUySULD,GDGH0pGLD
A ideia do Renascimento é justamente uma retomada explícita
12
13
14
15
ZEGURA, 2004, p. 35-36, 86, 127, 134, 145, 204-205, 261.
ARRUDA, José Jobson de A., História Moderna e Contemporânea. 17. ed. São Paulo: Ática, 1984. p. 35.
ARRUDA, 1984, p. 29.
ZEGURA, 2004, p. 35-36, 86, 127, 134, 145, 204-205, 261.
56
da Cultura Antiga Greco-Romana que se faz imortalizada (clássica).16
Convém mencionar que uma das contribuições para a divulgação do pensamento renascentista se deu através da imprensa. Johann
Gutenberg (1397-1468) aperfeiçoou a impressão dos livros, usando
OHWUDVPyYHLVHPHWiOLFDVTXHVHFRQKHFHFRPRWLSR'DtWLSRJUD¿D
Vale salientar que Gutenberg teve outros auxiliares nesse trabalho,
como Johann Fust e Peter Schoeffer. O primeiro livro (incunábulo)
impresso foi a Bíblia, em dois volumes (um de 1445 e outro de 1456).
Os livros impressos até as primeiras décadas de 1500 foram chamados de incunábulos. Incunabula, -orumQRODWLPVLJQL¿FDEHUoRRX
princípio.17 Vale salientar que os livros impressos, inicialmente, eram
semelhantes aos manuscritos, imitando as letras manuscriturísticas e
assim eram divulgados. Isso praticamente foi seguido por tipógrafos
do séc. XV a XVI.18 Também costuma-se designar de editio princeps
a primeira edição impressa de um determinado texto clássico ou de
um texto descoberto em manuscritos.
A exemplo do que foi supramencionado, sabe-se que o intelectual católico francês Adrien Turnèbe (mais conhecido como
Adrianus Turnebus), contemporâneo de François Rabelais, foi o
primeiro a editar o texto grego do Corpus Hermeticum em 1554,
HP3DULVFRPRUHVXOWDGRGRWUDEDOKRWLSRJUi¿FR(VWDeditio princeps recebeu o título Mercurii Trismegisti Poemander, seu de Potestate ac Sapientia Divina. $HVFXODSLL'H¿QLWLRQHVDG$PPRQHP
regem. Essa edição segue todos os padrões de um incunábulo.20
Rabelais não chegou a conhecer esta edição porque morreu um ano
DQWHGRWUDEDOKRGH7XUQHEXVWHUVLGR¿QDOL]DGR
16
17
18
19
20
SOUTO MAIOR, Armando. História Geral. 17. ed. São Paulo: Nacional, 1976. p.
285-286.
DICIONÁRIO de Latim-Português, Português-Latim. Porto: Porto, 2010. p. 237.
SOUTO MAIOR, 1976, p. 285; MILLER; HUBER, 2007, p. 160-161.
ROSSETTI, 2006, p. 356-357.
‫ݒ‬ȡȝȠࠎȉȡȚıȝİȖȓıIJȠȣȆȠȚȝȐȞįȡȘȢ݃ı‫צ‬ȜȘʌȚȠࠎ‫ݼ‬ȡȠȚʌȡާȢ݇ȝȝȦȞĮǺĮıȚȜȑĮ0HUFXULL
7ULVPHJLVWL3RHPDQGHUVHXGH3RWHVWDWHDF6DSLHQWLD'LYLQD$HVFXODSLL'H¿QLWLRQHVDG$PPRQHPUHJHP3DULLV0'/,,,,$SXG$GU7XUQHEXPW\SRJUDphum Regium. Cf. LIRA, 2015, p. 81-82.
57
1mRVHSRGHD¿UPDUTXHR5HQDVFLPHQWRpSURGXWRGHXPD
única causa. Poder-se-ia, aqui, apontar as principais causas: 1) a
crescimento das cidades e do comércio; 2) desenvolvimento do
KXPDQLVPRDLQÀXrQFLDGDVFXOWXUDVEL]DQWLQDVHiUDEHVD
fuga progressiva da mentalidade medieval ocidental, principalmente, no que diz respeito ao âmbito supersticioso e ascético. O
crescimento econômico de algumas cidades italianas, como Veneza, Florença, Gênova, Milão e Roma assim como o acúmulo
de riqueza por parte de algumas famílias-mecena, por exemplo,
RV0pGLFLVGH)ORUHQoDRV6IRU]DGH0LOmRHR¿QDQFLDPHQWRH
incentivo dos Papas Nicolau V, Júlio II e Leão X contribuíram
com Renascimento na Itália. 21
O principal motor do Renascimento foi o humanismo. O
DSHOR DR +RPHP 8QLYHUVDO UHÀHWH FRQVLGHUDYHOPHQWH R HQDOWHcimento da Cultura Greco-Romana da Antiguidade Clássica. Não
é por acaso que Pico della Mirandola (1463-1494), 22 divulgador
da Cabala 23 no Renascimento, citando o Ascelpius Latinus 6, diz:
“Que grande maravilha, ó Asclépio, é o homem” (propter haec,
o Asclepi, magnum miraculum est homo).24 O Homem é capaz de
tudo superar e conhecer. É um observador da natureza. Ele conhece a criação (o cosmo), conhece a si mesmo, conhece ao Criador.
$RGHVFUHYHURVHUKXPDQRFRPRHVSHFWDGRUࢡİĮIJ੽Ȣ>WKHDWƝV@
da criação de Deus, os autores herméticos descrevem o mundo
21
22
23
24
SOUTO MAIOR, 1976, p. 286.
Pico della Mirandola foi discípulo de Ficino. Sobre Mirandola, cf. HEISER, James
D. Prisci Theologi and Hermetic Reformation in the Fifteenth Century. Malone (Texas): Repristination Press, 2011. p. 24-64; EBELING, Florian. The Secret History
of Hermes Trismegistus: Hermeticism from Ancient to Modern Times. Forworded
by Jan Assmann. Translated from the German by David Lorton. Ithaca and London:
Cornell University Press, 2011. p. 65-70; YATES, Frances A. Giordano Bruno and
the Hermetic Tradition. London: Routledge and Kegan Paul, 1964. p. 84-116, 84116; ABRÃO, Bernadette Siqueira (Org.). +LVWyULD GD )LORVR¿D. São Paulo: Nova
Cultural. 2004. 480p. 139-140; ARRU-DA, 1984, p. 32
ZEGURA, 2004, p. 138.
HERMÈS TRISMÉGISTE. Corpus Hermeticum. Texte établi par A.D. Nock et traduit par A.-J. Festugière. 2. ed. Paris: Les Belles Lettres, 2011. t. 2, p. 301.
58
(cosmo) como um grande espetáculo mágico (Corpus Hermeticum IV.2).25
Isso é extremamente atrativo para o pensamento humanista
do Renascimento. O Gentil-Homem é, sobretudo, um admirador
polivante: domina as artes, as ciências e vai às fontes e origens.
Não é por acaso que o humanismo valoriza: a Prisca Philosophia; a Prisca Sapientia; a Prisca Theologia. Em suma, o retorno
às origens clássicas (imortais). Daí as expressões humanistas da
época: ad fontes, ad fontes et origines.26
Ademais, vale considerar alguns fatos importantes. Em
1438-1439, houve um Concílio em Florença que reuniu Católicos
Romanos e Ortodoxos. Cósimo de Médici, o pater patriae, estadista e político da cidade italiana de Florença e fundador da diQDVWLD0pGLFLIRLLQÀXHQFLDGRSRUXPPRQJHRUWRGR[RTXHID]LD
parte da delegação conciliar ortodoxa. Esse monge se chamava
Georgios Gemistos Plethon, um intelectual platonista, que aconselhou Cósimo a fundar uma Academia Platônica. Um dos líderes
desse Concílio foi justamente Nicolau de Cusa, conhecido como
um grande matemático, que se tornou um grande admirador das
ideias platonistas de Plethon. Cósimo amadureceu a ideia de criar
uma Academia Platônica em Florença, onde se poderia estudar
as línguas antigas, como grego antigo, latim antigo etc. MarsiOLR)LFLQR¿OKRGRPpGLFR'LRWHIHFLFXMRVHVWXGRV
de grego foram patrocinados por Cósimo de Médici em 1456, se
tornou o fundador da Academia Neoplatônica. Marsilio estudou
grego desde tenra idade com um exilado bizantino chamado Ioannes Argyropoulos, com o intuito de realizar o sonho de Cósimo.27
Ainda convém salientar que os estudos da língua grega só
foram possíveis graças a alguns fatos relevantes, a saber: entre o
Concílio de Florença e os estudos de Ficino houve as sucessivas
25
26
27
HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, 2t, p. 49-50.
HEISER, 2011, p. 33-64; EBELING, 2011, p. 64-70; YATES, 1964, passim; ABRÃO,
2004, p. 139-1140.
LIRA, 2015, p. 80.
59
invasões turcas e a Queda de Constantinopla (em 1453). Isso
contribuiu para que vários eruditos bizantinos (gregos) constantemente procurassem exílio na Itália. Eles traziam consigo manuscritos de textos clássicos, muitos desses eram desconhecidos
para os italianos. Esses eruditos passaram a lecionar grego (uma
OtQJXDTXH¿FRXTXDVHLJQRUDGDQR2FLGHQWHHPYiULDVFLGDGHV
italianas.28
Em todo caso, Cósimo, tendo colecionado vários manuscriWRVTXHFRQWLQKDPHVFULWRVGH3ODWmRUHSDVVRXSDUD)LFLQRD¿P
GHTXHHOHSXGHVVHWUDGX]LUHWDPEpPVHGHGLFDUj¿ORVR¿DSODW{nica. Ficino não tinha ainda iniciado a tradução das obras platônicas, ou talvez a tenha abandonado, quando, em 1460, Cósimo de
Médici lhe pediu para priorizar a tradução latina do manuscrito
grego de uma coleção dos textos de Hermes Trismegistos. Em
1463, Ficino concluiu a tradução daquilo que mais tarde viria a ser
chamado Corpus Hermeticum. Sua tradução, ou seja, a primeira
tradução editada do Corpus Hermeticum, publicada em 1471, foi
intitulada de Mercurii Trismegsti Liber de Potestate et Sapientia
Dei, ou simplesmente Pimander.29 O Pimander de Ficino ganhou
popularidade e logo se tornou o modelo para ele proceder à tradução dos diálogos platônicos. Até 1471, o Pimander de Ficino
IRLUHHGLWDGRGH]HVVHLVYH]HVDWpR¿QDOGRVpF;9,DWpIRL
reeditado vinte e cinco vezes, sem contar as transcrições de partes
do Pimander e as traduções feitas a partir dessa tradução latina.30
28
29
30
SOUTO MAIOR, 1976, p. 286; ARRUDA, 1984, p. 32. Fato interessante é a chegada
de um emissário bizantino, chamado Manuel Crisoloras, que apareceu em Veneza
para pedir ajuda, em nome do imperador bizantino, contra a invasão turca. Crisoloras
foi aclamado pelos italianos como o apóstolo do passado glorioso da Grécia. Posteriormente foi indicado como professor da cátedra de clássicos gregos da Universidade de Florença (SOUTO MAIOR, 1976, p. 286).
Mercurii Trismegsti Liber de Potestate & Sapientia Dei e graeco in latinum traductus
a Masilio Ficino... Tarvisii. M.CCCC. LXXI. O Pimander de Ficino foi publicado
recentemente em edição bilingue latim-italiano: FICINUS NOVUS. Pimander: Sive
de Potestate et Sapientia Dei. A cura di Maurizio Campanelli. Torino: Aragano, 2012.
LIRA, 2015, p. 80-81.
60
$LQÀXrQFLDGRSODWRQLVPRQRSHUtRGRUHQDVFHQWLVWDpQRtória. O próprio grego ático dos escritos de Platão foi estudado
como padrão da língua grega. Houve uma busca por padrões clásVLFRVQRHVWXGRGDOLWHUDWXUDDQWLJD+iLQÀXrQFLDGRVFOiVVLFRV
em escritores humanistas da Itália, Inglaterra, Holanda, Espanha,
Portugal e França, inclusive nas línguas vernáculas: Dante, Petrarca, Boccagio, Maquiavel, Shakespeare, Cervantes, François
Rabelais, Erasmo de Roterdam, Camões etc. O surgiram os traGXWRUHVRVWLSyJUDIRVHRV¿OyORJRVLQWHUHVVDGRVHPHVWXGRVFOiVsicos.32
Não se pode esquecer de mencionar que Erasmo de Roterdam (1465-1536) foi o primeiro a editar o Novo Testamento em
grego, acompanhado de uma tradução latina, em 1515 (1516).
Essa edição serviu de base, inclusive, para a tradução alemã da
Bíblia (em 1519) de Martinho Lutero (1483-1546). Erasmo de
Roterdam também mudou o sistema de pronúncia do grego antigo, que até então seguia a pronúncia bizantina, mais ou menos
como se pronuncia o grego moderno. Praticamente, em todas
as universidades e escolas do mundo, principalmente na França e com exceção da Grécia, desde o Renascimento até hoje, a
pronúncia que prevalece é a etacista ou erasmiana, diferente da
pronúncia iotacista, seguida por Johannes Reuchlin, que estudou
31
31
32
HEISER, 2011, p. 65-198.
SOUTO MAIOR, 1976, p. 286; ARRUDA, 1984, p. 32. William Shakespeare (15641616), por exemplo, era um exímio e profundo conhecedor de grego, latim. Conhecia
PXLWR EHP D %tEOLD +RPHUR 3OXWDUFR H 6rQHFD VHQGR LQÀXHQFLDGR SHORV UHQDVcentistas italianos. SHAKESPEARE. Tragédias: Romeu e Julieta; Macbeth; Hamlet, Príncipe da Dinamarca; Otelo, o Mouro de Veneza. Traduções de F. Carlos de
Almeida Cunha Medeiros e Oscar Mendes. Sinopses, dados históricos e notas de
F. Carlos de Almeida Cunha Medeiros. São Paulo: Abril Cultural, 1981. v. 1. p. 3.
CERVANTES, Miguel de. Dom Quixote de La Mancha. Tradução dos Viscondes
de Castilho e Azevedo. Notas de José María Castro Calvo, traduzidas por Fernando
Nuno Rodrigues. São Paulo: Abril Cultural, 1981. p. 3. CAMÕES, Luiz de. Os Lusíadas. Edição ilustrada. Lisboa: Editora Marujo, 2013 (1878). p. 5-7. RABELAIS,
2006, cap. 30, p. 5-14.
61
com Ioannis Argyropoulos, Ficino e Pico della Mirandola em
épocas diferentes.33
O estudo do grego se tornou extremamente importante: 1.
ler os Diálogos Platônicos; 2) retomar a Patrística Grega; 3) aproIXQGDU R HVWXGR ¿ORVy¿FR GD $QWLJXLGDGH OHU DV (VFULWXUDV
Sagradas no “suposto” original; etc. Como os textos platônicos
e o platonismo foram muito admirados, os humanistas do Renascimento elevaram o grego ático (de Platão, Sófocles, Tucídides e
Aristófanes) como Grego Clássico (da primeira classe). Tal designação é-nos conhecida até hoje.34 É importante frisar que, em
alguns países, o currículo escolar e universitário conservou as
tradições humanísticas do Renascimento, apresentando o grego
ático como o grego inicial e paradigmático para o aprendizado
dessa língua.35
O latim medieval passou por uma reforma padronizada a
partir do latim de Cícero (praticamente hoje nós reproduzimos),
embora retornar ao latim antigo também dependesse da seleção
que cada autor renascentista estabelecia, podendo chegar ao ciceronianismo exagerado extremado ou não. As obras escritas em
latim, desse período, foram drasticamente relacionadas a uma linguagem “acadêmica” e livresca. No entanto, convém frisar que
os renascentistas foram capazes de produzir seu próprio latim,
33
34
35
RAGON, E. Gramática grega. Inteiramente reformulada por A. Dain, J.-A. de Foucault, P. Poulain. Tradução de Cecilia Bartalotti. São Paulo: Odysseus, 2012. p. 3;
FREIRE, Antônio, S.J. Gramática Grega. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001. p.
5-6; TAYLOR, William Carey. Introdução ao Estudo do Novo Testamento Grego.
São Paulo: Batista Regular, 2014. p. 4; KÜMMEL, Werner Georg. Introdução ao
Novo Testamento. Nº 13. Nova Coleção Bíblica. 2 ed. São Paulo: Paulus, 1982. p.
714; MILLER.; HUBER, 2007, p. 158-159, 164-167.
Classicus, em latim, vem de classis (classe, categoria). O grego do séc. V a.E.C. se
tornou um padrão para o estudo helenista. DICIONÁRIO, 2010, p. 84.
BETTS, Gavin; HENRY, Alan. Complete New Testament Greek. 3 ed. London: Hodder and Stoughton; New York: McGraw Hill, 2010. p. 6-7.
62
o qual não tem relação com o latim medieval nem com o latim
antigo, tanto do ponto de vista de novas palavras quanto de novos
sentidos.36
Reconhecidamente, em concordância com o próprio princípio do
Humanismo da Renascença, que rejeita como «bárbaro» o latim
medieval e pretende voltar aos modelos da Antiguidade, a maior
parte do vocabulário usado por autores latino da Renascença – e
PDLVJHUDOPHQWHSRUDXWRUHVQHRODWLQRV±¿JXUDQRVGLFLRQiULRV
latinos tradicionais, que é importante para se consultar em primeiro lugar. Mas todos os leitores dos textos neolatinos sabem
que muitas vezes uma tal consulta se faz em vão, porque, por diversas razões, os autores neolatinos empregam, assim, numerosos
termos do latim da Antiguidade também, assim como várias palavras antigas providas de um sentido novo (tradução própria).37
O humanismo renascentista foi capaz de não só utilizar palavras arcaicas, mas também dar novas orientações etimológicas,
formas, sentidos e novos usos. Esse novo olhar linguístico não
apenas se deu com o uso do latim e do grego, mas ainda com as
novas palavras, formas e sentidos que os humanistas, em diferentes países, empregaram nas línguas nacionais. Quando se trata de
Shakespeare, não se pode negar a relevância que suas novas pa36
37
HOVEN, René. Lexique de la prose latine de la Renaissance. 2. éd. rev. et consid.
augm. Avec la collaboration de Laurent Grailet. Traduction anglaise par Coen Maas
Revue par Karin Renard-Jadoul. Leiden; Boston: Brill, 2006. P. vii. ZEGURA, 2004,
p. 35-36, 86, 127, 134, 145, 261.
Certes, conformément au principe même de l’Humanisme de la Renaissance, qui rejette comme «barbare» le latin médiéval et entend revenir aux modèles de l’Antiquité,
la plus grande partie du vocabulaire utilisé par les auteurs latins de la Renaissance
±HWSOXVJpQpUDOHPHQWSDUOHVDXWHXUVQpRODWLQV±¿JXUHGDQVOHVGLFWLRQQDLUHVODWLQV
traditionnels, qu’il importe de consulter en premier lieu. Mais tous les lecteurs de
textes néo-latins savent que maintes fois une telle consultation se fait en vain, car
pour diverses raisons les auteurs néo-latins emploient aussi de nombreux termes
ignorés du latin de l’Antiquité, ainsi que des mots anciens pourvus d’une acception
nouvelle. HOVEN, René. Lexique de la prose latine de la Renaissance. 2. éd. rev. et
consid. augm. Avec la collaboration de Laurent Grailet. Traduction anglaise par Coen
Maas Revue par Karin Renard-Jadoul. Leiden; Boston: Brill, 2006. P. vii.
63
lavras, diferentes usos e sentidos sui generis tiveram na formação
língua inglesa desde o renascimento até hoje. O mesmo pode se
dizer como Camões, com suas palavras e empregos, foi importante para a consolidação de vários usos em língua portuguesa.
Ademais, pode-se constatar como Martinho Lutero, ao traduzir
D%tEOLDSDUDRDOHPmRIRLFDSD]GHGDUXPDXQL¿FDomRHQRYD
¿VLRQRPLDjOtQJXDDOHPm38
No entanto, para se chegar até 1500, houve cem anos de
LQÀXrQFLDKXPDQLVWDTXHFRPHoRXQRVpF;9$VOtQJXDVMiKDYLDP VLGR LQÀXHQFLDGDV SRU PXGDQoDV GHFRUUHQWHV GD pSRFD GR
Renascimento, seja na modalidade oral ou escrita, não só por arcaísmos, mas também por palavras novas criadas pelo conhecimento de várias línguas, mesmo que muitas línguas nacionais já
tivessem em curso desde a Idade Média. Não existe apenas um
~QLFR IDWRU TXH GHWHUPLQH DV LQÀXrQFLDV VREUH R FRQKHFLPHQWR
enciclopédico da linguagem de Rabelais em sua obra. Isso advém
do fato de que ele era um humanista passível de todas as mudanças possíveis de sua época.
Rabelais conhecia os detalhes das línguas clássicas e moGHUQDV ,VVR ¿FD HYLGHQWH QR FDStWXOR GH 3DQWDJUXHO TXDQGR
Panurgo responde a Pantagruel em várias línguas.39 Ele conhece
os autores clássicos e suas obras.40 Bakhtin não nega que Rabelais era um adepto de instruções humanistas e que, diante de um
conhecimento enciclopédico, não titubeava em lançar mãos das
fontes antigas de cada área. Segundo Bakhtin, as posições rabelaisianas são vanguardistas em cada área que ele abordou: política, cultura, ciência e a vida cotidiana. Isso pode ser inferido na
Carta de Gargântua a Pantagruel HQDV5HÀH[}HVGH3DQWDJUXHO
sobre o Direito Romano.41
38
39
40
41
MILLER, Stephen M.; HUBER, Robert V. A Bíblia e Sua História: O Surgimento e
o Impacto da Búblia. Barueri: Sociedade Bíblica Brasileira, 2007. p. 164-167.
RABELAIS, 2006, cap. 9, p. 61-67.
RABELAIS, 2006, cap. 10, p. 69-74; cap. 18, p. 111-115; passim.
RABELAIS, 2006, p. 56-60, 69-74; BAKHTIN, 2010, p. 399.
64
3. As Implicações do Humanismo Renascentista em François
Rabelais
François Rabelais era um exímio conhecedor e sempre demonstrou competência em todos os domínios que ele apresentou
e abordou. Há estudos modernos que demonstram sua competência em várias áreas do conhecimento, tais como Medicina, Ciências Físicas e Biológicas, Arquitetura, Arte Militar, Navegação,
Falconaria, Educação Física e Esportes, Numismática, Teologia,
Gramática etc. Seu léxico, nomenclatura, termos técnicos e conceitos impressionam por pertencer a várias áreas do conhecimento. Embora haja quem diga que ele não aplicava os termos com
precisão, é ponto passivo de que ele possuía um conhecimento
enciclopédico e que manejava um léxico notável. Todavia, seu
conhecimento enciclopédico é resultado de um novo período
marcado pelo Renascimento intelectual e artístico. É justamente
neste período que o mundo da linguagem é enriquecido, renovado
e reagrupado de forma original e clara.42
$)UDQoDIRLLQÀXHQFLDGDSHOD,WiOLDHPpSRFDWDUGLDGRSHríodo do Renascimento, mas foi de forma única e bastante efetiva.
Isso advém do fato de que guerras, envolvendo os dois países,
colocaram os militares em contato e, posteriormente, os dois povos, contribuindo, assim, com as artes, as ciências, o comércio, a
indústria e com o cotidiano. Por consequência, surgiu uma nova
OLQJXDJHP LQÀXHQFLDGD SHORV ODWLQLVPRV KHOHQLVPRV LWDOLDQLVmos e também pelos neologismos típicos da época.43 Se, por um
lado, é-nos relevante concordar com Bakhtin que “não se tratava
de coisas novas, mas que estas tinham o poder de renovar à sua
volta as outras coisas antigas, de dar-lhes uma nova forma”44 e,
42
43
44
BAKHTIN, 2010, p. 400-401.
BAKHTIN, 2010, p. 401.
BAKHTIN, 2010, p. 401.
65
por isso, a sensibilidade de Rabelais estava à frente de sua época;
por outro lado, deve-se concordar que a sensibilidade de Rabelais
frente à novidade da linguagem, embora fosse avant-primière,
pertencia ao espírito humanista renascentista da época.45
Não se pode negar que François Rebelais tenha criado termos novos que até hoje se utiliza em algumas áreas. Na Arquitetura, por exemplo, foi ele que, pela primeira vez, empregou os
termos simetria, pórtico, arquitrave, frisa, entre outros. De igual
modo, isso ocorreu em outras áreas do conhecimento. Contudo,
muitas dessas palavras já existiam como palavras arcaicas e em
um vasto arcaísmo da época. O que se pode destacar é o seu emprego novo ou renovado na língua francesa.
Mikhail Bakhtin menciona que Rabelais já havia dado noPHVDRVSHL[HVÀXYLDLVHPDUtWLPRVRVTXDLVQmRHVWDYDPDLQGD
catalogados, por escrito, em estudos ictiológicos do séc. XVI e
que Guillaume Rodelet e Pierre Belon só haviam catalogado entre 1553 e 1554, depois da morte de Rabelais. Bakhtin salienta
que a fonte utilizada por Rabelais estava na modalidade oral, na
linguagem dos pescadores. Em todo caso, Bakhtin não está negligenciando que os nomes das coisas, na sua modalidade oral, também não tenham passado pelo crivo das renovações da linguagem
típica do humanismo renascentista. Ele salienta que o problema
“não é que Rabelais tenha conhecido nomes graças a fontes orais.
É que os nomes de peixes que ele enumerou não haviam ainda
¿JXUDGRQXPFRQWH[WROLYUHVFR´.46
De qualquer forma, Rabelais empregou amplamente, à vogue
de sua época, um léxico rico em helenismos, latinismos e neologismos. Os nomes vulgares da linguagem oral, os quais Bakhtin elege
como uma das fontes de Rabelais, não poderiam ser, naquela época, livrescos porque poderiam soar como evocação a coisas ruins
ou poderiam ser palavras de baixo calão. Caso semelhante ocorre,
45
46
BAKHTIN, 2010, p. 402.
BAKHTIN, 2010, p. 403.
66
no contexto nordestino brasileiro, com os nomes de doenças contagiosas, os quais podem vir carregados de conotações ruins, por
exemplo, gota-serena, “tisiu”, “tisgo” [sic tísico], chegando, amiúde, a constituírem expressões de insulto. Os nomes-apelidos que
VHFRQ¿JXUDPQDVREUDVGH5DEHODLVFRPRBocaberta (Badebec),
mãe de Pantagruel, em alguns estados do Brasil, são insultos. Isso
não estaria muito distante da ideia rabelaisiana dos nomes-apelidos,
dos apelidos elogioso-injuriosos e dos nomes-alcunhas, cujo sentido é ambivalente ou retórico. Entretanto, os nomes de origem grega, nas obras rabelesianas, vêm carregados de traços axiológicos
ou valorativos, como, entre outros, Panurgo, Eustênio, Thaumasto.
O nome PantagruelpDSUHVHQWDGRFRPXPDHWLPRORJLDDUWL¿FLDO
ou literária (greco-agarena), apresentando um trocadilho ou uma
ambivalência: (sedento de tudo). No entanto, essa ambivalência é
menos evidente do que a de Bocaberta (Badebec) porque os elementos de composição não são tipicamente franceses.47
Conclusões
Mikhail Bakhtin acentua algo que o próprio Rabelais, quiçá,
não tivesse consciência.48 A crítica de Rabelais, em Pantagruel,
é notoriamente a crítica sobre a linguagem, não sobre a modalidade de uso escrito ou oral das fontes.49(OHVDWLUL]DD)LORVR¿D
Escolástica e a Igreja, não necessariamente o classicismo. Se o
47
48
49
RABELAIS, 2006, p. 29, 31, 61, 64, 111, 195, 200, 201, 204; BAKHTIN, 2010, p.
403-408. BERTRANDO, Bernardino. Minidicionário de Pernambuquês. 2. ed. rev. e
DPSO5HFLIH%DJDoRS%DGHEHFQRWHPSRGH5DEHODLVVLJQL¿FDYD
boca-aberta, tolo. No francês moderno, utiliza-se muito badaud. DICIONÁRIO de
Francês-Português, Português-Francês. Porto: Porto, 2010. p. 55.
0XLWDV D¿UPDo}HV H FRQVWDWDo}HV GH %DNKWLQ VmR UHOHYDQWHV H SHUWLQHQWHV 1R HQtanto, talvez Bakhtin tenha ‘carregado muita tinta’ no tema da oralidade, das festas
populares e das apresentações em praças públicas ao defender as línguas nacionais
emergentes, em detrimento do classicismo latente no humanismo renascentista, e
tenha visto, em Rabelais, uma voz incólume na luta de classes.
ZEGURA, 2004, p. 204-205.
67
ponto fundante de sua crítica estivesse intimamente relacionado
com o pressuposto de uma fonte oral, ele correria o risco de estar
submetido à mesma crítica, uma vez que utilizou da literalidade
e do livresco para se expressar. Deve-se pensar que, durante a
Idade Média, o grego foi tão estigmatizado quanto qualquer língua nacional. Daí, se græcum est, non legitur (é grego, não se lê).
A única diferença é que o grego não era lido enquanto as outras
línguas eram menorizadas ou inferiorizadas, em detrimento do
latim. Rabelais desprezou e hostilizou esta tendência, defendendo
a ideia de que a palavra apresenta uma imensidão de possibilidades inexploradas. Mesmo a ausência de palavras possibilita se
expressar puramente com sentido.
Em última análise, a Carta de Gargântua a Pantagruel pertence a um microcontexto do capítulo 8, mas se enquadra no macrocontexto do capítulo 6, 7, 9. Neste contexto, Rabelais satiriza
as tendências dos estudantes universitários, em seu tempo, de latinizar a língua francesa e, mais do que isso, de reproduzir palavras
latinas sujeitas à sintaxe francesa. Isso advém do fato de que os
estudantes eram obrigados a falar latim em sala de aula. Rabelais
também parodia o latim degenerado dos eruditos. Ademais, ele
valoriza um conhecimento enciclopédico e a ostentação de um
conhecimento amplo de línguas diferentes, o que caracteriza o
cosmopolita aberto a uma nova época, sendo habilitado e capaz
de se exprimir em várias línguas, desde as mais elevadas até outras consideradas bárbaras.50
50
1RFDStWXOR3DQWDJUXHOHQFRQWUDXPHVWXGDQWHGH/LPRJHVTXHGHV¿JXUDDOtQJXD
francesa. Pantagruel se irrita com o francês latinizado desse estudante. No capítulo
7, é relatado como Pantagruel foi a Paris e encontrou os belos livros da Biblioteca de
São Vítor. Neste episódio, Rebelais apresenta uma relação de livros com títulos nobres em francês latinizado. No capítulo 9, Pantagruel encontra um homem chamado
Panurgo, que conhece vários idiomas (alemão, mistura de línguas orientais, italiano,
HVFRFrVEDVFRKRODQGrVHVSDQKROGLQDPDUTXrVKHEUDLFRJUHJRXPDOtQJXDDUWL¿cial e utópica, latim e francês). Neste episódio, ele intenciona demonstrar que Panurgo (o que faz tudo ou o que sabe tudo) é um cosmopolita aberto a um novo mundo.
RABELAIS, 2006, p.13, 45-67, 196; BAKHTIN, 2010, p. 403-408.
68
Em suma, nesse contexto supramencionado, emerge a Carta
de Gargântua a Pantagruel, escrita ao estilo ciceroniano (mas em
francês), com conteúdo humanista renascentista. François Rabelais apresenta, no capítulo 8, por meio da Carta de Gargântua a
Pantagruel, uma possibilidade de que é possível manter o estilo
clássico (ciceroniano), sem ferir a língua francesa (capítulo 6),
sem degenerar a língua clássica (capítulo 7) e valorizar todas as
possibilidades de aprendizado de várias línguas, seja oral, escrita,
moderna ou antiga (capítulo 9). Nesse macrocontexto estrutural,
a Carta de Gargântua a Pantagruel, no capítulo 8, possui um
elemento concêntrico solucionador de todos os problemas levantados, a saber: o humanismo renascentista.51
5HIHUrQFLDVELEOLRJUi¿FDV
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51
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69
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Resumo:
A Carta de Gargântua a Pantagruel, no capítulo 8 de Pantagruel, foi escrita
no estilo ciceroniano, seguindo de perto 'H2I¿FLV ou Dos Deveres de Cícero,
HQGHUHoDGRDVHX¿OKR0DUFR2OLYURGH&tFHURFXMRJrQHURpHQVDtVWLFRDVVHmelha-se a uma longa epístola, que poderia ter sido endereçada a qualquer pessoa que almejasse os cargos políticos em Roma. A própria Carta de Gargântua
a Pantagruel ajuda a recontar importância das Línguas e Literaturas Clássicas
na época de Rabelais. O presente texto objetiva apresentar as características da
historicidade de conteúdo na Carta de Gargântua a Pantagruel, perscrutando
as implicações humanistas renascentistas em François Rabelais, tendo como
SUHVVXSRVWRDLQÀXrQFLDFOiVVLFDQRVHXWH[WROLWHUiULRHQRVHXSHQVDPHQWR
'HVWDUWHVHJXHPVHWUrVHWDSDVLPSRUWDQWHVDLQÀXrQFLDFOiVVLFDQDCarta
de Gargântua a Pantagruel e no pensamento rabelaisiano; 2) a historicidade
do conteúdo da Carta de Gargântua a Pantagruel; e 3) as implicações do humanismo renascentista em François Rabelais.
Palavras-chave: Carta de Gargântua a Pantagruel; François Rabelais; Humanismo Renascentista; Historicidade.
Abstract:
The Letter from Gargantua to Pantagruel at the eighth chapter of Pantagruel
was written in the Ciceronian style, following close upon 'H2I¿FLV or On the
Duties by Cicero, addressed to his son Marcus. The book by Cicero, whose
gender is an essay, resembles a long epistle, which might have been addressed
to anyone who was longing for the political posts in Rome. The Letter itself
from Gargantua to Pantagruel helps to recount the importance of the Classic
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Languages and Literatures in the time of Rabelais. This text aims to present
the features of the historicity of content in the Letter from Gargântua to Pantagruel, scrutinizing the Renaissant Humanist implications in François Rabelais,
WDNLQJWKH&ODVVLFDOLQÀXHQFHDVDSUHVXSSRVLWLRQLQKLVOLWHUDU\WH[WDQGLQKLV
WKRXJKW6RWKUHHLPSRUWDQWVWDJHVDUHIROORZHGWKH&ODVVLFDOLQÀXHQFHLQ
the Letter from Gargantua to Pantagruel and in the Rabelaisian thought; 2) the
historicity of the content of the Letter from Gargantua to Pantagruel; and 3)
the implications of the the Renaissant Humanism in François Rabelais.
Keywords: Letter from Gargantua to Pantagruel; François Rabelais; Renaissant Humanism; Historicity.
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