Dependência da economia americana é o maior problema do

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Dependência da economia americana é o maior
problema do México
Lia Valls
Coordenadora de Projetos/IBRE
Perigosas
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O
México vive uma nova fase. E dois fatos novos merecem destaque. Após mais de 70 anos o presidente, Vicente Fox, que começou o mandato este ano, não pertence ao Partido Revolucionário Institucional (PRI) e recebeu uma economia em expansão.
O governo anterior implementou políticas de disciplina monetária e fiscal que permitiram a retomada do crescimento econômico e a queda da inflação. No ano passado, a economia do
país cresceu 6,9% e a taxa de inflação foi de 9,5%.
Já os quatro últimos presidentes mexicanos iniciaram os
mandatos com a economia em crise, inclusive o ex-presidente
Ernesto Zedillo, cuja posse foi em 1995. Naquele ano o PIB
mexicano registrou queda de 6,2% e o Índice de Preços ao
Consumidor aumentara de 6,9% (1994) para 35% (1995).
No entanto, a retração no crescimento dos Estados Unidos
certamente irá penalizar o México nesta nova etapa. Relatórios
de organismos internacionais de financiamento e consultorias
privadas mostram que o bom desempenho da economia mexicana fará o PIB ficar entre 1,9% e 3%.
Mas se as condições macroeconômicas parecem ter melhorado, os indicadores sociais preocupam. O Banco Mundial estima que em 1996 aproximadamente 2 em cada 3 mexicanos
eram pobres, sendo que um encontrava-se em situação de extrema pobreza. No ranking do Índice de Desenvolvimento
Humano das Nações Unidas o México aparece em 55º lugar,
com base nos dados de 1998. Uma situação melhor que a do
Brasil, classificado em 74º lugar.
Não entrando na polêmica sobre a metodologia do cálculo
desse índice, algumas informações confirmam a grave situação
da miséria mexicana. Na população que vive abaixo da linha
de pobreza, 17,9% sobrevivem com apenas um dólar por dia
(a preços da paridade do poder de compra de 1993), enquanto
no Brasil este percentual é de 5,1%. O aumento de gastos sociais
é considerado fundamental para assegurar um mínimo de proteção social aos mais pobres.
O Presidente Vicente Fox herda também o Tratado de Livre Comércio da América do Norte (TLCAN para os mexicanos e Nafta para canadenses e americanos), que entrou em
vigor em 1994. É consenso que o México só conseguiu o empréstimo de US$50 bilhões dos Estados Unidos, do Banco
Mundial e do Fundo Monetário Internacional para superar a
crise por pertencer ao Nafta, cujos efeitos sobre a economia
mexicana ainda são objeto de controvérsia. A melhoria na
competitividade do setor produtivo do país é considerada vital para assegurar ganhos de longo prazo com o processo de
abertura.
ESTABILIDADE, GASTOS, FINANÇAS
Quais seriam então os principais pontos da agenda mexicana
para o novo milênio? O relatório do Banco Mundial Una Agenda Integral de Desarrollo para La Nueva Era revela que as
receitas do petróleo explicam cerca de 30% da arrecadação
tributária do México. O percentual da carga tributária sobre o
PIB é baixo; excluindo o petróleo, é menor do que 10%. Há
diversas isenções por produtos, tipo de renda, região ou contribuinte e a fiscalização é ultrapassada.
Em abril o presidente Fox anunciou reformas tributária e
orçamentária recomendadas pelo Banco Mundial. A alíquota
do imposto sobre o valor adicionado (IVA) foi uniformizada
em 15%, eliminando as isenções sobre remédios, alimentos e
livros. Esperando resistências foi admitida a continuação de
alíquota zero para uma cesta de remédios genéricos e alguns
alimentos.
Já as alíquotas máximas do imposto de renda sobre a pessoa física e jurídica diminuíram, respectivamente, de 40% e
35% para 32%. Para diminuir o impacto das variações das
receitas do petróleo sobre a arrecadação foram criadas regras
claras para a utilização de receitas excedentes. A idéia é a mesma já em vigor no Chile com o cobre e na Colômbia com o
petróleo, que estabeleceram fundos de estabilização para que a
volatilidade das receitas não acabe gerando despesas excessivas e baixa disciplina fiscal em épocas de aumentos de preços
desses produtos no mercado mundial.
Paralelamente o governo anunciou uma série de medidas
para elevar os gastos com programas sociais e despesas em
infra-estrutura. Em 1980, os investimentos do governo em infraestrutura representavam 10% do PIB e, em 1998 apenas 2%.
Só que por causa da retração da economia e a prioridade à
disciplina fiscal, parte destas despesas poderá ser reduzida.
A dívida legal em relação ao PIB é baixa (cerca de 25%) e a
implícita (existe de fato, mas não legalmente), de 46%, também não é considerada muito alta. O Banco Mundial chama a
atenção, entretanto, para alguns problemas. Um deles é o
desequilíbrio atuarial do sistema de previdência dos servidores
públicos federais. A dívida dos estados em relação ao PIB é
pequena, somente 2%. Mas sugere maior compromisso com a
responsabilidade fiscal.
Melhorar a arrecadação tributária para que gastos sociais e
em infra-estrutura possam ser realizados é primordial. No item
da infra-estrutura as soluções passariam por medidas reguladoras que estimulem o investimento privado, especialmente em
energia elétrica e transportes. O Banco Mundial acha que o
México estaria à beira de uma crise hidráulica.
Outra debilidade do sistema econômico refere-se aos bancos. Devido à crise de 1994, os empréstimos do setor bancário reduziram-se 40% em termos reais, afetando principalmente os consumidores e pequenas e médias empresas sem
acesso a financiamentos externos. Medidas para melhorar a
função bancária foram introduzidas em 1997, mas ainda seria necessário aprimorar os mecanismos de regulamentação
do setor.
O SETOR EXTERNO
A abertura comercial no México começou em 1983, sendo consolidada com a entrada do país no GATT (Acordo Geral de
Tarifas e Comércio), em 1986. Em 1994 entrou em vigor o
Nafta. E quais os resultados?
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A participação das exportações no comércio mundial aumentou de 0,89% para 2,43% entre 1980 e 1999, classificando o país como o 12º principal exportador mundial. A
participação das exportações no PIB aumentou de 7,6% para
14,% entre 1980 e 1994 e atingiu 31,3% em 1999. A mudança foi acompanhada pelo aumento expressivo das exportações de manufaturados que explicaram 90% das exportações mexicanas em 1999.
A abertura comercial e o Nafta deram uma importância
crescente às exportações no crescimento do país. Dos 2 milhões de empregos criados entre 1993 e 1998, metade estaria
vinculada às exportações. Além disso, a diferença de salários
pagos nas indústrias exportadoras e nas direcionadas para o
mercado interno seria de 44%. Considerando a remuneração
média anual total dos empregados formais o ritmo de crescimento foi negativo em 2,4% entre 1994 e 1998.
É sabido que o aumento dos manufaturados mexicanos
está associado em grande parte às indústrias maquiladoras
(cerca de 45% das exportações, segundo a Organização Mundial do Comércio). O número de maquiladoras cresceu de
620 para 3.717, entre 1980 e 2000. Após a entrada no Nafta
o aumento foi de 80%, empregando cerca de 16 milhões de
trabalhadores.
Essas indústrias produzem principalmente bens intermediários, mas com elevado conteúdo de bens importados. Não distinguindo a origem dos produtos, a participação do consumo
intermediário no valor da produção das maquiladoras vem
aumentando ao longo do tempo. Em 1990 era de 80% e em
1999, de 89%. Em valores adicionados, a indústria
maquiladora tem apresentado incrementos anuais da ordem
de 12% para os anos de 1998 e 1999. Não temos os dados
desagregados, mas o componente importado de insumos intermediários da economia como um todo teria aumentado de
18,7% para 30,4% entre 1993 e 1997.
A participação dos Estados Unidos no comércio exterior
mexicano já era predominante antes do Nafta. Em 1994, a
participação das exportações era de 85% e das importações,
71%. Em 2000 estes percentuais foram 88% e 72%, respectivamente, e o saldo comercial com os Estados Unidos atingiu
um superávit de US$20 bilhões.
Mas com o resto do mundo o México foi deficitário em
US$28 bilhões em 2000 e a balança comercial tem elevado o
déficit em transações correntes, cerca de US$17,68 bilhões o
ano passado. Em 1994, o déficit era de US$29,66 bilhões. O
Estudo do Banco Mundial sugere ainda que uma posição menos vulnerável da economia mexicana depende também do aumento das exportações para fora dos Estados Unidos. O incremento médio anual das exportações entre 1995/2000 foi de
23,3% para os Estados Unidos e de 17% para o resto do mundo. Quanto às importações os valores são próximos: 17% (Estados Unidos) e 16% (resto do mundo).
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Os investimentos americanos aumentaram significativamente
após o Nafta e explicavam cerca de 58% dos investimentos
entre 1990 e 1994, atingindo US$4,87 bilhões em 1994. No
período 1995-2000 os valores têm aumentado e os dados provisórios indicam US$8,93 bilhões para 2000. A participação
dos investimentos americanos no período 1995-2000 foi, em
média, de 66%. Os saldos da balança de pagamentos têm sido
superavitários, sendo de US$2,82 bilhões em 2000. As reservas estão em US$38,36 bilhões.
Para melhorar as exportações, o Banco Mundial e analistas
mexicanos sugerem melhoras na infra-estrutura e investimentos no capital humano. Alguns indicadores de competitividade,
como o custo unitário da mão-de-obra na indústria
manufatureira, mostram que grande parte da vantagem mexicana está na sua mão-de-obra bem mais barata que a americana. Também a lógica da produção maquiladora com elevada
participação de consumo intermediário não sugere que este caminho seja suficiente para garantir um aumento continuado
do valor agregado da economia.
Além disso, o governo mexicano tem se preocupado em diversificar a sua pauta exportadora, tendo assinado um tratado
de livre comércio com a União Européia, que passou a vigorar
em julho do ano passado. O acordo cobre 100% dos produtos
industriais, quase todos os produtos de pesca e 62% dos agrícolas (exclui carne, lácteos e cereais, que são produtos sensíveis para os europeus e não são produtos de exportação mexicanos). O acordo com o Mercosul ainda está pendente, após o
fracasso das negociações em separado com o Brasil.
Um crescimento sustentado na economia mexicana que tenha efeitos positivos para todos os setores requer a dinamização
também do mercado interno. Até que ponto essa etapa será
alcançada depende mais de mudanças da agenda interna mexicana do que do Nafta. Melhorar a infra-estrutura física e social,
assegurar redes de proteção social para os mais pobres, garantir transparência administrativa são alguns pontos sugeridos.
Além disso não pode ser esquecido o caso particular do campo. A população rural é de 20%, mas a participação do setor
agrícola no PIB é de apenas 5%. A liberalização total do setor
agrícola no Nafta só se completará em 2010, o que requer
melhorias urgentes na competitividade agrícola.
Bibliografia
Abelardo Mariña Flores. “Factores Determinantes del Empleo en México, 1980-1998”. Comércio
Exterior , vol. 51, nº 5, maio de 2001.
Juan Ramiro Mendoza. “Relaciones entre Apertura y Crecimento Económico en México”. Idem
Marcelo M. Giugale. “Una Agenda Integral de Desarrollo para La Nueva Era”. Capítulo de
Sintesis do Relatório do Banco Mundial, novembro de 2000.
Utilizado o Instituto Nacional de Geografia e Informática do México, como fonte de dados.
www.inegi.gov.mx
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