Reseña de" A mais bela história da felicidade" de André Comte

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EccoS Revista Científica
ISSN: 1517-1949
[email protected]
Universidade Nove de Julho
Brasil
Bianchi de Araújo, Rogério
Reseña de "A mais bela história da felicidade" de André Comte-Sponville; Jean Delumeau; Arlette
Farge
EccoS Revista Científica, vol. 9, núm. 1, janeiro-junho, 2007, pp. 223-230
Universidade Nove de Julho
São Paulo, Brasil
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A mais bela história da felicidade,
de André Comte-Sponville; Jean Delumeau; Arlette Farge.
Tradução de Edgard de Assis Carvalho e Mariza Perassi Bosco
Difel: Rio de Janeiro, 2006. 169 p.
Rogério Bianchi de Araújo
Afinal, o que é a felicidade? Vivemos em função dela? Pode a filosofia
contribuir na busca do homem pela felicidade? A felicidade é intrínseca à
condição humana? Existem formas particulares de felicidade? Há certezas na
felicidade? A felicidade é algo impossível de alcançar? Ser feliz é um imperativo? É possível descrever uma história da felicidade? Qual o lugar da felicidade
hoje? Essas são questões fundamentais que o livro tenta responder. Para tanto,
utiliza-se um diálogo a três vozes: André Comte-Sponville, filósofo e autor
de numerosas obras sobre a ética e a questão da felicidade; Jean Delumeau,
professor do College de France e especialista em história das mentalidades
religiosas e Arlette Farge, historiadora especializada no século XVIII.
O livro está estruturado em três partes, chamadas de atos em vez de
capítulos, assim como numa peça de teatro. São três atos divididos em três
cenas cada um, composto de uma espécie de entrevista com perguntas e respostas num envolvente diálogo rico e questionador. No primeiro ato chamado
“Retorno às origens da sabedoria”, as perguntas são direcionadas ao filósofo
André Comte-Sponville.
Comte-Sponville diz que a filosofia instaura uma nova maneira de pensar a felicidade, principalmente a partir da revolução socrática, período antropológico da filosofia, quando a preocupação fundamental é entender o que é
o homem. Sócrates seria o pensador fundante da filosofia da felicidade, pois
pensar melhor ajuda a viver melhor. Ser feliz e ser virtuoso, segundo o pensamento grego clássico, são necessidades básicas para estabelecer o significado
EccoS – Revista Científica, São Paulo, v. 9, n. 1, p. 223-226, jan./jun. 2007.
Doutorando em Ciências
Sociais – PUC-SP;
Mestre em Filosofia Social
– PUC-Camp;
Professor de filosofia e sociologia na Unip; Imes e Uninove.
São Paulo – SP [Brasil]
[email protected]
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da “vida boa”. O autor primeiro discute o surgimento da filosofia da felicidade, tendo como base os pensadores gregos clássicos. Faz um paralelo com a
posição aristotélica e entre os estóicos e epicuristas. Depois, em Kant, entende
que a felicidade é algo inatingível, pois sempre teremos desejos insatisfeitos e
por isso jamais seremos plenamente felizes. Agir sem esperar nenhuma recompensa, segundo Kant, é o significado da boa ação. Esse é o dever do indivíduo,
cujo objetivo é cumprir com o dever. Essa é a revolução kantiana, segundo
Comte-Sponville. Considera a antropologia de Hobbes mais verdadeira, e a
ética de Epicuro, mais justa. Já na abordagem pascalina, fingimos ser felizes
para esquecer que não o somos. A única felicidade que poderíamos alcançar
está em outra vida, porque a única coisa que desejamos é o futuro, e este não
existe. Comte-Sponville discorda de Pascal no que concerne à desesperança,
pois esta não pode ser tratada necessariamente como uma infelicidade. Toma,
como exemplo, Espinosa, que acreditava ser a felicidade desesperança, porque
ela não espera por nada, pois o real já lhe basta.
Comte-Sponville conclui que a felicidade vem e vai, é momentânea e
relativa e não existe no real, num ideal que é intrínseco ao ser humano e que
nos mantém vivos. Propõe uma concepção modesta de felicidade, atrelada às
nossas experiências da vida. A partir do momento que não nos perguntarmos
mais sobre o sentido da vida, poderemos reconhecer a felicidade.
O segundo ato leva o nome de “A invenção do paraíso”, em que as perguntas são destinadas ao professor Jean Delumeau que inicia a primeira cena
discutindo o significado do paraíso ao longo de alguns momentos históricos,
até chegar a concepção moderna de paraíso, uma morada eterna ao lado de
Deus. A esperança aparece fundada sobre um ato de fé, ou seja, a crença na
existência do reino dos céus e de um lugar postado ao lado de Deus. Jesus é o
elo da nossa realidade com a felicidade do outro mundo. O autor aponta duas
revoluções que abalam a concepção de paraíso: a científica que mudou a representação do mundo e do universo. Sob esse ponto de vista, não poderiam mais
ser localizadas a morada de Deus e a dos sentimentos, na qual o paraíso seria
EccoS – Revista Científica, São Paulo, v. 9, n. 1, p. 223-226, jan./jun. 2007.
um lugar de reencontro com os entes queridos. Encontrar os seres amados do
outro lado é a representação mais fiel da felicidade. No céu e nesse reencontro
de bem-aventurados reina a felicidade eterna, cercada por uma aura de amor
eterno e infinito. Reina o amor entre todos, a Deus, ao próximo e a toda a
humanidade. Delumeau não acredita que o paraíso seja algo perdido e também não crê na existência de um “pecado original”. Defende a idéia de um
inferno minimizado. As pessoas que têm acesso à felicidade eterna recusada
serão testemunhas da felicidade dos outros para, em seguida, serem reduzidas
a nada, pois pressupor que existe um lugar de sofrimento eterno denotaria a
idéia de que Deus não venceu o mal. Não ter acesso à felicidade de viver ao
lado de Deus é a punição eterna.
O terceiro ato é chamado de “O sonho dos modernos”. As perguntas
são agora para a historiadora Arlette Farge. Na cena um, a discussão volta-se
para o Século das Luzes. O século XVIII é marcado pela ascensão da burguesia e pelo predomínio da estética e das aparências. Os eruditos e as elites representam estilos de vida que passam a ser considerados os mais apropriados. O
povo em si não teria tempo e seria considerado incapaz de ter discernimento
suficiente para pensar na verdadeira felicidade. A idéia corrente é que o povo
pensa pouco, é um corpo sem consciência. Aos poucos, as desigualdades sociais vão sendo desnudadas e as idéias de injustiça social tornam-se flagrantes.
Paralelamente, começa-se a atribuir honradez cada vez maior ao trabalho.
Para os trabalhadores do campo, vigora a idéia de que sua união e contato
com a natureza lhes darão garantia da felicidade. Nas cidades, a pobreza começa a incomodar. A partir do século XVIII, associa-se a felicidade aos prazeres dos sentidos e da descoberta, reside em aprender o que é novo. O poder
absoluto do rei passa a ser questionado. O povo quer reconstruir a felicidade
independentemente da vontade do rei, abolindo os privilégios.
No epílogo, os três autores dialogam e respondem a algumas perguntas
pertinentes à sociedade contemporânea. Esta sociedade parece não acreditar
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mais na felicidade eterna. Atualmente, a maior aspiração é a felicidade imediata. O lema é viver o aqui e agora, e o importante é ter saúde.
Comte-Sponville me parece apontar a melhor saída para repensarmos
a felicidade nos dias de hoje. Sugere seguir Espinosa em vez de Platão. Para
Platão, desejo é falta, já para Espinosa, é potência. A felicidade é o próprio
caminho, cheio de obstáculos e incertezas, é a própria vida.
No mundo contemporâneo, em que as futilidades estão na ordem
do dia, alimentadas por uma sociedade de consumo desenfreado, teremos
de aprender a desejar para afastar a pseudofelicidade e nossas ações devem
resultar em momentos felizes cada vez mais freqüentes. Isso, em absoluto,
deve significar comodismo e alienação, e sim coerência e realização, num
processo de valorização contínuo, mais condigno com a nossa condição e
existência humana.
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