Latinmag Letters, Volume 6, Special Issue (2016), C13, 1-5. Proceedings São Paulo, Brasil ANÁLISE PRELIMINAR DE VARIAÇÕES DE CAMPO MAGNÉTICO EM REGISTROS SEDIMENTARES DA LAGOA DOS PATOS, RIO GRANDE DO SUL, BRASIL Nicolau O. Santos1*, Jairo F. Savian2, Gelvam A. Hartmann3, Ricardo I.F. Trindade4, Elírio E. Toldo2, Michel D. Ivanoff2, Everton Frigo5 Laboratório de Geofísica Aplicada à Exploração de Petróleo (LGAEP) – Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas (IPECI) - Universidade Católica de Santos, Santos, Brasil. 2 Instituto de Geociências - Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, Brasil. 3 Observatório Nacional (ON), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. 4 Instituto de Geofísica, Astronomia e Ciências Atmosféricas (IAG) – Universidade de São Paulo (USP). 5 Campus Caçapava do Sul – Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA). * e-mail: [email protected] 1 ABSTRACT Earth’s magnetic field studies have been conducted in archeological and geological records from different parts of the world for the past few millennia. However, there is a large discrepancy in the quality and quantity of data for the southern hemisphere. In this work, there will be presented preliminary results of directional data of the geomagnetic field determined in a sedimentary record of Lagoa dos Patos, Rio Grande do Sul (Brazil) dated for the last 6000 years. The results show stable magnetization components throughout the whole core thus allowing the data to be used for geomagnetic field variation studies and incorporated into the global database. Keywords: Geomagnetic secular variation; Paleodirection; Lagoa dos Patos, Brazil. RESUMO Estudos de campo magnético terrestre têm sido realizados em registros arqueológicos e geológicos de diferentes partes do mundo para os últimos milênios. No entanto, observa-se uma grande discrepância na qualidade e quantidade de dados para o hemisfério sul. Neste trabalho serão apresentados resultados preliminares de dados direcionais do campo geomagnético determinados em um testemunho sedimentar da Lagoa dos Patos, Rio Grande do Sul (Brasil) datados para os últimos 6000 anos. Os resultados indicam componentes de magnetização estáveis ao longo de todo o testemunho permitindo, portanto, que esses dados sejam utilizados para estudos de variação do campo geomagnético e incorporados à base de dados global. Palavras Chave: Variação secular geomagnética, Paleodireção, Lagoa dos Patos, Brazil. Introdução O campo magnético terrestre pode ser estudado diretamente e/ou indiretamente (Hulot et al., 2010). O estudo direto do campo geomagnético somente pode ser realizado após o século XVI até o presente através de dados de observatórios magnéticos, satélites e dados coletados durante as grandes navegações. Com o intuito de estudar variações de campo magnético em um intervalo de tempo mais longo, análises indiretas são realizadas geralmente através de dois tipos de registros: (i) registros arqueológicos, como cerâmicas e materiais de construção e, (ii) registros geológicos, como rochas vulcânicas e sedimentares ou, até mesmo, sedimentos inconsolidados provenientes de ambientes lacustres ou marinhos. Todos esses materiais podem fornecer dados de paleodireção e paleointensidade do campo geomagnético em intervalos de tempos mais distantes do que àquelas determinadas pelos registros diretos do campo (e.g. Merrill et al., 1998). C13- 1/5 Latinmag Letters, Volume 6, Special Issue (2016), C13, 1-5. Proceedings São Paulo, Brasil As variações do campo geomagnético em diferentes escalas de tempo fornecem importantes informações sobre a origem do campo magnético. Entretanto, de acordo com Genevey et al (2008) e Donadini et al (2009), a contribuição de dados de variação de intensidade e de direção do campo geomagnético provenientes do hemisfério Sul é menor que 5% às bases de dados globais e menor que 3% em relação a dados direcionais nos últimos 4000 anos. Portanto, registros sedimentares contínuos da América do Sul podem ser muito úteis à base de dados global, bem como na descrição do campo magnético da Terra para os últimos milhares de anos. Neste trabalho são apresentados dados preliminares de direção de campo magnético de um testemunho coletado na Lagoa dos Patos, Rio Grande do Sul (Brasil) datados para os últimos 6000 anos (Toldo Jr. et al., 2000; 2006). Materiais e métodos Amostragem O testemunho de sedimentos holocênicos (PT-03) foi coletado na região norte da Lagoa dos Patos (Figura 1). Logo após a coleta, o testemunho foi preservado no repositório de testemunhos do Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceânica (CECO-IG) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). As amostras são sedimentos holocênicos provenientes de um ambiente com baixa energia deposicional, o fundo da laguna (Toldo Jr. et al, 2000). As amostras paleomagnéticas foram coletadas utilizando caixas cúbicas de plástico com 8 cm3 de volume posicionadas lado a lado ao longo de todo o comprimento do testemunho com orientação para a maior profundidade, totalizando 184 espécimes coletados. Figura 1. Localização do testemunho coletado. Medidas Magnéticas Medidas paleomagnéticas e de susceptibilidade magnética foram realizadas no Laboratório de Paleomagnetismo do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas, Universidade de São Paulo (IAG/USP). A análise dos dados foi realizada no Laboratório de Geofísica Aplicada à Exploração de Petróleo (LGAEP) do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas (IPECI) da Universidade Católica de Santos (UNISANTOS) utilizando o software Remasoft da AGICO Ltd. As medidas de susceptibilidade magnética foram realizadas utilizando o susceptômetro Kappabridge MFK1-FA da Agico Ltd. em duas frequências de operação (976 e 15616 Hz) em um campo de 200 A/m C13 - 2/5 Latinmag Letters, Volume 6, Special Issue (2016), C13, 1-5. Proceedings São Paulo, Brasil em temperatura ambiente. A susceptibilidade magnética (χ) é um indicativo da contribuição de todos os materiais magnéticos (ferromagnético, paramagnético e diamagnético) na amostra por completo (e.g. Evans e Heller, 2003; Liu et al, 2012). Dados direcionais foram adquiridos através de desmagnetização por campos magnéticos alternados (AF) em espécimes orientados. Na desmagnetização AF, a variação das componentes da magnetização remanente natural (NRM) é medida pelo momento magnético após cada passo de desmagnetização. Caso exista apenas uma componente magnética contribuindo para a NRM, nenhuma variação direcional será observada. Entretanto, caso existe mais de uma componente magnética, haverá mais de uma direção e uma mudança vetorial será observada. Geralmente, a componente magnética estável é a componente que persiste até os últimos passos da desmagnetização. Para identificar a componente magnética estável, análise vetorial (Zijderveld, 1967) e análise da componente principal (Kirschvink, 1980) foram realizadas. Resultados e discussão Medidas de susceptibilidade magnética foram realizadas em todos os espécimes do testemunho. A variação da susceptibilidade magnética com a profundidade é mostrada na Figura 2a. Os valores de susceptibilidade variam entre 2.0X10-8 m3/kg e 5.5X10-8 m3/kg. Pode-se observar que os valores de susceptibilidade não variam com frequências diferentes indicando mínima contribuição de grãos superparamagnéticos na amostra (e.g. Liu et al., 2012). Além disso, observa-se um aumento nos valores de susceptibilidade nos primeiros 50 cm que podem ser atribuídos a maior movimentação de sedimentos na seção mais próxima do fundo da lagoa e possível contribuição de metais pesados provenientes da desembocadura do rio Guaíba ao norte da lagoa (Andrade Neto et al, 2012). Medidas de magnetização remanente natural foram realizadas e são apresentados na Figura 2b. Os valores Figura 2. (a) Susceptibilidade magnética normalizada pela massa (m3/kg); (b) Intensidade da NRM (A/m); (c) Inclinação magnética; (d) Declinação magnética em relação a profundidade (cm). C13- 3/5 Latinmag Letters, Volume 6, Special Issue (2016), C13, 1-5. Proceedings São Paulo, Brasil encontrados de intensidade de magnetização ficaram entre 0.3X10-6 A/m e 2.5X10-6 A/m, que em geral e demonstram um alto valor de intensidade de magnetização presença de minerais magnéticos estáveis. As Figuras 2c e 2d apresentam a inclinação e a declinação magnéticas em relação à profundidade. A inclinação não mostrou um padrão de variação de seu valor que ficou entre -30º e -77º. A declinação variou entre 170º e 300º. Todas as amostras foram desmagnetizadas por campos magnéticos alternados (AF) e os resultados indicaram uma direção de magnetização estável e bem definida. A desmagnetização total dos espécimes ocorreu em intensidades de campo entre 70 e 90 mT (Figura 3), demonstrando a presença de magnetita e titanomagnetita, minerais cuja desmagnetização está neste intervalo de intensidade de campo magnético. Conclusão No total, 184 amostras do testemunho PT-03 foram submetidas a medidas de susceptibilidade magnética, magnetização remanente natural e desmagnetização por campos magnéticos alternados. Os resultados obtidos a partir destes experimentos apontam a qualidade destas amostras em contribuir com o estudo da variação do campo magnético na América do Sul nos últimos milênios. Pretende-se que, após a análise final dos dados, eles possam ser incorporados à base de dados globais e, consequentemente, aos modelos de campo geomagnético. Figura 3. Exemplo de uma desmagnetização AF do espécime 13 do testemunho PT-03. (a) Projeção esférica da direção vetorial, (b) diagrama ortogonal Zijderveld e (c) variação da magnetização (A/m) em relação a intensidade do campo de desmagnetização (mT). Agradecimentos Agradecemos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq – Processo 457802/2014-6) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES – Processo 2043/2014) pelo financiamento deste projeto. Agradecemos pelo suporte financeiro do Programa de PósGraduação em Geociências – PPGGEO/UFRGS, através do Programa de Formação de Recursos Humanos da Universidade Petrobrás (PRH-PB 215), e a CAPES através do Edital PNPD 2010 para realização da campanha oceanográfica na Lagoa dos Patos. Agradecemos também ao IAG-USP e ao IPECI-UNISANTOS pela disponibilização dos laboratórios para análise dos dados. Referências Andrade Neto, J. S. D., Rigon, L. T., Toldo Junior, E. E., Schettini, C. A. F., 2012. Descarga sólida em suspensão do sistema fluvial do Guaíba, RS, e sua variabilidade temporal. Pesquisas em Geociências, Porto Alegre, Vol. 39, n. 2 (maio/ago. 2012), 161-171. C13 - 4/5 Latinmag Letters, Volume 6, Special Issue (2016), C13, 1-5. Proceedings São Paulo, Brasil Donadini, F., Korte, M., Constable, C. G., 2009. Geomagnetic field for 0–3ka: 1, New data sets for global modeling, Geochem. Geophys. Geosyst., 10, 6, Q06007. Evans, M. E., Heller, F., 2003. Environmental Magnetism: Principles and Applications of Enviromagnetics, Academic, San Diego, California. Genevey, A., Gallet, Y., Constable, C. G., Korte, M., Hulot, G., 2008. ArcheoInt: An upgrated compilation of geomagnetic field intensity data for the past ten millennia and its application to the recovery of the past dipole moment, Geochem. Geophys. Geosyst., 9, 4, Q04038. Hulot, G., Finlay, C. C., Constable, C. G., Olsen, N., & Mandea, M., 2010. The magnetic field of planet Earth. Space science reviews, 152 (1-4), 159-222. Kirschvink, J. L., 1980. The least-squares line and plane and analysis of paleomagnetic data. Geophys. J. R. Astron. Soc., 62, 699-718. Liu, Q., Roberts, A. P., Larrasoaña, J. C., Banerjee, S K., Guyodo, Y., Tauxe, L, Oldfield, F., 2012. 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